Tédio.

Nunca pensei que fosse descrever o Tártaro assim, mas era um completo e vazio tédio.

Retire de sua cabeça sua ideia de “prisão que até os deuses temem”. Não é quente. Não há dor. Não tem monstros.

É só quieto e frio.

Nada mais que isso.

Não sabia onde Annabeth e Luke estavam. Também não havia como saber. A única coisa que eu conseguia enxergar era eu mesma. Um vestido estilo grego tinha aparecido em mim magicamente e eu estava em pé pelo que me pareceram horas.

Eu estava oficialmente irritada.

Por que não podia ser do tipo “lute ou morra”? Quando eu me joguei e pensei que desafios de verdade me esperavam. Mas isso? Não era nem de longe o que eu imaginava.

Bem... A espada sumiu. Ou seja, tudo isso para nada.

Mas eu não estava com raiva por isso.

Estava com raiva dos que se jogaram no abismo para tentar me defender. Será que eles não confiavam o bastante em mim para me deixarem fazer o que é certo?

Cada vez mais eu percebia que deveria ter seguida a ideia do Bryan: atrair e conquistar.

Teria funcionado.

Mas, eu tinha que ter uma ideia brilhante.

Notaram o sarcasmo?

O tempo todo era assim.

Basicamente uma garota amarga se culpando por todas as crises do Universo.

E os dias foram se passando e nada acontecia.

Nem um barulho, nem um sussurro, nem um grito.

Só o silêncio e nada mais além.

Pela primeira vez em muito tempo, tentei falar.

–Ân... Olá?

Eu realmente não esperava uma resposta e admito que senti um alívio imenso ao ouvir pela primeira vez a voz de alguém... Ou algo.

–Olá Ashley, vejo que se juntou a mim.

–É bom finalmente conhecer o meu inimigo. Creio que minha presença dispense quaisquer apresentações. Assim como a sua. Tifão.

–Vejo que não está muito satisfeita com sua condição atual.

Bufei irritada.

–Ah, claro que não. Estou adorando ficar num buraco – respondi sarcástica.

–Você sabe que eu posso mudar isso, não sabe? – disse a voz – Posso fazer de você uma pessoa normal. Sem monstros, você e o filho de Poseidon crescerão e serão felizes. Está em seu destino. Só depende da sua escolha.

– Ele só pode estar blefando – murmurei para mim mesma.

A voz estridente deu uma gargalhada sombria.

–Ah minha jovem Ashley. Você pode ser feliz. Só precisa se juntar a mim.

–Como vou saber se está falando a verdade? – sussurrei.

–Ora, veja por si mesma.

Pisquei e quando abri os olhos estava num colégio.

Uma garota loira - que usava um uniforme antiquado - passava sorridente, indo em direção á um moreno de olho verdes.

–Pers! – disse ela, puxando o garoto para uma área com piscinas – Vamos. Você vai se atrasar para o treino.

Pers.

Percy.

Percy Jackson.

Num clique tudo fez sentido. Eu era aquela garota, eu estava num colégio normal, com gente normal e amigos normais.

Será que Tifão podia mesmo fazer isso?

Ashley tinha sido puxada pelo Percy e havia caído na piscina.

–Você me paga seu... Seu... Cabeça de Algas! – gritou.

–Por que de algas? – perguntou o garoto, claramente se divertindo.

Ashley soltou uma gargalhada gostosa.

–Ora, foi à primeira coisa que me veio na cabeça – disse.

Pude notar a felicidade estampada nos rotos de ambos.

Notei também que não aparentavam ter mais que 14 anos de idade.

Lentamente os dois se aproximaram e, juntos, submergiram.

Na mesma velocidade que chegou a visão se foi.

Nunca fui muito de chorar. Mesmo com os piores monstros eu não havia derramado lágrimas.

Mas eu havia suportado tanta coisa nessa semana que não podia mais me preocupar em ser forte.

Meus olhos, antes marejados, agora transbordavam.

Sentei-me no chão e coloquei minha cabeça entre os joelhos.

Agora eu já soluçava.

A possibilidade de ter um futuro humano e tranquilo ao lado do Percy me reconfortava.

Eu gostava dele, mas nunca me ouviriam falar isso em voz alta.

–Então garota, junte-se a mim e poderá reiniciar sua vida do zero. Renascer normal e feliz. Será bonita e corajosa. Forte e gentil. Alegre por dentro e por fora. Só depende de você. Faça um serviço para mim e te darei o mundo que sempre sonhou.

A proposta ficava cada vez mais tentadora. Como eu podia recusar isso? Recusar uma nova chance de recomeçar do zero. Literalmente.

Há tempos eu ignorava os sonhos, as vozes, o medo. Mas e agora? No Tártaro podíamos ver como a solidão pode ser o pior dos males.

Como eu podia recusar passar a vida ao lado do meu Cabeça de Algas?

Por outro lado tinha o mundo. Ele equilibrava a balança.

Quem é mais importante? Minha felicidade ou o bem geral?

No fundo eu já sabia a resposta.

Ela vinha em minha mente todas as vezes que eu fechava os meus olhos.

Egoísta, egoísta, egoísta! – pensei comigo mesma.

Me levantei do chão com lentidão e dificuldade. As lágrimas ainda rolavam pelos meus olhos e escorriam pelo meu queixo.

Abaixei a cabeça e a voz.

–Tudo bem, você venceu. Eu me juntarei a você e a seu exercito se jurar pelo rio Estige que irá cumprir a promessa que me fez – sussurrei.

Ouvi seus risos de vitória ecoarem pelas profundezas do abismo.

–Eu juro pelo rio Estige que cumprirei minha promessa. Darei tudo que for pedido por você, Ashley Grace.

Um trovão soou - não sei como – por todo o Tártaro, selando nossa promessa.

Eu havia desistido. Eu havia cedido.

Eu havia sido mais fraca do que ninguém jamais foi.

Mas a decisão tinha sido tomada. Agora eu me estava oficialmente no “lado negro da força”.

Involuntariamente um sorriso se desenhou em meus lábios rosados.

–Então, o que estamos esperando? – disse eu – Precisamos destruir os deuses o mais rápido possível!

–Tenha paciência minha garota, antes disso precisamos apresentar minha mais nova tenente ao grupo e destruir a espada de Peleu, definitivamente– disse a voz – Agora você é uma rebelde. Bem vinda ao time.

(...)

–Ashley Grace, filha de Zeus. Senhor dos Céus. Bem-vinda ao exército de Tifão. Juntos, destruiremos de uma vez por todas a hierarquia dos deuses!