DR.ULLEY POV

Eu estava fazendo minha ronda quando uma das enfermeiras de plantão passa apressada por mim, indo em direção ao próximo quarto onde eu iria. Provavelmente alguém a chamara ate lá e então apressei meu passo a acompanhando.

Quando chegamos ao quarto - que agora sei que é de Katherine Castle- nos deparamos com a verdadeira face do desespero em Richard Castle.

Ele explica que a mulher havia acordado e que estava com dor, o que era óbvio, considerando seus olhos abertos e a expressão agoniante deles.

Vou rapidamente até os aparelhos que a monitoravam, checando se algo está alterado, enquanto a enfermeira falava com a Sra. Castle.

Depois de aplicar-lhe um medicamento para dor, que quase imediatamente fez efeito, como posso ver por sua expressão, me viro para o Sr. Castle e o peço para se retirar. Mesmo relutante ele saiu, depois de eu lhe assegurar que ela ficaria bem, dando uma ultima olhada para a esposa, que agora estava mais calma.

Eu podia imaginar o que ele estava passando. E não era difícil perceber o que ele estava sentindo, estava tudo estampado no seu rosto. Todo o medo e a desolação.

Depois que ele sai, me aproximo de Kate.

–E então? Se sente melhor?- pergunto.

–Sim, obrigada- ela responde, a voz rouca- eu estou faminta- completa, parecendo nem pensar.

–Nós vamos cuidar disso em um minuto- sorrio pra ela- agora, como se sente? Consegue se mover?

–Cansada- ela diz- meu corpo está pesado, mas posso movê-lo.

–Tudo bem, isso é ótimo. Com o tempo vai ficar mais fácil.

–O que houve comigo?

–Você sofreu um acidente de carro- respondo- você pode estar um pouco confusa, mas vai se lembrar- garanto. Já vi muitos casos parecidos com o dela, e as primeiras horas após acordar são sempre um pouco confusas.

Ela assente, a testa franzida.

–Eu vou precisar fazer alguns exames, pra ter certeza que você está bem, okay?

–Tudo bem- ela concorda.

A enfermeira me ajuda com os exames que agora são mais simples, e como por um milagre, Katherine não parecia ter sofrido nenhum dano com o acidente.

Claro que ainda seriam necessários exames mais detalhados, mas até agora ela estava se saindo incrivelmente bem.

Quando terminamos peço que a enfermeira traga algo pra ela comer. Ela parece cansada, mas a expressão preocupada dela me chama a atenção.

–Alguma coisa errada?

–Onde ele está?- ela solta rapidamente.

–Ele?-pergunto, e depois me lembro do marido desesperado do lado de fora- Ah, o seu marido. Ele está lá fora. O Sr. Castle não saiu daqui durante todos os dias em que você ficou aqui. Daqui a pouco eu o deixarei entrar.

–Durante todos os dias? Quantos- ela diz devagar e depois para. - Meu marido?

Então era isso. Eu tinha esperanças dela ter conseguido sair dessa sem qualquer dano, mas aparentemente não. Ao que parecia sua memória havia sido danificada.

A pergunta era quão danificada.

**

KATE POV

Eu não queria que ele fosse. Não queria que ele saísse de perto de mim. Mesmo através de toda a dor que sentia, não conseguia tirar sua voz da cabeça e não queria perdê-la.

Depois que o médico entrou e mexeu em algo próximo a mim, a dor como que por mágica havia sumido. E ele também. Não estava em qualquer lugar que eu pudesse ver.

O médico continuou falando algo sobre exames e eu apenas concordei, meus pensamentos ainda cheios dele. Não entendia de onde vinha essa necessidade cada vez maior de vê-lo e ouvir sua voz. Apenas precisava.

Após os tais exames, o Dr. Ulley- como me informou- continuou falando algo, mas eu não o escutava. Até que ele me faz uma pergunta e eu o respondo com outra.

–Onde ele está?- pergunto antes que possa me conter.

O médico fica um pouco confuso no começo mas depois parece entender do que estou falando.

Então ele começa a dizer sobre como o “Sr. Castle” não saiu do meu lado durante todos aqueles dias, e quando começo a perguntar sobre exatamente quantos dias ele falava, outra coisa que ele disse me chamou a atenção.

–Meu marido?- perguntei.

Eu obviamente já tinha notado que estava completamente perdida. Até mesmo meu nome- que agora supunha pelo que ouvi, ser Kate ou algo próximo- me parecia estranho, e o fato de eu ter um marido me parecia surreal.

É uma sensação estranha não saber nada sobre si mesmo. Um pouco apavorante até.

A única coisa que me parecia certa e um pouco familiar, era o homem que estava aqui até pouco tempo atrás. O homem que primeiramente só pude ouvir a voz, mas que foi a primeira pessoa que vi quando abri meus olhos. Ainda me lembro do brilho desesperado em seus olhos azuis.

Ele claramente se importava comigo. E eu já me importava com ele também. Mesmo antes, quando só podia ouvir sua voz, eu apertei sua mão quando ele pediu, sem querer decepcioná-lo.

Era tudo bem estranho.

O Dr. Ulley me tirou de meus pensamentos confusos.

–Eu pedi para agilizarem pra fazer o resto dos exames. Vão vir te buscar daqui a alguns minutos. Enquanto isso, eu vou te fazer algumas perguntas, tudo bem?

–Tudo bem.

–Você sabe qual o seu nome?

–Kate?- eu respondo, mais parecendo uma pergunta do que uma afirmação- Eu o ouvi dizer.

–Kate... Esse é um apelido. Seu nome é Katherine- ele sorriu- um belo nome. Então não se lembra?- eu nego com a cabeça- Quem você ouviu dizer?

–Aquele homem que estava aqui. Castle?-perguntei hesitante.

–Isso. Quando você o ouviu?

–Quando eu acordei. Mas o ouvi antes. Ele falava bastante, e eu ouvia quando conseguia. Na maior parte do tempo eram apenas murmúrios, ou algo assim.

–E o que mais você ouviu?

–Nébula 9- digo rápido- disse algo sobre até sentir falta de ser obrigado à assistir- sorrio.

–E o que mais você se lembra?

–Não muito. Lembro que algo me irritou um pouco. Não o ouvi por muito tempo, não me lembro das palavras. Só de sua voz. Eu gosto dela. - Solto sem perceber, e sinto meu rosto ficar quente.

Por que não conseguia simplesmente me calar? Mas o médico apenas assentiu, sorrindo.

–Você consegue se lembrar de algo mais? De antes ou de depois de acordar?

Eu tento me forçar a me lembrar de algo, mas tudo é um grande vazio na minha cabeça.

–Não, desculpe.

–Tudo bem, vai ficar tudo certo. Eu preciso sair agora, mas daqui a pouco as enfermeiras virão te buscar pra mais alguns exames e quando os resultados ficarem prontos, eu venho pra conversarmos, ok?

E concordo e nesse momento uma enfermeira mais jovem entra empurrando um pequeno carrinho, de onde posso sentir um cheiro de comida. Finalmente!

O médico sai e a simpática enfermeira me ajuda a sentar e a comer. Ela tentou iniciar uma conversa enquanto eu comia, e eu tive que fazer um esforço para acompanhá-la, porque meus pensamentos estavam tomados pelo Castle.

Era desconcertante me sentir assim, já que só o tinha visto uma única vez. Mas ele estava ali, e seus olhos e sua voz eram tão lindos...

Eu queria tanto conseguir me lembrar dele. Pelo que entendi segundo o Dr. Ulley, ele era meu marido. Éramos casados. Eu queria mesmo me lembrar, e isso era extremamente frustrante. As pessoas se lembrarem e me conhecerem, quando eu não os reconhecia. Eu não reconhecia nem a mim mesma.

Tudo o que restava pra mim agora era esperar. Esperar que o médico me desse qualquer expectativa de melhora, esperar que algum dia eu me lembrasse de tudo o que vivi, esperar que o homem com os lindos olhos azuis voltasse e entrasse pela porta, para que eu pudesse ouvir sua voz e apertar sua mão.

No fundo eu sabia que todo esse desejo era um pouco irracional. Mas essa necessidade era maior do que eu, como se estivesse gravada em cada célula do meu corpo.

Desejo, saudade, essa sensação de se importar tanto com alguém que eu não me lembrava de ter visto a não ser a pouco tempo atrás era, no mínimo, desconcertante.