Lealdade, Honra, e um Coração Disposto escrita por Dagny Fischer


Capítulo 35
Capítulo 35 – A Tempestade se Aproxima




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Wolfram acordou para ver que sua primeira impressão tinha sido verdade. Sua irmã agora tinha cabelos pretos e orelhas pontudas; sua filha mais velha tinha costeletas e encolhido quase trinta centímetros, e a mais nova tinha pés peludos e media cerca de um metro de altura. Um Bombur solícito lhe estendeu um copo de água e deixou o quarto, onde ele se sentou e tentou sacudir a tontura para fora de sua cabeça.

“O que, em nome dos céus, está acontecendo aqui?”
“Benvindo a Erebor, meu irmão! E que encontro afortunado, de fato!”

“Irmã! Meninas! Vocês estão vivas! Eu achei vocês! Eu tive tanto medo de que nunca encontraria vocês de novo! O que aconteceu? Por que não levaram seus celulares? Fiquei quase louco sem ter jeito de contatar vocês!”

“Por que a gente carregaria peso extra se estávamos indo para um parque onde não haveria sinal de celular?”
O homem sacudiu a cabeça ante a essa constatação e as mulheres resumiram a história para que não demorasse muito para contar, e conforme elas contavam ficava claro que a memória de Wolfram tinha o mesmo bloqueio que as memórias delas tinham – ele se lembrava de coisas que já tinham acontecido, mas não tinha noção do futuro.

“Vinnie me alertou que alguns Portais têm esse feito, alguns mais rápido, outros mais devagar, então isso não é totalmente inesperado.”

“Fale por si mesmo, irmão! Quem é esse Vinnie?”

“Um dos meus amigos da NerdNet que me ajudou a chegar aqui.”

“O que é a NerdNet?”

“Um bando de amigos que têm, hmm, algum conhecimento sobre coisas estranhas, por assim dizer.”

“Nunca ouvi falar deles! Por que não me falou dessa coisa de NerdNet? Por que eu nunca ouvi falar sobre isso?”

“Você não é nerd o suficiente, querida!”

“Vou considerar isso um insulto!”

“Normalmente, não é você que ouve falar da NerdNet, é a NerdNet que te encontra.” Seu sorriso enigmático não tinha preço. “Bem, quando descobri que vocês tinham pego o mapa encantado, direcionei todas minhas forças em encontrar outro Portal e resgatar vocês; tive muita ajuda.”

“Então você sabia o que esse mapa era capaz de fazer? E o deixou em cima da mesa como qualquer porcaria de papel?”

“E quem ia imaginar que alguém o pegaria?”

Um silêncio desconfortável caiu sobre eles enquanto olhavam para Iris, que subitamente se interessou por um certo cacho de cabelo em seu pé esquerdo.

“Bem, não importa mais, eu achei vocês, podemos ir para casa agora.”

“Como assim?”

“Ir para casa. De volta para o nosso mundo. Qual o problema?”

“Ah, irmão, acho que precisamos esclarecer algumas coisas antes. Em todo esse tempo que passamos aqui na Terra-média nós nos tornamos... ficamos muito próximas de algumas pessoas... se é que me entende.”

“Não, eu não entendo. O que quer dizer?”

“Eu e Lily estamos comprometidas com certos anões. Nossos casamentos serão em menos de um ano a partir de hoje. Nós não vamos voltar.”

“Vocês o quê?”

“Não vamos voltar. Estou noiva de Kíli…”

“O que aconteceu com o seu estado de ‘fora dos negócios”?

“... e Lily é a noiva de Thorin. Ou quem você acha que o resgatou da doença do ouro?”
Wolfram sacudiu a cabeça entre as mãos.

“Acho que vou desmaiar de novo! Isso é, certamente, interferir em outra realidade! Os caras da NerdNet vão me matar, temos um compromisso de não-interferência!”

Ellen riu.

“Não, eles não vão!” Não é você quem interferiu, fomos nós e nós não temos nenhum compromisso com eles!”

“Mas o mapa estava sob a minha guarda.”

“Hmm, bem, então acho que sim, eles vão querer te matar, irmão. Pelo menos você vai ter a desculpa de que nossas interferências resultaram em coisas melhores do que teriam acontecido sem nós.”

“Sim, até onde me lembro, você pode estar certa. Haverá o paradoxo de ter alterado o que Tolkien escreveu, mas como foi ele que usou um Portal de viagem no tempo, o paradoxo já havia acontecido. Os caras vão ter que lidar com isso.”

“Bem, de qualquer forma, seria muito indelicado ir embora imediatamente, Wolf. Precisamos te apresentar à Companhia, e tenho certeza de que vai querer falar com o seu genro, e quero que conheça seu cunhado, e cheguei a contar que fui adotada?”

“Minha cabeça está em turbilhão, mas estou feliz por você!”

O sorriso dele era sincero.

“E por mim, Pai?”

Os olhos de azul de mar profundo procuravam pela aprovação dele. Ele tomou as mãos dela entre as suas.

“Tenha certeza de que não é o que acreditava que um dia iria acontecer, mas que pai não ficaria orgulhoso de ter uma filha escolhida por um rei? Mesmo que isso tudo pareça ter saído de um conto de fadas. De qualquer forma, sei que alguns contos de fadas são verdadeiro.” Então lhe sobreveio uma curiosidade. “E você, Iris? Está tão quieta, o que te perturba? Tem alguma coisa que queira me contra? Ou alguém?”

Ela estava mordiscando os próprios lábios já há algum tempo.

“Não, Papai, não tenho reis nem príncipes na minha vida de hobbit. Na verdade, Fíli e Kíli são meus Irmãozinhos, mas não é a mesma coisa que ser plenamente adotada como a Titia foi pelo Balin e o Dwalin. Tudo que tenho a declarar é um namorado completamente obsecado em voltar para sua casa no Condado.”

“Bilbo Baggins!” Wolfram constatou com alegria. “Esse nome está destinado a ser lembrado, só não me pergunte por quê! Será um orgulho cumprimenta-lo, mesmo que eu não saiba o motivo, mas saberei quando voltar para casa, suponho.”

Houve uma suave batida na porta e Dori enfiou a cabeça para dentro.

“Caríssimos, aqueles a quem estávamos esperando chegaram; vocês poderão se juntar a essa reunião?”

“Com certeza, Dori, estamos indo agora mesmo.” Ellen voltou-se para o irmão. “Por favor, venha conosco, Wolfram, não vamos ter tempo para apresentações demoradas bem agora, isso virá no tempo certo, mas nós garotas precisamos participar dessa reunião.”

Ele concordou e foi com sua família para a sala de estar principal.

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Além da Companhia, com Bilbo de volta, estavam lá Gandalf e Bard. Legolas mandou palavra de que estava ao lado deles, ou, melhor dizendo, do lado da paz, e que concordava que as exigências de seu pai eram indevidas; prometeu a Gandalf dar o melhor de si para mudar as ideias de Thranduil.

Thorin pediu humildemente que Bilbo o perdoasse, e o hobbit não só aceitou suas desculpas mas também pediu as de Thorin, reconhecendo sua parcela de responsabilidade na bagunça que acontecera. O rei não explicou abertamente porque ou como decidiu abrir mão de seu ouro devido, mas concordou que, em troca exclusivamente da Arkenstone, o que quer que fosse necessário para a Cidade do Lago ser reconstruída seria providenciado da sua quota, assim como arranjos seriam feitos para reconstruir Dale, visto que havia sido destruída por Smaug em seu ataque à Erebor. Bard estava tendo dificuldade em acreditar que o rei anão, considerado ganancioso e orgulhoso por seu povo, tinha mesmo mudado daquele tanto e disposto a fazer todas aquelas reparações. Na verdade, a própria Companhia de Thorin estava meio confusa, ainda tentando entender até onde a mudança havia ido. O rei se sentiu livre para explicar.

“Aprendi que às vezes precisamos abrir mão de coisas que um dia foram importantes em prol de outras, que são melhores.”

A piscadela de Thorin para Ellen passou quase despercebida para a maioria deles.

“Bem, e o que vamos fazer quanto ao rei élfico?” Foi a Ellen pragmática que perguntou. “Lamento pela dependência econômica da Cidade do Lago para com eles, mas ele não tem nada a exigir de nós.”

“Compreendo se o povo da Cidade do Lago assumir uma posição neutra nisso, mas nenhuma ajuda será dispensada se ficarem do lado de Thranduil, Bard. Espero que compreenda.”

Thorin era o diplomático agora.

“Da minha parte está claro, ó Rei sob a Montanha. Mas, mesmo que eu fale como um general, e que muitos me considerem seu líder, a Cidade do Lago ainda responde ao Mestre, e ele é tão ganancioso quanto o rei élfico. Não posso fazer promessas em nome deles.”

“Não, você não pode, mestre Bard.” Gandalf disse lentamente. “Deve-se lidar com Thranduil de outro jeito.”

“E que jeito seria esse, mago?”

“Essa resposta ainda está por vir.”

“Assim como está por vir o exército do meu primo Dáin Pé-de-Ferro. Não farei guerra contra o povo da Cidade do Lago, enquanto esse povo permanecer neutro, mas não suportarei cerco do povo de Mirkwood em meu próprio lar.”

Wolfram se alarmou e inclinou a cabeça em direção a Ellen para sussurrar.

“Eles estão falando de guerra de verdade? Pessoas matando pessoas? Pensei que homens e anões e elfos fossem povos civilizadas!”

Ela respondeu no mesmo tom abafado.

“Irmão, aqui na Terra-média isso é civilização. Se quiser saber o que é barbárie, vá fazer amizade com os goblins.”

O homem sacudiu a cabeça, de olhos arregalados, em resposta.

Estavam nesse dilema quando foram surpresos pelo conjunto de espelhos de Nori cintilando uma mensagem. Ainda não tinham determinado um código completo para usar, e Ellen pretendia perguntar a Wolfram se ele podia deixar um esquema de código Morse, mas o que já tinham combinado era o suficiente para saber que estavam sendo chamados ao balcão. Alguém estava lá para falar com eles.

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“Salve, Roäc, filho de Carc, que suas penas nunca caiam!”

“Salve, Thorin Escudo-de-Carvalho, velho chapa! Tem algum biscoito no seu bolso?”

Wolfram balançou a cabeça não apenas por ouvir o grande corvo falar, mas também pela informalidade de sua fala, com a qual Thorin parecia não se importar. Bem, se ele estava acostumado com o jeito de suas filhas falarem, também não se importaria com o pássaro.

Thorin tirou um biscoito do bolso e o entregou ao corvo.

“Você vai acabar gordo e lento feito uma lesma.”

“Obrigado por seus elogios.”
“Roäc comeu o biscoito duma vez.

“O que o traz aqui, ó mais nobre de todos os corvos?”

“Um pouco de fofoca, como de costume.” O pássaro curvou o pescoço procurando outro biscoito. “A nuvem negra que vem do Norte não está ligada a nenhuma tempestade que vocês possam sentir lavando seus rostos; é uma vasta nuvem daqueles pássaros pretos que se refestelam em campos de batalha, e de morcegos que servem a desígnios mais obscuros; o horror sobrevém sobre todos vocês!”

Os ouvintes de Roäc olharam para ele desalentados; pois seu posto de vigília dava visada para todos os lados menos o Norte, e de lá a destruição se anunciava. Certo de que tinha sua atenção focada, Roäc continuou.

“Você tem mais biscoitos?”

Thorin pôs a mão no bolso e quando Roäc estava se inclinando em sua direção o anão agarrou o pescoço do pássaro.

“Tenho três biscoitos para você, velho chapa. Um se chama quem, o outro é quantos, e o terceiro é quando. Você canta, e eu te dou os biscoitos.”

O corvo foi pego de surpresa, mas parecia um tanto divertido pela resposta rápida de Thorin, e respondeu de bom humor.

“Você terá muitas hostes dos orcs de Azog e bandos de goblins em volta da sua montanha antes que essa noite termine, ó Rei Sob a Montanha, que sua barba cresça sem frescuras!”
“Quanto é muitas?”

“Eu sou um, você é dois, seus amigos são três, e todos nós somos muitos, ó poderoso Thorin!” O pássaro inclinou a cabeça. “Isso significa outro biscoito?”

Wolfram voltou-se para Ellen num sussurro.

“Nem corvos desse porte conseguem contar além de três?”

Ela respondeu em voz tão baixa quanto o que ele perguntou.

“E qualquer outro porte de pássaro consegue contar qualquer coisa que seja?”

Thorin colocou uma porção generosa dos biscoitos de Bombur na ameia e agradeceu o corvo. Gandalf voltou-se para toda a assembleia de anões, hobbits, elfa e homens.

“Ainda há tempo para concílio. Precisamos informar Dáin que seu inimigo é outro do que ele foi convocado para lutar contra, e a Thranduil que agora é a hora em que ele pode mostrar seu valor como representante de um dos Povos Livres da Terra-média! Apressemo-nos!”

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Não voltaram logo para o acampamento, visto que Gandalf queria falar um pouco mais com o recém-chegado, apesar de sua pressa. Wolfram foi adequadamente apresentado à Companhia como o irmão doze anos mais velho de Ellen, e pai de Lily e Iris, mas então o mago cinzento o cumprimentou de um jeito que surpreendeu a todos.

“Bem vindo aos círculos de Arda, Wolfram o Verde!”

“O que quer dizer?” Perguntou um Wolfram surpreso, de olhos arregalados.

“Já era tempo de Yavanna mandar mais alguém de sua parte para ajudar na contenda.”

“Lamento, senhor, mas deve haver algum engano. Nasci humano, de pais humanos, e mesmo atravessando o Portal me mantive humano, vê? Não me lembro de nada que não seja relacionado à minha vida humana, e nunca fui para Valinor, sou um cantor medonho, então, não, sem chance, de jeito nenhum sou mesmo que remotamente associado à qualquer coisa da sua ordem!”

Gandalf sorriu, divertido.

“E onde você me ouviu dizer algo diverso disso?”

“Ah, quando você mencionou Yavanna mandar alguém da parte dela?”
“E você acha que ela não pode escolher um campeão em algum outro lugar ao invés de mandar pessoalmente alguém de Valinor?”

Wolfram olhou para baixo, confuso.

“Ah, ela podia pelo menos ter perguntado?”

O mago cinzento riu.

“Pode apostar uma lata de atum que ela o fez, e que você concordou, mesmo que você não estivesse ciente de quem ela era, naquele momento.”

Thorin estava muito interessado no assunto.

“Então ocorre que teremos dois magos ao nosso lado nessa batalha? Isso será esplêndido!”

O homem pareceu entrar em pânico, acenando ‘não’ com as mãos, esgazeado. Gandalf veio em seu socorro.

“Lamento, Thorin, mas meu colega aqui não tem treinamento nenhum. Seria perigoso para todos nós tê-lo brandindo seu cajado, e até onde sei ele não tem nenhum treino em luta, não é assim? Nem mesmo o treinamento que essas três damas tinham quando as conhecemos.”

“Sim, é isso mesmo, não tenho nenhum treinamento, nenhuma habilidade, nenhum desejo de estar num campo de batalha, então não precisam se preocupar, vou ficar aqui fora do caminho com as garotas, certo?”

Thorin e Gandalf trocaram olhares, mas não disseram nada para ele a respeito de sua última afirmativa. Seria caso de as mulheres falarem com ele sobre esse assunto.

Com isso resolvido, Gandalf e Bard deixaram Erebor para se reunirem com elfos e homens, já tendo planejado com Thorin e tendo mandado Roäc para informar Dáin e seu povo sobre a mudança da maré.

Wolfram teve sua conversa em particular com Thorin e seus sobrinhos, visto que queria pelo menos conhecer um pouco mais aqueles que capturaram os corações de duas das pessoas mais importantes em sua vida, e Fíli não ficaria de fora disso por nada desse mundo; o que Wolfram ouviu o deixou mais à vontade, mas a distância era algo com que ele ainda teria que lidar.

“Entendo suas preocupações, ó Wolfram o Verde, mas juro que sua filha será tratada com uma rainha. Na verdade, ela será uma rainha.”

“E então, existe o Portal de Passagem, não é?” Kíli propôs. “Se você veio através dele uma vez, pode vir novamente para nos visitar!”
“Sim, é uma boa ideia, apesar de que não é uma passagem muito fácil para quem não está acostumado a mergulhar. Mas esse Portal não fica aberto o tempo todo, e tive realmente muita sorte de encontra-lo aberto, ou pelo menos foi o que meu amigo Vinnie disse. Além disso, há um descompasso de tempo, porque pelo que consigo calcular elas se aventuraram aqui na Terra-média por coisa de sete meses enquanto que no meu mundo se passaram apenas quatro semanas.”

“Vimos pessoas que parecem ser do seu mundo nas profundezas de Mirkwood; talvez haja outro Portal, também.” Fili acrescentou. Wolfram guardou essa observação.

“Vou tentar descobrir isso com meus companheiros da NerdNet.”

“Seria uma honra tê-lo presente em nossos matrimônios.” Thorin disse. “Pense carinhosamente sobre isso, e se houver algum Portal aberto para você vir, nossos humildes salões estarão sempre abertos para você, mestre Wolfram. Isso é o que verdadeiramente quero dizer.”

Apertaram as mãos calorosamente, e os anões foram terminar os preparativos para a batalha vindoura.

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Até perto do pôr do sol, Wolfram ainda não tinha entendido que apesar de sua oferta de ficar para trás com as meninas, as meninas não tinham a menor intenção de ficar em casa. Depois de olhar com interesse todos os preparativos de armamentos e armoraria que os anões estavam fazendo, voltou para o quartel-general e encontrou as três plenamente blindadas com o melhor de Erebor, de elmos lavrados com prata a lorigas de cota de malha de mithril, de guarda-braços de aço leve a espaldadeiras perfeitamente articuladas. Lily estava reorganizando suas aljavas para ficarem mais equilibradas e Iris e Ellen estavam afiando suas espadas.

“O que vocês pensam que estão fazendo?”
“O mesmo que todos da Companhia da qual fazemos parte estão fazendo, irmão. Nos preparando para a batalha.”

“Sem chance! Vocês não vão para essa batalha, o que estão pensando?”
“Papai, não somos as bonecas de princesinhas que você pensa! Somos capazes, não vamos deixar a Companhia sem a nossa ajuda!” Reclamou Lily.

“Que ajuda? Vocês são duas meninas urbanas do século XXI, uma delas uma adolescente, sem nenhuma experiência bélica; deixem a guerra ser feita por guerreiros, se é que tem que ser feita!”
“Lamento, irmão, mas acho que você ainda não está bem informado.”

Ellen mediu passos diante dele, tentando argumentar, apesar de compreender a resistência do irmão. Contou nos dedos.

“Considerando que na verdade Iris matou o Rei Goblin…”

O quê?”

Os olhos arregalados de Wolfram mostravam seu espanto.

“Ele me chamou de filhote.” Foi a explicação simples da garota.

“...e Lily atirou uma flecha no olho de Smaug...”

Você fez isso?”

A garota apenas assentiu.

“...eu diria que elas acumularam treino e experiência suficientes nos últimos meses para garantir boas probabilidades numa batalha.”

“Ellen, como é que você pode dizer uma coisa dessas? Você não pode arriscar a você mesma e às minhas filhas por uma guerra que não é sua, num mundo que não é seu! Por favor!”

“Wolf, você pode dizer que esse não é o seu mundo, mas, lamento, agora ele é de fato o meu mundo, e é o meu povo indo para a guerra!”

“Você pode responder por si mesma, mas não pelas minhas filhas!”

Wolfram estava realmente zangado, mas suas princesinhas haviam se tronado estranhas para ele; ou, melhor dizendo, haviam adquirido a atitude que ele esperava que tivessem, mas num tempo e lugar onde isso podia ser muito mais perigoso do que ele podia contar.

“Sua primogênita é noiva do rei, e uma guerreira orgulhosa!” A anã se defendeu. “Eu teria vergonha se fosse deixada em casa costurando mortalhas para meus companheiros!”

“E você, Iris? Santo Eru, você só tem dezesseis!”

A garota hobbit desembainhou suas espadas gêmeas e fez com que cantassem em suas mãos com movimentos quase rápidos demais para que ele os seguisse com os olhos.

“Vinte e cinco em idade de hobbit, na verdade.”O rosto dela era calmo como uma represa pronta para romper. “Sabe, meu pai me ensinou um velho ditado alemão que dizia que ‘se faz mal o suficiente quando não se faz nada de bom’. Agora estou aqui na encruzilhada de fazer alguma coisa boa e não fazer nada.” Ela parou e embainhou as espadas sem nem mesmo olhar para as bainhas, e então fixou seus olhos de azul celeste em Wolfram. “Qual estrada meu pai me aconselha a tomar?”

O homem balançou a cabeça. Entendia os pontos de vista delas, mas tendo acabado de chegar na Terra-média e nas lutas dos anões, ainda era alguém de fora, apenas tentando proteger sua família. Wolfram ainda estava tentando achar uma maneira de ficarem a salvo sem lutar de verdade, mas ajudando na batalha de qualquer forma porque era a coisa certa a fazer, quando ouviram o som de cornetas na distância.

“O que é isso?”

Não teve tempo de receber uma resposta. A frigideira favorita de Bombur, destramente manuseada por Ellen, tiniu em sua cabeça e o mandou para o mundo dos sonhos, onde podia filosofar o quanto quisesse.

“Lamento, irmão, mas não temos tempo para negociações agora.” A elfa voltou-se para as garotas. “Ele vai ficar bem, já fiz isso antes. Vamos coloca-lo numa cama e fazer o que tem que ser feito.”

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Wolfram acordou com uma leve dor de cabeça e por um momento não se lembrou por quê. Na verdade, nem mesmo lembrava onde estava, mas isso retornou à sua mente bem rapidamente. Sentou-se na cama, preocupado, olhando em volta procurando por suas filhas e irmã; nenhuma delas estava à vista, nem elas nem nenhum anão, hobbit, mago, qualquer coisa. Então se levantou, tentando achar seu caminho no lugar estranho, chegou à sala de estar e encontrou um bilhete sobre a mesa principal, endereçado a ele na letra angular de sua irmã.

“Caríssimo irmão,

Lamento por ter te acertado (de novo!), mas tem um trabalho sujo a ser feito lá fora e alguém tem que fazê-lo.

Enquanto estamos ‘trabalhando’, te peço, por favor, que nos perdoe, porque realmente não há maneira de ficarmos de fora dessa batalha. Como tentei explicar, essa guerra é nossa até as últimas consequências.

Também te peço que, por favor, use seus conhecimentos linguísticos para traduzir o arquivo anexo, oops, quero dizer, a folha de papel debaixo dessa, porque creio que você seja a única pessoa vivente na Terra-média capaz de lê-la. Sei que a primeira linha diz ‘Vida longa e próspera’ em Esperanto, mas do restante do texto tudo que consegui entender foi a palavra ‘Klingon’, então, como você é o Trekkie da família, espero que possa descobrir o que diz. Isso é o que está escrito na Pedra Tumular perto do Lago Espelho de onde você entrou na Terra-média; espero que tenha instruções de como usar o Portal de Passagem para voltar.

Ore por nós.

Amor para sempre,

Ellen Fundinul”


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