Todos estávamos na mesa da sala principal do bunker, Castiel disse que explicaria tudo. Aquilo era muito estranho, eu sabia que a família do receptáculo ainda existia... Mas elas duas sabia muito bem da situação e que não poderiam ter o Jimmy de volta. Então o que essa garota estava fazendo ali? Será que a esposa também teve contato com ele? Será que ele ia abandonar o corpo?

A garota me encarava o tempo todo, ela tinha os mesmos olhos azuis do Cass. Mas os dela não eram puros e vivos como os dele, pelo contrário, havia muita raiva e rancor naquele olhar.

– Então, não vai nos explicar por que trouxe outra pessoa para cá? - Dean perguntou cruzando os braços.

– A Claire precisa de um lugar para ficar, a mãe dela a abandonou há anos... Ela não tem lugar para ficar. - Castiel explicou.

– E onde ela esteve esse tempo todo? - Sam perguntou.

– Eu estive pulando de orfanato em orfanato e algumas casas de apoio. - A menina falou com desdenho - Minha mãe me largou com minha avó logo depois que esse daí deu as caras pois disse que "precisava se encontrar" e até hoje não achou... Então minha avó faleceu.

– Não me parece tão ruim, pelo menos é um teto. E fatalidades acontecem, todos morrem um dia. - Cruzei os braços. Sei que pareceu rude e insensível, mas essa pirralha me olhava como se eu fosse a pior pessoa do mundo.

– Queria ver se pensaria assim, estando na mesma situação! - Ela praticamente rosnou pra mim.

– Eu vivo isso, queridinha! Cidade em cidade, todos da minha família morreram! A diferença é que eu arrisco minha vida e salvo as pessoas, não sou uma pirralha egoísta que causa problemas! - Bati na mesa me inclinando para frente.

– Ei, calma aí, ruiva... - Dean segurou meu ombro e então notei que todos me olhavam assustados, até mesmo o Kevin que não sabia metade do que estava rolando ali.

– Escuta aqui, eu não pedi pra esse anjo me trazer aqui! Aliás, a última coisa que eu quero é ficar perto dele! - Ela se levantou e jogou a sua bolsa por cima do ombro - Então se alguém puder me deixar na estrada mais próxima, eu arrumo uma carona, vocês fingem que eu nunca existi e a ruiva aí pode viver feliz de novo.

– Claire, você não pode voltar para aquela vida. - Castiel se aproximou dela - Eu sei que fiz muito mal para você e sua família e me sinto na responsabilidade de ajudar.

– Não, você não precisa fazer isso! Eu me virei muito bem durante esses anos todos.

– Bom, tá na cara que você não soube fazer isso direito. - Sam falou - Por que não fica aqui com a gente? Não é o melhor lugar para uma adolescente, mas é seguro, grande, sempre tem gente... Não é tão ruim.

– Agradeço, mas eu já estou acostumada a ficar sozinha. E está na cara que não sou bem vinda aqui. - Ela me olhou pelo canto dos olhos.

– Ótimo! Agora eu sou a vilã! - Rolei os olhos - Não estou dizendo que não te quero aqui, estou dizendo que não é uma boa ideia! - Me virei para os irmãos - Vamos lá, vocês dois respondem, quando foi que envolver uma criança no nosso mundo deu certo?

– Nunca... - Os Winchester responderam com pesar.

– Ela não é uma criança! Tem 17 anos! - Castiel protestou.

– Cas, eu sei que se preocupa com ela e tudo mais... Mas olha a nossa situação, somos alvos do céu e do inferno! Não acha que ela estará mais segura longe de nós?

– Eu concordo com a ruiva! - Ela anunciou.

– Bom, apesar de também concordar com a Meghan - Sam falou -, eu também acho que pra ela não tem mais volta... Quer dizer, quantos anjos e demônios já não devem ter visto o Cas com ela? Não podemos largá-la novamente nesse mundo. Seria como assinar a sua sentença de morte.

– Então é isso? Eu agora estou presa aqui? - Ela se virou para o anjo - Não basta o que me fez há anos atrás... Agora você tirou a minha liberdade?

– Claire, eu...

– Não diga que queria me proteger! - Ela interrompeu o Cas - Você nunca devia ter me trazido aqui! Eu não suporto olhar para você, Castiel! - Então, algumas lágrimas raivosas começaram a escapar dos olhos da garota - Você acabou com a minha vida! Você matou o meu pai!

– Ok, primeiramente: Você precisa se acalmar. - Me levantei.

– Não me diga o que fazer, sua vadia barata. - Claire cuspiu as palavras.

– Como é que é, garota? Tá achando que está falando com quem?

– Oh! Calminha aí, as duas! - Dean interviu - Sam, você vai conversar com a Meghan e eu e o Cass vamos bater um papinho com essa moça aqui.

– Eu não quero conversar com ele! - Claire cruzou os braços e virou as costas para o anjo.

– Certo, então o Cas fica aqui batendo um papo com o Kevin e que tal nós dois termos uma conversa? - Dean revirou os olhos e puxou a garota para a cozinha.

Os outros três começaram a me encarar, Sam mantinha uma sobrancelha erguida, Castiel fazia aquela carinha de cachorro abandonado e Kevin me olhava como se esperasse alguma coisa.

– O que é?

– Nós que perguntamos, você partiu para cima da menina! - Sam cruzou os braços.

– Ela me chamou de vadia! Olha só, além de ser perigoso para ela... Não vai dar certo! Nós duas debaixo do mesmo teto...

– Meghan, por favor. - Cas veio até mim - Ela está sozinha, a mãe a abandonou por minha causa. O pai dela era uma boa pessoa que tinha fé em um Deus que não se importava realmente com ele, eu me sinto culpado.

– Você não tem culpa de nada! Só estava seguindo ordens e fazendo o que achava ser certo!

– Bom, ela não pode ficar sozinha! Ela tem problemas. - Kevin comentou - E o Castiel estar usando o corpo do pai dela não ajuda muito.

– Você falando desse jeito, também não ajuda! - Repreendi o profeta.

– Mas ele está certo... - Castiel abaixou o olhar e eu levantei o queixo dele para olhá-lo nos olhos.

– Tudo bem, ela fica aqui se isso for te fazer sentir melhor, mas se não der certo, vamos levá-la par outro lugar.

– Obrigado. - Ele sorriu e me deu um selinho.

Nós esperamos que Dean terminasse a conversa dele com a Claire, na verdade estávamos preocupados com o que ele poderia estar falando. Mas eu sabia que o Winchester mais velho era um especialista em lidar com filhos desobedientes e rebeldes, afinal, aqui está o Sam que não nos deixa mentir. Por fim, eles retornaram à sala e ele exibia um meio sorriso vitorioso enquanto a menina não tinha uma cara muito satisfeita.

– Eu vou ficar... E tentar me habituar, mas só até estar maior de idade. - Ela falou - O que não deve demorar muito e eu irei embora.

– Que bom! Ficamos aliviados ao ouvir isso! - Castiel disse sorrindo.

– E temos regras! - Dean ressaltou e apontou para o Kevin - Tá vendo aquele nerd ali? Ele está fazendo uma coisa muito importante, então, nada de atrapalhá-lo.

– Nada de sair por aí entrando nos lugares proibidos, como por exemplo, a sala 7B, garagem e despensa. - Sam complementou.

– Você terá seu próprio quarto, assim como todos nós e acho que não preciso dizer para você não se meter nos assuntos do trabalho, certo? - Perguntei.

– Entendi, não atrapalhar o nerd, não ir à lugares proibidos e não ser intrometida. - Ela assentiu.

– Muito obrigado por deixarem ela ficar aqui, com certeza será mais seguro. - Castiel falou.

– Eu também tenho minhas condições. - Claire falou um tanto incerta - Se possível, eu quero olhar para esse anjo o mínimo possível, se vou ficar aqui, adoraria que ele não aparecesse.

– Não mesmo! - Eu discordei e levantei novamente - O Cass vai vim sempre que quiser, como sempre, até mesmo porque ele precisa estar informado sobre o que o Kevin está fazendo.

– É verdade, precisamos do Cass aqui. - Sam falou.

– Tudo bem, Claire... Você vai me ver o mínimo possível. Só aparecerei quando necessário... Se isso a manter em segurança. - Castiel assentiu.

Um pânico me percorreu, eu não queria que Cass sumisse por tempo indeterminado de novo. Ele passa dias fora e volta com essa coisa pra sumir depois? Nada disso! Ele deveria ficar por aqui no mínimo uma semana para me compensar.

– Não! - Agarrei o braço do anjo - O bunker é enorme, você não precisa sair para que ela não o veja... E tem mais, o senhor tem que me explicar porque não deu notícias!

– Eu vou explicar, não se preocupe. - Cas sorriu me tranquilizando.

– Não acredito... Espera aí, vocês são tipo... namorados? - Claire fez uma careta de desgosto - Isso é demais! Não basta estar no corpo do meu pai, ainda tenho que te ver de caso com outra mulher?

– Melhor eu levá-la para conhecer o quarto dela. - Sam foi empurrando a garota pelos corredores do bunker.

– Vai ser uma experiência interessante! - Dean forçou um sorriso para nós.

– Antes de mais nada! Senhor Castiel, o que foi esse sumiço? Sabia que o Kevin tem novas informações? - Me virei para o anjo e cruzei os braços.

– Eu ouvi vocês chamarem, mas eu estava com a Claire. Foi bem complicado, ela estava metida com um cara que a mandava roubar por ele... E que informações? - Ele se virou para o profeta.

– Ah, na verdade é uma hipótese... - Kevin começou a explicar para o Cass sobre a possibilidade de extrair a graça de Metatron.

Eu podia estar enganada, mas o anjo estava escondendo alguma coisa e parecia estar me evitando... Ou talvez fosse apenas coisa da minha cabeça. Como se não bastassem as preocupações, ele ainda arrasta mais outro inocente pra isso. É, eu não odeio a Claire e apesar de tudo, eu a entendo. Também odiaria o Castiel, ou não... Impossível odiar o dono desses olhos adoráveis.

Foco. Meghan, foco!

Por fim nós fomos jantar e foi um clima bem tenso na mesa, Dean fazia umas piadas sem graça para tentar acalmar o clima, mas não adiantava, o silêncio desconfortável sempre voltava. E eu nem tive a chance de matar as saudades do anjo desde que ele voltou! Essa garota estava sendo uma bela pedra no sapato... Mas parece que apenas eu achava isso, pois todos estavam adorando a nova mascote.

– Você não vai comer? - Claire, que estava observando todos atentamente, perguntou ao Castiel.

– Não preciso, pra falar a verdade eu nem sinto o gosto.

– Que triste pra você... Isso está ótimo. - Ela elogiou a macarronada que nós preparamos.

– Parece que ela tem o nosso apetite, Meghan. - Dean sorriu olhando para a garota.

– Ótimo, mais um para o time do ataque cardíaco. - Kevin lançou um olhar cúmplice para o Sam.

– Nerds saudáveis? - Ela perguntou olhando para Sam e Kevin.

– Pode-se dizer que sim. - Sam forçou um sorriso.

– Eu estava aqui pensando... - Castiel falou - A Claire tem que terminar a escola, certo? Esse seria o seu último ano...

– Falou certo, anjo... Seria! Porque eu não vou voltar para a escola, eu não me dou bem... - Ela voltou a atenção para o prato a sua frente.

– Sabe, nenhum de nós se dava bem na escola... Com exceção do Kevin. - Sam começou a falar - Eu e Dean mudávamos pelo menos umas sete vezes ao ano, a Meghan e o irmão dela também, vez ou outra era que a gente dava a sorte de ficarmos os quatro juntos no mesmo colégio.

– E você não vai precisar mudar, vai passar o ano inteiro no mesmo... O que já é alguma coisa. - Kevin falou - Fora que podemos te ajudar com as matérias.

– Meu problema não é com os estudos, é com as pessoas... Elas são cruéis.

Todos ficaram em silêncio olhando para ela, nós sabíamos bem como era passar pelas pessoas idiotas na escola.

– Bom... - Eu comecei a falar - Você não vai se preocupar com eles porque... Eu posso... Te ajudar com isso.

– Você quer me ajudar? - Ela ergueu uma sobrancelha me encarando - Acho que dispenso.

– Ok, quando colarem chiclete no seu cabelo e tiver que cortar você vai saber pedir minha ajuda!

A garota levou as mãos instintivamente para os cabelos e fez uma cara de medo. É! Que garota não se preocupa com os próprios cabelos? E eu já havia passado por isso e o Sam também! É, com esse cabelo dele, até eu tenho vontade de colar um chiclete só pra ver o pânico.

– Talvez seja bom para você se a Meghan te ajudar, ela era a que se dava melhor de nós todos. - Sam falou.

– Claro além dos garotos, ela também sabia lidar com os professores... Não tinha um eu não caísse na lábia dela para aumentar a nota. - Dean balançou a cabeça negativamente.

– Eu não era uma rata de livros como o Sam, precisava de uma forma para passar... Então eu levava eles na conversa. - Eu ri.

– Você leva todos na conversa. - Kevin me acusou - Levou até o Castiel.

– Se eu disser que foi ao contrário, vocês não vão acreditar. - Olhei para o anjo pelo canto do olho.

– Aprendeu com o cara da pizza? - Dean perguntou rindo com a boca cheia de macarrão.

– Olha a educação, Winchester! - O repreendi.

– Talvez... - Cass disse com um meio sorriso.

– Castiel! - Me virei para o anjo e bati no ombro dele.

– Não entendi nada e sinto que é melhor continuar assim. - Claire falou e levantou da mesa - Com licença.

– Talvez seja melhor se vocês... Se comportarem na presença dela. - Kevin disse observando ela sair da cozinha.

– Mas eu estou me comportando! O Cass chegou há um tempão e eu mal dei um abraço nele. - Fiz um draminha e depois olhei para o anjo.

– Não se preocupe com isso. - Ele me assegurou - Bom, amanhã eu dou um jeito de levar a Claire na escola, claro que com algumas precauções, tipo símbolos enoquianos e pingentes antipossessões.

– Ih, tá mesmo entrando no papel de pai, hein? - Comentei pegando o copo de refrigerante.

– É, pelo menos você já sabe que ele será um bom pai para o seu pequeno nefilim! - Dean comentou.

Castiel arregalou os olhos e eu me engasguei com o refrigerante, comecei a tossir loucamente e a levantar os braços desesperada, Sam batia nas minhas costas para ajudar a desengasgar, Dean e Kevin caíram na gargalhada e o Cass estava paralisado sem expressão.

– Ficou louco? De onde você tirou isso? - Perguntei depois de retomar o fôlego.

– Ah, pode acontecer... - O loiro deu de ombros.

– Não! - Eu e Castiel falamos juntos.

– Ok, não está mais aqui quem falou...

Eu e o anjo nos entreolhamos e por um segundo, um mísero segundo, eu pude notar uma certa decepção no olhar dele. Castiel desviou o olhar e eu levantei da mesa colocando meu prato em cima da pia e me apoiando no balcão. Aquela conversa foi tão desnecessária quanto inconveniente.

– Cass! - Fui em direção a sala e o chamei, indicando a porta com a mão.

Paramos no meio da segunda sala do bunker, fiquei encarando ele por alguns segundos só para matar as saudades daqueles olhinhos azuis. Então não consegui me conter e me joguei nos braços dele e o beijei intensamente, só o largando depois quando estava quase sem ar.

– Eu também senti sua falta. - Ele sorriu me dando mais um beijo.

– Não suma desse jeito sem dar sinal de vida! - O repreendi.

– Não irei.

– Ótimo, mas acho que vou deixar para brigar com você depois porque agora estou mais interessada em arrancar esse sobretudo de você. - Dei um sorriso maldoso deslizando meus dedos pela gola do sobretudo.

– Também prefiro essa opção. - Ele sorriu pra mim.

Saí puxando o anjo pelo corredor, impressionante como aquele Castiel inocente e fofo se tornou tudo isso. Eu nem podia reclamar, gostava muito mais dessa versão, era intensa e surpreendente. Nem lembro bem como aconteceu, mas só sei que nossas roupas sumiram no mesmo segundo em que fechamos a porta do quarto.