Forgetting Loneliness escrita por Little Alice


Capítulo 1
U: to all that's pure that's in your heart


Notas iniciais do capítulo

Se alguém ler, espero que goste. Pelo menos um pouquinho.

Sugiro a leitura com essa música:
https://www.youtube.com/watch?v=yEEeYdA7k4k

Ou com essa versão da Birdy, que também é boa:
https://www.youtube.com/watch?v=9UnODFBH-io



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Ficamos em silêncio por quase três minutos. Rose se afastou do toca-discos e esperou. Foram cento e sessenta segundos para ajeitar o vinil no lugar, quinze aguardando; e apenas cinco para que dissesse:

― Vamos dançar.

Eu estava debruçado sobre o sofá, estudando cada fissura que havia no teto. Era patético, mas preferia ficar assim, quieto, contando os segundos e os milésimos vazios e silenciosos e analisando coisas estúpidas com uma precisão quase inimaginável. Eu sempre precisava contar para não lembrar. Mas não adiantava. Rose não parou de falar desde que voltamos do almoço. Ela tagarelou o dia inteiro. Tinha medo do meu silêncio. Para ser sincero, eu também tinha.

Durante aqueles três breves minutos, pude ouvir a voz do meu pai, gritando aquelas palavras que assombraram os meus sonhos nos primeiros meses. “Não há nada que possamos fazer, Scorpius”. Vi os olhos do meu avô materno, frios, inexpressivos, sem vida. E assisti a mim mesmo, envolto dos braços da minha mãe, acusando o homem que considerei meu herói durante muito tempo. “Como se você se importasse com alguém”. Nunca disse nada tão desprezível.

Droga.

Eu odiava essa época do ano. Eu me odiava nessa época do ano.

Anda! ― Rose insistiu, me puxando pelo braço. Ela parecia se divertir com a ideia. Na realidade, parecia animada desde que recebeu de sua coruja Penny Lane as encomendas que havia feito antes do Natal. Eram vinis de uma banda trouxa, chamada Smashing Pumpkins. Eu já estava acostumado com aquilo. Meu pai provavelmente torceria o nariz se soubesse que conhecia um bocado de bandas trouxas, mas a opinião dele não importava muito. Não mais.

Quero dizer, minha melhor amiga – e possivelmente a garota por quem eu era apaixonado – era uma Weasley. Meu outro melhor amigo era um Potter. Frequentemente, eu também visitava a cabana do Hagrid com os dois. Conhecer bandas, filmes e livros trouxas não era nada perto disso.

― Eu preciso dizer, Weasley ― respondi com uma careta ― Isso é patético.

Ela acreditava que nós deveríamos passar o ano novo de forma única e memorável, o que na sua concepção – e na minha também – significava: uísque de fogo contrabandeado pelo seu primo James, conversas aleatórias, porém de suma importância, sobre Doctor Who, e uma quantidade razoável de música trouxa. Então após uma visita à cozinha para nos reabastecermos com doces e outras guloseimas e uma breve discussão, porque de acordo com Rose “eu estava sendo resistente demais”, rumamos direto para o sétimo andar.

Mais precisamente, na Sala Precisa.

― Não é patético ― Rose me ignorou ― É apenas... divertido.

Não disse mais nada, porque estava realmente grato a ela. Primeiro, por ter decidido passar o feriado de Natal comigo. Embora dissesse que havia ficado porque nunca conseguia estudar direito com todos os seus primos no seu pé, eu sabia que não era isso. Ela se preocupava comigo e provavelmente não queria que eu fizesse nada muito estúpido, como ficar bastante bêbado e enviar cartas de desculpas ou ressentimento ao meu pai, dependendo do meu humor.

Segundo, por não ter dito nada quando apareci com os olhos vermelhos no café da manhã. Aquela época já era emocional o suficiente, por causa da morte do meu avô, a briga com meu pai e tudo mais, e eu realmente apreciava não ter que ficar respondendo sobre o meu estado de espírito o tempo todo. Terceiro, por suas inúmeras tentativas de me animar e me manter longe de pensamentos perigosos, mesmo que não conseguisse sempre e frequentemente as lembranças do ano passado viessem me assombrar. E quarto, por me aguentar naquele estado lamentável de chatice.

Porque, sim, eu estava sendo uma péssima companhia até então. Do tipo mal-humorado, quieto e ranzinza. Talvez eu já estivesse agindo assim há um bom tempo, há quase um ano, quando tudo aconteceu e eu perdi duas das pessoas mais importantes para mim – uma para a vida e a outra por minha estupidez e orgulho.

Observei quando Rose começou a estalar os dedos, mexendo os quadris, desajeitada. Ela podia entender de música, poções e runas antigas, mas não sabia nada sobre dançar. Com uma risada, tirou os sapatos, lançando-os pelos ares. Ela usava esmalte preto nas unhas dos pés.

― Não combina com você ― apontei.

― Combina sim ― Rose jogou os cabelos na frente do rosto e seu corpo se agitou mais rápido, tentando acompanhar a música ― Esmalte preto, piercing, tatuagem, alargador... Eu sou rebelde.

Não entendi quase nada do que ela falou.

― Você é a pessoa mais gostável do mundo ― precisei gritar para que minha voz se sobressaísse à música. Rose riu, provavelmente se lembrando da vez em que Alvo me disse a mesma coisa para tentar me convencer a ser amigo dela ― E mais uma vez... Isso. É. Patético.

Mas ela não parou de dançar daquele jeito esquisito.

Era patético, mas me fez rir.

― Está vendo? Eu fiz você rir ― observou, sem nem fingir falsa modéstia ― O que não é nenhuma novidade. Eu sempre consigo o que quero.

― Deveria ser da Sonserina então.

Ela apenas fez uma careta.

― Não vai ficar parado, vai?

Queria que outros garotos pudessem ver isso. A maneira como sorria e como os seus olhos azuis brilhavam. Talvez a achassem bonita. Porque eu achava. Bonita de uma maneira legal – e isso quer dizer que não tinha aquele tipo de sonho com ela.

Ok.

Isso não era totalmente verdade.

Eu já havia sonhado com ela desse jeito uma vez. Precisei tomar uma ducha fria para conseguir esquecer aquela imagem. Seus cabelos roçando meu rosto, sua pele debaixo da minha, seus lábios sobre os meus, suas unhas cravadas em mim. E aquilo era errado. E imoral. E eu não queria imaginá-la daquele jeito, mesmo que quisesse muito que aquele sonho se tornasse, no mínimo, um pouco real.

Desde então, reprimi qualquer outro impulso e desejo não sensato e provavelmente ofensivo.

― Dominique e Lily sempre dizem que eu pareço uma louca quando bebo uísque de fogo ― Rose continuou ― Então é melhor honrarmos esse título e darmos um motivo de verdade para me acharem louca. E se você não dançar, só eu vou parecer louca... E isso é realmente solitário e deprimente! ― Eu precisei rir do seu esforço.

― Eu não danço.

― Por que eu danço muito, não é? ― ironizou.

― Depois não reclame se os seus pés estiverem doendo ― eu me aproximei e segurei sua mão. A música não chegava a ser agitada. Rose balançava a cabeça, os cabelos ruivos e revoltos praticamente cobrindo o seu rosto. Eu fiz o mesmo. Por um momento vi as coisas girarem, mas depois descobri que aquilo era divertido. Bem divertido.

― Isso é quase tão bom quanto uísque de fogo ― gritei em tom de brincadeira. Rose concordou e continuou segurando minha mão, me guiando. Nós dois começamos a rodopiar até o sangue subir completamente à cabeça.

Era estranho que eu pudesse me divertir com uma coisa tão simples. Estava definitivamente rindo de tudo aquilo.

A música parou e outra faixa começou, mais lenta e também um pouco mais melancólica. Mas Rose não pareceu desistir. Ela se acalmou, me olhando longamente, e se aproximou, colocando seus braços sobre os meus ombros, enquanto seus pés me conduziam de um lado para o outro.

― Farewell and Godnight – Rose comentou, distraída – Gosto dessa música. “Boa noite, meu amor, para cada hora em cada dia. Boa noite, sempre, para tudo que está no seu coração”.

Ela parou de cantarolar e sorriu para mim.

― Comprei um vinil desses para você também. Ia te dar amanhã. Era para ser surpresa.

― Você sempre compra um ― refleti ― Nunca é surpresa.

― Se me lembro bem, eu não te dei um vinil de presente no Natal, mas uma coleção de luxo de O Senhor dos Anéis. O que significa que está sendo injusto sobre essa questão dos presentes.

― Só porque você é apaixonada pelo Legolas.

― Isso é verdade, mas não vem ao caso ― brincou ― De qualquer forma, é minha obrigação melhorar seus conhecimentos em música boa, mais conhecida como música trouxa. Mesmo você, um sangue-puro esnobe, precisa admitir que estou certa.

― Acho que um sangue-puro esnobe como eu jamais admitiria ― Rose revirou os olhos e fez uma expressão que poderia ser traduzida como você-não-me-engana.

― Tinha que ser da Sonserina...

― É claro que sim. Sou melhor do que um terço dessa escola inteira.

― Babaca.

― O que eu faria sem você, Rosie?

Ela deu um pequeno sorriso, mas não durou muito.

― Você e Al se sairiam bem sem mim ― disse de um jeito triste e me abraçou, apoiando o queixo em meu ombro.

― Você é a pessoa mais gostável do mundo.

― Você já disse isso.

― E tem uma pele legal ― acrescentei.

Rose riu um pouco. Ela se mantinha abraçada a mim, mas sem parar de mover os pés.

― Esse ano bem que poderia ser diferente.

― Como assim?

― Não sei. Só diferente.

Silêncio.

Não precisei contar os segundos e nem as fissuras do teto dessa vez. Apenas pensei em tudo o que eu gostaria que pudesse ser diferente no próximo ano, quando sua voz voltou a soar novamente:

― Acho que a gente não devia ficar só observando. Eu queria poder participar também.

― Do que?

― Da vida.

Eu não disse nada, mas sabia que Rose tinha razão. Eu só nunca pensei que ela pudesse se sentir assim também com relação a vida. E então tive esse ímpeto totalmente irracional e estúpido e a beijei. Porque se havia uma coisa que eu gostaria que fosse diferente, era isso: eu queria que ela soubesse como eu me sentia a respeito dela.

Ela correspondeu meu beijo por não mais do que alguns poucos segundos, tempo suficiente para se recuperar do susto e perceber que aquilo era no mínimo errado. Porque nós éramos amigos e coisa e tal. Ou talvez ela simplesmente não sentisse o mesmo por mim. Rose me afastou com um empurrão, embora não parecesse de fato com raiva. Ela só parecia... Surpresa.

― Perdão ― pedi, mesmo que bem lá no fundo eu não tivesse me arrependido de nada e a beijaria novamente se pudesse ― É que você parece tão fodidamente bonita agora, com as bochechas vermelhas e o cabelo bagunçado e essa cara de confusa, mas extremamente adorável ― completei como se isso justificasse alguma coisa.

Ela abriu um pequeno sorriso, embora eu percebesse o seu esforço em permanecer com a expressão neutra.

― Você também não está nada mal ― Rose me abraçou novamente e eu pude sentir o seu cheiro de lírios e amêndoas.

Ouvimos o relógio dar doze badaladas em algum lugar do castelo, o som se misturando à música que ainda tocava na Sala Precisa.

― Feliz ano novo ― Rose me desejou ― Eu faria um pedido, como sempre faço todo início de ano desde que descobri que gosto muito de você, mas acho que não vou precisar.

E dessa vez quem me beijou foi ela.

Eu me senti pateticamente feliz e esperançoso naquele momento. E terrivelmente disposto a fazer com que as coisas melhorassem. Que melhorassem de verdade. E que pudesse, talvez, resolver alguns dos meus muitos problemas existenciais e a coisa toda com o meu pai. Acho que finalmente eu estava começando a entender o que mamãe me falou uma vez em uma das suas cartas sobre "saber viver o momento e fazer parte".

Não que a vida não estivesse confusa e o mundo não tivesse dado voltas, muitas voltas, mas eu ainda me sentia parte de algo apesar de toda dor e perda e, naquele momento, eu não mudaria nada. Nada mesmo. Eu estava exatamente onde gostaria de estar. E sabia que Rose, de alguma forma, sempre estaria ali para me afastar da solidão e “levantar o meu astral” como ela costumava dizer ou me dar um soco no estômago quando fosse preciso.

Porque a verdade é que eu também estaria sempre ali por ela. Tentando fazê-la sorrir do meu jeito muitas vezes imbecil e errado, mas que parecia estar dando certo.


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Notas finais do capítulo

É isso, gente.

Beijos e feliz ano novo.



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