Corona Radiata escrita por Skarmory


Capítulo 4
4 - just like you imagined


Notas iniciais do capítulo

eu não morri
eu estudo em dois períodos
eu vou tentar postar uma vez por mês ok?



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— Eu avisei.

O avião estava prestes a decolar, e as três poltronas da primeira classe estavam ocupadas por um senhor confiante, um garoto apavorado e uma mulher tentando mostrar que era mais forte que o medo de aviões. Apenas dois dias atrás, quando Matthew anunciou por telefone à Chelsea que estava pronto para se mudar, ela lhe deu as instruções necessárias para que a equipe real de mudanças pegasse apenas o que ele queria. Horas depois lá estava nosso herói colocando etiquetas índigo em tudo o que lhe pertencia, deveras deprimido por saber que toda a sua vida até então podia muito bem caber numa garagem de um metro quadrado. Querendo ou não, morar em Aftermath seria uma ótima oportunidade para Matthew amadurecer cercado por gente inteligente, já que nunca tinha permissão para ir até a universidade onde o avô lecionava.

Matthew olhou para o livro que o chefe da equipe de mudanças entregou a ele, Introdução à Ingrays, um presente da rainha com uma dedicatória escrita à mão pela própria.

Chelsea e Pardis me disseram que você é muito inteligente, então fiz questão de te matricular na melhor sala da melhor escola de Aftermath. Também mandei minha melhor guia para ajudá-los a se acostumarem com o país, visto que tudo aqui é muito diferente de Cambridge. Você verá com o tempo que não é apenas o nerd da sala, e sim uma pessoa inteligente até para os padrões de Ingrays. Tenho certeza que será o melhor em qualquer caminho que escolher, seja como músico na Sinforquestra, como médico em Starre Méssito ou como um geninho da computação em Techwave. Está no seu sangue. Espero que nos tornemos grandes amigos. Com carinho, Nastia (que não é nada austera) Ingrays.

PS: Se decidir seguir como músico, posso ser sua produtora!

Após ler a dedicatória pela primeira vez, sentiu que a Rainha Nastia provavelmente seria uma pessoa de presença forte, que sabia se impor.

— Tenho certeza de ela te colocou na Academia Real de Aftermath — diz Colin — E que vai colocar todos os profeducas na sua cola.

— Profeducas?

— Você vai aprender Lane rapidinho quando entrar na Academia — disse ele, e Matt entendeu o que o avô queria dizer com isso. Assunto encerrado.

— Ainda não acredito que nesse lugar tem uma cidade-hospital! — diz Elinor, com seu melhor sorriso de criança prestes a entrar num parque de diversões. — É mais do que eu poderia sonhar!

— Você só vai para Starre Méssito depois que eu morrer, Elinor.

— Apenas saber que esse lugar existe me deixa feliz, senhor Bellamy.

Matthew pega os fones de sua poltrona e coloca sua fita do R.E.M. no toca-fitas que estava ao lado do porta-copos. Após a quarta música, o aviso da aeromoça de “apertem os cintos, vamos descer” é dado, e os três se despedem com pesar das poltronas terrivelmente confortáveis.

— Queria uma poltrona dessas em casa — diz Elinor, ao se levantar.

— Eu vou na frente — diz Colin — Deve ter um dos realvrums por aqui.

— Realvrums? — perguntam Matthew e Elinor.

— Veículos da realeza.

— Faz sentido — diz Matthew.

Os três seguem andando até a saída; até que veem um jovem alto e ruivo, trajando um uniforme preto com detalhes índigo e segurando um papel com “Bellamy” escrito em letra cursiva.

— Você deve ser o substituto do Tsoy — diz Colin ao jovem.

— Vocês devem ser os Bellamy — diz o jovem, num inglês impecável — O Tsoy acabou na Algematória.

— Por quê?

— Insinuação de adultério. Ele quis casar com a mulher do Príncipe Bória.

Colin cai na gargalhada.

— Ele não mudou nada. Colin Bellamy — diz ele, estendendo a mão.

— Adam Entezami.

— O senhor é marido da Pardis? — pergunta Matthew.

Adam ri.

— Sou. Nós disputávamos o cargo de supervisor de maltchiks, mas acabamos nos apaixonando no meio da disputa. Como não podíamos trabalhar juntos, eu entreguei a vaga e o Príncipe Bória me colocou no Departafuça.

— Departafuça? — perguntam Matthew e Elinor.

— Departamento de Detetives. Vocês vão aprender Lane bem skorre, ou melhor, rapidinho. A Princesa Chelsea queria ver vocês hoje, mas a Rainha preferiu que vocês se acostumassem com Aftermath até o aniversário da Princesinha.

— E quando é? — pergunta Matthew.

— Sexta. E suas aulas começam na segunda.

Todos entram num carro índigo, e Matthew se pergunta por que o banco do motorista está do lado errado, por que o marido da Pardis gosta de dirigir na contramão e por que Corona Radiata parecia um daqueles projetos de cidade ideal que os arquitetos nunca conseguem tirar do papel.

— Essa cidade era uma velharia quando morei aqui — diz Colin.

— A Rainha investiu muito na área de arquitetura e construção. Agora Ingrays é o destino número um de turistas que vem de países tropicais.

— A Algematória ainda aplica pena de morte?

— Não mudou muita coisa desde que o senhor foi embora. Adultério, assassinato, corrupção, pedofilia e estelionato ainda são crimes em que se aplica a pena de morte. O que mudou foi o cadastro nacional.

— Explique, Entezami.

— Como a internet aqui é bem desenvolvida, os geninhos de Techwave bolaram uma versão ainda mais assustadora dele, que agora tem tudo o que você já fez na vida. Em todo lugar tem terminais de consulta do Cadastro, onde dá pra ver sua situação financeira e criminal também. Eles até avisam quantos dias faltam pro vencimento das suas contas.

— O Grande Irmão está de olho em você — diz Matthew.

— Exatamente. A Rainha não gostou disso no começo, mas decidiu continuar com os terminais quando viu a criminalidade diminuindo mais a cada ano.

— E a economia? — perguntou Matthew.

— Eu não entendo muito disso, mas estamos mais ou menos no nível da Alemanha, e os impostos abaixaram no governo da Rainha Nastia, principalmente por causa dos gastos reais. Ela demitiu quase todos os guardas, desativou os realvrums e trancou metade de Caislean Cloiche.

— Ela vivia dizendo que andaria de metrô como todo mundo no governo dela — diz Colin.

— E anda — diz Adam — O senhor conhece a Rainha?

— Estudamos juntos. Eu era colega de quarto do Ethan.

“Eu fiz música na Universidade Nacional de Corona Radiata, amava Ingrays pra cacete e tinha uma namorada, aí a mãe dela ficou doente e o marido que arranjaram pra ela era meu colega de quarto.”, relembra Matthew.

— Puta merda! — exclama ele ao perceber o óbvio.

— Bico fechado, Matthew — diz Colin.

Adam fica surpreso. Como todos no Departafuça, ouviu mil vezes as histórias da Rainha Nastia na época da faculdade, quando ela tinha um namorado e tentou casar com ele, mas a Rainha Milena adoeceu e Nastia precisou casar às pressas com o cara que mais detestava, senão não poderia subir ao trono.

— Até eu ficaria intragável se casasse com quem não queria — disse Adam.

— E a saúde? — perguntou Elinor.

— Verdade, eu lembro que a senhorita Grimes é enfermeira. Eu que cuidei da sua papelada.

— Obrigada, senhor Entezami.

— Starre Méssito é a cidade-hospital, como deve saber. É onde fica a melhor faculdade de Medicina da Europa Oriental e o maior hospital do mundo. Tem um bairro-farmácia lá, onde as farmácias competem entre si pra ver quem vende os remédios mais baratos. Não há imposto sobre medicamentos fabricados em Ingrays e tudo é de graça, até o atendimento domiciliar. Em alguns casos eles te levam de helicóptero até o hospital de graça. E não há muitas enfermeiras aqui, elas costumam cuidar do soro, das vacinas e dos idosos.

— É a mesma coisa que na Inglaterra. A faculdade de Medicina é muito concorrida?

— As faculdades daqui não usam esse sistema — explica Colin — Acertou 95 de 100 questões, entrou. Eles não ligam se terão cadeiras vazias na sala de aula. E se a demanda for grande, eles constroem mais salas. Ingrays conseguiu plantar outra coisa além de mirtilo?

— Temos damascos também, mas como só crescem no sul do país, não dá pra exportar. E temos petróleo o suficiente para abastecer o país. Aqui estamos, Aftermath.

— O que Aftermath tem de especial? — pergunta Elinor.

— O país inteiro mora aqui. Também é onde ficam os mercados e restaurantes, embora os shoppings fiquem em Techwave e Corona Radiata. Tudo em Ingrays fica a no máximo uma hora e meia de metrô de Aftermath. Os idosos costumam morar ao norte da cidade, porque fica mais perto de Starre Méssito, mas como o senhor Colin tem uma enfermeira e adora teatro, conseguimos uma casa bem ao lado do Teatro Real de Aftermath.

Por alguns minutos, todos ficaram em silêncio observando o caminho, até que Elinor se surpreende ao ver uma casa índigo ao lado de um teatro vermelho.

— Acho que é aqui — diz ela.

A casa índigo de dois andares parecia estranhamente acolhedora, com apenas uma cerca baixa demais para os padrões de Cambridge protegendo o quintal. Se não fossem os pinheiros em vez de árvores frutíferas, o caminho para a porta da frente podia muito bem ser uma daquelas alamedas que só se viam em filmes antigos. Todos desceram do carro, e antes de partir com o realvrum, Adam entregou as chaves da casa para Colin, que agradeceu e se virou para a alameda, ainda impressionado com o lugar.


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Colin chamou o táxi índigo pela terceira vez na semana, o que significava que tinha faltado em mais um ensaio com a Resistência para vê-la. Nas primeiras vezes, sentiu culpa por abandonar os companheiros de banda, mas após a quinta ou sexta fuga parou de pensar que Ethan e Anders o chutariam da banda. Anders era o principal apoiador moral de Colin em relação a seu noivado secreto e proibido com Nastia, até porque foi o único que descobriu que o aparente ódio mortal entre os dois era um disfarce muito bem planejado.

O táxi logo chegou ao Révenir, e após pagar os dez flops ao motorista, a maître logo o reconheceu.

— Por aqui, senhor Bellamy — disse ela enquanto o levava para a área privada do restaurante.

— Obrigado, Sasha.

Ele abriu a porta da sala reservada, onde Nastia estava sentada na única mesa, vestindo um suéter índigo e uma calça jeans. Após vê-lo, seu olhar se iluminou e deixou todas as preocupações com sua mãe para trás.

— Desde a última vez que nos vimos, os parlamentares com quem conversei estão contando para minha mãe sobre a ficha suja de Ethan. Ela disse que vai demorar, mas vou poder escolher com quem casar.

— O que não significa que você estará livre para casar com qualquer um.

Ela se levantou e foi para o mesmo banco onde ele estava sentado.

— O que não significa que eu vá escolher qualquer outra pessoa que não seja você. Trouxe o esboço da casa?

Ele tirou o papel dobrado em seu bolso e colocou em cima da mesa. Ela abriu, e ficou impressionada, pois a Casa dos Sonhos desenhada no papel velho podia muito bem ser um trabalho formidável de qualquer grande arquiteto. Não poderiam morar lá, mas e aquele mês de férias que a família Ingrays passava naquela imitação de Versailles? Nastia concluiu que podia muito bem passar seu tempo livre num lugar realmente confortante, com a única pessoa que sabia confortá-la.

— Eu vou tirar isso do papel. Não aguento mais o Palácio Anastásia no verão. Já que eu reinarei de jeans e andarei de metrô, o que custa passar as férias como a pessoa comum que sou?

Colin riu. Ela podia ser tudo, menos comum.

— Eu e você numa casa comum — diz Colin, pensando alto demais. Dar asas à imaginação indubitavelmente era bom, porque queria esquecer a realidade. Saber que Nastia podia ser de outro alguém mesmo o amando doía, então a imaginação se tornou o combustível de que precisava para apoiá-la incondicionalmente em seus intentos.

— Parece incrível.

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A sala era exatamente do jeito que desenhara, tantos anos atrás. Um sofá onde duas pessoas poderiam dormir confortavelmente, uma televisão e uma vitrola ao lado do piano, o mesmo Mason & Hamlin que ficava no quarto de Nastia na faculdade. Uma estante cheia de livros bons com alguns retratos. Uma foto do casamento de Colin e Jennifer, uma foto do aniversário de oito anos de George, uma foto do casamento de George e Agatha, uma foto de George e Agatha segurando um Matthew recém-nascido e uma foto de Colin, Anders e Nastia antes da última apresentação da Resistência.

A casa era perfeita, mas sem ela tudo era entediante.

— Posso ligar a tevê? — pergunta Matthew.

— A casa é sua, Matthew. Você nem precisava pedir.

Matthew liga a televisão, e zapeia pelos canais até que para em um episódio de Scooby Doo, e Elinor se junta a ele no sofá, dizendo:

— Deus, que sofá maravilhoso! Você gosta mais da Velma ou da Daphne, Matt?

— A Daphne é bonita, mas a Velma é legal e inteligente, então prefiro ela.

Os dois são surpreendidos por um anúncio na televisão.

INTERROMPEMOS ESSE PROGRAMA PARA TRANSMITIR AO VIVO UM ANÚNCIO DA RAINHA.

— Boa tarde, cidadãos de Ingrays — diz uma mulher alta, loura e desesperada, tentando transmitir confiança sem sucesso — Me desculpem pelo incômodo e lamento por ser a portadora de notícias tão ruins. A Rússia continua insistindo para que Ingrays se torne parte da URSS, o que é injusto visto que avançamos tanto nos últimos anos. Cada um de vocês sabe o quanto nosso país lutou para se manter longe das garras dos russos, mas agora parece que só temos duas escolhas. Fomos informados que, se não nos tornarmos parte da URSS, entraremos em guerra. Obrigada pela atenção.

DESCULPE-NOS PELO INCÔMODO, VOLTEMOS COM A PROGRAMAÇÃO NORMAL.

— Ela é muito mais bonita que a Rainha Elizabeth — diz Elinor. — Muito mais jovem também.

— Ela tem sessenta e cinco, eu acho — mente Colin, por saber muito bem que os dois tinham a mesma idade.

— Quem dera poder envelhecer assim!

— O senhor tem bom gosto, vovô — diz Matthew, baixo o suficiente para que só o avô pudesse ouvir.

Colin pega Matthew no colo e diz:

— Você também tem, e vai ter mais certeza disso conforme os anos passarem.

— Como o senhor sabe disso?

Colin sorri ao lembrar que Nastia não tinha mudado nada e diz:

— Experiência própria.


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Notas finais do capítulo

nessa fanfic a internet foi criada em 1980 ok?
amo vocês e amo seus comentários também



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