End of the World escrita por Agatha, Amélia


Capítulo 12
Capítulo 12


Notas iniciais do capítulo

Oi, pessoas!
Sabemos que demoramos muito, muito mesmo, mas tentaremos explicar isso. Parece que o universo está conspirando contra nós, só pode ser, porque nunca dava tempo. Quando íamos escrever o capítulo, nosso irmão tinha que fazer trabalho e nós precisávamos ajudá-lo, quando tínhamos tempo de sobra surgia um compromisso e, mais recentemente, quando conseguimos escrever um pedaço relativamente grande, o computador desligou e perdemos tudo! Como a escola era o nosso maior empecilho e agora estamos de férias (só tivemos folga no dia 16), acreditamos que dê para postar mais um pouco.
Sem mais delongas, vamos ao capítulo. Esperamos que gostem, já que houve uma longa demora e é totalmente diferente do que temos feito até então.
PS: Uma leitora nos mandou essa capa. O que acharam dela? Ainda não sabemos de qual das duas gostamos mais e por enquanto vai ser essa mesmo, depois nós decidimos qual iremos usar. Qual vocês preferem?



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Ele realmente estava se esforçando para não rir, mas não era uma tarefa fácil, dadas as circunstâncias. A expressão carrancuda do tio dele nunca fora algo para ser levado a sério. Quando estava com muita raiva, como naquele momento, o homem adquiria uma fisionomia séria, que acentuava as rugas que começavam a surgir seu rosto. Embora ele tentasse parecer austero, Josh sabia que essa não era uma das qualidades de Matthew, por isso só conseguia achar graça naquilo, principalmente por conta do seu rosto jovial. O mais velho possuía feições contraídas de concentração, porém o trabalho que exercia estava resultando em um desastre. O pior era que Harris não percebia isso, e o professor esperava o momento certo para dizer a verdade.

– Seus guinchos não estão ajudando. Quer fazer algo que preste? – o engenheiro perguntou irritado. Pareciam mais resmungos do que palavras.

– Como se esse serviço aí estivesse prestando. É só uma arma, não é mais complicado que matar uma hidra...

– É mesmo? Porque me parece que estou olhando para uma! Só que as cabeças estão nascendo antes mesmo que eu as corte! Tem alguma sugestão, senhor mestre de armas?

– Pensei que demoraria mais até você perceber que precisa de mim, velho – Joshua se aproximou, tomando a Grendal-Sako das mãos do irmão de seu pai. Era mais um dos brinquedinhos do antigo dono da casa em que viviam. Nos últimos dias eles haviam descoberto o tesouro no porão, atrás de uma pilha de caixas empoeiradas que guardavam troféus e medalhas esportivas. A arma de caça estava em ótimo estado e tinha somente cinco balas. O único problema era que não possuía um silenciador, o que dificultava um pouco as coisas e fizera-os pensar pelo menos três vezes antes de decidirem usá-la. – Primeiro passo: aponte o buraco da arma para o seu alvo, assim.

– Parabéns, gênio, acho que esse é o espírito. Agora quer parar de tirar onda com a minha cara e fazer isso de uma vez?

– Relaxa! Esqueceu que eu fiz umas aulas de tiro? A que eu usava era uma Mosin-Nagant, obviamente, mas deve ser a mesma coisa.

– Espero que sim – ao contrário do sobrinho, Matthew havia acordado de péssimo humor, e as brincadeiras do jovem não estavam contribuindo para amenizar isso. Não que normalmente surtisse efeitos positivos, porém algumas vezes suas gracinhas e piadas faziam Matt sorrir. Era um grande tesouro poder vê-lo um pouco mais alegre que o comum. – Já que você vai ficar por conta disso, vou procurar o Max por aí. De quem foi a ideia de pegar o machado da mulher mesmo?

– Deixa o garoto...

Depois de checar a munição, Josh se deitou sobre terra seca, apoiando-se nos cotovelos. Ele aproximou o fuzil de precisão do corpo, deixando a parte superior do cano apontada para a floresta mais abaixo. O antigo proprietário da arma deveria entender do assunto, ou fora mera coincidência, pois a mira óptica tinha uma aproximação perfeita para o relevo da região. Provavelmente o chefe de seu tio gostava de caçar alguns cervos no final de semana.

Mais para frente, o terreno começava a declinar devido à erosão, como uma falésia, contudo eles estavam a milhas de distância do mar e aquele solo fora esculpido pelo rio que se encontrava logo abaixo. Isso com certeza tem um nome, por mais que eu não me lembre qual é. Desistiu de evocar os conceitos geográficos sem muita utilidade que havia apreendido fazia alguns anos e se concentrou em observar o local. Ele tinha uma boa visão do rio e, com o alcance que a arma dispunha, poderia ver um cervo que ocasionalmente estivesse bebendo água tranquilamente em uma longa faixa da margem do rio, sem que o animal o percebesse. Ele nem vai saber o que o acertou, isso se o vento não me denunciar.

– Ele disse que foi checar as armadilhas e nem sequer sabe onde elas ficam!

– Quer parar de resmungar? Está me desconcentrando, acha mesmo que vou conseguir acertar uma baleia sapateando na minha frente com você falando? Já pedi pra relaxar, tio...

– Parece que pelo menos um de nós tem senso de humor, irmão – Matthew disse num tom mais desanimado, carregado do cansaço acumulado nos últimos dias. Joshua se preocupava com ele e o excesso de responsabilidade que insistia em ter sozinho. Não era possível que alguém conseguisse viver daquela forma pelo resto da vida, viver apenas de deveres. Ora pensando no bem-estar de Kate, ora nos atos inconsequentes de Max, ora na jovem Avery, ora no próprio Josh e, por fim, na nova hospede da casa que não costumava falar muito. Ele passava a maior parte do tempo calado, nunca pensando nele mesmo.

– Você é assim com as suas namoradas também? Tenho pena delas... – foi o suficiente. O professor de História sabia muito bem a lista dos assuntos indesejados pelo tio, e com certeza este era um deles. Fora proposital, Josh quisera mesmo irritá-lo, no entanto era só uma brincadeira, que o mais novo se sentia no direito de fazer pela intimidade dos dois. Eram irmãos. Se fosse Max...

Não era uma lista muito extensa, passava por times de futebol americano e carros de corrida, duas coisas que ele não suportava. Havia os assuntos relacionados ao Wayne, que só poderia ser inserido na conversa pelos lábios do Harris mais velho, e que interinamente se referiam a sua má conduta, ao péssimo gosto de Kate para escolher namorados e a como ele não a merecia. O último tópico da lista imaginária de assuntos proibidos eram as namoradas de Matthew; ele só tivera duas e era muito reservado sobre esse assunto, até mesmo com Josh. Ele conhecia seus nomes e convivera com Susana e Courteney, eram pessoas que ele tivera esperança de que fizessem seu tio feliz, porém o tempo demonstrara que não era bem assim.

Talvez a vida amorosa de seu tio fosse estagnada por conta dele e de Kate, foram dezoito anos se dedicando apenas aos dois sobrinhos e ao emprego que sustentara a vida deles em Athens, umas das maiores cidades do estado da Geórgia, com mais de cem mil habitantes. Fora o tio quem pagara a sua faculdade de História e outros cursos à parte que Josh tinha feito; fora ele quem passara horas como professor de reforço para Katherine, assim com também pagara sua faculdade, seus ensaios fotográficos e sua viagem à Disney com as amigas no verão; ele servira como motorista, babá, cozinheiro e muito mais. Como se não bastasse o apoio financeiro, Matthew também era pai, tio, irmão, amigo e conselheiro sempre que podia, sabia com tratar os dois irmãos em suas individualidades e conhecia-os melhor do que ninguém. Contudo, não era a vida que levava que influenciava o coração de seu tio, por mais que sua vida particular sempre fosse deixada de lado.

Matthew se retirou, deixando-o sozinho à espera do animal. Esperar a presa não seria uma coisa rápida, poderia levar até mesmo horas antes que o cervo que os Harris haviam avistado surgisse para se refrescar no rio, se realmente resolvesse aparecer. Paciência era algo bastante necessário naquele momento, e Joshua estava preparado para não cair na tentação e acabar aflito, mantendo seu corpo e sua mente ocupados até o momento certo. Sem que acabasse divagando, ele começou a relembrar os conceitos sobre caça e tiro ao alvo. Tirou seu irmão deprimido dos pensamentos e lembrou-se das técnicas que um velho amigo tinha lhe ensinado em uma propriedade rural qualquer no sul da Geórgia. Por mais que se esforçasse, não conseguia recordar muita coisa do local, nem do dia ou da época do ano, ao menos as dicas ficaram. Lembrava-se de como diferir as diferentes armas e seus calibres, camuflagem em campos abertos, aproveitar o revelo, sentir o vento e outros componentes presentes no terreno, além do principal: como ser um sniper.

Aquele desejo surgira ainda na faculdade, quando havia estudado a Guerra de Inverno. Josh poderia dizer que Simo Häyhä tinha mudado a sua vida. Depois de ter conhecido a fama do mais eficiente franco-atirador da história, o jovem estudante sentira uma necessidade enorme de aprender aquilo, saber como era. Suas aulas com o rifle soviético Mosin-Nagant duraram um ano, e haviam sido interrompidas somente quando os estudos começaram a exigir tempo quase integral. Fora o suficiente para que ele passasse a admirar mais o Provocador e para que, naquele momento, se sentisse apto para abater o cervo.

A espera parecia demorar mais que o suficiente. Harris aproximou o olho direito da luneta, a cada momento que se passava ele tinha mais vontade de puxar o maldito gatilho. Esse era o lado negativo de segurar uma arma tão legal.

Encontrar Maxmillian. Esse era o objetivo de Matthew naquele momento, era por isso que ele caminhava pela floresta. Deveria ter sido algo simples, os três homens saíram de casa apenas para buscar comida, uma vez que as suas reservas se tornavam cada vez mais escassas, porém, com o namorado de sua sobrinha, qualquer simples tarefa se tornava um grande e estressante desafio. Harris aproveitava o tempo que andava sozinho para repassar as suas tarefas do dia, era o que costumava fazer para ocupar a mente, mesmo que fosse mais uma fonte de frustração.

Sua missão, no momento, era encontrar comida. Aquela esperança fora criada quando Josh vira, de relance, um cervo na mata. E lá foram eles, os homens da casa, em busca de uma refeição que talvez nem existisse. Com as escassas latas pouco nutritivas, dois galões de água, algumas barrinhas de cereal, saquinhos de frutas secas, pacotes de biscoito e caixas de cereal, não seria possível alimentar seis pessoas por muito tempo. Havia algumas armadilhas medianas espalhados por alguns cantos, porém a ideia de jantar um cervo inteiro ao invés de alguns coelhos magros tinha sido aprovada por todos. Eles tinham a arma e o animal. Afinal, o que poderia acontecer de ruim além de voltarem para a casa de mãos vazias?

Em seguida, Matt provavelmente checaria o carro, como fazia todos os dias por precaução. Em caso de possível fuga, o tanque deveria estar cheio e o porta-malas, abastecido com comida, água e alguns utensílios básicos. Posteriormente, se nada de especial acontecesse, ele deveria ter a conversa definitiva com Gabriela. Aparentemente, a mulher decidira se estabelecer de vez na residência, por influência de Avery, e havia uma série de pontos para se discutir, além do fator principal: um homem deveria conhecer a pessoa que abrigaria. O diálogo era algo imprevisível para o engenheiro, não sabia o que esperar dela. Hopper aparentava ser um pouco desequilibrada, já que seu emocional não era dos melhores, por motivos desconhecidos. Avery, que certamente sabia a causa, se recusara a falar, o que levava Matthew a duvidar do caráter da mulher, ela poderia ter feito coisas erradas antes daquele acidente. Contudo, este não lhe parecia ser o caso, o estado choque em que a mulher se encontrava após o despertar era visível, ela estava perturbada, seus olhos castanhos fitavam o vazio e não pareciam ter anseio por nada, como se a vida não tivesse mais nada para oferecê-la. Estranhamente, aquele olhar lhe parecia bastante familiar. Com o tempo, seus olhos pareceram ganhar brilho e outras características pareciam surgir no que antes aparentara ser apenas um corpo sofrido demais e que desejava ferozmente o descanso da vida terrena.

Apenas pelas palavras da loirinha, apelido inventado por Josh e aderido por Max, e pelas vezes em que a visitara para levar comida e acompanhar seu sobrinho nos “exames” que ele fazia, uma mulher nova parecia surgir na sua frente, apesar da permanência de alguns traços. Gabriela Hopper havia se mostrado uma mulher reclusa e muito calada, ao menos na sua frente. Sem dúvida Kate e Dickens fariam com que ela falasse, as duas loiras tinham esse dom. Além disso, a nova hóspede era metódica e teimosa de mais para aceitar a sua condição de enferma. A partir do momento em que havia se recuperado das lesões e que a fratura na costela fora descoberta como apenas um pequeno erro de cálculo, oriundo dos olhos leigos de Joshua, a latino-americana arrumara todos os seus pertences ordenadamente em uma combinação que só ela conhecia. Ademais, sempre que o via a mulher perguntava por seu machado.

O machado. A arma parecia ser, para Gabriela, mais importante que qualquer outra coisa. Havia sido de Max a brilhante ideia de levá-lo para a caçada, e Matthew se sentia culpado por ter concordado com aquilo. Era como se tivesse capturado a mulher, mantido-a prisioneira na casa e roubado seus pertences. Suas suspeitas iniciais iam morrendo aos poucos; era muito improvável que, recebendo o machado, Hopper atacasse os moradores da casa. Por isso, Harris começava a pensar que, talvez, o instrumento cortante pudesse ter algum valor sentimental para ela. Com o tempo, o engenheiro percebia que seus motivos para desconfiar dela se tornavam escassos, e isso trazia uma sensação desagradável de culpa. Era por isso que estava se dirigindo para a região das armadilhas em busca de Wayne, para recuperar o machado da administradora e impedir que ele fosse indevidamente usado. Era incerto que o namorado de sua sobrinha estaria no local que dissera, porém era necessário atestar antes de incriminá-lo. O mais plausível seria que aquilo tivesse sido apenas uma desculpa para fazer outras coisas. Por esse motivo, Matthew havia deixado Josh para trás.

Embora soubesse que o sobrinho era perfeitamente capaz de se defender, era difícil deixá-lo para trás. Josh não era mais um garotinho chorando ao lado dos túmulos de Mike e Alex, ele era um homem. Crescia e se tornava cada vez mais parecido com o pai... Naquele dia, em especial, sua maneira animada de agir e a forma com que se vestia, principalmente pela touca, lembravam Michael Harris no dia da sua despedida de solteiro. Matthew ainda se lembrava daquela noite que passara com o pai, o irmão e um grupo de amigos, jamais poderia se esquecer. Não fora apenas uma festa convencional, e sim um acampamento. De madrugada, no meio da mata, ao redor de uma fogueira, os homens contaram histórias, comeram, cantaram, dançaram, riram, beberam... O engenheiro não passava de um garoto de sete anos, o que não impedira todos ao redor de persuadi-lo a tomar um copo de cerveja, seu primeiro e último na vida. Naquela noite, Michael sorrira tanto que chegava a doer em Matt quando pensava no fim trágico do irmão e da cunhada.

O casal havia decidido fazer uma viagem de carro para o oeste naquele verão, iriam até o Texas para visitar os pais de Alexandra. Deixaram os filhos sob os cuidados dos avós e do tio. As crianças ficaram e os pais foram embora, ninguém poderia ter esperado o que aconteceria dias depois, a notícia não poderia ter sido mais devastadora. Michael e Alexandra Harris nunca chegaram ao seu destino, muito menos retornaram do passeio, assim como Joshua e Katherine jamais voltaram para casa. Na hora da despedida, o menino havia pedido para que os pais ficassem, não tinha lhe agradado a ideia de ficar dois meses longe deles.

Matthew sentia a falta de Mike... Mike, que apelido estúpido. A alcunha fora criada por ele nos primeiros anos de vida, na necessidade de chamar o irmão de alguma forma, uma vez que não era capaz de pronunciar o nome do mais velho. A grande diferença de idade entre os dois fizera com que Michael se tornasse uma espécie de mentor para Matt; aonde o primogênito ia, lá estava o mais novo. E, apesar de sentir muitas saudades dele, sabia que ao menos algo de bom havia ficado: o irmão lhe deixara seus dois filhos. O engenheiro não era capaz de imaginar sua vida sem eles.

Talvez Josh estivesse certo, afinal. Matthew estava ranzinza naquele dia, mas ser o responsável era cansativo. O homem não sabia que papel exercer se não aquele, já que a engenharia era inviável no fim do mundo, ninguém precisava de prédios. Tinha que cuidar dos sobrinhos, de Max e, mais recentemente, de Avery. A última era a mais fácil, não tinha causado muitos problemas além do fato de ter roubado sua bicicleta à noite e fugido para tentar perder o medo. Porém ela era uma criança, tinha a mente aberta e poderia aprender; os outros, por outro lado, eram jovens, imprudentes e difíceis de dobrar, isso fazia parte da personalidade deles e parecia ser impossível de se mudar. O fato de ter tido uma vida de responsabilidades deveria ser o motivo do fracasso de seus dois relacionamentos.

Matthew sempre levara tudo na seriedade. Suas prioridades sempre foram bastante claras: os sobrinhos e o trabalho. O resto vinha em segundo lugar. Harris também não era muito realista, e sabia disso, pois, quando se envolvia com alguém, era de verdade. Enquanto as namoradas pensaram apenas em curtir o momento e viver o presente, ele visara uma família e fizera planos para o futuro. Susana Flag havia sido uma colega na sua empresa, e isso mostrara a Matthew que relacionamentos dentro do trabalho não davam certo. Embora tivessem passado meses lado a lado, tinham pouco a dizer um ao outro. Com o tempo, o namoro foi se revelando muito precipitado e se tornando uma amizade. Susana quisera se dedicar mais ao trabalho, se especializar, e o casal tinha preferido terminar tudo. Levou algum tempo até que o homem voltasse a namorar, dessa vez com Courtney James, uma garota que havia se mudado temporariamente para a casa de uma amiga, a vizinha de Matthew. O namoro foi mais intenso e duradouro, contudo o engenheiro foi constatando que não dava a ela a devida atenção.

No fim das contas, Harris sabia que nunca havia amado uma mulher que não fosse de seu sangue. Jamais colocara outra mulher na frente de suas obrigações, jamais abrira mão de algo por uma mulher. Era isso que ele imaginava ser o amor. Matthew queria olhar para alguém e sentir que não precisava de mais nada. Era nisso que invejava Josh em seu relacionamento com Paul. O tio desconhecia os motivos do rompimento, mas sabia que aquilo ainda doía no sobrinho e no outro garoto, que já deveria estar bem mais velho. Era difícil imaginar que duas pessoas tão felizes pudessem optar por ficar separadas.

O engenheiro prosseguiu seu caminho, tentando focar mais no que estava fazendo. Chegando ao local da armadilha mais próxima, Matt constatou que não havia ninguém. Wayne sequer passara por lá.

Maximilian não queria estar ali, no entanto era o único local em que podia ficar sozinho. Fora muito sortudo por ter convencido o velho a deixá-lo sair sozinho, Matthew não costumava fazer aquele tipo de coisa. Sorte não existe. Provavelmente fora a idade, o tio de Kate já não era o mesmo de antes, parecia cada vez mais cansado e chato. Aquilo não importava, o que interessava era que Wayne havia conseguido.

Ele precisava muito dar um trago e fazia muito tempo desde a última vez. Matthew tinha-o flagrado da última vez, e até mesmo Josh, todo liberal, lhe lançara um olhar mais duro. De qualquer forma, todos pareceram muito ocupados com a mulher estranha que encontraram na estrada. Era como se um furacão tivesse passado pela casa desde a chegada dela, e Max gostava disso, de não ter atenção, ficar nas sombras. Podia fazer um punhado de coisas sem ser notado.

Avery havia parado de falar com ele depois daquela noite, se contrabandeara para o lado de Matthew. Wayne não tinha culpa se ela tinha lhe pedido um conselho, a garota deveria agradecer a ele pois, se não fosse por aquilo, Gabriela teria morrido. Uma lástima, pois havia simpatizado com a loirinha desde a sua chegada. O lado bom era que, à noite, tinha Katherine só para ele. Ela havia se mudado definitivamente para o quarto dele, e assim era melhor. Nada de encontros furtivos e saídas no meio da madrugada. Mais um ponto para a estranha. Ao menos Max tinha a namorada para aquecer sua cama à noite, não que eles dormissem muito...

Deu outra tragada no cigarro, que já estava quase no fim. Um dia aquilo acabaria, mas, no momento, quem se importava? O jovem olhou para frente, onde se formava a fumaça do fumo. Todos vão morrer... Do que adiantava tudo aquilo se, no fim, todos acabariam mortos e fedendo, embaixo da terra ou vagando por aí? O melhor era que queimassem todos.

A pior parte era que estavam no fim do mundo, isolados de qualquer tipo de comércio que pudesse haver. Enquanto outros sobreviventes saqueavam estabelecimentos, e certamente faziam isso, eles ficavam caçando coelhos ossudos para comer no jantar. Max preferia virar um fazendeiro e plantar sua própria maconha a perder aquela sensação. É o que eu teria feito, se os defuntos tivessem mandado um memo. Aquilo era estúpido, já que mortos não enviavam memorandos.

– Vamos logo, precisamos checar as outras armadilhas – Matthew anunciou enquanto caminhava na direção do rapaz. Usou um tom mais cordial que o de costume, porém, quando chegou ao lado de Max, sua expressão suave se tornou mais tensa. Quando ficava irritado, as marcas da idade no rosto de Harris se acentuavam e as olheiras se destacavam. – Foi pra isso que você veio aqui?

– Bem... – Wayne encolheu os ombros enquanto tentava iniciar a frase. Seu raciocínio estava lento, e ele precisou de alguns segundos para olhar na direção da mão e perceber que o cigarro já queimava seus dedos. O namorado de Kate soltou o tabaco no chão e pisou nele, apagando-o de vez ao mesmo tempo em que sacudia a mão direita para tentar aliviar a dor.

– Não importa, me dê esse machado e vamos embora. Não estou a fim de discutir – o engenheiro estendeu a mão de maneira impaciente.

– Por que você precisa do machado? Eu estou com ele agora, espera a sua vez. Sei que você deve ter um monte de armas secretas pela casa e fica guardando todas só pra você. Me diz o que te fez líder: ser o mais velho ou ter arranjado a casa? – o jovem deu um passo para trás, puxou o machado do cinto e o ergueu acima da cabeça de maneira desafiadora, como se fosse brincar com Matthew. Naquele instante, se sentia poderoso a ponto de decapitar ou partir em dois qualquer um que fizesse oposição a seus desejos. Inclusive o coroa.

– Isso não é questão de liderança, Max. Essa arma não é sua e não foi certo ter trazido ela – tentando manter a calma, Harris tornou a se aproximar e tocou o ombro dele. Estava tão perto que, caso o machado descesse, acertaria seu crânio em cheio. – Agora pare de ser infantil e me devolva o machado. Você devia se olhar no espelho antes de andar por aí pensando que é o dono do mundo. Está todo encurvado, mal consegue ficar de pé, e sua cara está horrível. Você pode se machucar com isso. Vamos logo para casa, tome um banho e eu me esquecerei disso. Estava pensando em te deixar com o machado até o fim da caçada, mas, dadas as circunstâncias em que te encontrei, é melhor para todos que não esteja em poder de nenhum objeto cortante.

– Se eu te devolver o machado, vou ficar sem arma nenhuma? – a pergunta demorou e Matthew a achou óbvia de mais. Outra prova de que ele não poderia ficar armado.

– Claro.

– Mas um homem deve andar armado! Vamos fazer uma troca: meu machado pela sua faca de caça – não era exatamente uma faca de caça, mas fazia um bom tempo Max namorava a arma que ele apelidara de A adaga. Era a sua chance de tê-la, já que o machado parecia importar tanto para Matthew.

– O que te faz pensar que eu saio com a faca por aí e por que motivos eu a daria para você?

– Daria. Estamos fazendo uma troca, cara. Olha que eu estou sendo generoso com você, já que o machado é mais poderoso. Anda, tira A adaga do bolso e vamos ver qual é maior.

– Garoto, eu estou me segurando muito pra não enfiar a mão na sua cara. Minha sobrinha não iria gostar de namorar um homem desdentado. Talvez aprecie menos um morto – seus pulsos já estavam cerrados, e, para Wayne, lhe pareceu como um cão raivoso.

O soco não veio, tampouco Maximilian teve que matá-lo... Ambos foram impedidos pelo som do bater de dezenas de asas a alguns metros de onde estavam. Os dois se voltaram para aquele lado, sem encontrar nada de mais. Logo em seguida, veio o odor nauseante de carne podre, um aviso claro do que estava por vir. Embora tivessem sido alertados, os homens nada fizeram.

Josh se aproximou por uma leve inclinação de maneira furtiva. Ele se esgueirava lentamente, como se estivesse se escondendo de algo ou alguém. Wayne se perguntou onde estava o cervo que deveria ter sido abatido. Joshua não parecia tão animado quanto no início daquela manhã, trazia uma expressão séria no rosto.

– A maior horda que eu já vi... Eles estão vindo.

Acho que eu vou precisar mesmo do machado.


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Notas finais do capítulo

Então, o que acharam?
Teremos uma viagem semana que vem, e isso deve nos atrapalhar um pouco, porém devemos estar livres na última semana de férias, fora os trabalhos...
Estamos prontas para escrever o próximo, mas precisamos da ajuda de vocês. Os acontecimentos estão quase simultâneos e logo os núcleos se unirão. Gostaríamos de saber se vocês preferem ver a Sarah e a Johanna ou a Avery e a Gabriela no capítulo 13. Isso não altera a ordem da história, e o núcleo menos votado virá no 14. É muito importante que vocês respondam, porque precisamos saber o que preferem para podermos começar a escrever.
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