You make me feel wrong escrita por Lyssia


Capítulo 6
Don't be shy


Notas iniciais do capítulo

A música de título (que é bem fofa e é por isso que tá aqui, pra falar a verdade) é de Cat Stevens.
Ah, pra quem não entende muito de jogos, especialmente os de terror, tem um pequeno (não tão pequeno) guia nas notas finais, para você se localizar nas referências. Escolhi as imagens mais suaves de quando o player tá no comando, então não precisam se preocupar com traumas XDD



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Beleza era algo estranhamente, interessantemente, significativo. Não é que ele via extrema importância nisso, ou era um de seus objetivos de vida ter uma ótima aparência física, mas Shey, até mesmo como desenhista, não podia negar que era algo que contava, sim. Em seus estudos para conseguir se relacionar bem com os outros, ele havia visto que o comportamento mudava, e às vezes bastante, de acordo com quão bonita ou bem vestida era a pessoa com quem se falava.

Devia ser uma frustração para uma pessoa que soava tão séria quanto Sarosh, por exemplo, ter nascido com um rosto tão amigável e infantil, pois parecia o tipo de coisa que impedia, ou ao menos dificultava, que os outros o levassem a sério. Ele também descobriu que caso se usasse roupas pretas e lápis de olho do jeito certo se poderia parecer bastante assustador, mas se o fizesse errado iriam apenas zombar de você (era algo bem recorrente, na verdade, zombar dos outros pela aparência física, o que ele não podia deixar de considerar um impulso humano até que bem intrigante).

Havia, também, aquelas pessoas que eram muito bonitas, tão bonitas que era divertido, ele não sabia bem porque, olhar para o rosto delas, e era mais difícil, algumas vezes, negar favores, principalmente se estivessem vestindo roupas ou usando penteados que as favorecessem ainda mais. Talvez fosse por estas vantagens que as pessoas tentassem tanto se encaixar no padrão cultural que era usado para determinar beleza no lugar onde vivessem.

Bem, o ponto é que Helena Bienow era uma dessas moças muito bonitas. Ele não havia posto muita atenção nisso antes, embora fosse difícil não notar, mas a coisa mudava um pouco de figura quando ela apareceu na porta da sua casa, com um vestido magenta estampado, de decote quadrado, um casaquinho jeans por cima, meia-calça branca e scarpins negros, com uma maquiagem suave, com aqueles “olhos de gato” feitos de delineador.

Era como olhar para alguma modelo fotográfica antes de uma sessão, e ele quis voltar para dentro de casa, buscar seus cadernos e pedir para ela não se mover muito enquanto a desenhava de corpo inteiro. Não sabia bem o que faria com o desenho depois (o daria de presente a ela, provavelmente. Parecia um pouco estressante para Daniel saber que um cara tinha um desenho da namorada dele guardado no armário), ele apenas queria muito fazê-lo.

Mesmo assim, decidiu ignorar sua vontade, ajeitando o casaco e começando a caminhar com eles, embora não fizesse a menor ideia de para onde estavam indo. Santini plantou-se ao seu lado nos primeiro minutos, perguntando daquela forma agitada de sempre o que ele ia comer, se estava levando um guarda-chuva, se estava com frio e lhe contando o tempo absurdo (dois meses, na verdade) que fazia desde que saíra com os amigos pela última vez, e como ele queria tentar achar um boliche depois, porque boliches eram legais.

Depois ele mudou para o lado de Helena e começou a repetir a ladainha, e fez o mesmo com Sarosh, e parecia muito empolgado e contente, o que era ao mesmo tempo extremamente exagerado e bem bonitinho, e acabou lhe fazendo sorrir minimamente algumas vezes e se esquecer de seu nervosismo antes de chegarem à casa de Daniel, mesmo que Sarosh ainda estivesse se mantendo distante dele de um jeito bastante óbvio, ainda que houvesse lhe cumprimentado quase amigavelmente quando saíra de casa.

Teria sido muito ótimo, e ele provavelmente teria concluído que valia à pena sair de casa pelos míseros vinte minutos de caminhada, não fossem os olhares que Helena recebia dos homens que passavam por eles na rua. O caso era que, bem, claro que ela estava muito bonita, e claro que ele também olhara para ela de uma forma admirada, mas era diferente, simplesmente diferente.

Alguns homens pareciam querer despi-la em plena rua, e ele não sabia como ela podia estar bem com isso. Reparou que, embora houvesse localizado algumas vezes antes pessoas a observando nos portões da escola, a coisa tomava proporções ridículas de falta de pudor quando Daniel, que devia ter para os seus 1,90 de altura, não estava ao lado deles, com uma mão na cintura da garota.

E claro que havia também as garotas que passavam olhando para Santini e cochichavam entre si, mas garotas eram mais descentes e costumavam abster-se a apenas admirar, o que ele completamente entendi porque, bem... bem, ele entendia, e o moreno tinha lá sua parcela de culpa pela forma como falava um pouco alto quando estava empolgado, pelo quanto gesticulava e pelo fato de ser o único no grupo com roupas claras.

Deus, um dia ele teria que desenhar Helena e Santini juntos.

Era algum tipo de necessidade artística.

Mas bem, ele estava quase chegando ao ponto de pedir à loira para fechar a jaqueta sobre os seios, embora ela não estivesse sendo vulgar, quando pararam a caminhada e Santini lhe informou que estavam em frente à casa de Daniel, antes de ir muito alegremente até a campainha, pressionando e soltando rapidamente repetidas vezes, como se tentando ritmar o toque, até Sarosh lhe segurar o braço e afastá-lo, encarando-o com exasperação e começando um sermão sobre haver uma pessoa de idade e uma criança naquela casa.

Tia Jay! — ele gritou repentinamente, interrompendo o discurso do ruivo, olhando na direção da casa, e Shey virou a cabeça para ver uma senhora de idade caminhando em direção ao portão, com um sorriso no rosto, perfeitamente visível atrás do muro baixo.

— Vem aqui, menino! — ela exclamou assim que apartou o portão, abrindo os braços para Santini, que imediatamente se jogou nela, apertando-a em um abraço que foi imediatamente retribuído. Ela olhou ao redor assim que se separou do garoto, com um sorriso afável. — Boa noite, Helena.

— ‘Noite.

— Sarosh, querido. Quanto tempo.

— Boa noite, dona Janine.

Ela finalmente virou-se para ele, franzindo um pouco o cenho por um segundo e então sorrindo, justo a tempo que Santini abria a boca, possivelmente para apresentá-lo, fazendo o garoto se calar.

— Você deve ser o... Shey... certo? — ela pronunciou, com alguma dúvida, e o loiro arregalou um pouco os olhos, assentindo com surpresa. — Daniel estava reclamando mais cedo que você é o único amigo dele que ainda não veio aqui jogar videogame e que sempre finge que não está na mesa quando ele chama os outros. Melhor concertar isso antes que ele fique te aporrinhando com o assunto. — ela aconselhou, soltando uma pequena risadinha em seguida.

— Ele quase fez a mesma coisa dessa vez, dona Janine. — Helena acrescentou, revirando seus olhos castanhos de uma forma bem visível. — A gente tem que começar a arrastá-lo pras coisas, não é possível.

Shey olhou-a com choque, sentindo o rosto ficar repentinamente pálido e então começar a ganhar cor rápido demais, tendo a certeza de que estava ficando vermelho, enquanto a senhora soltava uma risada contida e Santini parecia lhe dizer para ficar calmo com os olhos.

— Tia Jay, — o moreno chamou após alguns poucos segundos. — cadê a Amorinha?

— Está lá dentro, querido.

— Sério? Só isso? E ela não veio me ver?

— Está jogando no computador, nem deve ter ouvido a campainha. Vá lá ver ela, menino, vai! — incentivou, fazendo-o abrir um sorriso imenso e passar pelo portão com passos velozes, tirando os sapatos apressadamente, sem se abaixar, deixando-os de qualquer forma em frente à porta e sumindo dentro da casa. — Ai meu Jesus, ainda bem que não é mais criança... — negou com a cabeça, com um sorriso nostálgico no rosto. — Bem, mas que seja, melhor vocês entrarem um pouco, Daniel foi comigo ao mercado, perdemos a hora e ele ainda nem terminou de tomar banho.

Eles obedeceram quase que imediatamente, passando pelo portão, com dona Janine logo atrás, e indo até a entrada da casa, onde havia um daqueles tapetes de boas-vindas, sobre o qual ele e Sarosh deixaram os tênis, mas a senhora disse para Helena permanecer com os scarpins, para não correr o risco de furar a meia-calça.

Ele podia ouvir a voz contente de uma criança, junto da de Santini, misturada a risinhos, antes mesmo de cruzar a porta e assim que esta foi aberta e ele entrou pôde ver o adolescente sentado no tapete ao lado de uma menininha de uns oito anos, com um laptop sobre a mesinha de centro, mexendo apressadamente no mouse cor de rosa com florezinhas e fio cheio de glitter, olhando o tempo todo para Santini e lhe explicando algo com um enorme sorriso. Havia também a musiquinha ritmada de um joguinho, e sons de uma voz que se assemelhava à de zumbis, mas ele não conseguia ter certeza.

Havia muitos porta-retratos na sala, o que era interessante, pois em sua casa eles tinham apenas um, com ele, a mãe e Leon em uma foto tirada cerca de quatro anos atrás. Ele fixou o olhar em uma moldura de vidro com três crianças, uma ruivinha que parecia ter lá para seus cinco anos, no canto esquerdo, olhando indignada para o garoto ao seu lado, o que estava no meio, um alto de talvez sete anos, que punha chifrinhos nele, e no canto direito um outro, de cabelo negros e um enorme sorriso, como se gargalhando pela cena. Ele demorou um pouco mais do que devia para reconhecer Sarosh, Daniel e Santini.

Certo, uau, eles eram amigos fazia um bom tempo.

Havia outras: uma da menininha vestida de princesa, com um sorriso enorme em que faltava um dos dentinhos da frente, uma coroa na cabeça, e várias letras no porta-retratos, o que o fazia pensar que aquela fora tirada na formatura de alfabetização. Helena estava com Daniel em uma delas, apenas os dois, e eles sorriam de um jeito muito bonito para a câmera. E uma com a moldura cheia de morceguinhos, em que a menina estava com uma capa com a barra cheia de purpurina e chapéu pontudo, com um gatinho de pelúcia negro em uma das mãos e um sorriso nos lábios, montada nas costas de Daniel, que parecia tão feliz quanto.

Aquele lugar era um lar e isso era tão, mas tão claro, que ele sentiu-se sorrir apenas alguns segundos depois de fazê-lo, instantaneamente relaxando.

— Ei, quem é esse novato? — a menina perguntou, apontando para ele sem pudor algum, e ele tornou a se sentir nervoso, porque ali não havia nenhuma tinta guaxe antialérgica e ele realmente não era bom com crianças.

— Esse é o Shey, ele é um novo amigo nosso. — Santini respondeu, sem deixar de encarar a tela do laptop. — Acho que a gente precisa de mais planta que dá sol, Amorinha.

— Ih, é mesmo. — a garotinha concordou, clicando algumas vezes. — Esses zumbis vão só ver quando eu comprar a cartinha que faz a planta que dá sol ter duas cabeças! — ameaçou, em uma voz empolgada. — E boa noite, Shey! Eu sou a Amora. Você joga Plants vs Zombies? — ela perguntou, sem tirar os olhos da tela.

— Hmm... não?

— E Subway Surfers?

— Não...?

— Temple Run?

— Não...

— Candy Crush?

— Não.

— Você joga alguma coisa?

— Hmm... — ele resmungou, pensativo. Achou que não contava dizer Naruto, uma vez que apenas acompanhava o irmão e a mãe e era realmente ruim no jogo, então franziu as sobrancelhas, lembrando-se de algo que baixara em seu computador e vez ou outra tornava a zerar, ligando para jogar sempre que estava excessivamente entediado. — Resident Evil 3...?

— Ah, maneiro. O Daniel não me deixa jogar Resident Evil, mas tem zumbis e armas legais, né? — ela respondeu, empolgada. — Eu adoro jogos de zumbi.

— Resident Evil 3 é um clássico! — Helena se pronunciou, encantada. — E o 4 também, é claro! Embora não seja tão demais quanto The Last of Us, mas mesmo assim! E por sinal, Santini, eu finalmente joguei The Darkness II.

— Ah, Darkness! — Santini se pronunciou, cheio de paixão. — Uma obra-prima do gore em games, não?!

— O que é gore? — Amora perguntou, virando o rosto para Sarosh, que olhou de Helena a Santini de forma cansada.

— É uma coisa feia que você não precisa conhecer agora.

— Ah... tá bom, né.

— Já vi umas coisas mais grotescas, mas foi muito bom, mesmo! Quero dizer, aquelas cobras... se é que aquilo são cobras... são, tipo, wow!

— Sim, sim! Mas vai dizer que não dá vontade de ficar tipo “Come to the darkness, Jackie!”. E por sinal, Limbo também tem umas mortes horrendas desse tipo. Eu acho que você ia gostar.

— Ah, Santie, eu já joguei, mas Limbo é arcade!

— Não interessa, é incrível! Você sente a tensão, sente o medo e sente a pressão de precisar escapar das armadilhas e nem precisa de um gráfico fo— ele se interrompeu, lançando um olhar para Amora. — incrível pra isso!

— Tá, tá bom, mas eu não entendo como você pode citar esse terror psicológico antes de Outlast e Amnesia.

— Esses são bem estupendos, mesmo. — concordou Sarosh, assentindo com a cabeça, parecendo falar mais para si mesmo que para os outros.

— Muito simples, minha caríssima Helena. Olha pra minha cara de quem tem coragem de jogar essas coisas. — a garota riu alto, negando com a cabeça.

— É, acho que sendo você melhor ficar longe mesmo.

— Não tô entendendo nada. — comentou Amora, embora não parecesse particularmente frustrada, ainda brincando no computador.

Nem eu, Shey quis dizer, franzindo o cenho para a conversa.

— Eu vou fingir — a voz de Daniel pronunciou, e o loiro virou a cabeça para vê-lo surgindo do corredor. — que vocês não se esqueceram de citar Silent Hill, Dead Island e Alan Wake.

— Oh! Sim! — Helena comemorou, parecendo em êxtase.

— Eu nunca vou ter coragem de jogar essas coisas. — Santini murmurou, com o cenho franzido. — A gente podia falar de, sei lá, Far Cry 3. Eu gosto da ideia de ter uma maldita arma na mão e poder lutar, ao invés de ficar fugindo e tendo ataques cardíacos.

— Deixa de ser medroso, Santie!

— Eu não!

— Nos três jogos tem como atirar, você sabe. E acho que você ia gostar de Alan Wake, Santie.

— Hmm... sei não. Terror e tal. Criaturas das sombras que não estão do meu lado... não é pra mim.

— Bem, você que sabe. Mas como esse papo começou, heim? — Daniel questionou, parecendo curioso, enquanto terminava de pentear os cabelos.

— Shey joga Resident Evil Nemesis. — Helena explicou, sorrindo para o namorado e avançando para lhe pregar um selinho nos lábios. Ele imediatamente a abraçou de lado, pela cintura, quando se separaram, em um gesto natural, que parecia quase automático.

— Ah, esse também é muito bom. The Last of Us é melhor e você devia tentar, se gosta desse tipo de jogo, mas...

— É, você ia se divertir.

— Continua bem daora. Principalmente considerando a época, né. A gente tem que parar de esquecer isso, Helena.

— Temos, com certeza. — ela se virou para Shey, abrindo um sorriso. — Mas você só joga isso? Não tem mais nenhum game de terror?

— Ah... eu... — ele hesitou, desviando um pouco os olhos. — Meio que além disso só jogo um RPG online de Game of Thrones, mesmo. — uma vez a cada três meses, se eu me lembrar que aquilo existe, pensou em completar, escolhendo manter-se em silêncio para não parecer tão deslocado assim.

— Você lê As Crônicas de Gelo e Fogo?! — Sarosh soltou, em um tom radiante, para logo em seguida ter um sobressalto e desviar os olhos, fechando a expressão, fazendo tanto Santini quanto Helena prenderem a risada, enquanto Daniel olhava para o ruivo com confusão.

— Hmm... leio, leio sim. — respondeu, um pouco surpreso, arqueando uma sobrancelha na direção do outro, que ficou ainda mais emburrado.

— Tá. Quero dizer, é, legal.

— Bem, então vamos nessa, gente? — Helena chamou, sorrindo empolgada e sacando o celular para ver se estava tudo no lugar no reflexo da tela, antes de puxar Daniel, que ria de leve de sua atitude, pela mão em direção à saída.

Eles se despediram de dona Janine, que fora para a cozinha, Shey não sabia bem quando, e Amora, que finalmente tirou completamente os olhos do laptop e até foi até a porta, trocando acenos com Santini até que virassem uma esquina, com sorrisos empolgados em ambos os lábios, enquanto uma conversa amena sobre trilhas sonoras de jogos começava entre os outros três no grupo.

~o~

Quando eles chegaram à praça de alimentação que Sarosh mencionara, perto de um parque bem grande, onde havia uma fonte com esculturas de pinguins, muitos bancos e caminhos de pedra laranja e uma pequena casa de show, no momento fechada, depois de passar todo o percurso ouvindo os sons que Daniel e Helena produziam enquanto se beijavam, Shey continuava completamente sem fome, assim como quando saíra de casa.

Ele pensou no quão mal-educado e ridículo de sua parte seria dizer isso, uma vez que aquelas pessoas pretendiam ir a um restaurante japonês ao invés daquele lugar, e por isso, e apenas por isso, olhou ao redor de forma ansiosa, procurando algo que pudesse pelo menos não fazer do ato de mastigar e engolir uma tortura.

Santini parou ao seu lado pouco depois, encarando-o com uma expressão concentrada, que o fez olhá-lo de volta com estranheza e então abaixar a cabeça, nervoso, contemplando o chão.

— Você tem algum transtorno alimentar, ou algo assim? — Shey imediatamente voltou a fitá-lo, com o cenho franzido e um pouco estranhado.

— O que você quer dizer com isso? — perguntou de volta, vendo o garoto olhar ao redor, fixando suas íris azuis em Daniel e Helena, que estavam agarrados um no outro enquanto a garota olhava de stand em stand, fazendo comentários, procurando o que comer, e depois para Sarosh, que parecia averiguar os arredores.

— Quero dizer tipo anorexia ou bulimia. — finalmente respondeu, soando mais sério que normalmente, como sempre fazia quando o assunto era algo relacionado aos seus problemas.

— Não. — o loiro contestou imediatamente. — Por que uma pergunta dessas?

— Você não olha pra comida de um jeito muito bonito.

— Eu não sinto muita fome...

— Ah, mas vamos... a grande maioria das pessoas não precisa de fome pra comer porcarias. — retrucou, arqueando uma sobrancelha pra ele.

— Santie. — o ruivo chamou, se aproximando mais deles, em um tom um pouco incerto, antes que pudessem continuar com aquela conversa incômoda. — Não achei nenhuma saída de emergência.

— Hmm... — ele resmungou, parecendo um pouco agoniado, e olhou ao redor de um jeito nervoso, mordendo os lábios. — Sério? Como assim? E se houver um incêndio, ou aparecer um homicida, ou plantarem uma bomba aqui? Porque, quero dizer, soa como o tipo de coisa na qual você tem que pensar quando constrói um lugar para um aglomerado de pessoas. É, tipo, super necessário. E se, eu não sei, eu começar a passar mal? Tem certeza que não tem nem uma saída secundária, ou uma porta pra funcionários, ou— não sei, qualquer coisa?

— Não achei nada. — Sarosh respondeu naturalmente, como se não houvesse nada de estranho naquele discurso, enquanto o loiro arqueava uma sobrancelha, olhando de um a outro sem saber o que dizer.

— Tá. Tá. , e agora? — o moreno quis saber, olhando ao redor novamente, com uma postura um pouco mais defensiva.

— A gente pode ficar perto da saída. Eu tava vendo, e tem um casal que tá quase terminando de comer. Dá pra gente pegar a mesa deles. Íamos ficar só um pouco longe da porta.

— Tá, mas... — ele hesitou, franzindo o cenho, encarando Sarosh com dúvida. — Não seria por ali que o homicida entraria?

— Eu não acho que um homicida vá vir até aqui cometer um genocídio. — o ruivo argumentou, em um tom compassivo. — Não teria o menor impacto. Esse parque nem tem estátuas históricas ou qualquer coisa do tipo. — o loiro arqueou uma das sobrancelhas para o argumento, pela necessidade de haver um argumento, mas se manteve em silêncio, porque não era como se ele conhecesse muito bem aquelas pessoas, e aquilo parecia estranhamente decisivo, talvez porque nunca ouvira Sarosh falar tanto.

— É... é, acho que sim. — Santini murmurou, logo antes de rir de leve, dando de ombros. — Ok, do que eu tava falando?

— Relaxa. Vou ali rondar discretamente o casal enquanto vocês vão pegar algo pra comer, porque o lugar que eu escolhi mal tem fila, mesmo. — ele explicou, sorrindo para o amigo. — Larga essa boca, Santie.

— Ah. É. Tá. — ele assentiu bruscamente, deixando de morder o lábio, olhando ao redor novamente e então começando a andar, afastando-se deles sem sequer se despedir.

— Vai junto logo, caramba. — Sarosh resmungou assim que o amigo estava um pouco distante, encarando Shey, que ainda não se movera, com uma expressão impaciente. Então o empurrou um pouco pelo braço antes de virar as costas para caminhar mais para a entrada da praça, e o loiro pôs-se a andar na direção do moreno, que já se afastara relativamente, olhando ao redor.

— O que você quer comer? — Santini questionou, assim que estava ao lado dele, e o loiro tomou um momento para pensar.

— Se aqui tiver algum lugar que vende bolos...

— Ah, acho que tem, sim. — respondeu imediatamente, então franzindo o cenho e tornando a avaliar o ambiente. — Só que mais lá pro fundo. — ele lançou uma olhadela para a entrada da praça, arrastando os dentes no lábio inferior em seguida. — Mas eu nunca comi lá, não.

— Eles pelo menos parecem bons?

— Aham. São decorados, e tal. — ele fitou acima dos próprios ombros, mastigando o canto da boca antes de continuar a falar. — Tem uns cheios de creme e com frutas que dá vontade de tirar uma foto.

— Então eu vou pra lá, mesmo.

— Eu não achei que você gostasse de doces. — o moreno admitiu, e lançou outra olhadela à entrada.

— É mais com bolos, mas... você quer ir lá fora tomar um ar? — ele congelou um pouco no lugar, abrindo um sorriso agradecido logo em seguida.

— Na verdade— na verdade eu quero, sim. Valeu. Já volto, tá bom? — e logo depois virou as costas e foi em passos apressados para onde até então olhava.

O loiro tomou a atitude como um claro sinal para que não fosse junto e resignou-se a observar enquanto Santini ia por entre as mesas, passando por Sarosh, com quem trocou uma ou duas palavras, antes de sair da praça de alimentação. Só então virou para frente e continuou andando, em busca de seu bolo de creme.

Quando ele voltou para mesa, Helena ainda estavam com Daniel na fila de um stand de sushi e Sarosh voltou rápido do lugar que havia escolhido, com uma senha na mão. Eles passaram um bom tempo desconfortáveis e sem saber bem o que fazer, enquanto fitavam ocasionalmente a entrada, esperando Santini surgir por ela, o que aconteceu cerca de dois minutos antes da senha do ruivo ser chamada e ele ir buscar a própria comida.

Ele comeu muito lentamente, mas apenas um pouco mais devagar que Helena com seu prato de salada com frango grelhado, enquanto a garota lançava olhares de cão abandonado aos dois hambúrgueres com batata frita de Santini, que pelo menos estava mandando menos olhadelas à entrada, até que o garoto notou e piscou para ela, deixando-a irritada, o que acabou rendendo zombarias e comentários engraçadinhos pelo restante do tempo que demoraram para comer.

Ele não tinha ideia do porque, mas havia algo em sua cabeça que não o permitia pensar que não foi divertido.

~o~

Eles não conseguiram achar um boliche.

Isso talvez devesse querer dizer que foram para casa logo depois de rondar as proximidades, já que não conseguiram o que queriam. Com Santini não era tão simples assim. Ele não saberia dizer como exatamente foram parar em um playground antigo, ou como eles tiveram coragem de comprar fichas embora apenas crianças brincassem por lá, mas, no fim, lá estavam eles.

Enquanto Daniel e Helena tinha uma partida bastante acirrada em Tekken e Sarosh tentava algo no pinball, Santini o desafiou para uma disputa em The King of Fighters 98, o que foi uma experiência... divertida, na verdade, embora (obviamente) houvesse perdido, porque o outro dava seus saltinhos quando conseguia acertar especial, e mordia os lábios e sorria o tempo todo, com os olhos brilhando de um jeito bonito.

E é claro que ele foi derrotado uma vez de “perfect” por estar se concentrado na coisa errada, o que era bastante vergonhoso, mas ao menos Santini não percebeu, e apenas riu enquanto lhe falava para escolher um dos personagens da equipe dele, para que continuasse a jogar. Ele era sempre posto em primeiro, e o incrível da situação é que apenas uma vez conseguiu derrotar o primeiro da outra equipe, no segundo confronto.

Por sinal, no mestre ele conseguiu perder de perfect mais rápido que enquanto encarava Santini, e ele estava tentando, o que deixava a situação um pouco frustrante, mas no fim o outro garoto também perdeu, embora o mestre estivesse quase sendo derrotado, e ele não se sentiu tanto como uma negação completa.

Depois disso, entregou suas fichas a Daniel e Helena, porque ele não gostava de jogos tanto assim, e ficou sendo arrastado por Santini enquanto ele tentava acertar criaturinhas que saiam de buracos com um martelo, fazer muitas cestas em pouco tempo e montava no brinquedo de jet-ski até suas fichas também acabarem e finalmente pararem ao lado de Sarosh, que simplesmente gastara tudo em uma tentativa falha de jogar pinball.

Ele viu Helena e Daniel se tornando inimigos mortais enquanto passavam pelos fliperamas de luta e disputavam pontos no simulador de tiro e no pinball pelo resto do tempo, e chegou a ficar ligeiramente preocupado, embora Santini continuasse falando muito naturalmente, fazendo comentários, se balançando e remexendo as mãos, mas, no fim, quando estavam voltando para casa, eles voltaram a se atracar como sempre faziam logo que viraram uma esquina.

— Foi divertido? — seu irmão perguntou, assim que chegou em casa, e a mãe parecia expectante para a resposta.

— Foi. — ele disse apenas, assentindo uma vez, antes de correr para o andar de cima e pegar seus cadernos, porque simplesmente havia coisas que ele precisava desenhar, naquela noite, e ele esperava que fossem entender.

~o~

Ele entregou o desenho a Helena na segunda-feira. Era apenas ela do lado de Daniel, agarrada ao braço dele, e eles sorriam um para o outro. Eram as roupas usadas na sexta-feira, mas ele pusera uma lanterna na mão da moça, uma jaqueta marrom por cima de um casaco de capuz negro no lugar da jaqueta de Daniel e um revólver na mão dele. Helena soltou um gritinho de empolgação que atraiu atenção demais para eles e quase o deixou com vontade de se esconder dos olhares debaixo da mesa, logo antes de começar a quase que esfregar o desenho no rosto do namorado.

— Isso foi uma referência a Alan Wake, não foi?! — a loira meio que gritou, empolgada, enquanto Daniel finalmente conseguia ver direito o que estava na folha de papel, com ambas as sobrancelhas se arqueando.

— Foi...

— Pensei que você não tinha jogado!

— Busquei imagens na internet...

Ela soltou outro gritinho e escondeu o rosto nas mãos de um jeito emocionado, destampando-o logo em seguida, com um enorme sorriso no rosto.

— Você é bom nisso. — Daniel comentou, ainda parecendo surpreso, e virou a folha para Santini, que quase caia da cadeira tentando olhar. — Ficou foda, cara.

— Obrigado.

— Isso é muito legal! — Santini gritou, arrancando o desenho da mão do outro, que apenas negou com a cabeça, sorrindo. — Tipo, olha! Você bem que podia me desenhar um dia, sabia?! — o loiro desviou os olhos, engolindo em seco.

— T-talvez.

— Eu quero estar vestido de... de... de... hmmm... — ele franziu o cenho, com uma expressão pensativa. — Ah... pode me deixar vestido de Santini, mesmo. — completou, em um tom resignado, fazendo uma expressão desolada para o pedaço de papel, o que acabou arrancando risos dos outros três.

— Eu vou... pensar em algo pra você. — Shey murmurou, fazendo as feições do outro imediatamente ficarem alegres de novo, e os risos aumentarem.

O engraçado é que quando seu olhar se cruzou com o de Sarosh, o ruivo não parou de rir, embora tenha hesitado por um mísero segundo.


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Notas finais do capítulo

The Last of Us: http://jogazera.com.br/wp-content/uploads/2013/08/review-the-last-of-us-04.jpg
The Darkness II: http://upload.wikimedia.org/wikipedia/en/5/5b/The_Darkness_II_screenshot.png
Limbo: http://static.giantbomb.com/uploads/original/0/669/1404071-limbo_esrb_t_720p30_st_6300kbps_53.jpg
Outlast: http://einfogames.com/reviews/files/2014/02/892946097_1378720906.jpg
Amnesia: http://lusipurr.com/wp-content/uploads/2012/12/Amnesia-The-Dark-Descent-Screenshot-1.jpg
Silent Hill (1): http://static.giantbomb.com/uploads/original/16/168238/2436728-6498758650-3_19_.jpg
Sillent Hill (2): http://static.giantbomb.com/uploads/original/0/56/258523-gfs_22655_2_18.jpg
(A franquia é grande, então peguei só os dois primeiros)
Dead Island: http://www.gamestorrent.biz/wp-content/uploads/2014/01/Dead-Island-Riptide-Nail-Brass-Knuckles.jpg
Alan Wake: http://cdn.denofgeek.us/sites/denofgeekus/files/alan-wake-pc.jpg
Far Cry 3: http://static.giantbomb.com/uploads/original/11/118896/2464175-farcry3.png
Ah, me abstive de pôr imagens de Resident Evil e dos jogos de celular e fliperama porque suponho que todo mundo já tenha visto essas coisas, certo? ô.o
Por fim, "gore" são essas coisas grotescas, com desmembramentos e desumanidades do tipo. Outlast é bem pior que Darkness II, nesse sentido (mesmo que ninguém tenha me perguntado e tal)... e em muitos outros, na verdade. Outlast e Silent Hill meio que são os piores, no bom sentido da coisa, já que se trata de terror XD



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