Equilíbrio escrita por Huntress


Capítulo 4
Em direção à sua tortura.


Notas iniciais do capítulo

Eu demorei para ter ideia de como eu iria escrever este capítulo, por isso o atraso acarretado. Mas está aqui, acho. Espero que gostem.



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Sentia o peso do cansaço mandando-a parar enquanto batia no chão com a picareta que lhe fora designada como instrumento de trabalho, aprofundando e alargando o buraco, por razão desconhecida. Encontrava-se calada, como lhe fora pedido para que fizesse, mas sua mente enchia-se de pensamentos diversos. Bill a olhava com um quê de curiosidade, os braços cruzados e o corpo paralisado como rocha – o que realmente fazia sentido.

Cantarolou devagarzinho uma música perdida dentro de sua memória e, para sua surpresa, não foi repreendida. Palavras, então, começaram a sair de seus lábios involuntariamente, como se a música a guiasse. Exasperada, percebeu que seu canto era audível, porém baixo. Levantou os olhos procurando por uma face enraivecida, mas só encontrou os orbes perdidos do tutor, que prestava atenção em cada uma de suas ações.

Não entendia uma só letra que sua boca insistia em soltar pausadamente, desconhecendo a melodia que seus lábios pareciam conhecer tão bem. Sua mente enuviou-se quando escutou uma segunda voz acompanhando-a, de longe – era um tom seco e baixo, abafado por alguma espécie de pano ou tecido invisível.

Parou de cavar quando percebeu não haver mais terra logo à frente de seus pés ou abaixo de si. Apenas um espaço vazio; uma escuridão imensa que a encheu de curiosidade. Uma que não deveria ter.

No local onde se encontrava, para manter sua sanidade e sua própria vida, tivera de aprender a controlar seus instintos curiosos e apenas ouvir o que se passava ao seu redor. Seu olhar nunca se elevava aos céus avermelhados e obscurecidos do local de aparência infernal; seus pés nunca andavam por terras que não lhe eram obrigados a o fazer.

Porém, naquele instante, não se repreendeu ao inclinar um pouco a cabeça para observar o caos profundo que se estendia logo à frente de seus pés. Não pensou estar sendo inconsequente, nem teve medo do que poderia ataca-la – as atrocidades que já vira acontecer naquele lugar iam de banho no óleo fervente até ser engolido por um monstro que aparecia do nada para devorar, sem piedade, sua vítima.

“O que está olhando? Cave!”, o tom autoritário de seu tutor ressoou pelo vazio desértico. O eco parecia reverberar dentro de si, embora a voz pudesse ser ouvida apenas uma vez no mundo externo à sua mente. Ainda imóvel, podia ser sentido os olhos de pedra observando-a milimetricamente.

“Não há mais nada a cavar.”, sussurrou, tentando deixar seus instintos de procura longe da percepção do homem.

“Então pule.”, respondeu, como se fosse lógica a ação de simplesmente se jogar no buraco que acabara de abrir no chão de um lugar macabro e assassino.

“Isso seria suicídio.”, elevou um pouco seu próprio tom de forma a se fazer mais bem entendida. Retirou seu olhar da cova e seus olhos viajaram até a derme cinzenta daquele que a ordenava. Parecia revoltada com a situação; indignada com o pensamento de se jogar em um poço de escuridão só por não haver mais chão aonde bater.

“Quem lhe garante que já não está morta?”

Sua réplica questionadora deixou-a arrepiada e arrependida de ter feito o comentário anterior. Respirou fundo antes de se postar ereta e olhá-lo fixamente. Sua coragem fluiu rapidamente, como se alguém a lançasse em uma corrente extensa de adrenalina. E sentiu o empurrão violento do vento ou do invisível, que a fez cair no que considerou seu próprio túmulo.

A reação que se seguiu foi a de uma oração para os deuses que nunca conhecera; um pedido por ajuda misericordiosa. Mas, algo a prendeu no meio da primeira frase, fazendo-a desistir do clamor que soltaria aos céus, como se puxassem sua fé e tentassem roubar sua esperança com a força da gravidade.

Caía rapidamente, perdendo o controle de seu corpo por completo. Seus orbes se fecharam de forma vagarosa mostrando-a que toda a sua força se esvaíra, sem saber se no trabalho, na queda ou na tentativa falha de oração. Sentia-se transformada e transportada para um mundo sobre o qual não possuía controle, mas queria o ter.

“Acorde, garota.”, disse um homem – presumia que fosse um ser de características masculinas, por conta da voz grave que possuía –, dissipando a sensação da queda. Perguntou-se por quanto tempo realmente ficara caindo e por quanto tempo deixara-se levar pela ilusão, sem ter resposta alguma.

“Sofia, acorde.”, a esta ela reconheceu. Abriu os olhos lentamente e se pôs a tentar levantar-se, sem muito sucesso. Sua visão se encontrava prejudicada, percebeu logo de uma vez, pois não conseguia enxergar as faces que com ela falavam: somente borrões acinzentados parecidos com formas fantasmagóricas.

Sentiu um tapa do lado direito de seu rosto. Não houve dor, apenas ardência. Tentou capturar a sensação do toque, mas lembrou-se apenas de uma mão de dedos finos e macios quando conseguiu acordar verdadeiramente da sensação letárgica que havia adquirido sem nenhuma razão.

Em seu campo de visão se encontravam três figuras de aparência imponente e autoritária. Bill, com sua força incrível e pedregosa; um homem, a quem assimilara a voz, de olhos avermelhados e sinistros; e uma mulher, seminua, a quem atribuíra os dedos finos, sem nem ao menos olhar para os mesmos.

A garota pôs-se de pé, encolhendo-se involuntariamente à imagem do trio que exalava segurança. Sentiu-se inferior com a paisagem de poder e realeza que eles passavam.

Os olhos da mulher corriam por seu corpo como se analisassem, com grandes expectativas, quais poderiam ser os atos profanos que alguém poderia realizar consigo. Iam do cabelo de ondas claras até os pés descalços e sujos. Pareciam reconhecê-la de forma dolorosa, mas, Sofia pensava, lendo o olhar e a expressão da garota, não faziam menção a comentar sobre isso.

“Bem... Ela será útil.”, concluiu, depois do silêncio que se seguiu desconfortavelmente. Bill assentiu com um movimento leve, como se apenas concordasse com o que ela havia falado. “Podemos utilizá-la na Zona, mas não acredito que ela vá chamar muita atenção.”

“Ela é importante, acredito. Então... Cuide dela como se fosse ouro.”, perdeu-se no ‘ela é importante’ que o desconhecido soltara por nenhuma razão aparente. Tentou soltar uma pergunta, mas sua voz não saía. Suspeitou – já acreditando na magia, por ser loucura um local como aquele ser verdadeira e cientificamente real – que ele utilizava de algum feitiço para mantê-la calada.

“Como se fosse uma puta, na verdade.”, o dono dessa voz não era visível. Em pontos obscurecidos de sua memória há tempos perdida, pareceu reconhecer o tom e o ódio que ressoava pelo salão de pedras negras que se encontrava. “Ela é útil, mas deve ter o que merece.”

Reconhecia aquela frase e o jeito da fala; parecia saber até mesmo o sotaque insensível à audição dos desatentos. E a sensação que percorreu por si por conta daquele saber inútil não lhe fez bem de forma alguma.

“Lilith, leve-a para a Zona. E trate-a como qualquer outra.”, falou novamente o que pensou ser a escuridão. Pesquisou com o olhar todos os cantos do cômodo, mas nada encontrou: apenas olhos extremamente enegrecidos na pedra marcada de cicatrizes daquele que a mandara cavar por duas semanas em direção à sua tortura.


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Notas finais do capítulo

E então? Vocês já têm ideia do que é a Zona? [Sim, gente. Se chama Zona. E acho que já deixei meio implícito o que é, principalmente pelo nome. (risos)]
Acho que algumas pessoas pensam que estou sendo muito má com a Sof. Mas gente... Ela tá ali! Vocês querem o quê?! HAHA
Comentem, meus amorecos.



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