Aquele restinho de tarde passou voando e eu via o sol se pondo através de minha janela. Melissa e Lauren não demoraram a voltar e ficaram gritando pelos corredores, falando o quão belos eram seus vestidos ou quão estavam animadas para a grande festa que se aproximava.

Ouvia tudo atrás de minha porta, triste por não poder ir, mas confiante de que aquela fora minha melhor escolha.

Toda tarde elas vinham me importunar, e já disseram, antes mesmo de eu perguntar, elas simplesmente falaram que eu não iria. Já sabia da resposta, mas não custava perguntar.

Todo dia, tio August as despachava até o vilarejo já que, segundo ele, eles tinham que deixar uma boa impressão no reino. Às vezes, aproveitava essas saídas para dar uma volta a mais no castelo. Era bem raro eu sair e algumas dessa saídas geravam um chá com tio August que, por algum motivo, não contava a Lauren sobre nossas conversas no jardim com uma boa xícara de chá

Meu tio ainda tentava me convencer a ir ao tal baile, mas era teimosa demais para mudar de opinião

Enfim, o baile chegou. Tio August já havia se pronunciado que não iria, pois teria uma reunião com os ministros que já estava marcada há muito tempo.

Lauren não queria ir também, com medo que eu pudesse sair do quarto. Mas dessa vez, ela teve coragem o suficiente para se aproximar de mim, ameaçando tanto verbalmente como fisicamente, deixando-me tão roxa, que os hematomas poderiam ser vistos de longe.

Naquele fim de tarde, via através da janela do meu quartinho de bebe, o navio de Arendelle, partindo rumo as Ilhas do Sul.

Encontrei meu pingente, que não tirava mais do meu pescoço e pedi aos deuses que eu ficasse bem

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3 Anos Depois...

Admito que os anos passaram tão depressa que nem eu senti.

Era difícil aceitar que passei mais três anos da minha vida trancada no meu próprio quarto, mas foi uma escolha minha. Vivendo entre sonhos e pesadelos, não sabendo exatamente o que é e o que não é real. Podia me classificar como uma louca, que não tinha mais solução

Os pesadelos haviam parado por algum tempo, até Melissa criar a audácia de começar a me provocar. Não poda fazer nada, se reagisse, Lauren garantira minha passagem direto para a fogueira, sob o pretexto de eu ser uma bruxa e praticar bruxarias escondidos.

Apesar de tudo, queria viver

Elas nunca descobriram o túnel secreto e me agradecia mentalmente por isso.

Meu aniversário seria no próximo mês, 21 de junho

Completaria finalmente dezoito anos e assumiria a coroa

Mas eu não queria

Infelizmente, não é uma escolha de querer ou não

Tio August continuava sábio e bondoso, porém estava envelhecendo. Junto com a idade, veio uma doença misteriosa que o fazia ter uma grande crise de tosse a noite inteira, que podia ser ouvida pelo meu quarto.

Estava muito preocupada com ele, coisa que Lauren ou Melissa não demonstravam. Elas simplesmente reclamavam que queriam dormir e mandavam o homem calar-se, mas a situação só piorava

Desde o baile de dezesseis anos de Hans, Lauren tentava jogar a própria filha em herdeiros de tronos ricos. Melissa tentava a todo custo casar-se, oferecendo- se de diversas maneiras para que tal ato ocorresse

Tio August não saía mais da cama e os médicos alertavam para um perigo maior. Auxiliavam-no da maneira que podiam, mas Lauren simplesmente abanava a mão e dizia:

– Isso é frescura. Logo passa!

Mais algum tempo passou e a situação só piorava. O que antes era só uma tosse, agora agravava-se em coágulos saindo através da boca. Saía escondida do meu quarto no meio da noite, indo até a biblioteca procurar alguma coisa que pudesse fazer meu tio melhorar. Mas não encontrava nada e voltava para a cama de madrugada, cansada e frustrada, ma, principalmente, preocupada

Sempre que podia, ia visitá-lo. Estava mais branco que uma folha de papel, muito magro e seus olhos refletiam o sofrimento pelo qual estava passando.

Passava tardes com ele, sem que a bruxa de sua esposa me visse e ele também nunca contava a ela sobre minhas visitas.

Em meio a essa visitas, ele tirou de seu criado mudo, pilhas e pilhas de cartas de pretendentes que não eram interessados à Melissa, mas a mim. Havia cerca de duzentas cartas, sendo que algumas eram de Hans. Ele me disse que não poderia ter mais orgulho de mim e que seria uma excelente rainha

Deixei o amontoado de cartas em um canto de meu quarto, não ligando tanto. Havia coisas mais importantes acontecendo à minha volta

Uma noite, Louise veio até meu quarto trazer minha refeições e comentou sobre como Lauren andava preparando os alimentos de tio August e até os meus. Ela ainda contou que quando ela entrava, todos tinham que sair da cozinha, deixando-a só. Ela me orientou a não comer nada que a rainha postiça me trouxesse e que ela mesma começaria a ficar de olho nos alimentos, cuidando principalmente dos meus.

Na manhã seguinte, Lauren e Melissa entraram no meu quarto, trazendo-me o café da manhã. Não comi nada e quando Melissa mandou comer a maçã mais vermelha que já vira em minha vida, eu apenas neguei e a desafiei a morder a fruta em meu lugar. Ela deu um sorrisinho cínico e saiu do quarto depois da mãe. Me livrei da comida e logo Louise trouxe outra, que comi sem desconfiar

– Acha que está usando veneno? - perguntei, certa vez à Louise, já temendo a resposta

– Eu não sei. Ela nunca foi uma boa esposa. Não entendo porque está sendo agora, mas continua ignorando o fato que seu marido a cada dia que passa, definha-se mais - ela respondeu

Durante a noite, congelava a trinca de meu quarto e atravessava o túnel até meu quartinho, temendo passar a noite no meu original

O que me deixava confiante, de certa forma, era minha correntinha. Apesar de todos esses anos em meu pescoço, ela ainda reluzia, como se a tivesse encontrando à minutos e não à anos.

Era meu escape de toda essa loucura.

Toda vez que me concentrava e tocava no pingente, podia ver os olhos que balançavam minhas estruturas, ouvir a voz que deixava meu coração pulando feito desenfreado no peito, sentir cheiro de menta e ouvir o último adeus que deixava meu coração congelado despedaçado.

Sim, eu tenho um coração congelado

Porque sou um monstro, que não merece absolutamente nada

Perdida em meio a devaneios, vi que minha situação não mudará nada

Continuava em desgraça

Noites passavam, dias amanheciam e nunca havia um minuto em que não me parava de me culpar, seja pela morte de Anna ou a de meus pais.

Seja por não ter conseguido segurar tal pessoa de olhos azuis junto à mim

Estava me preparando a passar pela porta que dava acesso ao túnel, quando ouvi uma batida na porta. Ouvia choros e gritos de Lauren, até forçados pelo castelo, e imaginei mais algum chilique por alguma ruga nova ter aparecido.

– Elsa? - era Louise e parecia estar... chorando?

Fechei a passagem secreta e descongelei a trinca, deixando-a entrar

Ela estava de fato chorando

– Louise, o que houve? - perguntei, imaginando se Lauren tivera feito algo à ela

– Eu sinto muito, muito mesmo

Eu estava tão nervosa, que podia ouvir meus batimentos pelos tímpanos, até que, quando Louise deixou a frase cair, desejei nunca ter descongelado a trinca

– Seu tio faleceu. Você é a nova rainha de Arendelle