Cartas para Hope escrita por Skye Miller


Capítulo 26
Twenty Six.


Notas iniciais do capítulo

OI ANJINHOS.
É um recorde para mim fazer um capitulo de quase cinco mil palavras em um único dia. Estou tão animada! E tão triste, pois o proximo será o último.
Dia 22 estarei postando o capitulo 27, e no dia 24 vocês vão se deparar com três extras POV Henry, então fiquem preparados!
Dia 23 vou postar minha nova fic, In My Veins, e por lá vocês ficarão sabendo da minha outra fic (que não estou fazendo em parceria com minha filha, por assim dizer, Lost G), a Say Something, que também está sendo escrita e em breve será publicada, falta só alguns capitulos e um trailer novo.

Bom, espero que gostem do capitulo. Formatura e despedidas me deixam com dor no coração, então não vou falar muito.



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Sou acordada abruptamente por um alarme que não para de soar com notícias sobre mais um dia em Minneapolis. Meus olhos demoram-se para se conciliar com a realidade e eu caio em si quando me dou conta de que não estou no meu quarto. Que no meu teto há fotografias em vez de desenhos. Que minhas paredes são lilás e não brancas. Que eu não tenho tantas prateleiras de livros e porta retratos. Onde estou?

Estou com calor e não estou conseguindo respirar. Tento encher o pulmão de ar, mas há uma coisa que me impede de fazer isso. Um braço que rodeia todo o meu torso e uma cabeça apoiada em meu peito, além de um joelho por cima da minha coxa enrolado em um lençol.

E ali está ele. Henry Adams. Enrolado em mim como se fosse um casulo. Henry Adams, com seu cabelo loiro sedoso. Henry Adams, com a pele quente sobre a minha causando-me arrepios. Henry Adams. Simplesmente Henry.

Timidamente passo os dedos sobre seu cabelo que são tão macios que parecem plumas. Ele nem se mexe e eu estou começando a me preocupar, pois não faço a mínima ideia de que horas são. Afasto um pouco para o lado, só para conseguir respirar melhor, e então Henry se retrai. Ele abre os olhos e fica os piscando lentamente, como se estivesse acordando depois de anos. Continua com a cabeça apoiada em meu peito e boceja sonolento, depois coça os olhos com a palma das mãos.

– Eu finalmente morri e fui para o céu ou realmente estou nu no meu quarto com a minha namorada?

– Acredito que a segunda opção esteja correta.

Ele se afasta de mim e eu finalmente consigo respirar. Henry fica apoiando na cama com os cotovelos e sussurra com o rosto pairando sobre o meu.

– Bom dia, querida Hope.

E isso me desmonta. Eu me desmonto bem na sua frente. Meus lábios se abrem, meus olhos brilham e meu corpo inteiro relaxa. Estou tentando recobrar os sentidos, estou tentando me manter na Terra quando sussurro:

– Bom dia. – Minha voz sai tão irregular que eu quase não a reconheço. – Eu amo isso. Amo você me chamar de querida. Por favor, não pare nunca de me chamar assim.

– Querida Hope. – Henry beija a ponta do meu nariz. – Querida Hope. – A minha bochecha. – Querida Hope. – Seus lábios seguem uma linha reta por toda a região do meu pescoço. –Querida Hope. – Beija meu queixo. Meu lábio superior. Meu lábio inferior. Sempre sussurrando: – Querida Hope.

Enquanto seus lábios percorrem todo centímetro de pele e seus sussurros ficam mais intensos não consigo parar de pensar em como as pessoas mudam, não consigo parar de pensar no fato de que todos nós evoluímos. Às vezes, você acha que conhece alguém e acaba se surpreendendo com quem ela se mostra realmente ser.

Não consigo parar de pensar que eu evolui, que eu mudei. Acho que eu sempre fui uma mistura louca de defeitos e qualidades. Que eu sou humana, que tenho direito de errar e aprender como meus erros. Não consigo parar de pensar que eu tenho que escolher quem eu realmente devo ser. A Hope Adams divertida que faz de tudo para os amigos serem felizes ou a Hope Stonem corajosa que enfrenta o pai e aceita os próprios sentimentos. Talvez eu possa juntar minhas duas identidades e ser uma só. Talvez eu seja apenas Hope. A querida Hope, que acredita que a cor cinza é fabulosa, que acredita que rir é o melhor remédio para angústia, que correr muito é capaz de fazer você planar e voar. Posso ser a Hope que acredita em beijar, beijar muito. Hope que acredita no calor, no verão, em tulipas e em cigarros. Que acredita em fadas. Que acredita que meninas felizes são sempre as mais bonitas. Que a vida é um livro cheio de páginas brancas e lacunas abertas esperando para serem preenchidas. Que acredita que amanhã é um novo dia. Talvez eu possa ser a Hope que acredita no amor. No mais puro, complexo e fiel amor. Que acredita que o amor não é um mero sentimento qualquer que é uma doença, amor delírio nervosa, sem cura ou modificações, que traz benefícios e problemas, que é uma vida e não um simples verbo. Quero ser a Hope destemida, louca, divertida, dramática, inteligente, legal e muito chorona. Porque essa sou eu. Sem nada de surpreendente. Só Hope. Sem Adams ou Stonem. Só Hope.

– Hey. – Henry segura meu queixo e meus olhos ainda estão vagos olhando para os desenhos em sua parede. Ainda estou pensando. Pensando se quero ser Adams, Stonem ou só Hope. – Você está aí?

Então eu olho para ele e sorrio. É um sorriso esquisito, sei que é, pois ele faz uma careta e se inclina sobre mim com os olhos cheio de preocupações. Claro que sei quem eu quero ser. Claro que sei que eu quero ser somente Hope.

– Desculpa. Eu só estava... Pensando. – Ainda estou rindo. Meu olhar desviasse do seu e eu olho para o teto. Ao lado do desenho em que estou nua em um sofá há um que me intriga. Uma garota de cabelos cacheados, sorrindo com dois dedos para frente. Não posso deixar isso para depois, não posso ficar com essa questão martelando minha mente. – Henry, você era amigo da Aria?

Em um único segundo ele fica tenso, preocupado, irritado e triste. Solta um suspiro e assente.

– Ela era minha melhor amiga, Hope.

– Como eu nunca soube disso?

– Você nunca se interessou em saber. – Provoca sarcástico e ao notar meu olhar fulminante balança a cabeça de um lado para o outro. – Você ao menos falava com a Aria?

– Claro que não! Ela era a maior vadia da Walter. – Ele me olha magoado, então eu automaticamente reprimo um gemido e fecho os olhos com força. – Desculpa, mas todo mundo falava da Aria. Ninguém ia com a cara dela e o comportamento dela deixava ainda mais claro que ela não queria ter amigos. E, bem, você sabe que boatos correm rápido e que todos diziam que ela tinha caso até mesmo com o diretor.

– Hope. –A voz de Henry está tão seria que eu fico me culpando por ter tocado no assunto. Ninguém gosta de falar sobre Aria, não por ela estar morta, mas por causa de todos os segredos que rondam sua vida. – Nem tudo o que dizem é verdade. Você não pode julgar uma pessoa se não a conhece de verdade. Você sabe o nome da Aria, não a sua história.

– Desculpa. – Repito mais uma vez. Estou tão tão tão arrependida de ter tocado no assunto. Tenho que me lembrar mentalmente que a Só Hope não julga antes de conhecer, que a nova Hope acredita apenas naquilo que pode ser provado. Saio debaixo de Henry e sento-me na cama. – Que horas são?

– São... – Henry hesita em falar quando olha no relógio. – Oito e meia.

– Nossa, está muito claro para ser noite. Você dorme com abajur ligado?

– Hope, são oito e meia da manhã.

Estou gritando merda merda merda repentinas vezes enquanto ando pelo quarto e procuro pelas minhas roupas. Meus pais provavelmente irão me matar. O diretor da minha escola provavelmente vai me matar. Fiquei responsável para fazer o discurso para a abertura do evento de formatura, que acontecerá as dez. Nunca vou conseguir chegar em casa a tempo e me arrumar. Além do mais, meu pai vai me matar antes por ter dormido fora de casa.

Henry também está se vestindo e procura dinheiro suficiente para que possamos pegar um táxi. Não sei como ele está se sustentando, já que ele ainda não conseguiu um emprego e recusou o dinheiro que mamãe ofereceu a ele. Mas parece que está tudo bem, pois consigo ver diversas notas de cem dólares soltas na gaveta.

Meu celular solta um bipe agudo. Tem 47 chamadas perdidas e 14 mensagens. Minhas mãos tremem quando atendo a chamada de Lília.

– Alô?

– Graças a Deus! – Suspira aliviada depois de soltar um gritinho. – Onde você está, Hope? Tenho ligado desde as seis da manhã! Seus pais passaram a noite ligando para você, então ligaram para mim e eu fui obrigada a mentir dizendo que você estava aqui e que estava dormindo. Fiquei com o coração na mão sem saber se contava a verdade, por que tipo, imagina se você estivesse morta em um beco qualquer?

– Lília, calma, estou bem. Obrigada por ter feito o que fez. Estou voltando para casa .

– Voltando para casa? Você tem que ir direto para a escola! São quase nove horas e você faz parte da porcaria de organização, tem de estar lá antes da abertura.

–Merda. Merda. Merda. – Digo enquanto saio do dormitório de Henry ao seu lado. Nós corremos até o vestiário. As pessoas estão olhando para nós e eu não me importo em estar parecendo uma maluca correndo pelo campus segurando uma toalha. – Diga para a Anna levar meu vestido, okay? E o sapato também. Preciso que você leve sua nécessaire com maquiagem. Vou ter que me arrumar na escola.

– Meu Deus, Hope, onde diabos você está?

– Não posso falar agora.

Desligo o celular e entro dentro de uma cabine. Estou tomando o banho mais rápido da minha vida e estou muito constrangida com toda a situação. Henry joga por debaixo da porta dois vidros com shampoo e condicionador, agradeço com um sussurro e começo a lavar um cabelo.

Às nove horas, conseguimos pegar um táxi. Estou vestindo a mesma roupa de ontem com o cabelo molhando ensopado o banco de couro. Henry tenta calçar o sapato e eu ajusto sua gravata. Hoje era para ser um dos melhores dias da vida, mas na verdade está saindo tudo fora dos eixos, um grande desastre ambulante.

– Seu terno vai ficar marcado se você continuar se mexendo assim! – Grito irritada com Henry para que ele fique quieto, mas ele continua se inclinando sobre o banco, tentando ver seu reflexo pelo vidro para ajeitar o cabelo. – Henry!

– Meu Deus, Hope! Calma. – Sussurra olhando apreensivo para o relógio. Os ponteiros estão girando rápidos demais, provavelmente tirando sarro com a nossa cara. – Vamos chegar a tempo. Por favor, pare de gritar.

Eu me acalmo apenas quando ele beija minha testa e afaga minha bochecha.

Quando finalmente chegamos, faltando apenas vinte minutos para a abertura, é uma euforia. Eu corro em direção às meninas e elas me seguem pelos corredores. Entramos em uma sala vazia e eu visto o vestido, que acaba ficando colado demais e um pouco vulgar. Anna começa a pedir desculpas mas eu apenas balanço a cabeça de um lado para o outro e quando subo em cima da sandália o salto quebra.

– Puta merda. – Callie diz olhando-me apreensiva. Digo a mim mesma que não vou chorar, que não vou chorar, que não vou chorar mas o inevitável acontece e eu me jogo nas cadeiras e me desmorono. Essa sou eu. Hope, a chorona. – Vamos dar um jeito, Hope.

Lília tenta colocar meu astral para cima enquanto Callie procura algum armário aberto dentro do vestiário, pois talvez alguém tenha deixado um tênis. Isso mesmo, um tênis. Meu Deus, meu dia está ficando cada vez pior. Jassie limpa minhas lágrimas e começa a me maquiar. Os ponteiros estão rodando. Nove e cinquenta e sete.

– Desculpa. Desculpa. Desculpa. – Anna anda de um lado para o outro apreensiva. Ela fica engraçada quando está nervosa, então começo a rir, porque é inevitável não rir nessa situação cômica em que estamos passando. Lília também ri e puxa um pouco a bainha do meu vestido para baixo. Estou parecendo que vou para uma balada e não me formar. – Parem de rir! Eu não imaginava que o vestido não iria caber na Hope e que a porcaria do sapato iria quebrar. Caralho!

Agora é Jassie quem está rindo. E rindo pra valer. Não foi culpa de ninguém o que aconteceu. Henry uma vez disse que as coisas só acontecem se tiverem de acontecer. Não podemos mudar o passado e nem modificar o futuro. Disse que o que importa é o agora, e o que está acontecendo nele.

E, vamos dizer que o agora é bem cômico. Callie aparece com um vestido rodado azul de bolinhas que achou no camarim dos figurinos de teatro e uma sapatilha. Visto rapidamente, e, por incrível que pareça, estou linda. Não acredito que estou usando um vestido da Titanita em minha formatura e sapatilhas da fada sininho. Está diferente. Está engraçado. Está Hope.

A voz do diretor soa pelos auto falantes e nós corremos para fora. Há muitas pessoas aqui e todas olham para mim quando eu subo no palco. Sou a única que ainda não colocou a bata vermelha e o chapéu preto de formatura, então é meio óbvio que irei fazer a abertura.

Vejo meu pai e minha mãe sentados no meio da multidão. Eles não estão lado a lado, há três pessoas entre eles. Minha mãe não parece mais tão triste e meu pai conversando com alguém no telefone. Quando olha para mim, eu aceno, e ele acena de volta.

– Sejam bem vindos. – Não consigo prestar atenção em nada que o diretor diz, pois meus olhos estão em Henry. Mesmo com uma bata em cima o seu terno é visível e ele está com aquele sorriso lindo que só ele sabe dar. Seu chapéu está torto, e eu coloco a mão em cima da cabeça para avisar mas ele nega e continua a sorrir. Amo quando seus olhos ficam em cima do meu e seu sorriso fica reluzente. Desvio o olhar para a direita e Charlie acena sorrindo e eu retribuo. Ao seu lado está Ethan. Ethan, que hoje não usa o cabelo liso para baixo, e sim para cima. Acho que ele cortou, pois está extremamente arrepiado. Ele não tem mais o rosto de bebê, parecido com o Lucas Till, ele parece um modelo estilo Hunter Parrish. Ao perceber que estou olhando-o por tempo demais pisca um olho e meche a boca calmamente pronunciando as palavras Bonequinha de Luxo. Minhas amigas e David também estão na mesma fila, todos cochichando entre si. Só percebo que quero estar logo ali quando o diretor diz meu nome e eu ando rapidamente até o centro.

– Bom dia a todos. Meu nome é Hope Adams. Tenho 17 anos. – As pessoas olham para mim esperando que eu continue. Preciso de apenas alguns segundos para recuperar o fôlego e voltar a falar. – No começo do ano letivo estive presa em um grande dilema sem saber o que eu gostaria de ser. Acreditava que não tinha talento para absolutamente nada. Eu não sei dançar. Eu não sei cantar. Não sou boa com literatura. Não sei fazer malabarismo. Não sei jogar algum esporte. Não sei tocar nenhum instrumento. Isso é horrível. Essa sensação de não saber o que fazer da vida é sufocante. Às vezes, eu me olhava no espelho e perguntava: Quem é você? O que você quer ser? Qual é sua maior aptidão? E eu nunca sabia responder. Tudo o que eu fazia era encarar meu próprio reflexo, encarar essa pequena garota frágil. Acreditava que estava perdida, ou, pior do que isso, morta. Acho que muitos adolescentes passam por isso. Acho que muita gente não se enxerga. Acho que muita gente não sabe o que vai fazer ao sair daqui. Alguns irão para uma faculdade e se formar em uma boa profissão. Outros ficarão repetindo os anos por um longo tempo, apenas ganhando crédito, apenas adiando o inevitável. E há aqueles que não vão a lugar algum, que não vão fazer nada. Que vão tentar curtir o que resta da adolescência. Mas, e depois? Como vai ser? O que vai acontecer? – Faço uma pausa. É estranho ter tantos olhares em cima de mim. É estranho saber que minhas palavras podem estar servindo de lição para alguém. É estranho fazer parte de algo importante. Henry está olhando para mim da primeira fila, com o chapéu torto esperando que eu continue. – Os adultos costumam dizer que ser adolescente é fácil, mas não é. Ser adolescente é ser adulto e crianças ao mesmo tempo. Ser adolescente não significa apenas festas, hormônios e etc. Ser adolescente também significa tomar decisões, decisões que irão interferir de alguma maneira no futuro. Que irão trazer consequências boas ou ruins. É por isso que temos medo. É por isso que somos dramáticos. É por isso que não nos enxergamos. Hoje é um dia importante não só por estarmos nos formando, mas sim porque nossas decisões estão sendo testadas. Percebi que eu não conseguia distinguir o que eu queria ser pelo simples fato de eu não estar sendo eu mesma, pelo fato de eu não estar me enxergando. Então percebi que o meu real eu sempre esteve ali, presente, embaixo, por assim dizer, do meu nariz. Por um lado, fiquei aliviada, eu não estava perdida, eu não estava morta. Por outro, foi decepcionante. Percebi que não tem jeito, estamos sempre conosco, mesmo quando achamos que conseguimos nos livrar. A gente não desaparece. A gente só não se enxerga. E é isso o que devemos fazer, olharmos no espelho e nos enxergarmos. Enxergarmos dentro de nós mesmo, depois de camadas de pele e osso, depois de camadas de sentimentos, depois de camadas e mais camadas. Quando finalmente nos enxergarmos conseguiremos saber quem somos e o que queremos ser. Eu finalmente me enxerguei, espero que todos os outros consigam se enxergar também. – As pessoas estão batendo palmas e eu estou tão empolgada que dou um sorriso triunfante. Olho diretamente para meus amigos quando chego na segunda parte. – O ensino médio é para algumas pessoas algo terrível, mas, para outras, incríveis. A melhor coisa que cada um vai levar consigo são as memórias. Não há uma explicação empírica ou científica que define totalmente o significado de memória, sabemos apenas que ela foi feita para guardar aquilo que aconteceu e não vai voltar a se repetir. Teremos em nossa mente o primeiro dia de aula, o primeiro amigo, a primeira nota baixa, o primeiro mico, a primeira apresentação. Nossas memórias serão compostas de primeiras vezes, sendo elas boas ou ruins. Cada um de nós vai para um canto diferente e talvez aquele grupo inseparável de amigos nunca mais se vejam depois daqui. Mas as memórias dos momentos estarão sempre eternas dentro de nossos corações. Meu nome é Hope. Tenho dezessete anos. Quero ser advogada. Eu me enxergo. Eu tenho memórias.

O barulho das palmas faz com que borboletas em meu estomago batem suas asas de uma maneira frenética. Desço do palco, coloco minha bata e chapéu e sento-me na primeira fila. Por termos os sobrenomes iguais, Henry e eu ficamos lado a lado. Ele segura minha mão e eu contenho um suspiro quando sinto seus lábios sussurrando em meu ouvido:

– Adorei esse vestido da Titânia. – Sinto a ponta dos seus dedos levantarem um pouco minha bata para alisar o babado do vestido. Estou corando dos pés a cabeça, olhando diretamente para frente, para que ninguém perceba que tem alguma coisa de errado comigo. – Não vejo a hora de vê-la sem ele.

A cabeça de Ethan gira automaticamente e ele olha para nós com uma expressão engraçada, algo entre nojo e divertimento. Balança o dedo indicador um lado para o outro e diz:

– Não sou obrigado a ter que ouvir esse tipo de coisa. – Faz uma voz de tenor falsete e eu não consigo conter uma gargalhada. Charlie bate no meu ombro e minhas amigas começam a rir também, apesar de eu ter absoluta certeza de que elas nem sabem do que estão rindo. – Guardem esse fogo para mais tarde.

Henry bufa e eu assinto freneticamente com a cabeça. Hannah Wade sobre no palco e toca uma linda melodia no piano. Quando ela toca, parece que ela está tocando a sua alma. É tão bom, e eu concordo com Henry sobre o fato de as teclas pretas também fazerem música. As vezes, as teclas pretas são melhores que as brancas, pois as teclas pretas é um complemento fundamental para uma partitura.

Olhando para Hannah, percebo que sinto saudades de Tyler. Apesar de ter tido uma grande paixonite adolescente por ele durante quase quatro anos, considero como um amigo. Sinto saudades de conversar com ele, saudades de tê-lo lá em casa jogando vídeo game com Henry. Apesar de Henry negar, sei que no fundo, ele gosta de Tyler, de que no fundo, eles não são inimigos. Ele não me liga mais, nem manda diversas mensagens por dia. Acreditava que ele nunca iria mudar, mas ele mudou, todos mudamos, todos evoluímos.

Olho para as fileiras detrás e procuro por ele. Tyler está no fundo, olhando para Hannah com um sorriso. Se eles não estiverem namorando, estão quase. E, por incrível que pareça, fico feliz ao com isso. Se eles estão felizes, eu também estou.

Vejo cada um dos meus amigos sendo chamados por ordem alfabética. Anna, Callie, Charlie, David, Ethan e Jassie. Falta apenas Henry, Lília e eu. Daqui á uma hora, vamos nos encontrar em uma lanchonete detrás da escola, como fazemos todos os anos no último dia de aula. Pensar nisso me dá um aperto no peito, pois hoje literalmente é o último dia. Depois das férias de verão, não vou mais frequentar a escola e rever meus amigos, vou diretamente para a faculdade, com professores e alunos novos. Pensar nisso está me matando aos pouquinhos.

Henry aperta minha mão com força quando seu nome é chamado. Ele sobe no palco com um sorriso e o seu chapéu torto. Tudo nele é torto, o cabelo, a postura, o sorriso. Mas um torto bonito. Um torto charmoso. Um torto Henry. Pega o seu diploma e posa para uma foto ao lado dos nossos pais e o professor Ryan. Nunca gostei de Ryan, mas saber que foi ele quem incentivou Henry a seguir na carreira de escritor, faz com que ele ganhe um crédito comigo.

Então meu nome é chamado e lá estou eu subindo o palco novamente. Sorrio nervosa quando pego meu diploma. Estou tão feliz. Estou me sentindo tão realizada. Não consigo parar de rir e corar.

Tiro uma foto entre meu pai e minha mãe. Eles estão sorrindo também, papai diz estar orgulhoso de mim e mamãe beija minha testa antes de minha abraçar de lado. Me sinto amada. Nunca me senti deslocada por estar entre os Adams, apesar de não ter o cabelo loiro, os olhos claros, a pele branca e o sotaque como os deles, ainda me sinto parte dessa família. Sou Stonem. Sou Adams. Sou Hope.

– Você foi uma boa aluna. Srta. Hope. – O professor Ryan diz com um sorriso posando ao meu lado. Ele que ficou responsável por entrega-los. Apesar de sempre acha-lo metido, eu confesso que sim, ele é muito bonito, e sim, ele merece ser babado pelas calouras. Ter um professor gato de História tem lá suas vantagens. – Você tem um belo futuro pela frente.

O flash cega meus olhos e eu lhe dirijo um sorriso sem graça. Ele está olhando para minha mãe, olhando por tempo demais, e isso não me incomoda. O que me incomoda é o fato de ela estar corando e ajeitando o cabelo. O que me incomoda é meu pai fazer pouco caso com isso. O que me incomoda é ver que eles não estão usando suas alianças.

Quando Lília pega seu diploma, nós corremos para a lanchonete. David fica fazendo cena a todo momento, tentando chamar a atenção, e quando finalmente consegue, sobe em cima de uma cadeira e nós começamos a rir.

– Atenção! Atenção. – Seus cachos estão revoltados hoje, então eu subo em minha cadeira e coloco um gorro nele. David me agradece com um sorriso, seus olhos verdes com um brilho especial. Acho que ele e Louis não estão mais a pé de guerra, acho que ele está bem. Ainda temos muito a conversar, e graças a Deus meu melhor amigo não vai ficar longe de mim, já que faremos a mesma faculdade. – Durante todo o ensino médio nos reunimos aqui, nessa lanchonete cafona de comida ruim, para celebrar o ultimo dia de aula. Hoje, as coisas estão mais especiais. Temos três integrantes novos! Sejam bem vindos, Henry, Anna e Ethan. Agora vocês fazem parte do grupo de invisíveis fodões da Walter. Bem, ex-grupo, na verdade. Esse ano literalmente é o último. E, sabe, isso me faz ficar triste. Triste de verdade, pois vamos nos separar. – Como sempre, estou chorando. Acho que choro pelo menos quatro vezes ao dia ou mais. Pelo menos não sou a única, Lília está com a cabeça baixa tentando não demonstrar que também está chorando e Jassie funga a cada cinco segundos. As únicas que estão quietas são Anna e Jassie. Anna porque não tem muita intimidade e Callie porque, bem, Callie é Callie, ela é uma assexuada que não se permite ter sentimentos, ou seja, não se permite chorar. – Eu vou sentir saudades de vocês, sério. Como vai ser quando eu acordar de manhã decidido a ir para o treino das meninas e lembrar que elas estão na faculdade, que eu estou na faculdade, e não existe mais time de vôlei e handebol? Como vai ser quando eu perceber que Callie e eu não vamos mais andar junto de ônibus atrasados para a primeira aula? Como vai ser quando daqui a vinte anos, eu sentir saudades de cada um de vocês e nem saber onde vocês estão, o que fizeram de suas vidas, se estão casados ou não? Isso vai ser um saco. Um saco completo. E pensar nisso está me matando. – Ele para de falar em meio a um suspiro. Todos nós estamos olhando para ele, para suas mãos que se mechem freneticamente para cima e seus olhos inchados. – Eu não sei se vou ter tempo para tentar fazer com que nosso grupo de amigos continue junto, intacto, pois vou estar muito ocupado com as coisas da faculdade. Então, se essa for a última vez que vamos estar todos juntos, eu só queria deixar bem claro que vocês foram as melhores coisas da minha vida, literalmente. Minha vida não é perfeita, é uma bosta, literalmente uma bosta, por poucas pessoas me aceitarem como eu sou. E vocês fazem parte dos poucos, por isso vocês são tão maravilhosos. Eu estava em uma fase ruim antes de começar o ensino médio, e vocês me ajudaram a superar. Mesmo que não sabem do que eu estou falando, mesmo que não entendem pelo que eu estava passando, vocês me fizeram não se sentir tão sozinho. Sei que há pessoas que não acreditam que essas coisas acontecem, que não acreditam que possamos mudar. Sei que há pessoas que esquecem o que é fazer parte do último ano quando vão para a faculdade, e se esquecem da faculdade quando começam a trabalhar. Sei que há pessoas que esquecem o que é ter dezessete anos quando completam dezoito, e esquecem o que é ter dezoito quando fazem oitenta. E sei que tudo isso, todo o agora, tudo o que vivemos, será apenas histórias um dia. Será apenas o que a Hope disse, será apenas memorias. E nós vamos virar fotografias antigas, daquelas bem cafonas que ficam nos álbuns velhos no fundo do baú, e todos seremos mães e pais um dia, e nossos filhos vão perguntar sobre as fotografias, e nós teremos sempre uma história diferente para contar. Sempre terei uma história, como quando a Hope fumou pela primeira vez e disse que cigarro era coisa do capeta, mas acabou fumando mesmo assim e ficou viciada. Ou quando a Lília torceu o tornozelo e ficou fazendo drama durante um mês inteiro por estar com uma tipoia no pé. Ou quando Callie ficou desesperada porque acreditava que era uma alienígena por não se sentir atraída por ninguém. Ou quando Jassie terminou o namoro e fez um escândalo e duas horas depois já estava namorando com o Flynn novamente. Ou quando o Charlie tentou me convencer que jogar basquete era quase a mesma coisa que jogar handebol e eu levei uma bolada na cara tão grande que quase quebrei o nariz... Sempre haverá histórias, mas agora, esses momentos não são histórias. Isso tudo está acontecendo. Eu estou aqui, em cima de uma cadeira em uma lanchonete cafona e não consigo parar de falar cafona pois essa palavra é muito engraçada e muito gay. E vocês todos estão olhando para mim, e eu estou olhando para todos vocês. E eu amo tanto vocês, até mesmo Henry, Ethan e Anna, que conheço há séculos e sempre dirigi poucas palavras. E vocês são tão especiais, tão lindos, tão fabulosos e tão cafonas porque todos nós somos cafonas. Eu sei disso. Eu vejo isso. O momento que você percebe que sua vida não é apenas uma história triste, você está vivo. E você olha para o céu pelo vidro dessa lanchonete cafona, então olha para o teto, olha para os lados, para as luzes que iluminam o lugar, para seus amigos e tudo isso te deixa surpreso. Como você nunca notou isso antes? É o que você se pergunta. E você está ouvindo a sua voz aguda desesperada falando coisas para as pessoas que você mais ama no mundo. E nesse momento, você percebe, eu juro que você percebe, que nós não somos apenas histórias. Que nós somos reais.


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Notas finais do capítulo

Dia vinte e quatro vocês vão se deparar com "Desabafo de uma bebada" nas notas finais do capitulo. Não se assustem, pois a bebada sou eu, e eu estava bebada quando escrevi esse desabafo, há quase três semanas, logo após concluir o último extra. Fiquem avisados.
To com os dedinhos tremendo por ter que fazer uma despedida no dia 22 e agradecimentos, ai sem or.

Alguém aqui já leu os livros da Stephanie Perkins? Gente, que mulher maravilhosa. Sou apaixonada pela Isla, e dentre os garotos eu amo o St. Clair... Essa trilogia que não é trilogia é maravilhosa, super recomendo vocês se aventurarem no mundo de Anna, Lola e Isla!

Boooooooooom, até dia vinte e dois. To com vontade de chorar pq é a segunda vez que finalizo um capitulo estilo As Vantagens de Ser Indivisível, e isso me dá vontade de chorar, aff.

Tchauzinho.

Skye.
Beijinhos de luz.



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