Cartas para Hope escrita por Skye Miller


Capítulo 24
Twenty Four.


Notas iniciais do capítulo

Olá anjinhos!
Tudo bem???? Olha, eu to bem, porque ainda tenho três semanas inteiras para decidir o que fazer com essa fic e to atolada de livros pra ler, e isso é bom, eu adoro isso, na boa. To de férias e to um pouquinho preocupada com minhas notas, to com muito sete, e sete é quase a mesma bosta que nota vermelha, o que é uma droga, mas tudo vai ficar bem.
Então, gostaria de agradecer a Vick por ter recomendado a fic! Me deixou beeem feliz, e por falar em recomendação, vou reclamar algo: Comentem! Poxa vida, eu escrevo um capitulo de quase sete mil palavras e vocês nem comentam? Porra mano, isso é chato viu? Aff.
Booooom, espero que gostem desse capitulo. É meio desnecessário, mas é a conexão fundamental para o que vai acontecer no proximo.
Beijinhos de luz!



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Há um espelho no meu quarto. Ele tem um formato retangular e algumas fotos coladas nos cantos. São fotos variadas, todas feitas especialmente para me lembrar de que momentos importantes têm de ficar marcados na memoria, pois não voltarão jamais. Sempre que possível eu o evito, costumo olhar para meu reflexo apenas para ajustar meu cabelo ou fazer um cheque rápido do meu rosto.

Mas hoje, estou olhando-me diretamente. Movo a cabeça para o lado e meu reflexo faz o mesmo. Depois sorrio, arqueio as sobrancelhas, faço bico, encho as bochechas de ar, ponho a língua para fora, aperto os olhos e faço uma careta. Tem alguma coisa de errado comigo. Tem alguma coisa diferente. E eu não sei o que é.

São três horas da tarde, meu pai foi me buscar pela manhã e não me deixou criar desculpas para ficar mais algum tempo na casa de Anna. De qualquer maneira, eu estava com saudades de casa, com saudades da minha rotina, com saudades dos meus pais, amigos e das pessoas que vivem ao meu redor. Fiquei intrigada por um tempo, sem saber se avisava ou não a Henry que eu estava voltando, mas ele já deveria saber.

Não o encontrei em casa e quando perguntei a mamãe se ela sabia de alguma coisa a seu respeito ela negou e disse que talvez ele estivesse na casa de Ethan. Minhas entranhas ficam se remexendo de tempos em tempos. Olho para os lados a todo segundo, checando se meu pai não percebeu que estou escondendo algo, perguntando-me se alguém sabe o meu segredo, se alguém sabe que beijei meu não-irmão na noite passada em um estádio.

Olho bem para o meu reflexo e suspiro. Sei bem o que mudou. Não foi minha aparência, foi minha personalidade. Não estou mais encolhida pelos cantos, reprimida e cheia de incertezas. Estou sorrindo, com as bochechas coradas e os olhos brilhantes. Minha vida está tão agitada que estou me acostumando com isso, seria decepcionante se de uma hora para outro tudo parasse de repente. Mas repito a mim mesma: Não vai parar, não vai parar, não vai parar.

– Hope, querida. – Minha mãe grita subindo as escadas e eu rapidamente corro para a cama e finjo que estou dormindo. Não quero cruzar com o seu olhar avaliativo e a sua boca retorcida, não quero ver sua hesitação em chegar perto de mim. Estou apenas esperando por Henry para dizermos a ela o que está acontecendo. Sinto sua presença no quarto, ela se aproxima da cama e meche meu ombro lentamente. Sou um fracasso em fingir qualquer coisa, por isso abro logo os olhos e vejo o cinza de suas íris. – Suas amigas estão na cozinha, estão esperando por você.

Fico confusa por um tempo. Por que simplesmente não foram para o meu quarto? Então a resposta é obvia: Cassie fez bolo de chocolate. Eu assinto e me sento sobre a cama, esperando que minha mãe vá embora, mas ela continua parada torcendo o pano de prato nos seus dedos brancos de unhas perfeitas.

– Hope, precisamos conversar...

– Mãe. – Eu a interrompo e fico de pé. Coloco minhas mãos sobre seus ombros e nego. – Não quero falar disso agora, entendeu? Não é o momento certo para isso.

Por incrível que pareça ela apenas assente e dá um sorriso sem graça. Eu a acompanho até a cozinha e não fico nem um pouco surpresa ao encontrar Callie e Lília brigando pelo último pedaço na forma. Só de olhar para o bolo sinto um enjoo repentino e torço o nariz. Odeio chocolate. Odeio.

– Olha só! – Jassie exclama quando me vê e vem correndo até mim. – Quem é vivo sempre aparece! Sua vadia, como ousa se esconder na casa da Palmer e fingir que só existe aquela vaca ruiva no mundo?

– Mas você já comeu três pedaços e... Hey! – Callie interrompe seu discurso ao meio e dá um tapa no ombro de Jassie. – Ela não é uma vaca ruiva, tá legal?

– Desde quando você começou a defender a vaca ruiva?

– Não te interessa.

– Escuta aqui sua assexuada mal amada que...

Bato minha mão com força na mesa e três cabeças automaticamente giram em minha direção. Eu sorrio com a expressão assustada de cada uma. Lília está com a boca suja de chocolate e dá um sorrisinho envergonhado, não falei com ela ainda, é bem provável que ela ainda ache que eu a odeio, sendo que nunca poderia odiá-la. Callie encolhe um pouco os ombros e Jassie arregala os olhos.

– Mas que baderna é essa? – Eu quase rio ao meio da frase, minha voz soa tão fina e meu sotaque caipira saí tão puxado que chega a parecer falso. – Vocês vieram aqui para me ver ou comer a droga de um bolo?

– Para falar a verdade... – Lília começa a falar olhando diretamente para o bolo no seu prato, lambi os lábios e depois balança a cabeça, repreendendo qualquer outro pensamento. – Ver você, é claro.

Então todas as três vêm em minha direção, meio correndo, meio pulando, uma mistura meio louca e nós nos abraçamos. O cabelo curto de Callie pinica meu rosto, as bochechas meladas de Lília sujam meu pescoço e a fragrância forte de baunilha que exala de Jassie se entranha no meu corpo. Nós ficamos nesse abraço grupal por quase três minutos inteiros, apenas abraçadas.

Eu gosto disso. Gosto quando existe apenas eu e elas no mundo. Quando nós simplesmente nos abraçamos e falamos coisas sem sentido em meio a esse abraço, e acabamos todas as quatro rindo de maneira estranha e desengonçada. Gosto da maneira como elas fazem-me sentir viva. Gosto das nossas conversas. Gosto de estar com elas. Simplesmente gosto delas, são mais do que amigas, são mais do que irmãs, são minhas companheiras de crime, são uma parte de mim que levo para todos os cantos possíveis. Levo Jassie comigo sempre que vejo, falo ou presencio um jogo de vôlei. Levo Callie sempre que canto, escuto ou pesquiso sobre alguma banda de rock que ela gosta e levo Lília sempre que assisto ou divulgo alguma série de que ela acompanha.

– E aí? O que perdi nos últimos dias? – Estou deitada no sofá de pernas para cima olhando para o desenho animado que passa na TV. Lília está pintando as unhas de Jassie com um preto fosco e Callie lê um livro sentada no carpete. – Quero todos os detalhes.

– Nós vamos para as olimpíadas de vôlei. – Callie diz sem tirar os olhos do livro. – Passamos pelas regionais, foi incrível e tudo mais, só que estou tão sobrecarregada. Esse é meu ultimo ano e quero entrar em uma boa universidade, não sei se vou ter tempo para jogar.

Sua voz é quase um sussurro e paira um ar tenso no ar. Ela não está chorando, ela quase nunca chora, mas mesmo assim a trato como se estivesse se debulindo lagrimas. Eu me arrasto pelo sofá e lhe dou um abraço desajeitado e sussurro: Tudo vai ficar bem.

– Eu estou namorando. – Jassie diz para amenizar o clima, mas sua declaração não é nenhuma surpresa, aposto que ela voltou com o ex. – Mas não é com o Flinn.

Todos nós ficamos em silêncio, literalmente. Há esse intervalo de tempo em que nossas respirações ficam entrecortadas e três cabeças giram automaticamente na direção de Jassie. Piscamos os olhos em uníssimo e soltamos um suspiro abafado, não sabemos ainda se é de surpresa ou alivio.

– Aí! Lília caralho! – Jassie guincha. – Você quase cortou meus dedos!

– Desculpa! Desculpa! – Lília começa a dizer atrapalhada e nós rimos. – É que... Meu Deus Jassie! Você finalmente superou aquele babaca! Mas quem é o sortudo?

Jassie não responde. Ela nega e diz:

– No ano novo, na hora das revelações, eu vou contar.

Desde o sexto ano temos uma espécie de ritual quando chega o réveillon. Nós nos vestimos de branco ou azul todas as vezes, sentamos no gramado aqui de casa no final da noite, depois de toda a bebida, de todo o fumo, beijos, risos e tudo o que aconteceu no decorrer da noite. Aí, David sempre tira um cilindro colorido do bolso e acende. São fogos de artificio. E deitamos na grama, ficamos vendo os fogos, mesmo que seja mais de quatro da madrugada e falamos um segredo, um profundo segredo que obtivemos durante o ano. No ano passado, revelei que eu queria me mudar para a Flórida, por ser distante e quente. Todos ficaram olhando para mim, chocados, porque ninguém em sã consciência iria querer trocar Minneapolis por Flórida. Foi o segredo, a revelação mais bombástica. Acho que esse ano vou ganhar novamente quando disser que encontrei o Sr. Confuso.

– Hm... – Lília continua limpando as unhas de Jassie e ergue as sobrancelhas. Suas sobrancelhas são lindas, exatamente como as da Lily Collins. Estou esperando o momento exato para falar com ela sobre Henry, ou talvez eu nem fale, falta apenas três semanas para o fim do ano e uma para a formatura. Talvez eu conte para ela só depois. – Eu me encontrei com o Cam.

É a minha vez de ter um piti. Eu me sento ereta no encosto do sofá e me inclino em sua direção.

– O gatinho europeu? – Eu pergunto empolgada. Callie finge estar lendo, mas sei que seus ouvidos estão aguçados capitando qualquer informação e Jassie está bom os olhos arregalados. – Quando? Onde? Como?

– Para inicio de conversa, ele não é da Europa. Ele estava apenas em uma viagem com os pais. Foi ontem, no shopping. Eu fui sozinha, porque a Jassie estava com o tal namorado misterioso e a Callie no treino de atletismo. O que me faz lembrar... – Ela para de pintar as unhas de Jassie por um segundo e olha diretamente para a Marvin, que aperta o livro com força e tenta se esconder dentro dele. – O que você fazia ali? Que eu saiba, você só estava correndo para se recuperar do joelho, não para entrar para a equipe, e olha que estamos no final do ano letivo.

O rosto de Callie fica vermelho e ela gagueja:

– V-você não estava f-falando do C-cameron? Vamos voltar a-a-a atenção pra ele.

É muito engraçado ver Callie corar e gaguejar ao mesmo tempo. Isso quase nunca acontece. Olho semicerrado para ela e minhas outras amigas fazem o mesmo. Ela se encolhe um pouco e então caímos na gargalhada.

– Certo! – Lília volta a pintar as unhas e eu volto minha atenção para ela. – Ele é mais velho do que havia me dito. Ele não tem quinze, ele tem dezoito. Fiquei meio receosa no começo, porque, como poderei confiar nele se a base disso tudo foi uma mentira? Aí ele explicou que não queria dizer a real idade para não me assustar, ou impressionar. Saímos para o cinema, depois andemos pelo shopping. A gente conversou bastante, e eu gosto dele, meu Deus, gosto de verdade.

Eu sorrio e assinto. Sei bem como é isso, esse negocio de gostar. Quase abro a boca e digo que também estou gostando de alguém, quase digo que também estou namorando, mas me detenho a tempo e volto a assistir TV.

Minha sala de estar fica com cheiro de esmalte e quando meu pai chega em casa não para de reclamar disso. Mas eu não digo nada, porque ultimamente não estou reconhecendo quem ele se tornou e tenho medo do que ele é capaz de fazer. Já é noite e Henry não chegou ainda, faço qualquer coisa para me distrair, para não pensar nele, para não sentir saudades, mas não consigo.

Subo para o seu quarto e deito-me em sua cama. Nunca invadi sua privacidade dessa maneira e me sinto toda empolgada em estar fazendo isso pela primeira vez. Um quarto diz muito sobre uma pessoa, um quarto é uma janela para a alma de alguém.

Quando alguém entra no meu quarto, consegue ver uma menina que adora colecionar coisas antigas, que adora música, cigarros, tulipas e verão, uma garota que tem esperanças.

Quando entro no quarto de Henry, nunca consigo distinguir alguma coisa que o define realmente. Há uma parede coberta de post-its com frases de grandes filósofos e algumas bem destacadas, como se ele quisesse que elas saíssem do papel e se transformasse em algo sólido. O seu closet não é ocupado por roupas ou sapatos, é ocupado por livros. Dezenas dele, do chão ao teto. Eu pisco os olhos várias vezes, não acreditando no que estou vendo. Há títulos que nunca ouvi falar e outros famosos até demais. Pergunto-me como ele pôde esconder essa parte dele de mim por tanto tempo, nem mesmo sabia que Henry gostava de ler.

Ao canto, há uma mesa onde costumava ficar sua maquina de escrever. Agora tem papeis sobre ela, diversos deles, alguns com frases soltas e outros com textos. Eu leio os poemas de Henry, e são tão lindos, tão cheios de significados que só ele compreende. Ao olhar para o seu quarto, vejo o mundo de um adolescente jovem com alma de velho. Vejo um escritor. Vejo alguém importante. Simplesmente vejo Henry.

Eu deito sobre sua cama e me enrolo em seus lenções, tem um seu cheiro. Fico encarando o teto por alguns minutos, até que eles se tornam horas. Então me levanto e estou a um passo de ir para meu quarto quando olho para as prateleiras na parede, cobertas de porta retratos e telas de pintura. Eu analiso cada obra de arte, depois cada foto. Algumas são de Henry, Ethan e Tyler, outras Henry e Sophia. Em um canto bem estratégico há uma minha com Lília. Ao lado dela, há outra foto, que chama minha atenção e me obriga a se aproximar para ver melhor. São duas garotas bonitas de biquíni, óculos de sol e um chapéu de praia, sorrindo diretamente para a câmera. Uma é Sophia, eu consigo reconhece-la por causa do óculos de armação vermelha que ela adora usar e o cabelo loiro perfeito de uma Adams. Fico olhando para a outra garota e me pergunto quem é. Ela não usa óculos e seu cabelo é longo e cacheado. Eu sinto que a conheço, por isso aproximo mais a foto para meu rosto e examino melhor.

Quase não acredito quando a reconheço. É Aria. A Aria Gomez. Ela está tão feliz nessa foto. E com o cabelo longo. Da ultima vez que a vi, Aria parecia menor, mais magra e com uma Channel mal feita cheia de apliques laranja. Havia até mesmo me esquecido do seu rosto, afinal, fazem quase dois anos que ela morreu. Não sei o que sua foto está fazendo aqui, nem sei porque ela está ao lado de Sophia. Mas, apesar de tudo, não quero saber. Existem coisas que foram feitas para permanecerem em segredos, coisas que não foram feitas para serem perguntadas. Nunca fui próxima de Aria, mas o seu suicídio abalou todos nós, apesar de ninguém realmente saber a causa do acontecimento.

Coloco a foto no lugar e volto para o meu quarto. Segundos depois meu pai aparece.

– Hope, você já fez a inscrição da UCM? – Meu pai pergunta e eu faço uma careta. Não sei do que ele está falando. Papai solta um suspiro e senta no pufe perto da porta. – A faculdade central de Minneapolis, Hope. Começou semana passada e termina daqui a pouco, já fez sua inscrição?

Eu nego e meu pai suspira. Estou envergonhada. A formatura do meu ultimo ano escolar será em alguns dias e eu ainda não programei nada do que farei em seguida, nem mesmo estudei para fazer alguma seleção. Para falar a verdade, tenho estado em um impasse muito grande, um conflito comigo mesma. Não sei qual carreira seguir, não sei em quê devo me formar. Não posso sobreviver para sempre à custa do meu pai, não posso dançar balé como meio para conseguir dinheiro e nem posso me formar em educação física por causa do atletismo, pois não quero ser professora ou personal. O que irei fazer?

– É só colocar seus dados. – Meu pai estende seu celular em minha direção com um sorriso que preenche todo o seu rosto. Quero abraça-lo por estar sendo tão prestativo, mas não consigo fazer isso, apesar de amá-lo cenas de Henry sendo espancado atacam minha mente a todo segundo. – Eles dão varias alternativas de curso.

– Quer me sugerir algum?

Papai abre a boca surpreso e senta-se ao meu lado.

– Ah, Hope, com você tudo é tão mais simples. – Ele confessa afagando meu cabelo. – Henry nem sequer quis se inscrever. Não sei o que ele vai fazer da vida, mas eu o inscrevi mesmo assim, na área de direito.

Meu rosto esquenta e eu afasto a cabeça até que as mãos do meu pai já não estejam mais ali.

– Já parou para pensar que não é isso o que ele quer fazer?

– É isso, ou nada. – Sua voz fica dura e sua postura ereta. – Minha casa, minhas regras.

– Mas e se eu quisesse, sei lá, seguir um ramo diferente? – Pergunto levantando-me subitamente. – Tipo, música? E se eu quisesse me formar em música?

– Você pode se formar no que quiser, Hope, até mesmo a mais simples das profissões.

– Por que Henry não pode fazer o mesmo?

– Porque é diferente, Hope. Ele é o mais velho, ele é homem, ele vai comandar a minha empresa, vai ser o meu sucessor.

Quase grito que Henry não quer nada disso, mas recomponho-me e começo a digitar meus dados furiosamente. Quando chego na etapa de escolher um curso, não hesito em clicar naquele que antes nunca foi uma alternativa para mim. Eu sorrio quando encerro a inscrição, empolgada pelo que eu escolhi. No fundo, isso foi o que eu sempre quis fazer, mesmo sem meu pai saber de nada, mesmo sem ninguém me forçar. A Hope Adams gostaria de ser bailarina, diferentemente da Hope Stonem, ela quer uma coisa completamente diferente disso.

– O que você escolheu?

Eu sufoco um sorriso e apenas abro a porta do meu quarto para que ele possa passar.

– Você vai saber, pai, na hora certa você vai saber.

Estou esperando ansiosamente para ver sua reação. Para ver a sua cara espantada. Estou contando os segundos. Ah, se estou.

....

Não sou uma pessoa de sono pesado, sempre tive um sono muito leve, daqueles que, com o mais simples barulho, desperta. Meus olhos se abrem rapidamente, mas não me mexo. Meu quarto está escuro e ainda estou na mesma posição de que fui deitar, por isso acredito que não faz muito tempo que peguei no sono. Respiro fundo e tento me concentrar no barulho que me acordou – A porta do meu quarto sendo aberta.

Escuto a maçaneta girando e sei que nesse momento eu deveria estar me armando com um taco de beisebol ou gritando, pois tem alguém entrando no meu quarto. Em vez disso continuo quieta, paralisada, sem nem ao menos respirar direto, porque quem quer seja não está tentando invadir o meu quarto e meus pais não costumam acordar a essa hora para vir me ver, o que me faz presumir que é Henry. Mas mesmo assim meu coração dispara e todos os poros do meu corpo ficam arrepiados quando o colchão afunda e ele se deita ao meu lado. Quanto mais próximo estamos, mais tenho certeza de que é ele, pois ninguém além dele é capaz de fazer meu corpo inteiro tremer, entrar em combustão ou qualquer coisa do gênero como está acontecendo agora. Encolho-me um pouco quando sinto as cobertas sendo erguidas. Estou tremendo levemente, talvez de emoção, ou medo de que a qualquer segundo meu pai apareça, não sei, apenas estou apavorada.

O braço dele desliza por baixo do meu travesseiro, e seu outro braço me envolve minha cintura após encontrar minhas mãos. Ele me puxa para seu peito e entrelaça os dedos nos meus, enterrando em seguida a cabeça no meu pescoço. Sinto um arrepio repentino. Sei que estou apenas trajando uma blusinha de alças e shorts curtos de algodão para dormir, mas apesar disso não me importo, pois Henry não seria capaz de tocar um dedo em mim sem a minha permissão.

Eu sei que ele sabe que eu estou acordada, pois minha pulsação e meu coração me traem, eles faltam pular para fora do meu corpo e no mínimo roçar de seus pés nos meus eu arfo. Ele me abraça com força, trazendo-me sempre para perto do seu peito, como se eu estivesse a um passo de entrar ali dentro e tornarmos um só, as vezes ele simplesmente aproxima o rosto do meu, encosta os lábios nos meus cabelos e os beija com ternura.

Ficamos deitados sem dizer nada por um longo tempo, acho que vinte minutos, não tenho total certeza. Não quero falar nada, pois não quero estourar a bolha que nos ronda, não quero acabar com essa energia que nos mantem tão próximos. E ele não faz anda além de me ninar, enterrar a cabeça no meu pescoço e me apertar com tanta força e desespero que é de partir o coração.

– Fiquei esperando você o dia inteiro.

Henry me aperta com ainda mais força, puxando-me ainda mais para ele, como se fosse possível e beija meu ouvido antes de sussurrar baixinho.

– Eu sei, Hope. – Sua mão desliza pela minha cintura, dedilhando o contorno da minha barriga e me fazendo tremer. – Sinto muito por isso.

Sua voz faz com que placas tectônicas se movam dentro do meu peito. Deslizo minha mão sobre a sua e entrelaço nossos dedos, depois aperto firmemente. Ele está aqui, oh céus, ele está realmente aqui, isso tudo não é apenas um sonho bobo.

– Onde você estava?

Ele encosta a boca em meu ombro e o beija com delicadeza. A sensação de seus lábios em minha pele faz com que eu sinta um calor intenso correndo o meu corpo inteiro, desde a pontinha dos pés até as raízes do meu cabelo.

– Concertando os erros que você deixou para trás. – Ele murmura deslizando seus lábios pela minha clavícula e meu pescoço sem pressa alguma.

– Não entendi. – Estou até mesmo surpresa por estar conseguindo pronunciar tais palavras. O seu hálito sobre minha pele está ficando mais intenso e eu não consigo me concentrar em nada porque ele não para de percorrer todos os centímetros do meu pescoço. – O que você quer dizer com isso?

Então ele se afasta e eu quase imploro para que volte. Mesmo que poucos centímetros, mesmo que lentamente, mesmo que apenas para me dar espaço. Mesmo assim, eu automaticamente giro a cabeça em sua direção, tentando olhar para o seu rosto, mas está tudo tão escuro que não consigo nem mesmo ver a cor de suas íris.

– Quando você foi embora, Hope, você destruiu tudo. – Ele sussurra e vai se afastando ao pronunciar cada sílaba. Meu corpo inteiro sofre um choque térmico e fica gelado. Eu me sento na cama quando ele fica de pé e liga as luzes. Fecho os olhos, pois a claridade me incomoda. – Você rasgou cartas, quebrou discos, a vitrola, rasgou a blusa que Ethan lhe deu. Simplesmente virou uma gatinha selvagem.

Eu abro os olhos, conseguindo ao pouco ajustar o foco da minha visão. Henry continua sussurrando, pois o quarto de John e Cassie fica apenas alguns passos a frente. Henry vai até o meu guarda roupa e abre a porta onde normalmente costumo guardar meus sapatos.

Quase choro quando vejo o que há ali dentro. Discos novos de vinil. Um novo toca discos. Os desenhos todos reconstruídos. Uma blusa idêntica a que eu rasguei. Tudo novinho em folha, como se eu nunca tivesse danificado nada.

– Demorei o dia inteiro para conseguir recompor tudo. Mas, sabe, você nem fez um estrago tão grande assim e eu consegui um bom dinheiro pela capa do disco dos Beatles, que louco, né? Aí juntei uma grana, o Ethan, a Lília e a Anna ajudaram e fomos ajeitar tudo. Só não consegui recompor as cartas. Não lembro o que escrevi para você quando enviava como Sr. Confuso. – Ele pega um dos desenhos e sorri. Um sorriso de menino, com covinhas brilhantes e estupidamente lindas. Céus, estou me desintegrando. – Foi fácil desenhar novamente e... O que você está fazendo?

Eu estou de pé tentando abrir a porta emperrada do outro lado do guarda roupa. Há uma caixa lá dentro, que foi esquecida muito tempo atrás. Há algo que sempre quis dar ou para o Sr. Confuso ou para Henry, e agora que sei que ambos são a mesma pessoa isso me deixa aliviada por estar dando para a pessoa certa.

Ainda estou chorando e com o estomago formigando por Henry ser tão maravilhoso e me dar todas essas coisas perdidas de volta. Apesar de ter rasgado as cartas, tenho cada palavra no meu corpo, alma e coração. Cada letrinha decorada, cada virgula, acento ou sinal. Tudo.

Quando Henry vê o que tenho em mãos ele arregala os olhos e deixa o desenho cair no chão. Coloco a maquina em cima da cama, olhando o tempo inteiro para a porta, receosa para o momento exato em que ela irá abrir e meu pai nos pegará no flagra. Estou ficando louca com isso.

– Meu Deus... É a... é a... a... – Ele caminha lentamente em minha direção. Eu quero beijá-lo agora mesmo, por estar com uma careta fofa de espanto e admiração, mas continuo quieta esperando até que ele esteja ao meu lado para que eu possa assentir. – Meu Deus! Ela está em perfeito estado.

– Eu a consertei, Henry. Bom, não eu, mas paguei pelo concerto. Você merece uma segunda chance, todos nós merecemos.

– Caramba, Hope. – O sorriso dele é a coisa mais linda que eu já vi. – Eu amo tanto você. – Imediatamente, ele abaixa a boca e pressiona firmemente seus lábios nos meus. Reajo na mesma hora, separando os lábios e deixando ele me preencher com seu gosto de chiclete e refrigerante de guaraná. Ele é tudo o que eu sempre imaginei e sonhei. Delicado, firme, cuidadoso e exuberante. – Amo tanto, tanto, tanto, tanto. – Nossos lábios se movem de forma apaixonada enquanto nossos corpos tentam encontrar a posição perfeita exatamente como nossas bocas, procurando achar uma maneira de ficar ainda mais próximos, fundidos em um só. Eu gemo e arquejo todas as vezes que ele mexe com a boca delicadamente com a minha e Henry inspira todas as vezes que isso acontece. Aos poucos, acho que vou simplesmente me desintegrando em suas mãos. Nos beijamos até que meus lábios ficam dormentes e eu não consiga parar de rir.

Cuidadosamente, eu digito na maquina, sorrindo com a melodia que cada tecla solta. É tão prático, tão simples, tão melhor que um computador.

Escreva sobre nós.

É o que digito e ele responde:

Eu irei.

Nos deitamos novamente na cama, em um silêncio absoluto. Fico olhando para o teto do meu quarto, olhando para cada desenho e foto que há ali. Nunca havia notado antes, mas há fotos de Henry e eu quando éramos crianças, talvez minha mãe tenha colocado ali. Henry nunca sorri, ele está sempre com os olhos cor de âmbar avaliativos, as sobrancelhas arqueadas e as covinhas aparecendo mesmo sem nenhum sorriso. O cabelo ainda mais loiro do que é atualmente, como se fossem feitos de areia.

– Você sabe, não é? Que isso não vai durar para sempre? – Eu sussurro e Henry resmunga algo inaudível sobre meus cabelos. Estou de frente para ele, com minha cabeça encostada em seu peito ouvindo o tum tum tum do seu coração. – Não consigo parar de olhar para a porta com medo de que John possa abri-la a qualquer segundo. Estou apreensiva, Henry, temos que fazer algo a respeito disso.

– Mais tarde. – É tudo o que ele diz. – Juro que vou contar pela manhã, as coisas tudo vão mudar, mas só mais tarde, Hope. Vamos viver o agora.

Seus lábios tocam meu pescoço antes que sua respiração fique lenta e ele não se mova mais. Está dormindo, com o rosto sereno e os cabelos grudados na testa. E é exatamente assim que pegamos no sono, com minha cabeça apoiada em seu peito e nossos corpos envoltos um no outro, em silêncio.

Estamos vivendo o agora.


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Notas finais do capítulo

Alguém aqui já leu Estilhaça-me? GENTE DO CÉU O WARNER É TÃO LINDO TÃO FODA GOSTOSO MARAVILHOSO EU TO DE QUATRO POR ELE. Esse livro é do capeta, faz você shippar um casal eternamente por 100 páginas e aí surge um loirinho problemático e você começa a shippar outro pelo resto da trilogia inteira. Aff, tipo A Seleção.
E Sangue Quente? Do Isaac Marion? GENTE É TÃO FOFINHO, nunca achei que pudesse gostar de um zumbi, mas o R é maravilhoso.

Bom, espero que tenham gostado.
E comentem!
Beijinhos de luz.

Skye.



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