Jogos Vorazes - Peeta Mellark escrita por Nicoly Faustino


Capítulo 14
Parte 14




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/522956/chapter/14

Katniss parece hesitar por um segundo. Olha para o corredor vazio, como se estivesse prestes a fugir. Ou talvez esteja apenas meio bêbada ainda devido ao excesso de vinho que bebeu. Talvez ela queira me contar algo. Talvez esteja apenas com medo. Penso aonde poderíamos ir, e ficar a sós para que ela possa tentar se abrir comigo. De repente me vem na cabeça que o melhor lugar para irmos é o telhado. Acredito que não tenha ninguém lá para nos vigiar, nem câmeras. Não sei ao certo como chegar até lá, mas além de ter ouvido Cinna falar com Portia algumas coisas sobre isso, tenho quase certeza de ter visto uma escada que só pode levar até lá.

— Você já esteve no telhado? – pergunto finalmente.

Katniss balança a cabeça em negação.

— Cinna me mostrou. Você pode praticamente ver toda a cidade. O vento é um pouco barulhento, entretanto. – invento essa desculpa, torcendo para que ela entenda que lá talvez possamos ficar a sós.

Ela ainda me lança um olhar desconfiado, antes de concordar.

— Nós podemos apenas subir?

— Claro, venha — digo, tentando esconder o meu entusiasmo, por finalmente poder conversar a sós com ela. Seria uma boa oportunidade para dizer tudo o que sinto?

Vou então em direção as escadarias, seguido por ela. Subimos as escadas, e entramos em um cômodo onde há uma pequena porta. Rezo para que ela não esteja trancada. Quando a forço um pouco ela abre, e como eu havia imaginado, lá estamos nós, no telhado. Fico impressionado com aquela vista. Tantas luzes. Até mesmo a noite é possível ver as cores da capital. Tudo extremamente exuberante. Mas não posso demonstrar isso, pois disse a Katniss que já estive ali antes. Ela, em compensação parece até perder o folego. Não sei se é pela vista, ou pelo vento, que está bem mais forte do que eu esperava.

Andamos até o parapeito nos limites do telhado. Olhamos para baixo, e ambos ficamos impressionados com a quantidade de pessoas na rua. A uma hora dessas, todos no Distrito 12 já estariam dormindo.

Katniss não diz uma palavra. Parece até que ela se esqueceu que o intuito de virmos até aqui, é para podermos conversar.

— Perguntei a Cinna porque eles nos deixam subir aqui. Eles não estariam preocupados que algum dos tributos possa decidir pular pela beirada? – digo, me lembrando do que Portia e Cinna conversaram antes do jantar.

— O que ele disse? — ela pergunta parecendo se interessar pelo assunto.

— Você não pode — digo, enquanto levanto a minha mão, esticando apenas um pouco o braço, logo escutando um zumbido. Então é verdade o que Cinna falou, penso. — Algum tipo de campo elétrico te joga de volta ao telhado. – concluo, mas para eu mesmo, que para ela.

— Sempre preocupados com a nossa segurança — ela diz, num tom irônico.

Tomara que ela nunca pergunte a Cinna sobre essa história do telhado. Não quero que ela me veja como um mentiroso. Mas as vezes mentir é preciso para nos aproximarmos das pessoas. Eu aprendi isso.

— Você acha que eles estão nos assistindo agora? – Ela pergunta.

— Talvez — admito. Olho ao redor a procura de câmeras, ou de qualquer sinal de vigilância. Não encontro nada. Mas avisto um jardim do outro lado. Quanto mais nos afastarmos melhor, penso. — Venha ver o jardim.

Andamos em direção ao jardim, que contem flores de tipos tão diferentes, que aposto nunca ter visto nada igual. O vento aqui está mais forte, e parece abafar qualquer barulho. É o local perfeito. Olho para ela com expectativa, esperando que ela me conte. Ela parece distante, examinando uma flor. Passa-se vários minutos... Fico olhando para ela, pensando que eu poderia ficar assim para sempre.

— Nós estávamos caçando na floresta um dia. Escondidos, esperando pela caça — ela sussurra de repente.

— Você e seu pai? — eu sussurro ansiando escutar ela dizer que sim.

— Não, meu amigo Gale. Repentinamente, todos os pássaros pararam de cantar de uma vez. Exceto um. Era como se ele estivesse nos dando uma chamada de alerta. E então nós a vimos. Tenho certeza que era a mesma garota. Um garoto estava com ela. Suas roupas estavam esfarrapadas. Eles tinham círculos escuros sob seus olhos de falta de sono. Eles estavam correndo como se suas vidas dependessem disso.

Ela fica em silencio. E eu também. Não é uma boa hora para demonstrar ciúmes. Mas isso é tudo que consigo sentir. Imagens de Katniss e Gale sozinhos na floresta atravessam a minha mente, e tudo o que posso fazer, é focar em Katniss a minha frente. Ela parece estar prestes a chorar. Mas se recupera e continua.

— O aerobarco apareceu do nada. Quero dizer, em um momento o céu estava vazio e no outro lá estava ele. Não fez nenhum som, mas eles o viram. Uma rede caiu em cima da garota e a carregou para cima, rápido, tão rápido como um elevador. Eles atiraram algum tipo de arpão no garoto. Estava amarrado a um cabo e eles o prenderam e o puxaram também. Mas eu estava certa que ele estava morto. Nós escutamos a garota gritar uma vez. O nome do garoto, eu acho. Então ele se foi, o aerobarco. Sumiu no ar. E os pássaros começaram a cantar de novo, como se nada tivesse acontecido.

— Eles viram vocês? — pergunto, só agora percebendo a gravidade disso, e me sentindo tolo por quase demonstrar meus sentimentos, enquanto Katniss estava tão agoniada com esse segredo dela. E de Gale. Agora meu também.

— Não sei. Estávamos sob uma rocha — ela explica, enquanto olha para o chão.

Eu sei que sobre isso ela está mentindo. Se a garota não a tivesse visto, porque teria ficado tão apavorada quando Katniss a reconheceu? Decido não questiona-la. Ela parece abalada demais.

— Você está tremendo — só então noto.

Tiro minha jaqueta, e coloco sobre os seus ombros. Ela parece querer recuar, mas então aceita.

— Eles eram daqui? — pergunto, enquanto fecho um botão em seu pescoço. Espero que ela não perceba que agora eu que estou tremendo. E não é por causa do vento.

Ela apenas assentiu.

— Para onde você acha que eles estavam indo? — pergunto não só por querer mesmo saber, mas por querer prolongar ao máximo nossa conversa.

— Eu não sei. O Distrito 12 é muito como o fim da linha. Além de nós, há apenas a imensidão. Se você não contar com as ruínas do Distrito 13 que ainda arde lentamente das bombas tóxicas. Eles mostram na televisão ocasionalmente, só para nos lembrar. E porque eles partiriam daqui?

— Eu partiria daqui — deixo escapar mais alto do que deveria. Então eu olho ao redor um pouco nervoso. Afinal, não seria muito bom ser acusado de traição contra a capital, pouco antes de ser enviado aos jogos. Tudo parece igual, então continuo falando, mais baixo dessa vez — Eu iria para casa agora se eles me deixassem. Mas você tem que admitir, a comida é de primeira.

Ela quase sorri.

— Está ficando frio. É melhor entrarmos — digo percebendo que nossa conversa parece ter chego ao fim.

Quando chegamos dentro do pequeno cômodo que leva até o telhado, não resisto.

— Seu amigo Gale. Ele é o que levou a sua irmã da colheita? – Pergunto, mesmo sabendo quem ele é.

— Sim. Você o conhece? — ela pergunta.

— Não realmente. Ouvi que as garotas falam muito sobre ele. Achei que ele fosse seu primo ou algo. Vocês ajudam um ao outro. – Comento num tom de voz que soou quase amargo.

— Não, nós não somos parentes — ela diz, me observando com certa curiosidade.

Eu não queria sentir isso. O ciúme que sinto dela com Gale, é quase maior que o amor que cultivei por ela todos esses anos. Tento não pensar mais sobre isso, mas agora as coisas já saíram de meu controle. Eu aceno, enquanto a próxima pergunta da qual eu não gostaria de saber a resposta, sai de minha boca.

— Ele veio dizer adeus para você?

— Sim — ela responde, parecendo me analisar. — E seu pai também. Ele me trouxe biscoitos.

Eu levanto as sobrancelhas surpreso. Mas realmente, isso é novidade para mim.

— Verdade? Bem, ele gosta de você e da sua irmã. Acho que ele queria ter tido uma filha em vez de uma casa cheia de garotos. – Comento, sabendo que ambas as afirmações são verdadeiras.

— Ele conhecia sua mãe quando eles eram crianças — Continuo.

Ela parece surpresa.

— Oh, sim. Ela cresceu na cidade.

Andamos o resto do corredor em silencio. Chegamos até a porta do seu quarto, e ela parece estar esgotada. Ela desabotoa a jaqueta, e me devolve.

— Vejo você de manhã, então. – ela diz, com pouco entusiasmo.

— Até — eu digo, frustrado por ter estragado minha única oportunidade de ao menos ser amigo dela. Por um curto espaço de tempo, claro.

Vago pelo corredor, remoendo cada palavra da nossa conversa. No fundo estou feliz, afinal Katniss me contou algo muito sério. Muito pessoal. Considerei isso como um sinal de confiança. Mas por outro lado, estou realmente frustrado, pois eu estraguei tudo colocando Gale no meio dessa conversa. E por mais que eu soubesse que a verdade não iria me agradar, eu persisti no erro.

Chego em meu quarto e me jogo na cama. A jaqueta que Katniss devolveu está em meus braços. Percebo que está com o cheiro dela. Abraço a jaqueta com todas as minhas forças enquanto sinto o seu cheiro. Por um segundo parece que Katniss está ali comigo, pois seu cheiro está tão fresco, tão vivo, tão perto. Eu não aguento e começo a chorar, porque de alguma forma eu sei, que isso é o mais perto que posso chegar de ter Katniss comigo. O seu cheiro na minha jaqueta. E essa é uma realidade devastadora.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Jogos Vorazes - Peeta Mellark" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.