Mirror, O Reflexo da Verdade escrita por Nynna Days


Capítulo 4
Capítulo 4


Notas iniciais do capítulo

Gente, esse foi o capítulo que eu mais demorei a escrever. Sério. Decidir cada coisa que eles iriam fazer foi uma tortura. Mas consegui. E espero que vocês gostem. Ah, quero falar com todos ali embaixo.

Aproveitem o capítulo.



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Estávamos deitados em cima de uma toalha de piquenique quadriculada, nossos braços se tocando e os dedos médios entrelaçados. Mas, os olhos fixos nas estrelas acima de nós. Aliel suspirou saudosa de casa. E, como sempre, me senti incapacitado. Seus cabelos escuros e cacheados dela roçavam em meu rosto, mesmo que estivessem presos em uma longa trança.

O seu cheiro faria qualquer flor sentir inveja. E era natural. Aliel não gostava de coisas artificiais ou que alterassem a aparência. Claro que tinha as suas exceções. Meu piercing, por exemplo. Prendi-o entre os dentes e puxei levemente, sentindo minha língua formigar um pouco. Suas longas unhas roçaram na palma de minha mão, fazendo todo o meu corpo tremer. Ela poderia me chamar de Tentação, mas quem estava se segurando para não pecar era eu.

Seu ombro encostou-se ao meu com leveza, como se para que manter ciente de sua presença inesquecível. Ou do outro artifício que habitava em meu corpo. A tatuagem que tinha feito em minhas costas atrás do ombro direito, quando tinha dezessete. Eu estava bêbado e muito drogado no dia. Suspeitava que tivesse perdido uma aposta. E como não era do tipo de pessoa que não recuava diante de um desafio, aceitei as consequências.

“Não acredito que essa semana passou tão rápido.”, meu anjo lamentou. Virou o corpo de bruços e se apoiou nos cotovelos para pode olhar em meu rosto. “Mas foi incrível.”, sorriu.

Fechei os olhos, suspirando com as lembranças.

“Eu sei.”

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Assim que chegamos, na segunda, quis levar Aliel para uma experiência nova. Quero dizer, sabia que ela já deveria ter feito isso algumas vezes, mas iria mostrar o ponto de vista humano. Estávamos deitados na cama, distraído com os pensamentos longínquos que ousaram nos acompanhar. Ela estava sentada, os olhos fixos em um ponto distante e vazio. Não me atrevi a interrompê-la. Sabia que estava tendo alguma de suas visões angélicas.

Minha cabeça repousava em sua barriga enquanto seus dedos delicados moviam-se por entre os meus cabelos escuros. Era um movimento rítmico, mas automático. Não que estivesse melhor. Meus olhos estavam presos na tela de meu celular enquanto recebia inúmeras mensagens do pessoal do time e de Jason. Todos falando da festa que teria dali a algumas semanas. Sarah tinha comentado isso com Aliel, mas minha Guardiã não havia dado certeza de sua presença.

“Você não precisa deixar de ir aos lugares por minha causa, Jeremy.”, ela disse no dia.

Compreendia que ela estava certa, mas era um pouco fora de lógica. Se fôssemos um casal normal, sem nenhum vínculo angelical, daria toda a razão para ela. Mas Aliel teria que estar em todos os lugares que eu fosse garantindo minha sobriedade e longinquidade das drogas. E aqueles ambientes a deixavam tonta, além de dar dor de cabeça. Não queria que ela tivesse essas reações e me deixasse inválido de ajudá-la.

Por isso, ou Aliel me acompanha solidamente as festas, ou não participava.

“Acabei.”, ela disse soltando meus cabelos, dando-me a chance de sentar. Piscou seus olhos algumas vezes, até que eles retomassem a cor escura. Dei um tímido sorriso. “Desculpe ter te entediado.”

Balancei a mão, demonstrando indiferença.

“Você tem trabalho com o pessoal lá de cima.”, apontei discretamente para o telhado, vendo seus olhos brilhando em humor. Dei um meio sorriso e toquei seu queixo com a ponta de meus dedos, fazendo-a ficar visivelmente constrangida. Abaixei minha voz até que ficasse em um tom rouco e sedutor. “Mas agora estou afim de levar minha namorada para o cinema.”

Ela mordeu a ponta do lábio inferior, olhando meu rosto com a respiração pesada. A intensidade de seu olhar me fez ficar tenso e inapto á ter algum pensamento coerente. E quando ele pousou em minha boca, tive que juntar toda a minha força de vontade para soltá-la e levantar da cama. Pigarreei, passando as mãos por meus cabelos e acalmando meu coração – e o restante de meu corpo. Tudo estava acelerado e esquentado.

“Jeremy...”, ela chamou hesitando.

Engoli a seco, tentando evitar que seu sussurro suave me atingisse com a mesma força e intensidade que seu olhar. Forcei um sorriso e me virei para ela. Aliel tinha uma sobrancelha levantada, estranhando minha mudança de comportamento. Estiquei minha mão na sua direção e a fiz levantar junto comigo.

“Vamos ao cinema.”, repeti a proposta, vendo assenti concordando. Meu sorriso se tornou verdadeiro. “Vou te mostrar como o ser humano pode criar coisas lindas, mesmo que em meio á tanta destruição.”

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“Adorei o filme.”, ela disse se aconchegando em meu corpo e pondo o rosto na curva de meu pescoço. Sua respiração contra minha pele fez meus pelos se arrepiarem e algumas partes responderem. Dobrei as pernas, erguendo os joelhos e pus meu tornozelo em um deles. “Tive que me segurar para não transformar esse tempo estrelado em uma chuva inigualável.”

Tirei uma das mãos de trás da cabeça e pus ao seu redor. Isso a fez se pressionar com mais segurança em mim. Mordi o lábio inferior, retendo um suspiro e comecei a sentir seu coração batendo contra a lateral do meu peito. Sorri com a velocidade e me perguntei mentalmente se estaria apostando corrida com o meu.

“Sinto-me culpado por tê-la feito assistir A Culpa É Das Estrelas.”, confessei, escutando seu riso em seguida. “É sério.”, acrescentei bem humorado. “Jason me contou que viu com Sarah e ela chorou desde o meio até o final. Pensei que iria gostar de se sentir como uma humana. Mas esqueci de que algumas reações que para nós é normal, para você pode desencadear uma mudança climática.”

Ela afastou o rosto de meu pescoço e me encarou, incrédula.

“E você ainda disse que não conseguia fazer seu currículo para a faculdade.”, comentou, irônica. Meneou a cabeça, me olhando com desapontamento falso. “Era tudo fingimento, Jeremy?”

Movi a língua pelos lábios, vendo-a forçando seu sorriso para que parecesse casual. Voltei a olhar para as estrelas, soltando nossas mãos entrelaçadas e pondo a minha atrás da cabeça. Ela pousou a sua em meu peito. Meu rosto se esquentou quando a possibilidade de que ela sentisse meu coração batendo contra sua palma tomou minha mente.

Desviei do assunto.

“Nossa visita a Hollywood foi incrível.”, suspirei.

Ela assentiu contra o meu peito.

“Verdade.”

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“Hey, Anjo.”, chamei-a. “Não sabia que voava tão alto.”

Aliel sorriu batendo suas asas e as fechando em suas costas. Era impossível não ficar boquiaberto com a beleza de suas penas embranquecidas e prateadas nas pontas. Há algum tempo, ela contou que tinha medo de eu ter medo de suas asas por terem um formato similar ao das águias. Poderia ser ofensivo para os anjos, mas era perfeito para mim. Como um reflexo de sua personalidade. Pura, mas se não indefesa.

O vento bateu em seu rosto enquanto ela cruzava as pernas tranquilamente sentada em cima da letra H de Hollywood. Aquilo era proibido e nós sabíamos disso, mas não era pecado, certo? Seus cabelos estavam soltos e por conta do vento, voavam para trás quase se enroscando em suas penas. Sorri, maravilhado. Ela passou os dedos pelos fios que teimavam em tapar sua visão.

“Parece que você consegue alcançar mais coisas do que meu coração.”, murmurei. Ela fechou os olhos e respirou fundo, apreciando o momento. “Você poderia ter me levado para cima junto com você, não é?”

Ela riu, mantendo os olhos fechados.

“E te ver se equilibrando aqui e em seguida caindo de cabeça no chão?”, ela perguntou retoricamente. Cruzei os braços, ofendido. “Não, muito obrigada. Gosto do meu emprego.”

Levantei uma sobrancelha.

“Isso não tem nada haver com o fato de eu morrer?”

Isso a fez me encarar os olhos escuros e afiados.

“Sempre tem haver com você, Jeremy.”

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“Queria ter subido em uma das letras.”, lamentei.

Seu nariz roçou em meu pescoço enquanto meneava a cabeça, negando-me aquele pensamento. Seu corpo estava tenso, só com a pequena possibilidade de algo acontecer comigo. Movi minha mão até suas costas e a afaguei, até que relaxasse totalmente. Sua mão deslizou por meu peito até o ombro e ela respirou fundo, como um suspiro sonolento.

“A caminhada pela estrada da fama também foi interessante.”, comentou, tentando ser discreta ao trocar de assunto. Meus lábios se torceram em um pequeno sorriso. “A sua fascinação por aquele Michael Jackson foi engraçada.”

Bufei, coçando a cabeça.

“Não entendo como vocês, anjos, vivem milhares de anos pela terra e não tem nenhuma consciência do que é cultura pop. Nem um música, Aliel?”

Encolheu os ombros, defensiva.

“Nós conhecemos música.”, rebateu e a imaginei franzido o cenho. “Só que apenas a nossa música. Cantada na língua dos anjos. Caliel adorava. Sempre que estávamos sentados no telhado do meu quarto do lado da igreja, ela cantava. Isso nos faz bem. Lembra-nos de onde viemos e para onde voltaremos.”, suspirou melancólica.

Com um pouco de esforço, virei o rosto o suficiente para dar um beijo em sua testa. Meus lábios formigaram e minha pele se esquentou. Era incrível o quanto tinha mudado em tão pouco tempo por causa dessa mulher. Ela retribuiu o beijo pressionando os lábios em meu pescoço. Fechei minha mão em meu couro cabeludo, me impedindo de fazer uma besteira incomparável. Meu maxilar trincou e tentei não parecer sem controle.

Soltei o ar que nem tinha percebido que havia prendido e controlei minhas reações inexploráveis. Tratei de me acalmar rapidamente antes que Aliel percebesse meu silêncio. Todos sabiam que eu não fechava a boca por nem um segundo. Peguei a ponta de sua trança e enrolei por entre os meus dedos.

“Acho que o Michael Jackson não ganhou do parque de diversão.”

Pude senti-la fazendo uma careta.

“Se for caçoar por conta do que aconteceu no carrinho bate-bate.”

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“Vamos, Anjo”, gritei batendo em seu carro com força.

A força da batia fez seu corpo ir para frente e para trás, quase fazendo-a perder a noção de espaço pro alguns segundos. Estreitou os olhos para mim, que mantinha um sorriso vitorioso e convencido nos lábios. Uma garota vestindo a camisa do parque parou ao lado de Aliel e lhe deu algumas instruções.

Minha Guardiã escutou com atenção, assentindo com cada palavra. E assim que a garota se afastou, pôs os orbes escuros em mim, determinados. Apertei o volante, pressionando os lábios juntos. Aliel levantou uma sobrancelha em desafio. Dei um meio sorriso ao mesmo tempo em que o segundo sinal tocou.

Avancei na sua direção, vendo-a fazer o mesmo. Iríamos bater de frentes, mas nenhum dos dois estava disposto a recuar. Parecia que a pista tinha escurecido e éramos apenas nós dois e a nossa disputa particular. Quando estávamos a um centímetro de trombar, virei o carrinho, saindo de sua mira.

Nesse milésimo de segundo, vi seus olhos se arregalando de surpresa. Com destreza, parei o carrinho em um ponto estratégico, vendo o estrago que havia causado. Aliel estava na linha de tiro, então era um alvo óbvio. Todos os carrinhos concentraram suas atenções nela. E escutei vagamente o seu grito horrorizado.

Ok, poderia parecer um péssimo namorado, mas queria que ela tivesse todas as experiências humanas possíveis. Inclusive essa. Mas assim que o último sinal tocou, minha mão estava estendida em sua direção. Ela me olhava com dúvidas, talvez pensando que era outro truque. Aproximei minha mão ainda mais e sorri, tentando lhe passa confiança.

Ela retribuiu o sorriso e pegou minha mão. Mesmo que estivesse apertando com mais força do que o necessário.

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“Pelo menos agora você sabe como é ser cercada por um bando de crianças de oito anos.”, brinquei, sendo beliscado no peito em seguida. Soltei um muxoxo. “Achei que anjos não deveriam ser agressivos.”

Senti sua respiração em minha orelha, a entorpecendo.

“Não somos.”, ela confirmou. Soltei sua trança, pousando minha mão nas suas costas novamente. Seu tom de voz estava alegre o que me contagiou. “Mas tem alguns pupilos que nos levam ao limite.”, cutucou meu peito com o indicador.

Segurei seu dedo, brincando a ponta de sua unha.

“Espero que esteja falando da Mellany Brown.”, retruquei. Ela riu. Revirei os olhos. “Eu tive dois Guardiões. Ela teve quatro. Quatro!”, exclamei. Cocei o queixo discretamente. “E não duvido nada que esteja partindo para o quinto.”, isso me levantou uma dúvida. “O que aconteceu com meu antigo Guardião?”

Aliel ficou em silêncio por um instante, até que deu de ombros.

“Manuel foi remanejado.”, ela esclareceu. Assenti comigo mesmo. “Ele foi para uma criança que havia nascido na Grécia. Sortudo”

Bufei.

“Perdeu a oportunidade de ficar com o gostosão aqui.”, dei um tapa no meu peito, fazendo-a rir. “Vai dizer que estou mentindo. Fiquei um gato no casamento de Caliel.”

Ela assentiu contra meu ombro.

Ainda bem que não estava vendo meu cenho franzido.

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“Então hoje não vamos aprontar nada?”, Aliel perguntou pela terceira vez.

Assenti, puxando-a junto para cama. Ela sentou e cruzou as pernas em borboleta. Encostei-me nela, pousando minha cabeça em seus seios com cuidado para não machucá-la. Ela passou os braços por cima dos meus ombros e cruzou as mãos em meu peito.

“Não.”, disse com um sorriso ao ver seus olhos se arregalarem. “Acho que adrenalina dos carrinhos bate-bate já foi demais para você.”

Ela revirou os olhos, bufando.

“Se for continuar com esse assunto...”, começou a me empurrar.

Segurei seu pulso, impedindo-a de se afastar. O aperto era firma, mas não para machucá-la. Encarei-a, fazendo minha melhor expressão de desamparado. Ficamos parados por alguns segundos, até que ela assentiu e voltou a se sentar e passar os braços por meus ombros. Peguei o celular, querendo me atualizar e vi que tinham posto as fotos do casamento de Caliel.

“Hey.”, ergui o celular para que ela visse. “As fotos.”

Sua mão se pressionou na minha, enquanto passava as fotos e ria. Muitas eram de Caliel chorando na cerimônia, ou dançando com Nicolas na festa. Até que chegou à foto com os convidados. Caliel estava sorridente ao lado das madrinhas. Aliel, Mellany e Annie –cunhada de Nicolas.

A foto seguinte era de Nicolas e os padrinhos. Seu irmão Gerard, Adriel e mais um homem que não conhecia. Depois foi a foto da família. Nicolas, Gerard, Mellany e Vanessa sorriam, mesmo que fosse visível o desconforto de Mellany. Seu rosto estava rígido e seus olhos cinza, estreitos. Lembrei-me vagamente de tê-la visto se afastando com velocidade da mãe, logo depois que a fotografia foi batida.

“Elas vão demorar para se entender.”, comentei apontando para as mulheres Brown. “Mellany tem uma cara de que guarda rancor por um bom tempo. Além disso, a mãe dela os abandonou por... três anos?”

“Cinco.”, Aliel me corrigiu com os olhos ainda na foto. Então suspirou. “Isso é uma coisa de tempo. Adriel me disse que Mellany já havia se acostumado com a ideia da mãe voltando para a vida deles. Só que Vanessa está forçando a barra e não sabe que sua filha odeia ser pressionada.”

Assenti, concordando com as palavras de Aliel. O curto período em que conheci Mellany, foi interessante. Era cômico o fato de sermos tão parecidos, até fisicamente. E eu a havia ajudado tantas vezes com suas armações que me sentia responsável por metade de seus castigos. Passei a foto e sorri.

“Você estava linda.”, sussurrei.

Seus lábios se pressionaram no topo da minha cabeça.

“E você magnífico.”

Ergui meus olhos e lhe dei uma piscadinha.

“Eu sei.”

Fiquei olhando para a nossa fotografia dançando, por alguns segundos. As minhas mãos na cintura fina de Aliel enquanto seu corpo se pressionava no meu. Seus pés tentavam acompanhar o mesmo ritmo que a música exigia. Suas mãos em meus ombros pedindo apoio e que não a deixasse cair. Sua cabeça perfeitamente encaixada na curva de meu pescoço e meus lábios pressionados em seus cabelos cacheados.

Mas, seus olhos tinham um brilho distante que me incomodou. Tristeza, talvez. Mesclada com dúvida e sofrimento. Sabia que nossas limitações lhe causavam dor, só não tinha noção de quanto. Só então me lembrei de que aquela dança havia sido depois que eu tinha esbarrado com aquela garota loira – Mary – e meu cérebro severo castigou meu corpo por agir de um jeito tão inapropriado.

“Nem percebi eles batendo a foto.”, Aliel disse me tirando dos pensamentos. Seu sorriso era pequeno, mesmo que seus olhos brilhassem. “Obrigada por não me deixar cair.”

Larguei o celular em um canto qualquer da cama e relaxei meu corpo. Todo o calor de Aliel estava sendo transportado para mim, fazendo-me ficar superaquecido. Suas mãos pararam de acariciar meu peito quando perceberam a tensão que eu emanava. Escutei-a engolir a seco. Me levantei, sabendo que não era responsável por meus atos.

“Vou tomar um banho.”

Frio.

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“Você demorou bastante naquele banho.”, ela ressaltou.

Meu rosto se aqueceu enquanto atingia o tom avermelhado. Pigarreei e acalmei minha respiração. Nunca havia sentido vergonha de falar sobre qualquer coisa perto de uma garota. Mas, Aliel além de ser minha namorada, era um Anjo. Não poderia sair gritando aos quatro ventos que ela havia sido o motivo da minha demora.

“Lavei o cabelo.”, menti. E antes que ela pudesse detectar a blasfêmia, mudei de assunto. O vento soprou em meu rosto, fazendo alguns fios de cabelos ficassem na frente de meus olhos. “O dia mais produtivo que tivemos aqui foi sexta.”

Aliel bufou, cética de minhas palavras.

“Eu devo ter um imã para o chão com a quantidade de vezes que quase caí.”, reclamou. Gargalhei com as lembranças. “Além daquela roupa desconfortável.”

“Aquilo se chama vestido, Aliel.”, gracejei.

Ela soltou um riso irônico.

“Eu chamaria aquilo de toalha, no máximo.”, ela pausou e me peguei imaginando careta estava fazendo. “Mas não vi você reclamando nem um segundo.”

Ri.

“Isso porque não tinha motivo para reclamar.”

Ela soltou um muxoxo.

“Fale por si mesmo.”, murmurou.

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A música soou em nossos ouvidos e eu sorri ao ver Aliel abaixando os olhos, envergonhada. Sua pele chocolate se destacando com o vestido azul que moldava perfeitamente se corpo curvilíneo e alto, como o de uma modelo. Estava com as mãos nas coxas, como se quisesse impedir que o pano se erguesse mais do que o necessário. Tive que me impedir de babar por suas pernas longas e torneadas destacadas pelo salto – talvez de cinco centímetros, já que ela não gostava de ser muito alta.

“Vamos!”, o instrutor gritou. “Peguem suas parceiras e dancem.”

Pelo canto do olho percebi alguns homens fascinados pela beleza de Aliel, o que fez meu rosto adquirir uma coloração avermelhada. Mas meu peito pulsava de orgulho. Todos almejavam algo que era meu. Toquei em sua mão, querendo que minha coragem fosse transferida para ela. Aliel sorriu e se aproximou o bastante para que pudesse pousar suas mãos em meus ombros. Envolvi sua cintura, exatamente como no casamento.

“Acho que o ritmo é mais agitado.”, ela comentou.

Balançávamos nossos corpos totalmente fora do ritmo, apenas pelo prazer de fazê-lo. Senti sua respiração contra a minha pele fez tudo dentro de mim se agitar e se refletiu em meu interior, arrepiando todos os meus pelos. Impulsivo, apertei-a com força contra o meu corpo, escutando seu riso baixo em meu ouvido.

Estávamos presos em nosso próprio mundo, ao ritmo de nossos corações. Algumas vezes, a gravidade exigia o encontro do corpo de Aliel com o chão. Mas minhas mãos permaneceram firmes, lhe dando suporte e confiança. Seus pés ameaçavam cair, fazendo-a bufar e reclamar de sua própria descoordenação. Mas em nenhum segundo seus olhos deixaram de brilhar ou seu sorriso desabou de seus lábios.

“Hey, casal!”, o instrutor parou do nosso lado com os braços cruzados. Seus olhos analisaram Aliel por mais tempo que o necessário, fazendo-a dar um passo para trás em defensiva. Pus um braço ao redor de seus ombros, protetor. “Acho que seria melhor se vocês acompanhassem o ritmo da música.”

Nós assentimos e ele sorriu agradecido. Como a música era mais agitada, distanciei – a contragosto – meu corpo do de minha Guardiã. Segurei suas duas mãos, mexendo poucas partes do corpo simultaneamente para não confundi-la. Quando dei por mim, estávamos dando piruetas e Aliel mexia seus quadris no mesmo ritmo que seus cabelos, tornando uma inocente dança no ato mais sensual que já vi em toda minha vida.

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“Você foi boa.”, elogiei.

“Jeremy...”

O tom de aviso estava implícito em sua voz. Sentei-me, vendo-a fazer o mesmo. Sua expressão confusa se contrapôs com a minha determinação. Tinha uma coisa que eu queria dizer desde que quase nos beijamos na praia. Meus olhos se fecharam, movido por essa curta lembrança.

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“Você é mais humana do que eu.”

Cruzei os braços, mal humorado. Ela riu, terminando sua escritura na areia e se levantou para contemplar o seu trabalho. Jeremy Read estava escrito dentro de um coração. Se fosse qualquer outra garota de dezessete anos que tivesse escrito aquilo para mim, teria rido e dito o quanto aquilo era brega. Mas meu coração se inflou e foi impossível conter meu sorriso.

Sem conseguir me conter, a abracei. Pega de surpresa soltou um grito baixo enquanto seus pés se desequilibravam. Meu corpo facilmente cobriu o seu e nossos rostos ficaram perigosamente perto. Sua respiração arfante se cruzou com a minha, enquanto tentava controlar o impulso de deixar que meus lábios formigantes tocassem os seus.

Senti suas unhas roçando levemente em meus braços, traçando cada músculo, como se ela quisesse memorizar cada detalhe meu. Seus olhos estavam fixos nos meus azuis – que apostava que estavam fazendo aquela bizarrice de ficar em um tom de anil azulado – até que deslizaram pousando em meus lábios.

O fato de eu estar vestindo apenas uma bermuda e chinelos não ajudava. Aliel tinha optado por um biquíni verde esmeralda, bermuda jeans, chinelos e uma camiseta branca. Nossos membros se tocavam em todos os lugares possíveis e pude sentir seu coração batendo em uma velocidade surpreendente contra meu peito.

Respirei fundo, balançando a cabeça. Contrariado, me ergui, tirando a areia de meus cabelos. Vi Aliel fazendo a mesma coisa em silêncio. Balançou seu rabo de cavalo e suspirou, olhando melancólica para o coração que tinha se desmanchado em nossa queda. Pôs as mãos na cintura e manteve o olhar distante do meu. Suspirou dando um sorriso triste.

“Não era para ser.”

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“Era sim.”

Aliel continuou me olhando confusa. Saí dos meus pensamentos confusos e lhe dei um meio sorriso convencido. Seus olhos brilharam e retribuiu. Peguei sua mão, traçando lentamente o seu rosto com a ponta dos meus dedos. Como uma criatura tão perfeita poderia ter sido destinada a ficar com um pecador como eu?

Só que estava cansado de resistir. Meu coração implorava por liberdade diariamente e privá-lo do direito de se declarar, me fazia sentir mal. Quase angustiado. Havia um motivo para eu tê-la trazido até o telhado, além de querer olhar as estrelas. Queria que todos que moravam ali em cima tivessem a chance de testemunhar a pronunciação de meus sentimentos.

“Nós dois, Aliel.”, eu esclareci. Seu corpo se tencionou no mesmo instante. Estávamos beirando a linha de risco. Só que eu estava disposto a pular por ela. “Em todo esses seis meses, tentei demonstrar meus sentimentos de inúmeras maneiras, mas nunca pareceram suficiente.”

“Jeremy...”, ela suspirou.

Ergui um dedo, a interrompendo.

“Juro que serei rápido.”, disse ainda sorrindo. Aproximei nossos rostos. “Você me fez uma pessoa melhor do que eu era. E eu to pouco me...”, limpei a garganta impedindo um palavrão de sair dos meus lábios. “lixando para o que as pessoas dizem. Somos opostos em número e letra. Só que eu não me importo. E quanto mais penso nisso...”, suspirei abaixando os olhos. Conseguia escutar meu coração contra meu ouvido. Estava cedendo à ele. A encarei, vendo a emoção transbordando de seu rosto. Beijei sua testa. “E quanto mais eu penso nisso, mais apaixonado fico por você, Anjo.”


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Notas finais do capítulo

Então, estou pensando em fazer uma One Short para um certo momento de um certo par de personagens da série Broken Wings. Então, queria que vocês escolhessem. Dependendo, posso postar na semana que vem. Juro que avisarei a vocês.

Então. As opções seriam:
— Caliel e Nicolas na lua de mel
— Mellany e Adriel aproveitando alguns momentos sozinhos
— Jeremy entregando o cordão á Aliel
— Sarah e Jason contando um resumo de seu relacionamento
— Mellany e Paul antes da vinda para Nova Jersey
— Nicolas e Erika em Seatlle após o beijo em Caliel
— Jeremy na festa a fantasia (período antes, durante e depois da briga com Aliel)

Podem dar sugestões de One Short também. E escolham o POV da pessoa que vai narrar. E lembrando que dependendo da escolha, pode ter cenas mais quentes, hahaha. Beijos. Até domingo.