Annabella Starks

Quando Amber entrou no meu quarto, eu estava relendo “Cidade de Vidro” e por isso eu gritava “MORRA VALENTIM, MORRA” enquanto batia o meu livro repetidamente na minha cama. Isso fez a loira arquear a sobrancelha quando ela me viu.

— O que aconteceu? E quem é Valentim?

Eu pigarreie, tentando disfarçar.

— Ahm... Ninguém.

A loira deu de ombros e sentou-se na beirada da minha cama.

— Algum problema? — ela perguntou.

— Não, — foi tudo o que eu disse — porque teria?

— Ahm... Talvez porque você não saiu do quarto desde manhã, só para almoçar, isto é.

— Eu estou bem — eu menti enquanto enfiava de novo a cara no livro na parte em que Clary e Simon estão conversando após o aparecimento do Valentim.

Filho da Puta.

— Não está não — Amber teimou enquanto tirava meu rosto do livro.

Bufei enquanto cruzava os braços.

— Vai, Bell, me conte. O que está acontecendo?

Eu não falei nada. Na verdade, não tinha o que falar. Nem eu sabia o que estava acontecendo. Eu simplesmente não conseguia mais ficar perto do Leon sem sentir alguma coisa no meu estômago, parecia que tinha um tubo de ar lá dentro fazendo a festa. Sem contar no fato de eu não conseguir tirar o beijo que eu dei nele – antes de vomitar em cima dele, claro – e de estar com uma sensação de estar esquecendo alguma coisa terrivelmente importante que aconteceu depois.

Isso estava me matando porque sabe-se Deus lá o que uma EU bêbada fez para o Leon. Coisa boa que não poderia ter sido.

Amber continuou tentando me fazer contar o que tinha acontecido, mas eu não falava de maneira alguma.

O dia continuou da mesma forma. Amber me enchendo o saco para eu falar, eu não falando nada e no final, acabamos jantando e eu voltei para o meu quarto.

Quando eu estava começando a reler “A Pirâmide Vermelha” alguém bateu na porta.

— Vá embora, Amber — eu gritei sem sair da minha posição de leitora... Uma das dez mil.

— Não é a Amber — disse meu irmão do outro lado da porta.

Suspirei e deixei ele entrar.

Peter pegou o banquinho da cozinha que eu tinha me apossado para empilhar meus livros ali e, depois de tirar todos os livros de cima, ele sentou-se.

— Amber me pediu para vir falar com você, ela está preocupada. Na verdade, todos nós estamos.

Eu revirei os olhos e fechei o livro.

— Não sei por quê. Eu estou bem, sério!

— Bell — ele suspirou — eu sei quando você está num dilema. Isso aconteceu exatamente quando você passou em Cambridge. Você não sabia se poderia pagar a faculdade, ou se iria dar muita despesa para a mamãe e, até resolver o assunto, você só saia do seu quarto para comer.

— Bem, você queria que eu comesse como?

— Pare de tentar mudar de assunto. Você sabe que não consegue fazer isso comigo como faz com a mãe.

Eu não disse nada. Eu odiava quando ele estava certo.

— Isso envolve o Leon, né?

Meus olhos arregalaram e eu já percebi que eu não tinha como fugir do meu irmão.

— Ma-mas, como...?

Eu fiquei quieta. Já iria passar vergonha por causa do Rider, eu não precisava passar vergonha por gaguejar.

— Eu te conheço, irmãzinha — Peter deu um meio-sorriso — e eu sei quando você se interessa por alguém.

Suspirei novamente.

— A verdade, Peter, é que nem eu sei o que está acontecendo. Eu simplesmente estou enlouquecendo e NEM SEI O MOTIVO. Deve ser algum problema comigo, sei lá. Talvez seja por causa do beijo...

— Beijo?! — ele perguntou alarmado — que beijo?

Oh, minha maldita boca. Eu ainda vou pagar caro por você.

Depois de explicar toda a minha situação pra ele, ele ficou quieto assentindo.

— Fique pronta — ele disse.

— O-o que? Por quê?

— Você precisa relaxar esses nervos. Abriu uma Confeitaria aqui perto. Nós vamos colocar glicose nessa suas células gordas e preguiçosas.

Antes dele sair eu joguei um travesseiro na sua cara.

— Células gordas e preguiçosas são seu orifício anal.

Enquanto eu escolhia a roupa para me trocar, pude jurar ouvir a risada de Peter ecoando na escada.

***

Eu vou matar Peter.

Sério.

Provavelmente vou torturá-lo jogando ácido sulfúrico em seu rosto de depois cortando com um facão a sua parte íntima. Aí eu iria matá-lo. Lentamente.

O filho da puta me deixou numa confeitaria sozinha com Rider.

Sim.

É isso aí. Eu e Rider estamos numa confeitaria irradiando cores e alegria. Se opondo aos meus sentimentos tenebrosos e taciturnos.

— ...stá melhor?

— O que? — eu virei-me para Leon que deu um meio-sorriso ao perceber que eu estava viajando na maionese.

— Você está melhor? Francamente, Starks, você está bem? Talvez bebida alcóolica tenha afetado seus neurônios. Aqueles cinco que você tem aí dentro.

— Ha-há — eu disse pausadamente — você deveria ganhar um prêmio Nobel por ser tão engraçado assim.

— Prêmio Nobel é para pessoas na área de ciência, Sherlock.

Eu fuzilei ele com o olhar, coisa que só fez seu sorrisinho aumentar mais ainda.

— Vamos entrar? — ele falou enquanto subia os cinco degraus para a confeitaria.

Eu fiquei chocada quando vi que Leon não se importou de me acompanhar. Lógico que nossa relação estava ótima, mas talvez ele não esteja enlouquecendo com todo esse lance do beijo, talvez realmente não tivesse significado nada.

— Por que você está encarando sua torta como se ela tivesse matado um gatinho?

Levantei meu olhar e encontrei Rider fitando intensamente meus olhos.

— Não é nada. Eu só lembrei de algo que eu não gostei.

Leon deu de ombros e voltou a comer seu bolo de chocolate.

Uma menina X saiu do buraco e ela ficou parada ao lado de Leon com os olhos brilhantes como se estivesse esperando por algo. Leon, que tinha acabado de perceber a garota, pigarreou.

— Posso ajudá-la?

O sorriso da menina aumentou. Eu fiquei estática e Rider também deve ter ficado. Ele estava usando uma peruca loira – que infelizmente tinha ficado boa nele, afinal não era aquelas que eu usava em festas de Halloween – e óculos sem grau. Não tinha como alguém reconhecê-lo, mas nunca se sabe, eu e ele já estávamos prontos para sair correndo dali.

— Ahm... Do que que é a sua sobremesa?

Aquilo era uma cantada? Nossa, sério?

Eu senti meu corpo relaxar e ao mesmo tempo o tubo de ar no meu estômago voltou. Não era legal.

— Por que você quer saber? — eu falei antes de Leon abrir a boca.

A menina me fuzilou com o olhar.

— Porque eu quero pedir o que ele está tendo — e voltou a sorrir para Rider.

Mais uma vez, antes que ele falasse alguma coisa, eu falei.

— Nossa, tem uma baita vitrine ali com o nome de todas as sobremesas embaixo dos doces e, bem, se ele está comendo um bolo que é marrom e tem cheiro de chocolate, bolo de amora é que não é, né?

Leon arregalou os olhos e segurou uma risada enquanto a menina, totalmente sem graça e raivosa, saiu batendo o pé da confeitaria.

— O que causou isso de repente? — ele perguntou entre risadas.

— O tubo de ar — foi tudo o que respondi enquanto Leon tinha uma expressão confusa em seu rosto.

***

Enquanto Rider e eu estávamos voltando para a casa, a gente começou a falar sobre música. Era fácil, pois nossos gostos eram muito parecidos. Eu realmente gostava da companhia dele e estava feliz ao seu lado. Mesmo com a sensação de tubo de ar.

Eu pensei que ela iria diminuir se eu estivesse ao lado dele e perceber que o beijo não foi nada, mas a sensação ainda estava lá e não passava. Eu não tinha a mínima ideia do que era.

Quando passamos em frente uma luz de um motel acendeu como se fosse para eu levantar meus olhos e olhá-la.

Lar do amor.

Amor? Minha bunda.

Ou o orifício de Peter também serve.