O príncipe, a cientista e o plebeu escrita por Vanessa Sakata


Capítulo 59
A arte humana de tirar um peso das costas




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Yamcha, após dizer aquelas palavras, desceu do topo da grande mansão e deixou um Vegeta ainda mais pensativo do que antes. Mesmo que não tivesse a intenção, o ex-ladrão fez com que o sentimento de culpa pesasse ainda mais sobre ele. Isso só o fizera sentir cada vez mais que decepcionara quem havia confiado nele enquanto havia desconfiança ao seu redor.

Irônico, não? Irônico pensar que ele, que já fora traiçoeiro, agora se preocupava em ter ou não traído a confiança de alguém.

Riu discreta e amargamente, sentindo pela primeira vez a culpa começando a corroer-lhe o coração. Quantas vezes ele já fizera coisas igualmente terríveis e nunca sentira qualquer tipo de arrependimento? Desde que começara a servir Freeza, conquistando e dizimando povos inteiros e até destruindo alguns planetas que talvez não fossem tão úteis assim para o propósito do então “imperador”, foram tantos atos considerados terríveis que cometera, que não sentia absolutamente nada quando os fazia. Até se divertia quando um planeta se explodia. Pouco lhe importava se os habitantes perdessem suas vidas e seus entes queridos. Com seu poder, costumava zombar e humilhar aqueles que eram considerados fracos, além de debochar de quem defendia os seus.

O mundo dava voltas, e essa era mais uma sentença que aprendera e que significava que coisas poderiam mudar num determinado espaço de tempo. Assim como a Terra dava voltas ao redor do sol amarelo que era o centro do sistema solar da Galáxia Norte, mudando as estações a cada trimestre, ele sabia que também mudara em muitas coisas, e essa sensação era uma delas. Havia cometido erros demais, a ponto de perder mais um lar e pessoas com as quais desenvolvera laços afetivos, um preço que fora cobrado por sua estupidez ao se deixar ser possuído por Babidi, e que começara todo aquele pesadelo que vivera.

Quando percebeu, tentou corrigir o erro, mas era tarde demais... E esperava não ser tarde demais para poder arrancar essa sensação incômoda de seu peito.

― Finalmente te achei, Vegeta! – ouviu Bulma ralhar com ele, ofegante da subida da escada que a levava até o topo da mansão amarela.

Ela até pensava em dar continuidade à sua bronca, pois havia pedido a Yamcha para chamá-lo e não deixaria barato que ele a ignorasse, mas mudou de ideia quando o viu contemplando o crepúsculo. Era a primeira vez que o via fazendo isso e percebera que o saiyajin parecia não estar apenas vendo o horizonte enquanto o céu começava a escurecer. Aproximou-se e percebeu que os ombros dele estavam ainda tensos e seus olhos negros como azeviche não prestavam tanta atenção ao espetáculo corriqueiro da natureza.

Aquela definitivamente não era a postura de alguém que relaxava enquanto descansava após uma luta difícil. Não que Vegeta fosse do tipo que relaxasse, pois vivia sempre em estado de alerta e numa rigorosa disciplina quanto aos seus treinos constantes, mas não aparentava estar nesse estado como de costume. Na verdade, era como se algo o incomodasse muito a ponto de deixá-lo naquele estado tão reflexivo.

Ela se aproximou e indagou:

― Se importa se eu me sentar ao seu lado?

― Hã?! – ele olhou para o lado e a encarou surpreso. – Ah, sim, faça o que quiser.

Sim, ele estava tão imerso em seus próprios pensamentos que nem percebera a aproximação da mulher de cabelos azuis. Se não achava ruim a sua presença, talvez quisesse alguma companhia.

Estava feliz por ele estar de volta, sentira muito sua falta. Quando soube que ele havia se sacrificado, seu coração se partira em mil pedaços e não sabia se algum dia conseguiria reunir todos os cacos. Ser informada de que ele havia dado cabo de sua própria vida para poder evitar o pior numa tentativa desesperada de reparar um erro fora ainda mais doloroso ao saber que Vegeta poderia não voltar mais e ser condenado a desaparecer para sempre, ficando apenas em sua memória e em Trunks.

Ao ouvir sua voz ecoar pedindo energia para todos a fim de formar a Genkidama de Goku, seu coração bateu ainda mais forte e de algum modo sentia que não o perderia para sempre. E isso se confirmou quando aquela luta acabou e Boo foi vencido e, em seguida, viu Vegeta... Vivo. Queria muito correr e abraçá-lo forte, tascar-lhe um beijão apaixonado, até mesmo marcar seu rosto de batom, mas mesmo com tanta felicidade conseguira se conter.

Afinal, ele sempre fora muito avesso a demonstrações de afeto em público e tentava o máximo possível respeitar essa reserva de sua parte.

Entretanto, ele parecia reflexivo demais, tenso demais, e isso não parecia ser do seu costume de não baixar a guarda. Era como se ele, na verdade, aparentasse insegurança, à qual nem mesmo o homem mais seguro de si era imune. Apesar da convivência, algumas vezes Bulma não conseguia distinguir alguns comportamentos do saiyajin. Ele continuava não sendo de demonstrar abertamente o que sentia, e sempre coube a ela distinguir determinados sinais. Sempre fora assim que funcionara entre os dois desde que começaram a se relacionar.

― Bulma – ele disse sem a encarar. – O que se faz quando se sente um peso nas costas da gente?

― Que peso? – ela estava intrigada, mas a pergunta foi mais para incentivá-lo a continuar.

― O peso de escolhas ruins. O que se faz quando isso começa a incomodar?

Bulma já começava a desconfiar sobre a que Vegeta se referia.

― Infelizmente, não há como simplesmente apagar os erros que foram cometidos, Vegeta. As escolhas erradas nos servem de lição para não voltarmos a errar.

― Mesmo assim, e se continuar esse peso por eu ter decepcionado alguém?

Ela percebeu que Vegeta procurava evitar contato visual, como se estivesse envergonhado de algo.

― Teria que admitir o erro, se desculpar com essa pessoa de algum modo e aprender com o que aconteceu... E erguer a cabeça pra seguir em frente, fazendo do jeito certo.

― Eu decepcionei a pessoa que acreditou em mim desde o início. – ele finalmente dizia após tomar coragem para encarar os olhos azuis dela. – Nunca fiz isso, mas quero me desculpar com essa pessoa e tirar esse peso de mim. Se não fosse por eu ter aceitado o acordo com aquele cretino do Babidi, nada daquilo teria acontecido... E você não teria voltado a ver o meu pior lado e todas as consequências que vieram depois.

A cientista arregalou os olhos em genuína surpresa. Ele estava se desculpando com ela? Por que fazia isso a essa altura, depois que tudo acabou?

― Vegeta... – ela pousou suavemente a mão no rosto dele. – Eu não tenho nada a desculpar, porque já te perdoei faz tempo. Você buscou se redimir do que fez, e isso vale ainda mais do que qualquer pedido de desculpas.

Deu uma breve pausa e sorriu, para depois prosseguir:

― As coisas que aconteceram não mudaram o que ainda sinto por você. Amar é isso, errar, acertar, perdoar e ser perdoado... E também é confiar e acreditar no outro, e acho que estamos muito bem nisso, não?

Ele apenas sorriu em resposta, parecia aliviado apesar de se sentir um bobo sentimental. Não achava mais isso tão ruim, afinal. O peso que havia em suas costas acabou sumindo, pois tudo o que precisava era de uma conversa franca com ela e entender que não era ruim passar a ter sentimentos humanos... Além de entender também por que os terráqueos se tornavam mais fortes numa situação de perigo. Os saiyajins, em sua essência, sempre foram mais individualistas e dificilmente se uniam em situações nas quais deveriam lutar por sua sobrevivência. Os laços afetivos não eram tão fortes quanto eram os dos terráqueos. Esses laços afetivos acabavam por fortalecer a pessoa, que ficava ainda mais forte quando tinha apoio. Foi por essa razão que os terráqueos salvaram o universo através da energia que formara aquela Genkidama. E era por essa razão que ele se sentira tão determinado a se redimir de suas decisões equivocadas.

Durante muito tempo estivera errado. Os sentimentos e os laços afetivos não o deixavam mais fraco. Muito pelo contrário, isso o deixara ainda mais forte e acendia nele o desejo de proteger as pessoas que mais lhe eram queridas. Chegar a essa conclusão o deixara mais leve e agora poderia se sentir realmente grato ao destino por ter lhe permitido voltar a viver mais uma vez... E ver todos os dias aqueles olhos azuis.

E, enquanto as primeiras estrelas começavam a brilhar no céu noturno, os dois se beijaram sem mais nenhum peso nas costas, aliviados por estarem novamente juntos graças a mais um capricho do destino.


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