Amizade Colorida escrita por Juh Nasch


Capítulo 9
Leonard 2.1


Notas iniciais do capítulo

Boa leitura :)



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Minha mão ainda está latejando, mesmo depois de todas aquelas compressas de gelo. O corte no canto de minha boca parou de sangrar, mais ainda assim arde. Ao olhar a duas macas de distância me sinto um pouco melhor, pois sei que não levei a pior.

Diego está deitado. Acharam melhor nos manter a uma distância segura, porque durante todo o percurso até chegarmos à emergência do hospital, nós discutimos. Os médicos temendo uma nova onda de agressões nos separaram. Jennifer tinha vindo conosco na ambulância e ficava perplexa a cada vez que eu tentava levantar em direção aquele babaca.

Ele tem o olho inchado, a tal ponto de ele mal conseguir abri-lo. Os cortes em seu rosto já foram suturados pela equipe médica. Alguns hematomas estão espalhados por seu rosto. Suas costelas também devem ter sido prejudicadas, já que as articulações de meus dedos tem a cor azulada.

Ao partir pra cima dele no pátio da escola, eu surpreendi a todos, inclusive ele. Ele mal teve tempo de reagir, e quando o fez não durou muito, já que fomos separados por alguns alunos e o inspetor da escola. A diretora, preocupada, ligou para providenciar atendimento médico.

—E então mocinho? Se sente melhor? —pergunta a enfermeira que nos atendeu.

Ela traz uma bandeja com um copo de água e alguns comprimidos.

—Isso não foi nada. Estou pronto pro segundo round. —digo tentando dar um sorriso, mas que se transforma em uma careta de dor.

—Nem pense nisso. —ela sorri e me oferece o copo. Pego um dos comprimidos e vejo que são analgésicos. —Sua namorada já está louca de preocupação lá fora.

—Namorada? Quem? Jennifer? —digo depois de esvaziar o copo d'água e beber os medicamentos. —Ela não pode vir até aqui?

—Na verdade, nem será necessário. Eu só precisava lhe dar esse medicamento. O médico já te deu alta. Mas nada de encrenca. Não espero vê-lo aqui de novo. —ela diz com aquele tom de "mãe" preocupada.

—Pode deixar. —digo me levantando e me encaminhando para o corredor. Olho por cima de meu ombro por um segundo e percebo que Diego está me olhando. Sua expressão é uma máscara de puro ódio.

Saio andando, um pouco cambaleante. Não queria demonstrar fraqueza perto daquele idiota, mas eu sentia fisgadas a cada passo. Logo me deparo com Jennifer, sentada em um dos bancos do corredor. Ela está com a bochecha apoiada em sua mão, e o cotovelo apoiado em sua perna. Não sei se são os analgésicos fazendo efeito ou a presença dela, mas a dor diminui quase por completo.

—E aí gatinha. —digo com a maior naturalidade enquanto me sento ao seu lado. —Você vem sempre aqui?

Ela não devia ter me visto se aproximar, porque levou um grande susto.

—Ah, meu Deus, Leo! —ela arregala os olhos para o meu rosto e depois pras minhas mãos, boquiaberta. Estaria tão mal assim?

—Não foi nada, Jenn. —digo tentando tranquilizá-la. —É sério. Eu tô bem.

Ela não diz nada, só simplesmente me abraça, repentinamente.

—Okay. Não tão bem assim. —não consigo reprimir o resmungo. Ela estava me apertando demais. —Já pode soltar.

Ela me solta no mesmo instante e sua expressão de preocupação é rapidamente substituída por uma de raiva.

—O que você estava pensando Leonard? —ela ergue as mãos em sinal de frustração. —Qual é o seu problema?

—Como assim? —ela estava com raiva por que eu tinha batido em Diego? Aquilo não fazia sentido.

—Eu vi o que você fez com o Diego. —ela parece decepcionada enquanto balança a cabeça. —O garoto está todo machucado...

—Você está com pena dele? —meu olhar era incrédulo. Depois de tudo que ele havia falado, ela ainda o defendia? —Sabia que você gostava dele, mas pensei que depois de ele ter se mostrado um otário você teria acordado. —me levanto, não aguentando a raiva que eu mesmo estou sentindo agora. —Eu fui te defender Jennifer. Era nisso que eu estava pensando.

—Com violência, Leo? Você sabe o que eu penso sobre isso e... —ela diz num tom mais calmo, delicado.

—Tá bom, Jennifer! —solto um suspiro e olho para cima. — Por que você não vai lá dentro e perdoa logo o Diego e acaba com isso de uma vez? Aproveita e vai consolá-lo. Ele vai precisar de cuidados. —digo com o máximo de ironia impregnada na voz e saio andando em direção à saída.

Ela me olha ir embora e continua no mesmo lugar. Já estou quase passando pela porta quando escuto novamente sua voz.

—Leo! —ela grita correndo em minha direção.

Continuo andando, fingindo não ter a notado. Estava cansado de Jennifer. Tudo o que eu fazia era motivo de brigas. Cansei de seus dramas e de tudo. Primeiro a infantilidade em relação ao beijo com Priscila e agora ela defendia o idiota que tinha espalhado boatos falsos sobre ela para todos os garotos da escola. Eu juro que tentava, mas a lógica dela não parecia nem um pouco lógica para mim.

Ela então consegue me ultrapassar e fica na minha frente, colocando uma mão sobre meu peito.

—Leo, me escuta! —ela está ofegante e os cabelos bagunçados em volta do seu rosto.

Cruzo os braços e ergo as sobrancelhas esperando que ela falasse.

—Não é que você esteja errado ou algo assim. —ela parece escolher as palavras. —É que eu me preocupo com você e não suporto a ideia de alguém te machucando... —seu olhar terno desmancha minha raiva quase que instantaneamente. Odiava aquele efeito que ela produzia em mim.

—Ele não me machucou... —paro assim que ela olha sugestivamente para os machucados no meu rosto. —Isso não é nada, Jennifer. —uso um tom de desdém. E realmente não era. Já tinha me envolvido em brigas mais graves.

—Agradeço muito o que você fez por mim, sério, mas você tem que prometer que jamais fará algo assim. —ela pede com súplica.

—Isso eu não posso prometer, Jennifer. —balanço a cabeça em negativa. —Você é minha melhor amiga, é como se fosse uma irmã pra mim. —toco seu rosto com a ponta dos dedos. —Eu vou te proteger sempre. —a palavra irmã soa estranha em meus lábios. Não parecia ser o termo certo para denominá-la. Amiga também parecia deslocado agora. Éramos mais do que isso.

—Por favor, Leo! —ela insiste.

—Você está aqui sozinha? —olho para os lados, deixando claro minha mudança repentina de assunto.

Ela olha para mim, visivelmente decepcionada, mas eu não podia prometer uma coisa que sabia que não poderia cumprir. Odiava quando não cumpria com minha palavra.

—Ethan está no estacionamento nos esperando. —ela diz sem me fitar.

—Então vamos! —digo puxando-a pela mão.

—Acho melhor você ligar pra sua mãe antes. —ela morde os lábios inquieta.

—Você avisou a ela? —pergunto perplexo. Minha voz sai mais alta e esganiçada do que eu pretendia.

—Eu não, mas a diretora sim. Ela queria vir pra cá, mas falei pra ela que seria melhor se ela ficasse em casa. Eu e Ethan levaríamos você pra casa.

—Onde está meu celular? —digo tateando os bolsos de minha calça.

Ela o tira do bolso de seu casaco e me entrega.

Disco o número e o telefone toca três vezes antes de alguém atender:

—Alô?

—Oi Lê. —digo respirando fundo. Já estava imaginando o sermão se fosse minha mãe que atendesse. —É o Leonard.

—Ah, meu Deus. Mãe! —escuto ela gritar e seus passos na escada. —É o Leo no telefone. Ele ainda está vivo! —seu tom é tão teatral que sinto obrigação de rolar os olhos. —Onde você está? Tá bem? Quebrou alguma coisa?

—Nossa! Sabia que suas frases de "eu te odeio!" eram puro marketing. —consigo dar uma risadinha. —Eu tô saindo do hospital agora. Eu estou bem e não, não quebrei nada, obrigado.

—Vem logo pra casa. —ela parece mais calma e me pergunto se Letícia realmente ficou preocupada.

—Já estou a caminho. E fala pra mamãe maneirar no sermão, tá?

—Deixa comigo.

—Até mais.

Guardo o telefone em meu bolso, e eu e Jennifer vamos andando calmamente em direção ao estacionamento. Ela me olha a cada segundo.

—Será que dá pra você parar? —pergunto, fingindo irritação.

—Parar com o quê? —ela ergue as sobrancelhas.

—De me olhar assim.

—Assim como?

—Como se eu fosse cair a cada passo. —ela ri. —Eu tô bem, cara. Por que vocês não conseguem entender isso?

—Porque mesmo que você estiver desmoronando você dirá que está bem, Leo. —ela me olha seriamente. —É de sua natureza. Você é um mentiroso nato.

—Isso não é mentir. —dou de ombros. —É omitir. E são coisas absolutamente diferentes.

—Ambos encobrem a verdade. —franzo a testa quando ela diz isso, mas ela parece indiferente.

Avisto Ethan encostado na lateral de seu carro, com os braços cruzados e um sorriso largo.

—E aí valentão. —ele levanta a mão para me cumprimentar. —Cara parecia até que eu estava assistindo UFC Combate. —ele finge dar alguns golpes no ar e eu apenas sorrio. —O que foi aquilo?

—Eu ainda não vejo a mínima graça nisso. —diz Jennifer com carranca, entrando no carro e sentando no banco do carona.

—É porque você é careta, Jennifer. —diz Ethan entrando no carro, ainda sorrindo.

Eu faço o mesmo. Ethan dirige rápido e logo já estamos parando em frente a minha casa.

Depois de uns abraços apertados, que ocasionam alguns protestos e gemidos de dor, e o tão aguardado sermão, minha mãe me deixa em paz.

Ela convida Ethan e Jenn pra jantar e eles aceitam. Minha mãe faz várias perguntas acerca do motivo da briga, mas digo que conversaremos sobre isso mais tarde. Não quero que Jennifer se sinta constrangida por eu ter que repetir novamente aquela história.

Minha mãe, Jennifer e Letícia, após terminarmos de comer, vão para a cozinha, levando consigo pratos e copos. Ethan então se inclina sobre a mesa e diz em tom baixo:

—Cara, sinceramente, acho que Diego não vai deixar isso barato assim.

—É, eu acho isso também. —faço círculos na mesa com as pontas dos dedos.

—Então se prepara aí, campeão! —ele abre um sorriso escancarado.

—Eu já nasci preparado. —digo retribuindo o sorriso.

Eu já havia pensado nisso assim que vi a expressão de Diego, quando sai da Emergência. Mas ainda assim, estava preparado para o que viesse. Eu esperava que eu estivesse.


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