Eternity escrita por Lena Saunders


Capítulo 2
Origem




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Quando minha mãe disse que partiríamos antes do sol nascer, ela falou sério. Minha família não precisava dormir, mas eu sim. Então, depois de muito implorar, meu irmão concordou em ceder o ombro dele. O que não adiantou muito, já que Ashton era muito mais alto do que eu.

Eu nunca tinha andado de avião. Meu pai fretou um voô só para minha família e quem pilotava era meu tio, Dylan, então podíamos conversar e cantar. Bem, Julieta, Sarah e Touhe poderíam cantar. Mamãe implorou para que os outros parassem depois de vinte minutos. E eu? Eu aproveitei cada segudo de sono extra. No meio da viajem, senti um cutucão na testa.

– Papai quer dar um aviso. - Ashton disse, enquanto eu me espreguiçava.

– Agora que estamos no avião e ninguém pode fugir, quero anunciar o real motivo de estarmos indo hoje.

Eu sabia. É claro que havia algo errado. Ninguém planeja uma viajem tão em cima da hora para trinta pessoas.

– Durante muito tempo nós escondemos suas origens e, embora muitos de vocês possam nos odiar por isso, chegou o momento de contarmos a verdade.

– Eu sou descendente de uma mulher chamada Maria Antonieta de Bourbon. A rainha da França.

Ouvi Hannah engasgar atrás de mim, enquanto Romeu teve uma crise de riso.

– Ela fala sério. - Meu avô continuou. - Eu sou o filho mais velho, da única filha, do filho mais velho, do único filho de Maria Antonieta que fugiu. Sua mãe é minha filha mais velha, e, portanto, herdeira por direito do trono da França.

O silêncio que se seguiu foi inédito na minha família. Meu pai piaguerrou e continuou seu discurso.

– Vocês se lembram quando aprenderam sobre Portugal? E sobre Dom Sebastião, o Rei que sumiu em uma cruzada?

Apenas Alec, Jazz e Bleu concordaram.

– Ele, na verdade, resolveu abandonar seu reino e seguir uma vida comum, em busca dos ideais passados por seus falecidos pais. Assim ele permaneceu durante cinco anos, quando foi encontrado à beira da morte e transformado em vampiro. Anos depois, na Itália, ele encontrou uma adorável jovem ruiva, descendente de uma família da realeza. O resto, creio eu, vocês já sabem.

À esse ponto, eu me virei e voltei a dormir. Obviamente, eu ainda não havia acordado. Embora o silêncio incomum me incomodasse, continuei de olhos fechados até ouvir o som do tapa. Fiquei curiosa o bastante para abrir os olhos novamente.

Minha irmã Lunna acertara o rosto de meu pai. A marca rosada na bochecha dele era prova disso, assim como a palma dela, ainda no ar. Sua gêmea, Soleil, soltou um grito rápido e agudo.

– Lunna! - Minha mãe a repreendeu.

– Não diga nada! Vocês mentiram! Todos esses anos! Eu sou uma maldita princesa! Todos nós somos! Príncipes e princesas!

Ela olhou para todos nós, ainda em silêncio em nossos bancos. Suas bochechas estavam vermelhas e eu entendia seu ódio. Nossas vidas eram mentiras. Nós erámos mentiras.

– Lunna. - Minha mãe tentou novamente. - Por favor, querida, sente-se novamente e...

– Ah, eu vou me sentar. Mas irei embora assim que essa droga de avião pousar.

– Lunna. - Soleil a puxou pelo braço, tentando fazê-la se sentar novamente.

Lunna puxou seu braço, seu rosto contorcido em desagrado e raiva. Atrás de Soleil, Vick batia os dedos no braço do assento, também irritada. Lunna foi até o fundo do avião e se trancou no banheiro depois de bater a porta como máximo de força que conseguira. Para um vampiro, isso é bastante, acredite. A porta se amassou para dentro.

– A França, - Continuou papai, aceitando a reação explosiva dela. - está passando por uma Guerra Civil. Vocês têm o sangue de duas grandes famílias reais e, após alguns exames de DNA provaremos que somos, legitimamente, os herdeiros do país.

– Vocês estão reivindicando o trono francês. - Sussurrou Selena. - Têm alguma idéia do que isso significa?! - Ela começou a gritar e se levantou também.

Acho que essa era uma boa definição de voô turbulento. Alguns cochichos se espalharam e, conforme esperado, meus tios e avós não pareciam surpresos.

– Isso é um Golpe de Estado! E estão nos levando lá para o meio! Nós seremos os próximos guilhotinados!

Ela disse metaforicamente. Eu acho.

– Selena, querida, acalma-se, por favor.

– Não me venha com seus "queridas", mãe! Vão nos devorar vivos! Guilhotilharam a ultima família real da França, lembra? Como pôde concordar com isso, pai? Pare de ceder aos malditos caprichos dela!

– Selena, não fale assim com sua mãe. Vocês não compreendem.

– Compreendemos sim. - Dessa vez quem falou foi Touhe. - Pai, tenho 22 anos mortais. No mundo humano isso é o bastante para entender muitas coisas.

Meu pai parecia desolado, mas eu não podia defendê-lo. Não depois de tudo o que eles esconderam e planejaram em nossas costas. Conclui que esta crise familiar seria um bom momento para contar o que eu decidira na noite anterior.

– Eu também vou embora. Como Lunna.

Minha família pareceu finalmente notar minha existência. A pirralha da família que nunca dava opinião nesses momentos de discórdia.

– Veni, querida, sua irmã só está estressada, assim como todos vocês. Ela não vai embora de verdade.

– Certo. Então eu irei embora de qualquer forma. Sinto muito, mas não posso mais fazer isso.

Minha mãe estava chorando. Clássico. Ela não era uma megera nem nada do tipo, mas ela sempre conseguia o que queria. Sempre. Não dessa vez.

– Tudo bem Venilla. Assim que se transformar, você e todos os seus irmãos poderão ir para onde quiserem. Viajem, divirtão-se. Vocês têm todo o direito de aproveitar alguns anos.

– Vocês não entenderam. - Eu disse, lenta e cuidadosamente.

Meu pai inclinou a cabeça, tentando me compreender. Bleu, no banco atrás de mim, esticou a mão para que eu a segurasse. Agradeci mentalmente.

– Eu não vou passar pela transformação. Não serei uma vampira.

Minha mãe abriu a boca, atônita e chocada, assim como meu pai.

– Filha, não diga uma bobagem destas. Seu Dia da Escolha é em apenas dois meses. Pode perguntar para os seus irmãos, não há o que temer. Não há dor. - Meu pai tentou me tranqüilizar.

– Exatamente, pai. Dia da Escolha. Há um motivo para chamarmos assim, não há? O senhor cedeu aos caprichos de mamãe. Nunca pararam para pensar no que estavam fazendo? Eu amo cada um dos meus irmãos, mas eu não os escolhi. Não escolhi nada disso. Algumas de minhas irmãs já tem mais de trinta anos mortais. Nunca pararam para pensar que talvez elas quisessem se casar? Que quisessem ter filhos?

À essa altura minha mãe se sentara, segurando a mão de meu pai. Ele permanecia em pé, rígido, servindo de escudo para ela. Minha mão apertava a de Bleu com força. Senti os nós de meus dedos se tornarem brancos.

– Bem, e se todos nós quisessemos nos casar e ter filhos? Transformaríamos nossos maridos, esposas e filhos também? Até quando isso seria sustentável? Nossos filhos e filhas iriam querer suas próprias famílias. Com dois ou três filhos isso poderia ser manejado, mas com vinte? Impossível.

– Veni. Acho que já chega. - Intercedeu minha prima, Violeta. Eu podia sentir as lágrimas escorrendo por meu rosto e o peso de minhas palavras deixando meus ombros e se fazendo presente no meio da minha família.

– Não Vi. Eles precisam entender. Eu não quero ser uma vampira. Eu nunca quis. Eu quero viajar pelo mundo, conhecer um garoto, me apaixonar. Quero me casar e ter filhos. Filhos de verdade. Não apenas um monte de gente que mora comigo e eu não conheço. Quero criá-los e ajudá-los a criar meus netos. E quero, depois de tudo isso, morrer em paz. É isso que quero e vou fazer. Sinto muito mãe. Sinto muito pai. Lamento estragar seu ideal de família perfeita com vinte lindos filhos vampiros. Eu realmente lamento.

Não esperei para ouvir suas palavras. Corri para o banheiro na frente do que Lunna havia entrado. Estava feito. Eu acabara de destruir meus pais e alguns de meus irmãos. Mas eu não suportaria continuar com eles durante a eternidade. Não que eu não os amasse. Pelo contrário, na verdade. Eu amava cada um deles, com suas qualidades e defeitos. Mas essa era minha vida. E eu estava cansada de ficar trancada.

Quinze minutos mais tarde, o aviso para colocar o cinto soou. Iríamos pousar. Fui até o meu assento e, ainda com as mãos tremendo, apertei meu cinto.

– Venilla. - Meu pai se sentou ao meu lado, no lugar onde antes estava meu irmão. - Nós conversamos e decidimos que você tem razão. A escolha é sua. Mas gostaríamos de pedir algo.

Permaneci em silêncio e ele interpretou isso como um sinal para continuar seu discurso.

– Gostaríamos que ficasse conosco até seu aniversário. Sabemos que você quer ir embora e viver sua vida, e entendemos isso. Mas gostaríamos de passar mais algum tempo com você. Por favor, fique conosco mais um pouco. Vá para a escola com seus irmãos, por pelo menos dois meses. Depois, bancaremos suas viajens. Para onde você quiser ir.

Pensei sobre aquela proposta. Não havia motivo para negar. Eu precisaria do dinheiro e não me importaria de conviver mais dois meses apenas com eles. Afinal, nada poderia dar errado.

– Certo. Eu ficarei então, pai.

Ele pareceu minimamente contente e o avião acabara de pousar.

– Ah, tem mais uma coisa. Decidimos que você e seus irmãos se passarão por filhos nossos, de Dylan e Dereck e de Claire e Scott. Tudo bem?

– Mas eu não quero ser princesa. E vocês são muito jovens para... Ah. Certo. Benefícios da Imortalidade.

Benefícios da Imortalidade é como chamávamos as coisas que apena vampiros podiam fazer. Como alterar a idade que aparentavam.

O avião terminou de pousar e meu pai elevou seu tom de voz, para que todos pudessem escutar.

– Muito bem. Violeta, Jacinto, Aideen, Ashton, Aaron, Sarah e Hannah. Todos vocês serão filhos de Claire e Scott. Violeta e Jacinto permanecem com suas idades. Meninos, consigas uns vinte e um, ok? E meninas, dezesseis.

Meus irmãos começaram a mudar. Suas barbas se tornaram mais evidentes e seus traços, mais fortes. Nada muito grande, mas o bastante para parecerem mais velhos.
Em minhas irmãs, a mudança foi mais evidente. Seus seios diminuiram, assim como suas alturas. Mas todos eles continuaram perfeitamente lindos.

– Eu também quero brincar! - Disse minha prima Violeta. Ela se tornou mais baixa e completamente sem seios. Seus olhos pareceram proporcionalmente maiores em relação ao resto de seu rosto e seu cabelo, antes longo, encurtou até os ombros. Ela era uma criança.

– Você tem certeza Vi? Você parece ter uns oito anos. - Perguntou sua mãe, Claire.

– Eu serei uma daquelas crianças prodígios. Igual as que vimos na televisão. Vai ser divertido.

Ela parecia adoravelmente contente e meu pai não se importou em ter uma criança na família e continuou sua "distribuição familiar".

– Venilla, Bleu, Touhe, Rouge, Romeu, Julieta, Soleil e Lunna. Vocês continuam conosco. Como Venilla ainda não passou pela transformação, vou precisar que vocês pareçam mais novos. Algo como dezessete, dezesseis e talvez quinze. Podem fazer isso?

– Eu vou querer festas de aniversário, ok? - Anunciou Soleil enquanto ficava com os traços mais suaves, seu rosto se infantilizando apenas o suficiente para parece um pouco mais nova. Lunna acompanhou a transformação, seus cabelos negros se tornando mais longos e bagunçados.

Romeu, Julieta, Touhe e Rouge optaram por não modificar nada. Um ano ou dois não faria tanta diferença segundo eles. Bleu apenas resolveu que queria uma barba rala para combinar com seu novo visual de "príncipe badboy". Ele também exigiu roupas novas e uma moto. E sim, ele inventou isso na hora. Clássico.

– Helena, Selena e Serena, vocês serão filhas do primeiro casamento de Derek. Assim sendo, podem manter suas idades. - Serena pareceu contente em não precisar mudar para aderir à farsa. Helena apenas deu de ombros e disse algo sobre acompanhar Bleu nas compras. - Elizabeth, Vicktória, Alex e Alec, vocês serão filhos do primeiro casamento de Dylan. Escolham qualquer idade, contanto que pelos menos dois de vocês mudem um pouco.

Alec tentou parecer mais velho, e obteve sucesso completo. Eu daria uns vinte anos, se não o conhecesse. As meninas se recusaram a mudar, alegando que não havia necessidade, e Alex achou que seria divertido ter doze anos.

– Você não se importa, né cara? - Ele perguntou ao seu irmão gêmeo, que negou. Aparentemente Alex queria reviver a "parte mais legal" da sua vida, mas, dessa vez, com amigos. Ele estava um pouco empolgado demais para o meu gosto, mas tudo bem.

– Bem, agora que todos têm suas famílias redefinidas, quero avisar que muito provavelmente haverá repórters nos esperando no aeroporto. Não falem com ninguém e acompanhem seus "pais". - Ele fez aspas no ar. - Até suas limosines, tudo bem? Lembrem-se que agora vocês são da realeza. Mantenham a postura e todas essas coisas que vocês viram naqueles filmes americanos.

Todos concordaram com diferentes níveis de empolgação. Os "adultos" finalmente resolveram mudar, alguns fios brancos e rugas surgindo em seus rostos. Meu tio finalmente abriu as portas do avião. Chegar até a sala de desembarque foi relativamente simples. Sair de lá, entretanto...

Eram tantas pessoas que eu simplesmente entrei em estado catatonico todas aquelas vozes, perguntas, flashes... Homens de terno apareceram do nada, afastando a multidão e abrindo passagem dentro do possível.

"Eu tenho que seguir meus pais. Meus pais... Onde... O que eu estou fazendo aqui? Onde estão meus pais?"

Localizei o cabelo ruivo de minha mãe e me direcionei para segui-la, quando o som de algo caindo me fez virar. Era uma menininha de uns seis anos e ela tinha cortado a testa. Um fino fio de sangue escorria por sua sobrancelha.

Ela parecia assustada, enfiada naquele pequeno vestidinho rosado. Eu dei dois passos e a levantei do chão. Ela estava chorando desesperadamente.

– Cadê sua mãe?

– Eu não sei. - O nariz dela escorria e eu sabia que se a deixasse ali era seria pisoteada ou abandonada pela multidão.

Olhei ao redor, procurando por uma mãe desesperada ou algo assim mas não esncontrei nada. Só aquelas vozes e... "Estavam me fazendo perguntas? Onde estava minha família?"Bleu acenou para mim da porta do aeroporto. Fiquei tão aliviada de encontrá-lo. Quando o alcancei ele parecia confuso.

– O que você está fazendo, Veni?

Demorei para entender o que ele queria dizer. Eu ainda segurava a menininha, apoiando-a em minha cintura. Eu não queria largá-la ali à própria sorte. Sem pensar direito, eu subi no banco ao lado da porta e levantei a menininha, saindo do alcance de Bleu, que foi afastado por um dos homens de terno.

– Alguém sabe onde está a mãe dela? - Perguntei em voz alta, com meu francês enferrujado.

– Ellie! - Um par de mãos se levantou no meio da multidão.

– Mamãe! - A menina gritou, assim que a coloquei no chão.

A mãe dela era baixa e abriu caminho pela multidão, acotovelando todos os que estavam em seu caminho. Ela agarrou a garotinha tão forte que parecia querer sufocá-la. Quando ela me alcançou, um homem alto, vestido de terno se colocou entre nós, impedindo sua passagem.

– Seus pais estão esperando na limosine, Alteza. - Ele pronunciou a palavra quase com nojo, como alguém diria estuprador.

– Eu já estou indo. Deixe-a passar, por favor. - Não havia porque barrá-la.

Ele pareceu surpreso por um segundo e deu um passo para o lado, ainda mantendo o resto da multidão afastada. A mulher segurou meu rosto e gritou em francês.

– Obrigada. Muito obrigada, princesa! - Então ela beijou minhas duas bochechas antes de eu ser arrastada por meu irmão que finalmente me alcançara.

De dentro da limosine, eu conseguia ver Ellie e sua mãe acenando para mim da calçada. Já meus pais me encaravam com feições nada simpáticas.


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Notas finais do capítulo

Espero que tenha gostado :3
Em alguns capítulos acho que já vai dar para conhecer melhor todos os personagens...
Obrigada por ler!
~Lena



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