Diário de confissões escrita por Clary Cahill


Capítulo 6
Mais do que posso aguentar.


Notas iniciais do capítulo

Comentem.



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Assim que saio da portaria me pego correndo. Correndo. Correndo...

Para onde? Meu refugio está assombrado. Meu melhor amigo não está em casa.

Estou correndo para a escola. Não sei mais para onde ir e é o primeiro lugar que vem a minha mente.

Não escuto as pessoas buzinando. Não escuto nada. O mundo some de meus olhos e ouvidos. O caminho é automático.

Quando me vejo, estou na frente da escola. A encaro por um tempo.A grande maioria de nos evita a escola. Irônico.

A escola fica aberta até as seis da tarde. Pois existem alunos que estudam no período da tarde e outros que se reúnem para fazer trabalhos escolares.Entro na escola e percebo exatamente aonde estou indo. Estou indo ver o memorial de Carol. Eu devia evitar olhar para ele. Mas tenho que entender.

Paro de frente para a foto de Carolina Mendes. Ela era botinha. Cabelos lisos, morenos, olhos negros e um sorriso excepcionalmente branco, aquele que mesmo no pior humor, consegue te deixa um pouco melhor.

Como é chegar ao ponto de temer a vida mais do que a morte?

“É coragem perceber que o problema não tem saída e acabar com o sofrimento com as próprias mãos ou é covardia se entregar sem lutar até o fim?

“Carolina Mendes a brilhante jovem que fez a escolha errada.”

“Sempre uma luz no fim do túnel. “

“Amada e querida.”

É isso que está escrito abaixo de sua foto. Eu já tinha lido isso uma vez. A escola está usando Carol como exemplo para mostrar que o suicídio é a pior ideia. Por que estou aqui? Não faz sentido ficar aqui. Se Letícia, que era sua amiga, não entendeu, por que eu iria entender? Por que isso me perturba tanto? Viro-me. Há uma pessoa me encarando.

Dante.

Assusto-me. Dou um grito e acabo tropeçando. Caindo de bunda no chão. Sinto meu rosto ficar vermelho.

Ele estende a mão e me ajuda a ficar de pé.

–Obrigada. –falo sem jeito. Estou quase virando para ir embora, mas sinto a mão de Dante me virar.

–Desculpa Elisa. Não pretendia te assustar. E desculpa pelo outro dia, estou me sentindo mal. – ele diz.

–Não tem problema. – eu digo.

Seu olhar se desvia do meu. Dante encara a foto de Carol. Ele dá um longo suspiro.

Não me seguro de curiosidade. Talvez, ele saiba alguma coisa sobre ela. Algo que me ajude a entender.

–Ela foi sua aluna, não foi?- pergunto, mesmo já sabendo a resposta.

–Sim. Ela tirava as notas mais altas da turma. Ela gostava de matemática. Ela gostava de problemas difíceis.

–Você notou alguma coisa antes dela... Você sabe.

–Não. Já me fiz essa pergunta muitas vezes. Mas não. Para mim, foi chocante.

–Como ela era? – pergunto.

–Brilhante, sorridente e cheia de amigos. Ela gostava muito de conversar durante as aulas, porém parecia que ela nem precisava ouvir as aulas.-ele faz uma pausa. - Por que veio até aqui?

–Não sei. – digo. É verdade. –Apenas ando me perguntando por quê.

Ele parece um pouco surpreso.

–Carolina gostava de problemas difíceis. Talvez, ela queria deixar um para todos nos tentarmos resolver. Até hoje, ninguém conseguiu. Eu acredito que não existem problemas impossíveis.

–Está tentando resolver esse?- pergunto.

–Acho que vou tentar pelo resto da minha vida. – ele diz. – Eu tenho que ir.

–Tudo bem.

Então ele se vai.

Encaro a foto. O que eu estou querendo? Não é como se a foto fosse me responder. Ninguém sabe. Por que eu saberia o por quê?

Devo voltar para casa?

Não quero ir. Por isso paro em um parque, entre minha casa e a escola e descido ler um pouco mais.Disse a mim mesma que eu não iria ler, mas.. eu necessito.

12 de agosto.

Carol é o assunto do momento. Acho que vai ser pelo resto do ano ou quem sabe até me formar no ensino médio.

Policias estão entrevistando os alunos em trios. Vou ter que ficar em uma sala de interrogatório com Mateus. Pelo menos Sara ficou no meio. Esse era o pensamento inicial.

Sara

Pergunto-me se algum dia essa tensão existente entre mim e Matheus vai sumir.

O interrogatório não devia ser nada demais, mas quando se mente para policia, a culpa machuca.

Ela mentiu para polícia?

Os polícias começaram perguntando se andávamos com Carol. O que achávamos dela. Se notamos algum comportamento estranho nela antes dela se matar.

Até ai, eu disse a verdade.

–Onde vocês estávamos no dia do suicídio? –perguntou um policial entediado.

–Na minha casa. - disse Matheus.

–Eu estava na casa da Letícia Castro. –Falou Sara indiferente.

Ela não estava na minha casa. A encarei. Por que ela disse isso?

–É eu estava na minha casa juto com a Sara. – menti.

No final de tudo fui falar com Sara.

–Por que você disse que estava na minha casa? – pergunto. Ela não me respondeu.

–Sara, você tem noção do quão grave isso é? Por que você disse que estava na minha casa?

–Letícia foi só uma mentirinha à toa. Eu não lembro onde estava, provavelmente bêbada por algum cato da cidade. Queria que eu falasse isso para policia? Que sou uma menor bebendo ilegalmente? E se foi tão errado, por que ficou do meu lado?

–Queria que eu ferrasse você? – perguntei com raiva.

–Eu sabia que você não ia me ferrar. Por isso disse que estava na sua casa.

Sara saiu andando. Não sei se acredito nela. Tem sentido o que ela disse. Só não sei se é verdade.

Por que não seria verdade? Muitos jovens estão se matando de beber. Eu já fiz isso uma vez ano passado, por isso evito beber.

O que minha irmã está insinuando?Preciso me manter em movimento. Não aguento ficar muito tempo sentada no mesmo lugar. Não exatamente por que. Só tenho que me mover.É como se eu estivesse fugindo de alguma coisa. Provavelmente o fantasma de minha irmã. Eu deveria parar de ler, pois é o diário que o atrai.

Mas no momento, parar de ler, não é uma opção.

Vou até uma sorveteria perto do parque. Sento em uma mesa do fundo e compro uma água. Decido ler mais.

Dia 23 de agosto.

Hoje foi um dia bom. Minha irmã, Elisa, descobriu um jogo na internet.

Será que ela está falando do que eu acho que estou falando?

É assim. Você escreve uma história curta. Depois retira algumas palavras. Palavras que podem ser substituídas. Como na sua história tem uma Anna. Você retira o escrito “Anna” e deixa um espaço em branco. Depois você define o que cada espaço em branco é. Se é um nome, uma cor, animal, objeto, parte do corpo, ação, entre outros. Então você pede para uma pessoa que está participando para escolher a primeira coisa que lhe vem à cabeça relacionada à cor, nome, parte do corpo e etc. Aos poucos você completa os espaços em brancos com as palavras ditas.

Acho que eu nunca ri tanto em toda minha vida. Não estou brincando. Eu e meus irmãos jogamos isso a tarde inteira. Cada coisa que saiu.

Jennifer Aniston esfaqueou Cinderela com um pato de borracha roxo, bem no pâncreas.

A frase original: Magda esfaqueou Marcio com uma lamina prateada, bem no peito.

Eu me lembro desse dia. Eu me lembro de rolar no chão de tanto rir. Estávamos todos felizes. Foi um bom momento.

Quanto ao resto da minha vida... Bom, eu e Matheus estamos tendo alguns progressos, sabe não nos evitamos mais. A morte de Carol ainda é um buraco para mim e Sara anda agindo de modo estranho. Não sei como. Ela anda sorrindo menos. Evitando falar comigo. Inventaram de fazer um memorial em homenagem a Carol. Em minha opinião, é mais uma propaganda contra suicídio do que um memorial. Só está servindo para me torturar enquanto passo no corredor.

Sorrio. Apesar do final. Gosto das lembranças felizes.

É tão injusto. Tão injusto.

Tenho que ler mais.

3 de setembro.

Muita coisa aconteceu. Eu mesma não entendo o que acabou de acontecer.

Matheus e eu voltamos a ser amigos, logo depois que ele começou a namorar a Sara Bonatteli.

A namorada de Fernando.

Falando nela, um clima estranho anda por nós duas. Desde do incidente da policia.

Três dias atrás um coisa estranha aconteceu. Fomos a uma festa open bar. Eu sei, eu sei, temos apenas 15 anos.

De qualquer modo, eu não bebo.Sempre fica a irritante voz na minha cabeça da minha mãe dizendo: Isso é errado. Imagina se seu pai descobrir. Enquanto todos estavam caindo no chão de tanto beber, eu e Sara estávamos bebendo água.

–Não vai beber? – perguntei a ela.

–Eu não bebo. – ela sorri.

“Eu não lembro onde estava, provavelmente bêbada por algum cato da cidade.” – ela disse isso para mim antes.

Tem algo muito errado acontecendo. Eu não sei mais o que pensar.

Olho para frente e vejo que já está escuro. Penso no encontro de Fernando com Sara, eu deveria mostrar a ele? E se na próxima pagina tiver uma explicação para tudo?

Mas o que acabou de acontecer tirou meus pensamentos de Sara. Eu acabei de beijar minha melhor amiga. Bom, ela me beijou e foi embora. Bruna e eu nos beijamos.

Releio aquela rase varias vezes. Ah, meu Deus. Uma facada.

O que pensar sobre isso? Eu dei uma pizzada na minha casa (como o consentimento dos meus pais). Todos tinham ido embora. Estávamos no meu quarto rindo de alguma coisa que ela disse.

Estou tentando lembrar o porquê estávamos rindo. Eu não me lembro o que ela disse.

Bruna é viciada em um seriado antigo, chamado Friends. Estávamos assistindo um episódio que estava passando na Tv. É ainda passam reprises do show.

No episódio Rachel tenta convencer Phoebe de que havia beijado uma amiga dela há muito tempo atrás. Phoebe não acredita e a amiga nega. Até que Rachel beija a amiga por estar frustrada da negação. Então a amiga admite, após o beijo, que o antigo beijo tinha acontecido e que ela ainda era apaixonada pela Rachel.

Enquanto eu ria desesperadamente da cena. Bruna ergueu meu queixo e me beijou. O pior é que eu deixei. Eu abri passagem para língua dela. Eu deixei. Ficamos nos beijando até o momento que lembramos que tínhamos que respirar.

Nos encaramos, eu mais vermelha que um pimentão. Então, ela saiu. Foi embora. Não disse nada.

O mais chocante é que eu gostei.

Fecho o diário. Não consigo raciocinar. Essa não é a menina que eu conheci. Essa menina mentiu para policia e essa menina beijou sua melhor amiga.

Meu celular vibra. Fernando. Não consigo falar com ninguém. Desligo o telefone. Pago a água que eu bebi e saio daquele lugar e volto ao parque. Não pretendo mai ler o diário.

Só quero dar uma vota e absorver as informações.

Depois de um tempo andando, lho as horas no meu relógio de pulso. 20:30.

É ,minha mãe vai me matar.

Pego meu celular. 13 ligações perdidas.Sendo 10 da mesma pessoa. Fernando. As outras 3 da minha mãe.

Ligo para ele. Ele atende no segundo toque.

–Aonde é que você está? –ele pergunta urgentemente

.Esqueço como se fala por alguns instantes. O choque da minha realidade foi um soco no estomago.

–Elisa? Elisa? Você esta ai? –escuto Fernando me chamar.

–Oi. – digo baixinho.

–Você está bem? Onde você está?

–Em um parque. – digo. – Aquele perto de casa.

–Quer que eu vá ai?

Assinto por um tempo. Lembro-me que Fernando, não pode me ver.

–Quero.

–Tudo bem. –ele diz.

Então desligo o telefone e espero Fernando vir. Fico um tempo ali. Está frio, mas eu não me importo.Então o vejo. Fernando anda até mim e se ajoelha na minha frente.

–Nunca, nunca mais faça isso comigo. – ele pede. –Sua mãe me ligou e perguntou se você iria demorar para voltar do almoço. Eu menti e disse que iríamos ver um filme no cinema. Eu estava pensando que eu ia ter que falar que o almoço nunca existiu.

–Estraguei seu encontro?- pergunto.

–Não. Sara almoçou comigo e se mandou. –ele diz levemente irritado. -Seus lábios estão azuis.

Então ele tira jaqueta e passa pelos meus ombros.

–Obrigada. -eu digo.

–O que aconteceu?- ele pergunta.

–O diário. Minha irmã ela mentiu para policia. Uma amiga dela se matou. E ela beijou Bruna ou Bruna a beijou.

–Nossa. – ele arregala os olhos. – Acho que você podia parar de ler. É muita coisa.

–Eu preciso ler. –digo.

Ele assente.

–Vem, vamos embora.Ele se levanta e segura minha mão, me ajudando a levantar do banco. Ele coloca o braço ao redor de meus ombros e me acompanha até a portaria.

–Me desculpa. – eu digo.

–Por quê?

–Por ter te deixado preocupado.

–Não tem problema. Quer que eu suba?

–Não precisa. Obrigada. -Tiro a blusa dos meus ombros. –De verdade.

Ele sorri e se afasta. Então me viro e subo.

Acho que vou ter outra noite em claro.


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