Sentada no sofá, conseguia-se ver meu irmão brincando com seu carrinho. Cheiro de bolo pairava no ar, a chuva forte batia na janela e os relâmpagos iluminavam o céu. Era uma noite de sábado, pelo que eu me lembre. Estava tudo normal, minha mãe cozinhando, meu irmãozinho brincando... E meu padrasto no escritório.
Não sou capaz de demonstrar meu ódio por ele, que conseguiu tornar nossa vida em um inferno apenas entrando por aquela porta. Minha mãe o conheceu em um congresso de medicina e desde então, segundo ele, são ‘’apaixonados’’.
Eu não acredito em uma palavra que ele diz.
Minha mãe não o ama, isso é fato. Por que ela continua com ele, então?
Parece que esse é o mistério de toda a minha vida.
Ela diz que não consigo segurar minha raiva, que deveria me esforçar para que isso não seja algo perigo, capaz de causar um acidente.
Como se fosse fácil controlar sua raiva com um padrasto que nem o meu dentro de casa. Ela nunca entenderia se eu explicasse. Tudo o que faço é dizer que iria me esforçar para tal coisa não acontecesse.
Mas infelizmente, nunca cumpri essa promessa.
E hoje, sei o motivo disso. A raiva descontrolada é um motivo muito mais... poderoso, digamos assim.
Esse motivo foi escondido de mim por dezesseis anos.
Agora, não mais.