Nunca me conformei com o fim de nada. Por mais que sentisse que era a hora.

–

Tudo bem, sem traumas, sem lágrimas, eu não mereço passar por isso. Olhando a cara inchada no espelho agora eu só consigo pensar em como eu pude chorar na frente daquele idiota. Depois de ontem eu não quero mais qualquer tipo de contato com o João, eu achei que o nível dele de maturidade fosse maior, mas vi que não. Na verdade... Eu nem sei por que chorei. Eu admito que quanto a ele, meus sentimentos são irreconhecíveis, e que sinto coisas que não há como explicar. Eu sei que ele não sente o mesmo, o ruim de você gostar de alguém no passado é que independente do que ele foi para você, bom ou ruim, você sempre lembrará dali pra frente, nem que seja pra lembrar que não deu certo. A cena de ontem me abalou mais do que qualquer outra coisa, e não me julgo errada. O azar que tenho em ser sempre traída pela mesma pessoa dói. Aquela vadia!

Fui despertada dos meus pensamentos com meu celular tocando em algum lugar do quarto, saí procurando de baixo do edredom, por cima das cômodas, mas não achei. Parou de tocar e começou de novo, decidi olhar de baixo da cama, lugar pouco provável, mas vai que... Achei! – Como foi parar aí? – Balbuciei baixo olhando visor, era a Mel.

Início de chamada

– Alô?

– Malu, onde você se enfiou? Caramba, você e Angelina sumiram, eu tentei ligar pra Angel, mas ela não atendeu e eu to te ligando desde ontem e... – A interrompi.

– Calma, respira – Me joguei na cama – Eu to em casa agora, e não sumi, só por ontem. Tá tudo uma bagunça, Mel – Suspirei – Meu celular estava em baixo da cama, provavelmente a hora que você ligou eu não estava em casa, só escutei tocar agora.

– Eu to com saudade. – Ela disse com uma voz de criancinha e sorri de imediato imaginando ela fazendo biquinho – Posso ir aí? Quero te ver poxa.

– Também to, Mel. Pode sim, pega alguma coisa pra anotar meu endereço.

– Não preciso, eu liguei pra sua mãe antes, ela já me passou. – Melanie disse e senti seu sorriso pela voz.

Ótimo, eu ainda tenho mãe. Pelo menos isso.

– Hã, tudo bem então. – Respondi normal.

– Tem problema se eu for agora? Tá um tédio aqui, pensei em almoçarmos junto, o que acha?

– Claro, liga pra Angel, chama ela também, aguardo vocês! Preciso desligar to meio ocupada agora. – Menti.

– Já liguei amiga, ela está vindo pra cá. Até daqui a pouco.

– Até.

Chamada Finalizada

Amiga, pensei. Melanie nunca me chama de amiga, sempre pelo sobrenome ou pela inicial, mania nossa. Ou é impressão minha ou ela tá aprontando algo. Decidi tomar um banho rápido, mas antes preciso avisar a Dorota de fazer um bom almoço.

–

– Dorinha, meu amor – Sorri entrando na cozinha – Minhas amigas estão vindo pra cá almoçar, bota mais pratos na mesa e faz um almoço bem gostoso. To morrendo de fome – Sorri largo em súplica e ela riu.

– Claro, eu já estava preparando fritas e bife, sua mãe disse que é seu prato favorito. – Piscou.

– Na verdade, eu prefiro pizza. Mas obrigada – Saí apressada para o banho, já disse o quanto a Mel é perceptiva? Pois é, nada passa batido, e essa minha cara de noite mal dormida não vai ajudar em nada.

–

Quando eu cheguei à cozinha novamente vi que as meninas já tinham conhecido a Dorota, e pelo visto tinham gostado, porque estavam gargalhando.

– Atrapalho? – Sorri enquanto abraçava Angelina por trás e depositava um beijo em sua testa, ao lado dei um beijo no rosto da Mel que sorriu a me ver, sentei-me do outro lado da mesa de frente pra elas enquanto Dorota ia servindo a comida.

– Claro que não sua idiota, eu nunca fiquei tanto tempo longe de vocês – Disse Mel com uma cara forjada de indignação, Angelina gargalhou.

– Você é tão dramática! Já ficamos semanas sem nos ver – Disse Angel.

– Mesmo assim só vivíamos no celular, ou em qualquer rede social nos falando. Vocês estão se escondendo de mim. – Protestou Mel enquanto comia.

– Não estamos não. – Eu ia falar mais alguma coisa quando vi o João adentrar a cozinha, mas preferi ficar calada. Ele se jogou na cadeira de qualquer jeito.

SoundTrack - Clica

– Dora meu amor, põe um prato aqui pra mim porque eu to morrendo de fome – Suplicou fazendo Dorota sorrir.

– Boa tarde pra você também Miguel. – Melanie sorriu pra ele e Angelina olhou para mim, que ignorei o olhar continuando a comer.

– E aí loira, não cansa dessas sombras pretas durante o dia não? – Riu começando a comer o que Dorota lhe servira.

– Não, me deixa sexy – Olhou pra ele com um sorriso largo no rosto enquanto ele retribuiu o olhar com intensidade.

É impressão minha ou a Melanie tá dando em cima dele na minha cara?

Prefiro acreditar que não.

– Me conta Miguel, como está sendo o casamento com a MALU? – Angelina sobressaltou um novo assunto que quase me fez engasgar.

– É, hã... Tá sendo... Bom... Apesar de insuportável, não tá sendo tão ruim assim. – Deu um sorriso pervertido e Melanie me encarou.

– Insuportável? Fala sério Malu! Esse jogo difícil não cola com o João. – Disse Mel, deixando os olhares atentos a ela.

– Jogo fácil também não faz o tipo dele. – Virei as costas percebendo que Dorota quem tinha dado a resposta. Angelina começou a rir.

– O que você quis insinuar com isso? – Melanie ruborizou.

– Que se você quer dar em cima do Miguel, dê no mínimo fora da casa da garota que você chama de melhor amiga, Melzinha – Dessa vez Angel respondeu, sorri sarcasticamente.

– Mas é óbvio que ela não tá dando em cima do João, vocês é que interpretaram errado, não é Mel? – Olhei-a fixamente e ela sorriu doce em minha direção.

– Com certeza, você é minha melhor amiga. – Revirou os olhos e encarou Angelina – Tudo bem se você quer plantar discórdia, mas ainda não entendi sua implicância desde que cheguei.

Angelina sorriu. Aquele sorriso irônico que a deixa sexy, não pude deixar de sorrir junto.

– Discórdia? Fala sério Mel! Esse jogo de mentiras não cola com a gente. – Repetiu o que Mel disse, mas reformulou a pergunta.

– Jogo de mentiras? Temos um jogo de mentiras? – Eu disse percebendo que o João tinha parado de comer para nos observar, ele nos olhava como quem estivesse em um parque de diversões.

– Não sei, temos Angelina? – Melanie deu seu sorriso mais angelical.

A mesma ao ouvir a perguntada mais como uma alfinetada, respondeu com um sorriso desafiador. Mordi os lábios enquanto encarávamos umas as outras.

Tinha algo errado ali. Algo que Angelina me escondeu e Melanie não fez questão de contar. Algo nessa conversa despertou um sentimento ruim em mim, não gostei do rumo que levou, nunca tinha acontecido antes. Angelina assentiu para Mel enquanto terminavam de comer a comida fria já ao prato. Bebi o refrigerante servido e me levantei indo em direção à sala. Sentei no sofá e não chamei ninguém, nem quis, Angelina me deve boas explicações.

A campainha tocou e só tive tempo de ver o João correndo em direção a porta, ao abrir percebi um rosto familiar, os dois se cumprimentaram com um toque de mãos e falaram alguma coisa sobre “Hoje tem balada, tu vai né?”. Foi quando desviei meu olhar para o lado oposto, em direção à cozinha. Angelina estava ali parada olhando a porta em que João estava com um garoto que não consegui ver o rosto, só sabia que era branco e tinha cabelos negros. Melanie apareceu atrás sorrindo e correu até a porta

– Kevin? Tá de brincadeira? O que você tá fazendo aqui? – Sorriu na direção do mesmo e o abraçou, ele retribuiu o abraço levantando-a do chão.

Kevin. Isso explica a cor rosa nas bochechas de Angelina.