Contas certas desacertadas escrita por Carolina Herdy


Capítulo 1
Capítulo único


Notas iniciais do capítulo

Bom, o que aprendemos hoje, Carol? Que participar de desafios pode ser muito desgastante e que escrever uma história sem utilizar "verbos de pensamento" pode ser quase impossível. rs Ainda assim, aí está o resultado da minha tentativa. Divirtam-se!



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David Sralow estacionou a Kawasaki que não lhe pertencia defronte do prédio azul. Desceu do veículo, retirou o pesado capacete e permitiu que a brisa outonal, carregada de poeira e fumaça, tocasse-lhe as faces. Esfregou as maçãs cobertas pela barba rala, deslisou os dedos longos e finos pelos cabelos cor de areia e checou, uma última vez, sua aparência no retrovisor: o terno italiano, que também não lhe pertencia, combinado com os sapatos sociais pretos e lustrosos, garantiam uma sofisticação necessária para o momento. Tocou discretamente o volume que portava no bolso. Acionou o alarme da motocicleta e, enquanto assobiava uma canção antiga, dos anos sessenta, dirigiu-se à entrada.

— Apartamento 403, por favor! — Sua voz rouca, desgastada pelo hábito do fumo, reverberou nas paredes do hall.

O porteiro, um homem magro e encurvado, acenou-lhe positivamente e indicou os elevadores com um dedo ossudo e comprido.

Dentro da caixa metálica, abafada e cheirando a Chanel número 5, David retirou o objeto de seu bolso. Olhou-o relanceadamente enquanto segurava nas mãos, medindo o peso, o conforto de portá-lo. Guardou-o rapidamente e, ao ouvir a campainha do elevador, esperou que as portas deslisassem, passou por elas e se encostou na parede mais próxima.

Fechou os olhos por um breve instante, contou até dez e vacilou alguns passos em direção ao seu destino. Parou novamente, levou a mão ao outro bolso, apanhou um cigarro. Chegou a buscar uma janela, levar o pequeno cartucho aos lábios e empunhar o isqueiro, mas antes de acendê-lo, cuspiu fora o cigarro e retomou sua caminhada.

A porta do apartamento 403 estava tão polida que David quase podia fazê-la de espelho. Buscou a chave feita no dia anterior. Estava junto de seu precioso objeto metálico. Com muito cuidado, inseriu-a na fechadura e, só então, percebeu o quanto suas mãos tremiam. A fenda da fechadura parecia dançar, desviando-se das investidas do homem. Aquilo estava levando mais tempo do que o planejado. Uma gota solitária de suor escorreu da testa para o nariz. Ele a secou com o dedo. Por fim, abriu a porta.

A sala, forrada por um tapete cor de vinho, estava vazia. David retirou os sapatos e adentrou o local sorrateiramente. Atravessou o cômodo, por pouco não esbarrando na pequena mesinha de centro, feita de vidro, com enfeites em cima. Havia ruídos no quarto. Entrou no corredor branco, fracamente iluminado por uma lâmpada ainda acesa. Estendeu a mão para apagá-la, mas se deteve. Caso o fizesse, sua presença seria notada.

Tocou a maçaneta. Estava fria. Pelo barulho, a diversão atrás daquela porta era garantida. David sorriu, mas mordeu os lábios logo em seguida. Apanhou o objeto em seu bolso, encarou-o profundamente mais uma vez. Ajustou-o bem em suas mãos e, após um longo suspiro, abriu a porta.

Lá estava ela: deitada na cama, o vestido azul quase levantado. Deleitava-se com o prazer da outra companhia masculina. Ao ver David, arregalou os olhos em surpresa. Tentou dizer algo, mas antes que o fizesse, o homem à porta antecipou-se:

— Surpresa!

David lançou-se sobre a menina, encheu-a de beijos pelo rosto e fez-lhe cócegas com a mão livre. Na outra, em punho, trazia o bracelete prateado que ela tanto queria. Seus olhinhos de criança brilhavam, trazendo ao peito do homem, uma sensação indescritível de calor. Um calor gostoso que começa ali, onde as pulsações se fazem presentes, fortes, e se espalha por cada terminação nervosa do corpo. Os olhos ardiam em lágrimas ao admirar aquela visão: sua filha estarrecida com o susto e a felicidade de ter em sua posse o que tanto queria.

— Pensei que não tínhamos dinheiro para comprar isso... — Sussurrou Adam, seu companheiro.

— É aniversário dela, querido. Ela merece.

A pequena Avery abraçou seus dois pais com muita força. Correu para sua mãe, aquela que tanto se parecia com ela, e exibiu seu novo presente. Depois, desceram juntos, pais e filha, pegaram o carro de Adam e foram jantar em um restaurante cuja comida era muito apreciada pela menina.

***

No dia seguinte, David telefonou à sua ex-namorada e agradeceu, não só por contar a Avery que seu pai passaria todo o dia no trabalho e não poderia comemorar seu aniversário com ela, mas também, pelo empréstimo da motocicleta, do terno caro, dentre outras coisas.

— Imagina, David! — Ela disse ao outro lado da linha. — Bela surpresa você fez para a nossa filha.


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