Winter Soldier - Retomando o Passado escrita por Vendetta23


Capítulo 4
Cacos




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Me espremo abrindo passagem pelas muitas pessoas que lotam a sala. Meus machucados não doem mais tanto desde que os desinfetei com água oxigenada, meus sapatos destruídos e a minha calça rasgada foram substituídos com uma rápida parada numa loja de rua e acrescentei um boné ao meu disfarce. Eu pareço um cara como qualquer outro. Levo comigo somente a mala que Natasha havia me dado, ela é grande demais e só serve para me pressionar mais contra o turbilhão de gente. Finalmente, chego em frente ao painel que estava procurando. Ter descoberto a existência de uma parte do museu local sobre a 2ª Guerra dedicada ao batalhão no qual lutei me deu uma direção, talvez isso me ajudasse a recobrar alguma coisa.

“James Buchanan Barnes” exibe o painel, contando uma breve história da minha vida e atos heroicos durante a guerra. Que belo herói eu sou... A história contada pelo painel não é nada fiel à minha história, pelo menos não a que construí depois de “ter dado minha vida pela pátria”. Que merda, falam de mim como se eu tivesse sido corajoso e.... e bravo, eu posso não me lembrar direito do que aconteceu, mas eu tenho certeza de que eu não fui nada disso, eu estava morrendo de medo. Heróis morriam ao meu lado todos os dias, engolidos pelas explosões ou abatidos pelas balas e eu... eu vivi pra manchar o nome deles. Que piada. Logo as letras começam a dançar na minha frente e o calor da raiva começa a subir pelo meu peito. Eu não estou pronto, eu posso ficar aqui o dia inteiro reconstruído as ligações entre as minhas memórias mas não estou pronto pra me ver quando eu tiver juntado os cacos da minha imagem e ficar frente a frente com todo o mal que eu causei... Eu não queria estar sozinho, eu gostaria de tê-lo do meu lado agora. Mas que merda eu ia dizer pra ele? ‘Olha, eu tentei te matar mas eu não sabia o que eu estava fazendo, acredite em mim, eu não quis fazer nada daquilo’ e depois ‘Eu estava convencido de que estava fazendo um bem pra... humanidade, eu não sei como isso aconteceu, eles me limparam de tudo aquilo que eu um dia fui mas você... você me fez lembrar’ e claro, provavelmente depois ele me daria um longo abraço e sairíamos dessa como os amigos que sempre fomos. Me obrigo a desviar a atenção dessa fantasia estúpida, eu não deveria estar surpreso com o meu desejo de que ela fosse real, mas estou, eu não posso me permitir ser tão ingênuo, não quando tenho tanta merda pra dar conta. Saio dali.

Pela rua, eu ando sem propósito sempre olhando para trás, certo de que alguém está me seguindo, juro que estou mergulhando cada vez mais numa paranoia psicótica. Eu tenho que tomar cuidado pra não ficar mais maluco do que eu já estou. Há uma sombra grudada nos meus passos, uma risada impiedosa, eu ando pelo asfalto dessa cidade e cada prédio reduzido a escombros e cerimônia aos mortos do ataque que EU conduzi a ela me lembram incessantemente de que eu não posso fugir do meu passado. Um frio que parece que somente eu estou sentindo corta o meu rosto como uma faca quando paro em frente a uma loja de televisores bem na hora da transmissão da saída do Capitão América do hospital. Ele é recebido com exaltação pela plateia que o estava esperando, ele anda sem exibir sinais de que está com dor, de certa forma isso me acalma, entro na loja para ouvir a conferência que ele vai dar à imprensa. Cercado de jornalistas, ele calmamente responde uma a uma as questões que eles lhe fazem.

“Como está o seu quadro de saúde, capitão Rogers?” pergunta uma jornalista na sua frente.

“Minha saúde já se estabilizou, minhas feridas se cicatrizam rápido” ele respondeu em tom animador.

“Com a S.H.I.E.L.D. agora desfeita, qual será o seu objetivo? Há intenções de revivê-la?” essa pergunta demandou alguns instantes de reflexão de Steve.

“Não tenho como responder essa pergunta agora. Mas podem ter certeza de que haverá membros que pertenceram à S.H.I.E.L.D., como eu, que continuarão trabalhando para garantir o bem estar da população. Muitos membros da H.Y.D.R.A. ainda não foram punidos por seus crimes, ainda não acabou.” Ele balançou a cabeça como se reafirmasse suas últimas palavras.

Então um jornalista que estava até então tomando notas em seu caderno ao lado de Steve deu um passo à frente e perguntou:

“Um dos soldado que participava dos ataques se sobressaiu” a postura de Steve mudou imediatamente, ele se enrijeceu e engoliu seco “O homem com o braço mecânico foi captado por nossas câmeras conduzindo ataques que fizeram vítimas civis. Vocês têm alguma pista de seu paradeiro?”. Ele ficou em silêncio durante alguns segundos até se inclinar para o gravador “Nos esforçaremos para encontra-lo.” Sua frase foi cortante e encerrou as entrevistas, ele seguiu para um carro estacionado na frente do hospital, seus vidros escurecidos me privaram de seguir olhando-o, tentando entender o que eu vi em seus olhos quando ele respondeu à pergunta. Eu vi neles um traço de raiva? Eu estou imaginando coisas, por favor, que ele não esteja com raiva de mim. O mesmo calor que eu senti no museu subiu pelo meu peito novamente, agora seguido de uma leve tontura. Isso não é normal. Checo meu pulso e percebo que meus batimentos cardíacos estão acelerados. Saio da loja procurando um lugar no qual possa sentar um pouco e comer alguma coisa, eu não me alimento desde manhã, deve ser por isso que estou me sentindo fraco. Já era noite e depois de andar por alguns minutos avistei o letreiro luminoso de uma lanchonete no final do quarteirão, minhas pernas parecem bambas e estou suando frio, isso não está com cara de que é uma simples falta de alimento, ótimo. Estou há uns 20 metros da lanchonete quando a ânsia me sobe pela garganta, viro no beco pelo qual estou passando e vomito em algumas latas de lixo. Como se o chão estivesse se movendo, me apoio na parede para não cair, a mala cai do meu ombro e eu logo vou de encontro ao chão, tremendo incontrolavelmente, a única frase que me vem à memória ‘Mas ele está fora do gelo há tempo demais’.

Uma sombra se projeta sobre a luz que vem da rua no chão do beco. Eu mal consigo me mexer, meus músculos se contraem involuntariamente, minha cabeça bate contra o chão e o calor agora muita mais forte, se estendeu para todo o meu corpo na medida que começou a ficar insuportavelmente doloroso, mas eu ergo os olhos para o homem parado na minha frente. Consigo ver pouco de seu contorno, a luz que vem de trás dele e muito forte e logo cedo à força com que os músculos do meu pescoço se contraem, eu não tenho mais controle. Ouço passos chegando cada vez mais perto da minha cabeça, eu tenho certeza que esse cara não quer me ajudar, tento dizer alguma coisa, qualquer coisa, mas a pressão nos meus pulmões me impede.

“Você não pensou que pudesse fugir durante muito tempo, certamente” seu tom de voz era calmo, enquanto eu lutava para não perder a consciência ele se pôs no meu campo de visão. Ele tirou os óculos escuros revelando seus olhos, o esquerdo não brilhava como o direito e era cortado por uma cicatriz.

Eu fui em direção ao carro depois de ter explodido sua parte inferior. Ele tinha parado a uns 30 metros da onde eu estava. O motorista com o tapa-olho ainda se mexia, e isso significava que eu tinha que terminar a minha missão. Arranquei a porta com meu braço e me abaixei com a arma em punho. Ele tinha perfurado o asfalto e fugido pelos esgotos. Hum. Abri um sorriso por baixo da máscara, a caça que corre é sempre mais divertida. Me levanto e levo meu comunicador em direção a minha boca, pedindo por novas ordens.

Não pode ser...

Em seu rosto aparece um sorriso de satisfação. O chute que ele desfere no meu rosto me apaga.


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