"As coisas estão desmoronando, as mentiras estão voltando-se contra mim."

Katie nunca gostou de hospitais.

A começar pelo cheiro incomum de detergente e naftalina, depois vinha o clima tenso e por último a sensação estranha de estar sendo observada no hospital. Parece que algo ruim está por vir, até mesmo em uma maternidade, você sempre espera por uma noticia péssima quando está em um hospital, às chances de receber uma noticia boa são quase nulas.

Seu corpo estava rígido sobre o assento da sala de espera, já fazia alguns minutos que Travis sairá para trocar os curativos do rosto e Angel fora para o banheiro. Ela estava sozinha naquele lugar cômico, o pior lugar para se frequentar. Não recebeu uma única noticia sobre James, ele ainda estava em processo de avaliação.

Por mais que Katie tentasse focar seus pensamentos no fato de James estar inconsciente em alguma maca do hospital seus pensamentos iam para horas mais cedo, quando ela e Travis tiveram um momento intimo mais do quê intenso. Ainda sentia o formigamento sobre seus lábios. Claro que ela nunca deixou de notar o quanto Travis era bonito, mas nunca passara pela sua cabeça um dia ter seus lábios sobre os dele. E pior, ela ter tido a atitude de beijá-lo.

Respirou fundo e encostou a cabeça no ombro no momento em que uma mulher passou as pressas na sua frente, foi inevitável Katie não levantar a cabeça e observa-la. Era de altura mediana e cabelos longos, por um único segundo Katie achou ser a mulher do sinal, aquela ao qual tinha certeza de que era a sua mãe. Mas seria impossível ela estar ali naquele hospital e Katie não teve tempo de ver o seu rosto.

– Vamos para a lanchonete? – Angel disse aflita quando voltou do banheiro. – Preciso comer algo.

Katie assentiu e elas caminharam em direção a lanchonete do hospital, as mãos de Angelina tremiam e pareciam ganhar vida, deixando-a ainda mais preocupada do que já estava. Katie não entendia aquele comportamento e preferiu não perguntar.

– E a sua namorada? – Perguntou casualmente sentando-se em uma mesa depois do pedido.

– É sobre isso o que quero falar. – Angel respirou fundo e olhou para os lados, seu nervosismo acabava com a sua imagem de durona. – Nós terminamos.

– Oh!

– Na verdade, nunca tivemos algo.

– Como assim?

Angelina analisou as mãos e cerrou os punhos, com a intenção de fazê-los parar de tremer, mas não conseguiu. Ela ficou em silêncio por um tempo analisando as pessoas ao redor e tentava a todo custo não olhar para Katie.

– Eu não sou lésbica.

– Não estou entendendo.

– As coisas estão desmoronando, as mentiras estão voltando-se contra mim. – Angelina disse em um fio de voz e respirou fundo. A garçonete trouxe os pedidos, mas Angel nem ao menos tocou na comida, parecia travar uma batalha contra si mesma. – E agora o Stiles está aqui. Droga, eu havia prometido a mim mesma nunca mais me envolver com ele e... droga, eu estou... Ai meu Deus, eu estou chorando.

Katie arregalou os olhos ao constar que o que Angelina dizia era verdade. Ela estava se desintegrando em lagrimas na sua frente. Katie se aproximou e tentou confortar a amiga com um meio abraço.

– Do que você está falando, Angel?

– Eu sempre fui uma garota diferente das outras. Eu gostava de livros, mas livros de contos, tipo Cinderela e tudo mais. Eu amava a Disney. Perdia meu tempo acreditando que príncipes encantados existem. Eu sempre preferi ficar em casa lendo livros enquanto a Thalia estava em alguma boate saindo com diversos caras, sempre se apaixonando e se magoando. A Thalia se jogava com tudo em qualquer cara somente para ter alguém, para preencher algum vazio, e eu preferia esperar pela pessoa certa. – Angelina parou de falar e fungou, era a primeira vez que falava daquele assunto com alguém. – Então o James apareceu, e, Meu Deus, ele era tão legal! Logo de cara viramos amigos e por alguma influencia do destino eu me apaixonei por ele. Cara, foi uma cagada gostar dele, pois ele não retribuiu. Ele preferiu ficar com a Thalia. – Katie prendeu a respiração e analisou as expressões da Angel, nunca em milhões de anos imaginava que um dia ouviria aquilo. – Eu fiquei tão magoada, eu fiquei tão... Sei lá. Eu decidi que nunca mais iria me apaixonar, eu parei de acreditar na Disney, eu parei de acreditar em príncipes encantados. Para afastar os garotos que me davam mole eu dizia ser lésbica... E isso pegou. De tanto eu falar ser lésbica as pessoas passaram a acreditar. E pior, passaram a criar boatos. Garotas que eu nunca nem ao menos havia visto na vida começaram a dizer que já haviam ficado comigo, eu não desmentia, eu confirmava e ainda apimentava a história. Eu ganhei fama por isso, eu me vi presa em um episodio de Faking It. Eu não era eu mesma. E então eu conheci a Lily e foi para ela que eu contei toda a história, ela é lésbica de verdade e decidiu me ajudar ao máximo possível a manter a fama de cola velcro. O problema, é que o Stiles voltou, voltou com tudo. Arrebentando todas as barreiras que eu construí. E agora eu acho que ele vai morrer, e isso não pode acontecer. Por que... Por mais doloroso que seja dizer isso, eu amo ele. E eu me apaixonei por ele novamente.

Katie não conseguiu esconder sua cara de espanto. Ela se afastou de Angel em uma velocidade surpreendente e ficou analisando-a como se ela fosse um alienígena. Se fora difícil para Angel dizer tudo aquilo foi mais difícil ainda para Katie digerir. Ela piscou os olhos com força, sentindo seus longos cílios pinicarem suas pálpebras. Angel não ser lésbica já era difícil de imaginar, agora Angel apaixonada pelo James? Pior ainda.

– E eu acho que talvez ele goste de mim. – Angel tentou não soar convencida enquanto pegava o celular de James de dentro da sua bolsa. Ela se aproximou de Katie novamente e abriu a galeria. – Eu achei uma pasta secreta, a senha é a data do aniversario dele... E, o conteúdo, são diversas fotos minhas, tanto sozinha quanto com ele, do tempo que éramos amigos.

Katie analisou as fotos uma por uma, com um sorrisinho no rosto. Claro que sempre soubera que o amigo nutria sentimentos positivos por Angel e agora que sabia que ela sentia o mesmo esperava que eles se entendessem e pudessem ficar juntos.

Angelina puxou o celular e as duas começaram a ver diversas fotos, em determinado momento Angel soltou um risinho debochado e Katie olhou para a foto: Era James fazendo pose sem camisa na praia. Sorriu também e estudou a foto por um tempo. Sua mente deu um nó quando constatou algo.

Seu pai, John Gardner, tinha uma marca de nascença na clavícula, em forma de coração. Katie herdou uma idêntica, porém uma pouco mais acima, próximo ao pescoço, mas ainda sim na linha da clavícula. E agora, olhando para a foto de James, ela deu zoom naquele exato lugar.

E ele tinha a mesma marca.

– Que estranho. – Disse e passou o polegar pela tela, mudando de foto. Nessa, haviam duas crianças, do mesmo tamanho e de aparência semelhante, eram gêmeas. Um garoto e uma garota lado a lado rindo. – Quem é essa?

– James tinha uma irmã, ela morreu antes de completar três anos. Ele não gosta muito de comentar sobre esse assunto.

Katie nada disse, apenas continuou olhando para a garota, e sentiu um arrepio na espinha ao constar que conhecia aquela garotinha.

Era ela.

***

– Eu sinto muito dizer isso, mas os enxames apontaram Insufiência Renal Crônica. – A forma lenta como o médico disse aquelas palavras fez o coração de Katie afundar. Ela respirou fundo e inconscientemente abraçou Travis. Angel parecia não ter digerido as palavras ainda, olhando para o médico com uma careta, como se não tivesse entendido bem. – Está em um estado avançado e a única opção que temos é o transplante. Eu sinto muito mesmo, ele terá de ficar na fila de espera se nenhum doador direto se manifestar. Estamos a muito tempo com um problema, são poucos doadores disponíveis. Ele ficará na fila de espera, eu só não sei até quando ele virá a suportar. Ele pode vir a ficar em um estado terminal.

Alguns segundos de silêncio foram manifestados, porém bruscamente acabado com o som vindo do fundo da garganta de Angel. Ela estava chorando próxima a maca, James ainda estava inconsciente. Sem perceber, Katie também chorava e agarrava com força a camiseta de Travis, como se aquilo fosse lhe proteger.

– Você não pode morrer, não pode, não pode! – Angel disse entre lagrimas se inclinando sobre Stiles e tocando-lhe no rosto. – Eu não vou permitir!

– A mãe do rapaz saiu daqui a poucas horas, estava muito abalada por não poder doar o rim ao filho.

– Por que ela não pode?

– Porque não é compatível. Ele entrará para a lista de espera nacional, para um ruim doado por um cadáver.

– Eu poderia doar o meu? – Angel automaticamente perguntou.

– Não é tão simples assim. Já que você não é maior de idade deverá ter a premiação dos seus pais, além de possuir um histórico de saúde perfeito. Sem bebida alcoólica ou qualquer conteúdo ilícito. Além de passar por uma série de testes para ver se o rim é compatível.

Angelina voltou a chorar.

– Meu pai nunca permitiria. – Fungou.

– Mas o meu sim. – Katie se surpreendeu ao constar que sua voz havia saído firme. Se afastou de Travis e analisou o médico. – Quando poderemos começar os testes?

Antes que o médico pudesse responder, uma mulher entrou no quarto e ficou estática ao ver os três adolescentes ali. Katie ficou pálida ao ver quem era.

– O que você tá fazendo aqui? – Disseram, as duas em uníssimo.