O Amante escrita por Allie Blake


Capítulo 3
A carta part.2




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Sakura tinha as mãos trêmulas ao pegar a carta que Sasuke lhe entregava e que estava escrito com a caligrafia de seu sobrinho. Também sua vista parecia-lhe falhar, então pediu em tom suave:

— Poderia arranjar-me uma vela, sim? — Fosse qual fosse o conteúdo daquela carta, ela não tinha intenção de voltar ao seu quarto para lê-lo. Muito menos na companhia de Sasuke Uchiha, porque seu quarto guardava muitas recordações dos momentos preciosos que haviam passado ali juntos. E Sakura não queria, em hipótese alguma, lembrar-se do carinho, da atenção, da suavidade de Sasuke quando faziam amor.

Calado, ele se retirou para o corredor, de onde voltou instantes depois trazendo uma vela que tirara de dentro de uma arandela.

A textura do papel que Sakura segurava fazia com que se lembrasse da carta concisa que escrevera a Sasuke havia poucos dias. Fora com certa relutância que o fizera, e o arrependimento antecipado por ter de romper com seu relacionamento quase a tinha feito desistir, mas ela sabia que aquela seria a melhor atitude a tomar, e, assim pensando, endurecera as palavras que escrevera. Não queria feri-lo, mas também não queria que Sasuke tivesse falsas esperanças quanto à possibilidade de ela mudar de ideia e aceitá-lo novamente.

Se o visse pouco depois, sabia que aqueles belos olhos negros dele e seu jeito calado, a teriam feito desistir da decisão. Não, não podia fazê-lo, argumentara consigo mesma. Haveria consequências desastrosas se agisse de outra forma.

— E então? — Sasuke incentivou-a, o olhar fixo na folha de papel que Sakura segurava sem abrir. — Vai ler ou não?

— É claro... — ela declarou desperta de suas próprias reflexões. Seus dedos ainda tremiam quando rompeu o selo. — Não me apresse.

Tudo indicava que Sasuke estava certo em suas desconfianças até o momento. Mas Sakura ainda alimentava uma tênue esperança de que a carta de Oliver contivesse algo muito diferente do que temia ler. Tudo o que sabia era que seu sobrinho mal conhecia Emily Uchiha. E, mesmo se ele conhecesse aquela moça muito bem e até gostasse dela, um homem das ciências como Oliver não teria o temperamento tão desvairado a ponto de fugir com ela daquela forma.

O problema, ao que parecia, era que o temperamento de Emily Uchiha era assim. E isso poderia valer para ambos, numa situação de desvario provocada pela paixão, pior ainda, ela era linda, o que poderia levar qualquer homem a perder completamente o juízo.

Sakura esforçava-se por concentrar-se e ler o que o sobrinho lhe escrevera. Sasuke segurava a vela um tanto alta, procurando espiar por sobre seu ombro. E sua respiração, junto a seu ouvido, tornava quase impossível para Sakura conseguir pensar em qualquer coisa, ainda mais porque a caligrafia do jovem cientista era um tanto complicada.

Querida tia Sakura — Sasuke leu em voz alta, impaciente, tomando à dianteira. — Quando encontrar esta carta, já estarei a caminho da Escócia, onde pretendo casar-me com a srta. Emily Uchiha. Como ela ainda se encontra em idade que depende do consentimento de sua família, e teme que o irmão possa não aprovar nossa união... — Sasuke interrompeu a leitura para murmurar, raivoso: — Tem razão, rapaz! — E depois continuou: ... Decidimos fugir juntos. E, sabendo quanto à senhora gosta de minha futura esposa, imagino que vá nos desejar muita felicidade. Esperamos ansiosamente poder residir com a senhora quando retornarmos já casados. Seu sobrinho, que a estima por demais, Oliver Armitage.

Sasuke baixou bem devagar a mão que segurava a vela. Sakura agiu da mesma forma com a carta que ainda tinha em mãos. Nenhum dos dois foi capaz de pronunciar uma só palavra por alguns segundos, durante os quais toda a defesa que Sakura articulara a favor do sobrinho ruía por terra.

— Meu Deus! — sussurrou ela por fim. — Isso é uma loucura! Não... não consigo imaginar um casal mais... Inadequado do que meu sobrinho e sua irmã! O que pode ter acontecido a essas duas crianças para agirem assim?!

Ela ergueu os olhos para Sasuke, atônitos. E, ao perceber quanto ele se encontrava próximo, engoliu em seco e deu um passo para se afastar. Não estava com medo dele, mas do efeito poderoso e intenso que Sasuke exercia em seus sentidos. Sentia uma vontade enorme de tocar-lhe o rosto, acariciar-lhe os cabelos, num gesto que acabara ficando entre os dois como um sinal para que se recolhessem à cama.

Um sinal que não existia mais se lembrou, entristecida. E fechou as mãos, detendo a vontade que as fazia agirem. Talvez o brilho intenso de seus olhos tivesse traído seus pensamentos, avaliou, pois Sasuke baixou o tom de voz consideravelmente, falando-lhe como mesmo carinho de antes:

— Acho que sei o que aconteceu a essas duas crianças, lady Haruno. — E seu olhar passou-lhe pelo rosto como uma doce carícia. — Foi a mesma loucura que às vezes aflige corações mais velhos e mais experientes.

Ela tornou a engolir em seco, depois afirmou, tentando parecer firme:

— Não está se referindo a nós, por certo... — E forçou uma risada que, no entanto, nada tinha de alegre, mas deirônica. — Porque eu já estou curada das ilusões da adolescência há muito tempo e nada tenho em mim de romântica. E você é o último homem em Bath, talvez em toda a Grã-Bretanha, inclinado a cometer uma loucura ou qualquer outro tipo de excesso por amor.

Sasuke Uchiha, sempre tão sensato, correto, respeitável, decente; Sakura sabia, porque tinha pesado todas essas qualidades a favor dele mesmo antes de escolhê-lo para tornar-se seu conveniente amante. Não quisera alguém mais romântico, muito menos passional, que pudesse pensar estar apaixonado por ela.

Mas Sasuke não parecia contente com o que deveria ter sido um elogio a seus atributos de caráter. Franziu as sobrancelhas e encarou-a muito sério, e Sakura chegou a recuar diante da sombra que surgiu naqueles belos olhos.

— Então, eu a entediava — ele comentou, parecendo ferido.

— Não seja tolo — ela rebateu, mas suas palavras pareceram falsas até mesmo para si própria. Sasuke não a entediava, repetia para si própria, Sasuke simplesmente deixara de surpreendê-la. Até essa noite...

E agora Sakura não conseguia entender se gostava ou não de tais surpresas. — Sou incapaz de ser tolo — Sasuke respondeu, com franqueza.

— Bem, da forma como fala, parece que o acusei de um crime! Não é bem assim... Há muita gente tola neste mundo, e eles só conseguem causar problemas a pessoas sensatas como nós. Esses dois jovens, por exemplo. O modo como você chegou aqui esta noite leva-me a crer que não está gostando dessa fuga romântica tanto quanto eu.

— É claro que não estou! — Sasuke, agora, parecia estar ofendido diante de tal possibilidade. — Minha irmã é jovem demais para saber o que quer da vida, ainda mais num assunto tão importantequanto o casamento.

Emily Uchiha não tinha mais do que dezessete anos, Sakura sabia. A mesma idade com que ela própria embarcara para uma viagem terrível em seu casamento.

Sasuke continuava sem perceber que lhe causava recordações amargas:

— E, como você mesma disse, eles formam um parcompletamente incompatível! Minha irmã... Oh, Deus, jamais poderia imaginá-la como esposa de um cientista! Emily tem um temperamento adorável, um coração de ouro!

— Mas poderia também ser considerada fútil e impulsiva, não? —Sakura indagou, sabendo do que falava.

Sasuke preparou-se para contradizê-la, porém preferiu dar de ombros e comentar:

— Talvez você tenha razão. Imagino que Emily deve ter achado a idéiade uma fuga muito romântica. Mas viu tão pouco do mundo! Como pode saber se o jovem Armitage é o homem indicado para fazê-la feliz?! Não deve nem ter certeza se quer passarquinze dias com ele, quanto mais uma vida inteira.

— É verdade — Sakura comentou, num suspiro. Pelo menosnesse aspecto, ela e Sasuke pensavam da mesma forma. Tinham os mesmos motivos para querer impedir que seu sobrinho se casasse com a irmã dele. Ouquase.

Ela possuía um motivo a mais do que ele. Um de que Sasuke não podia ter conhecimento. O mesmo motivo pelo qual rompera o relacionamentode ambos prematuramente, quando ainda queria muito continuar aquele romance até o fim da temporada; não fosse por esse motivo, poderia até querer continuar a ver Sasuke e amá-lo no ano seguinte.

Mas, agora, esse desejo não poderia mais se concretizar, da mesma forma que o casamento de seu sobrinho com alguém da família Uchiha não poderia jamais se realizar.

— Pareceque concordamos, então — Sasuke observou, arrependendo-se agora por ter feito aquela observação quanto a ser entediante para Sakura. Nada poderia ser mais entediante do que um amante que se recusava a partir em silêncio, sem contestar o porquê de um rompimento. — Eles precisam ser alcançados e verem a loucura que estãocometendo, para depois serem trazidos de volta para casa.

Sakura ergueu as sobrancelhas e endireitou os ombros. Depois disse, decidida:

— Muito bem, então. Vou fazer uma pequena mala e partir esta noite mesmo. Eles não devem estar mais de doze horas adiantados e, provavelmente, os alcançarei antes que cheguem a Gloucester.

Com um movimento rápido, ela se dirigiu à porta. Vestida como estava com a alvacamisola e com os cabelos estranhamente rosas soltos sobre as costas, parecia pouco mais velha do que Emily.

— Não seja ridícula! — Sasuke protestou, adiantando-se e segurando-a pelo pulso, que lhe pareceu frágil entre seus dedos. — Não pode sair por aí sozinha, cruzar praticamente todo o país!

Sakura encarou-o e soltou a mão puxando-a sem delicadeza.

— Não vou estar sozinha — rebateu. — Vou em minha carruagem, é claro, com um cocheiro muito experiente e pelo menos um criado.

E, como se tais palavras tivessem definido a situação, voltou-se, saiu do quarto do sobrinho e seguiu pelo corredor, de volta a seus aposentos. Sasuke acompanhou-a de pronto.

— Além do mais — ela continuou, voltando-se de repente para encará-lo ainda uma vez —, não vou precisar seguir Oliver e sua irmã por todo o caminho, daqui até a Escócia! Não sabemos o que eles estão usando como meio de transporte! Talvez um veículo de aluguel. É o maisprovável. Com um pouco de sorte, vou até adiantar-me a eles amanhã. E então poderei enviar Emily de volta em segurança no dia seguinte.

Sakura parou à porta de seu quarto e ergueu uma das mãos. Por um segundo, Sasuke imaginou se ela queria que ele se inclinasse e a beijasse numa despedida, mas depois entendeu que lhe pedia a vela.

Teimoso, não a entregou.

— Acha, honestamente, que vai segui-los, encontrá-los com facilidade e depois mandar Emily de volta a Bath? — perguntou com certo sarcasmo. — E se pararam em uma taverna ou hospedaria de beira de estrada para trocarem de cavalos, e você passar por eles com muitaantecedência?

Sakura não respondeu. Aquela, como muitas outras, era uma possibilidade que não considerara. Sasuke tivera muito mais tempo para pensar e considerar, até mesmo planejar, desde que se dera conta do desaparecimento da irmã da casa modesta em que viviam nos subúrbios de Bath.

— Vou perguntar por eles sempre que parar em qualquer lugar para descansar ou trocar de cavalos — ela explicou. — Não deve ser assim tão difícil saber por onde passaram, ou rastrear seu paradeiro. E, se eu tiver de segui-los até Gretna, estou preparada para a jornada. Agora, por favor, dê-me essa vela para que eu possa me vestir e arrumar minha mala, sim? Se... Não for lhe pedir muito, por favor, acorde meu cocheiro e meus criados e informe-os a respeito da viagem e sobre a urgência de sairmos daqui quanto antes.

— Não, Sakura. Não vou permitir que faça uma coisa dessas. — Sasuke afastou a vela das mãos dela. — Será uma viagem difícil, talvez até perigosa.

Os olhos de Sakura brilharam audazes, altivos.

— Não é meu guardião, sr. Uchiha. E, mesmo tendo partilhado minha cama, não é meu marido tampouco. Se eu disse que vou partir nessa viagem, não há como evitar que o faça.

Sasuke cerrou os dentes diante daquela teimosia. Sakura parecia querer mostrar a ele que, além de tê-lo dispensado, era-lhe superior também pela posição social. Mas se controlou, seria bem-feito para Sakura se ele permitisse que ela se metesse numa empreitada assim.

Para sua surpresa, porém, ela tomou-lhe a mão livre nas suas e suavizou a voz para dizer:

— Pensei que tínhamos concordado que Emily e Oliver devem ser detidos. Por que estamos discutindo, então? Que alternativa temos?

Uma alternativa poderia ser óbvia, Sasuke pensou. E decidiu que, se a mostrasse, Sakura poderia aceitá-la:

— Eu irei. Posso ser mais rápido se for a cavalo. Posso até cruzar os campos para intercepta-los. Posso pedir informações em qualquer lugar por onde passar, para qualquer pessoa, desde viajantes até donos de espeluncas e cobradores de pedágio, qualquer um que uma dama talvez tivesse receio de interceptar.

Sakura pensava, e Sasuke percebeu que ela começava a ceder. Portanto continuou, sentindo o calor das mãos dela, que subia lentamente por seu braço e o deixava entorpecido.

— Assim que eu conseguir alcançá-los poderei exigir que minha irmã volte comigo para casa. Afinal, sou seu tutor legal, e ela não poderá se recusar. — Esse era o melhor argumento que ele tinha para convencer Sakura de sua ida. — Você não teria tal influência sobre ela ou seu sobrinho. Por esta e outras razões que mencionei, sou eu quem deve persegui-los. Mas...

— Sim?

Sasuke hesitou visivelmente embaraçado. Preferiria cortar a língua a ter de admitir o que pensava, em especial para ela. E, como sabia que sua vergonha estava estampada em suas feições, baixou a mão que segurava a vela para que Sakura nada percebesse. Só então disse:

— Não tenho recursos à minha disposição para a viagem, como antes tive.

Mesmo digno e cheio de orgulho, ele não conseguia encarar uma das mulheres mais ricas da Inglaterra e cuidava para não gaguejar na revelação humilhante que era obrigado a fazer-lhe.

Nunca tinham falado a respeito da enorme disparidade entre suas posses. Na verdade, jamais tinham conversado sobre assuntos mais profundos. Ainda assim, imaginava que Sakura soubesse que sua família havia perdido boa parte dos bens que um dia possuíra. Pelo menos, a casa modesta em que morava devia ter sido uma evidência suficiente, numa cidade onde o preço das casas crescia na mesma proporção da vizinhança. Suas roupas, bem talhadas, mas antigas, poderiam tê-lo acusado como o homem sem meios que era agora. Não tinha sequer uma carruagem...

Ao que parecia, Sakura conhecia sua situação financeira desde muito antes de se aproximar de Sasuke com seu convite sedutor, intrigante, e até escandaloso para que se tornassem amantes. Um homem mais rico poderia sentir-se até ofendido... E ele, agora, tinha de confessar sua situação em face do dilema que viviam:

— Meu pai deixou dívidas consideráveis quando faleceu, há algum tempo. Tenho conseguido quitar boa parte delas e espero ver minha família recuperada em alguns anos, próspera até. No momento, porém, não disponho de dinheiro vivo. E, já que nós dois temos interesse em ver seu sobrinho e minha irmã afastados de um casamento que poderia ser catastrófico, sugiro que juntemos nossas forças. Se você financiar a viagem, eu a pouparei do trabalho de ir pessoalmente, colocando-me à sua disposição para encontrá-los.

Sakura já soltara a mão de Sasuke e via agora que ele aguardava sua resposta, parecendo tenso. Não a olhava, talvez para não ver algum sinal de piedade, que completaria sua humilhação.

Houve alguns segundos de um intenso e misterioso silêncio por parte de Sakura, até que ela, num movimento rápido, tomou a vela da mão de Sasuke e, em seguida, entrou em seu quarto e fechou a porta.

Antes que ele pudesse reagir, um ruído seco indicou que ela girava a chave no ferrolho.

— Sakura! — Sasuke bateu contra a madeira trabalhada, indignado. — O que está fazendo?! O que significa essa sua atitude?!

A voz dela soou distante, fria e calma:

— Imagino que seja óbvio. Sinto muito, mas não aceito a sua oferta para fazer a viagem em meu lugar.

Sasuke percebeu que os criados deviam estar acordados agora, porque ouviu ruídos e sussurros no andar de baixo da casa. Imaginou que um deles poderia aparecer e lançá-lo porta a fora sem fazer perguntas. Na verdade, todos os criados daquela casa tinham mostrado grande paciência até agora para com ele.

Assim, parou de bater na porta e baixou a voz:

— Não ouviu nem uma palavra do que acabei de dizer?

— Ouvi, sim. E considerei cada uma delas para tomar minha decisão — ela disse lá de dentro. — Aprecio a sua oferta, mas decidi seguir sozinha, ponto final! Tenho certeza de que exagerou em suas considerações quanto ao que pode me acontecer.

— Não, não exagerei em nada. Eu apenas...

— Sr. Uchiha, por favor! — Sakura pediu como se perdesse a paciência. — Tomei minha decisão e não vou deixar que me convença a agir de forma diferente, muito menos se exaltar. Agora, se me der licença, tenho muitas coisas para preparar.

A implicação de que ele deveria se retirar estava implícita, porém, mesmo assim, ela concluiu:

— Espero que poupe sua dignidade e a minha saindo daqui em silêncio. Se não o fizer, terei de chamar meus criados para acompanhá-lo até a porta.


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Notas finais do capítulo

Me digam o que acharam...
^^



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