Jake DarkShadow

Quando eu soube da história de Angeles, fiquei chocado, com raiva e acima de tudo, culpado. Eu havia simplesmente deduzido que ela era mimada e por causa disso eu a tratei mal, bem, isso e por outros motivos que todos já sabem.

Após ter abraçado esse ser de um pouco mais de um metro, eu decidi fazer o seu humor melhorar. Não por causa da culpa, ou porque eu estava com dó, mas sim porque eu queria ver aquele sorriso infantil em seu rosto.

— Vou ao mercado, você quer vir comigo? — perguntei por educação, afinal eu já sabia qual seria a resposta quando envolvia Chi e comida.

Seus olhos brilharam e ela balançou a cabeça vigorosamente, lutei contra a vontade de rir e peguei meu blusão, afinal estava frio.

Angeles se trocou, colocou uma calça skinny cinza escura e um blusão fechado branco (que ficava gigante nela, como sempre) que tinha um desenho do Snoopy. Ela prendeu sua cabeleira negra num coque desarrumado e calçou seu vans apressadamente.

Fomos para o carro e liguei o rádio porque parecia que Angeles não estava muito afim de conversar. Uma música começou a tocar e Chi começou a cantar. A música era legal e era engraçado ver Angel a cantando.

Quando chegamos no mercado, Angeles aparatou.

Literalmente, ela SUMIU.

Peguei o carrinho e comecei a procurá-la de um lado pro outro. Do nada, ela surgiu do meu lado carregando pacotes e pacotes de porcarias.

— Quatro latas de Pringles, um pacote de Trakinas de morango, dois pacotes de cookies, duas barras de chocolate, dez garrafas de coca-cola, três pacotes de Finni e mais uma lata de sorvete.

— Achou que preciso de mais alguma coisa?

— Que tal COMIDA DE VERDADE?

Angeles deu de ombros.

— Isso eu deixo com você.

Bufei. Realmente, eu não deveria ter tido a ideia de trazê-la comigo.

— Tudo bem, mas faça o favor de pegar mais refrigerante e um pacote de amendoins.

Ela sorriu vitoriosamente, como se tivesse feito “um bom negócio” e saiu saltitando pelos corredores do WallMart.

Parei na sessão de jogos para Xbox para tentar encontrar algum jogo legal. Achei um interessante do Star Wars e separei no carrinho.

Percebi pelo canto do olho que duas garotas estavam olhando para mim. Sorri arrogantemente, é claro que elas estavam olhando para mim.

Virei para vê-las melhor. Uma era loira do cabelo curto, e usava um vestido mesmo estando frio, a outra era uma morena com mechas loiras, um pouco mais alta que a outra e tinha olhos verdes. Elas perceberam que eu estava olhando para elas e coraram. Sorri e pisquei para elas, fazendo elas rirem embaraçadas e trocarem algumas palavras que não conseguia ouvir.

A loira tomou coragem e me entregou um papel. Vi que tinha seu número e o nome, Stacey, estava escrito com uma letra caprichada. Sorri novamente e fazendo um pequeno aceno na mão, fui procurar Chi.

Ela estava pulando feito uma retardada para alcançar o pacote de amendoim. Soltei uma risada e fui ajudá-la. Quando um garoto escroto veio na frente e a ajudou primeiro. Fiquei olhando com uma sobrancelha arqueada que eles estavam conversando.

No mínimo, Chi estava agradecendo o imbecil e ele estava flertando com ela.

Mas é óbvio que ela não estava percebendo.

Parei para olhar seu perfil. Ele usava jeans, vans e um blusão aberto. Seu cabelo era castanho claro e tinha olhos cor de mel.

Um imbecil.

Angeles estava conversando com ele, que ao dizer alguma coisa, a fez rir. Não sei porque, mas eu estava sentindo um incômodo, acho que era porque eu sentia a reponsabilidade de cuidar dela quando Allan não estava por perto. Me aproximei e percebi um pouco da conversa.

— Está sozinha?

— Ah, não, vim com meu amigo. E você?

— Infelizmente, eu não tive tanta sorte quanto seu amigo de vir tão bem acompanhado. Vim com meu colega retardado.

Angeles riu, e percebi que corou, provavelmente por causa do flerte do imbecil. Ele disse mais alguma coisa irrelevante que a fez rir e decidi entrar.

— O que está acontecendo de tão engraçado.

Angeles virou-se para mim, e sorriu, porém a reação do Sr. Imbecil não foi de felicidade. Ele ficou me encarando com a sobrancelha arqueada e retornei o olhar pouco receptivo.

Chi é claro não percebeu nada.

— Joshua estava me ajudando a pegar seus estúpidos amendoins. Conseguiu pegar a comida?

— Não, eu estava olhando os jogos. Vamos — disse pegando seu pulso — pegar as comidas.

— Oh, O.k. — ela disse mas puxou seu pulso para se virar para o Joshua-imbecil e se despedir. Joshua sorriu calorosamente para ela e depois voltou seus olhos para mim como se estivesse me desafiando.

Decidi irritar o babaca e puxei Chi e coloquei meu braço na sua cintura, aproximei de sua orelha e sussurrei em seu ouvido.

— Vamos logo, senão não vou levar seus doces — percebi que Joshua cerrou seus punhos e sorri maliciosamente para ele.

Quem é o maioral agora, Joshua-babaca?

Virei para olhar para Chi que tinha uma expressão de estranhamento em seu rosto. Ela se virou e saiu andando em direção aos congelados, não antes de acenar para o imbecil.

Depois de fazermos a compra, discutimos por pelo menos cinco minutos para decidir quem ia pagar tudo. E como qualquer outra pessoa madura decidimos isso sabiamente.

No velho e bom “ímpar ou par”.

— ÍMPAR, EU GANHEI! — Chi exclamou.

— Então você paga.

— Mas eu ganhei!

— Exatamente, você ganhou a oportunidade de ser boazinha.

Ela revirou os olhos.

— Vamos mais uma vez, quem ganhar NÃO vai pagar as compras.

E mais uma vez perdi.

Bufei ao fechar minha carteira. Depois de colocar tudo no carro, Angeles cismou que queria tomar café. Paramos num StarBucks e tomamos café. Percebi que Angeles já havia restaurado seu humor e fiquei satisfeito com isso. Como... Se fosse uma missão cumprida.

Era bem engraçado, ver que depois de quase dois meses nós nos acostumamos um com o outro.

É claro que as brincadeiras sempre continuaram. Eu, ontem mesmo, troquei a canela que ela põe no chocolate quente por cominho. E ela, irritada, acabou mergulhando minha melhor camisa BRANCA em suco de uva. E na semana anterior a essa, escondi seus sapatos atrás da geladeira porque ela havia quebrado algumas molas da minha cama por ter pulado nela.

Ela demorou horas para achar o sapato.

E quando achou tentou acertá-los em mim. Essa parte não foi tão engraçada.

Chegamos nos dormitórios e como estávamos com preguiça decidimos assistir filmes na sala.

Discutimos porque eu queria ver “A laranja mecânica” e ela queria ver “Enrolados” que estava passando em outro canal.

Decidimos dessa vez no “pedra, papel ou tesoura” e ela ganhou.

Eu decidi continuar ali no sofá, porque era onde a comida se encontrava e porque eu não ligava de assistir desenho.

Até chegar nas horas da música.

E Chi começar a cantar.

— Sua mãaeeee sabe mais! — ela cantava enquanto colocava ursinhos Finni na sua boca.

E ela cantou todas as músicas.

— Brilha linda flor, teu poder venceu, traz de volta já, o que uma vez foi meu...

E também não podemos esquecer.

— Vejo enfim a luuuzz bilhar! Já passou o nevoeiro...

— Nunca mais eu vou assistir musicais com você — disse enquanto comia minhas bolachas.

Ela riu.

— Você não reclamou até agora. Posso até pensar que você gostou de me ouvir cantando.

Sim, ela tinha uma voz agradável.

— Isso não estaria errado.

— O que? — ela perguntou, como se estivesse chocada pelo que eu falei. E eu também me choquei. Desde quando eu saio por aí distribuindo elogios?

— Isso estaria COMPLETAMENTE errado. O que você pensou que eu tinha dito?

Ela fez um baixinho “Ah” como se ela estivesse envergonhada de ter pensado que eu a elogiei e voltou seus olhos para a tela enquanto tomava um gole de sua coca.

Fiquei quieto.

Eu precisava tomar cuidado, muito cuidado com o que eu falo para Angeles. Não posso deixar ela se aproximar demais. Se não, ela vai ser a única a se machucar.