Os Guardiões escrita por Mariane, Amanda Ferreira


Capítulo 47
A Salvação


Notas iniciais do capítulo

HOLA CHIQUITOS
COMO ESTAN?
NOSSA QUE SAUDADES DE VOCÊS, PARECE QUE JA PASSOU UM MILENIO, MAS EIS QUE ESTAMOS DE VOLTA
ESPERO QUE GOSTEM DO CP, AMAMOS VOCÊS :>



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***

A sensação de desespero me consumia como em um afogamento. Eu tentava lutar contra, mas cada vez que eu abria a boca tudo o que saia era um lufada de ar e confusão. Eu simplesmente não podia encarar os dois, a simples ideia de perdê-los fazia com que eu quisesse desistir. 

Eu queria desaparecer daquela encruzilhada, queria minha vida de volta, queria minha mãe afagando meus cabelos, queria Frederick gritando comigo, queria minha babá, meus brinquedos, Yve e Leninha, até mesmo a Kince Joyce.

Então eu senti uma voz reconfortante que eu não esperava nunca mais ouvir. 

— Katherine. - sua voz era tão diferente do que eu lembrava, e por mais que eu soubesse que era apenas mais uma miragem projetada por aquele inferno, à sensação de vê-la me acalmou um pouco mais. - Kate, você está tão diferente. 

Antes que eu me desse conta já estava chorando, chorando como eu não fazia há meses. Chorando tudo o que eu deveria ter chorado desde primeiro dia em que entrei naquele mundo. 

— Mamãe. - suspirei inaudível. - Mamãe... m

— Sim, sou eu meu amor. 

— Mas, mas você morreu.

— Eu sei. - ela sorriu.

— Então... O que você está fazendo aqui?

Olhei em volta e agora eu não me encontrava mais na clareira entre Lucas e Nicolas, estávamos no jardim de casa. Da minha antiga casa na Inglaterra.

— Você pediu sua vida de volta, então eu vim te dizer que não vale a pena meu amor. - ela estava exatamente como eu me lembrava. Pele clara e cabelos castanhos com um tom de ruivo.

— Mas eu era mais feliz. 

— Era? Você acredita mesmo nisso? Não me diga que você não ama seus pais, seu irmão? - perguntou docemente - Que não ama ele? Eles... 

— Mas eu amava você. - funguei.

— Mas eles precisam de você filha. Todos eles. - falou docemente sorrindo.

— Eu não posso escolher. Eu os amo igualmente. 

— Então não escolha. - disse simplesmente.

— Como? 

— Não escolhendo. - respondeu e então sua imagem tremeluziu. - Você não precisa escolher, siga seus instintos. - e então desapareceu, tudo desapareceu restando apenas Nicolas e Lucas me encarando na expectativa de uma resposta. 

— Ninguém. Eu não escolho ninguém. - respondi sinceramente para o céu.

Então tudo se deteriorou com um clarão, a luz foi tamanha que me vi caindo para trás. Tudo tremeu e um ruído horrível se estendeu durante uns minutos até que a escuridão tomou-me, olhei em volta tentando entender o que estava acontecendo. Eu não poderia ter morrido, não admitiria isso. Eu simplesmente não podia acreditar, mas uma pequena luz, tão minúscula que foi quase impossível ver surgiu e se aproximou. 

— Katherine você veio! - falou a vozinha de Faith 

 - O que está acontecendo? - perguntei sem entender absolutamente nada. 

— Você passou no seu teste final! - respondeu - Vou te levar até a adaga, mas devo-lhe avisar que a história da adaga é trágica e por onde ela passa leva muita dor. Você tem certeza que quer tirá-la daqui? 

— Eu preciso Faith, faz parte da minha missão. Eu preciso libertar meus amigos. 

— Ou você pode ficar comigo Kate, eu nunca tive uma amiga antes. Podíamos viver eternamente juntas, eu sei que você vai gostar. - sua voz ficando cada vez mais urgente - Podemos contar sobre nossas vidas, podemos cuidar de tudo, aqui você ficará segura para sempre. 

— Me desculpe Faith, eu não posso ficar. 

— Mas... - ela choramingou. - Eu não acredito! Depois de tudo o que eu fiz! Você vai me abandonar como ela? Eu... Eu... 

— Faith, por favor, você tem que entender! Eu não posso ficar. Está guerra está quase no fim. Eu sinto muito. 

Observar uma fada chorar é uma coisa que eu não recomendo a ninguém. O som é agonizante. Eu fiquei atônita por um tempo até que finalmente ela parou me encarou e desapareceu em um raio de luz. 

Senti-me triste por ela e fiz uma promessa a mim mesma: a tiraria dessa caverna.

Aonde eu me encontrava parecia muito com a caverna que entrei, era úmida, oca e escorregadia. Tentei entender mais uma vez o que estava acontecendo, sem muito sucesso. Então resolvi apenas andar até achar uma pista. Depois de três minutos avistei uma claridade. 

O lugar era quase idêntico ao templo pelo lado de fora, todo branco e lindo, coberto de ouro e pedras preciosas por todos os lados, desenhos de planetas, da lua, sol e estrelas, um desenho lindo de Kira estava no centro, seus olhos faiscando uma vivacidade que eu nunca havia visto nem mesmo em meus mais realistas sonhos. Na sua frente estava um baú de madeira maciça, era tão simples quanto uma caixa de charutos que Frederick comprava às vezes. 

Eu podia sentir algo dentro dele, algo perigoso e tão poderoso que só poderia ser a adaga. Cada vez que eu chegava mais perto eu sentia um estranho formigamento crescer em meu corpo e quando eu estava frente a frente da caixa, um medo me acorrentou ao chão. E se Faith estivesse certa? E se quando eu a tirasse dali algo muito pior acontecesse? 

Depois de tanta tragédia eu realmente queria libertar mais coisas piores? Eu sabia a resposta. Eu sabia do meu dever. Mas será que valia a pena arriscar tanto, por isso? Será? 

Então com um ímpeto de coragem, respirando fundo eu tirei a caixa do altar e fechei meus olhos rezando para que Kira me protegesse, para que minha mãe me protegesse, para que protegessem todos os que eu amava, porque eu precisava levar aquela adaga. Eu precisava salvar o meu povo. Os meus amigos. A minha família. 

 E quando eu abri novamente meus olhos eu estava no templo real de Kira, do lado de fora daquele mundo imprevisível tão distante da realidade.

Em alguns metros de mim, Nicolas gemia de dor, com as roupas ensanguentadas e o rosto pálido como o mármore ao redor.  Corri na sua direção deixando a caixa ao seu lado e pegando sua cabeça colocando-a em meu colo.

— Nick? – chamei, mas ele parecia inconsciente.

Tentei pensar no que poderia fazer para tira-lo dali. Ele estava morrendo.

Fiquei aflita e de repente a caixa começou a tremer forçando a abertura. Por um momento me contive a abrir, mas levei a mão abrindo-a e uma luz sufocante saiu me cegando. Quando finalmente cessou uma adaga prateada com detalhes do que me pareciam diamante tremeluzia no fundo da caixa.

Peguei receosa e na lateral algo estava escrito em latim e como um milagre eu consegui deduzir.

“O poder de tirar a escuridão e de trazer a vida de volta”.

De principio não entendi, mas logo uma ideia maluca passou pela minha cabeça e encarei Nicolas inconsciente.

Coloquei a cabeça no seu peito e não ouvi. Ele não tinha batimentos, talvez...

Respirei fundo e posicionei a adaga, fechei os olhos temendo ter interpretado errado e sem pudor enfiei-a em seu peito. Nada aconteceu e temi tê-lo matado de vez, mas ele abriu os olhos em rompante e eu tirei a adaga. Ele respirou profundamente e quase deu um pulo ficando sentado.

— Kate?

***

Corri desesperada com medo de ser tarde demais. Não pude pegar o Bruno de volta, agora ele pertencia aos lobos, mas eu não.

Voltei pelo mesmo caminho que a matilha me obrigou a seguir e deixar Lucas para morrer. Quando parei me deparando com seu corpo inerte e uma poça de sangue ao redor por entre as folhas, senti que me coração estava partido.

Encolhi-me transformando-me em humana novamente.

— Lucas? – rasguei um pedaço de minha blusa e amarrei na ferida do seu pescoço. – Por favor...

Procurei por mais machucados e aparentemente não tinha nada. Seu corpo nu não me surpreendeu naquele momento, minha mente só funcionava achando que eu o havia perdido para sempre.

Por mais zangada que eu estivesse com ele, perde-lo não estava na minha lista.

— Por favor, não faz isso comigo. Por favor.

O pânico que crescia no meu peito era desesperador. Eu não podia perdê-lo, eu não poderia suportar aquela dor, depois de tudo ele simplesmente não poderia me deixar.

Eu não sabia o que fazer, me sentia tão perdida quanto da primeira vez que estivemos naquela situação. Eu não tinha a menor ideia do que fazer. Óbvio que com os anos de convívio na matilha eu entendia como curar feridas normais, mas feridas de alfas eram muito mais difíceis e naquele meu estado eu não conseguia lembrar nada que pudesse ajudar no processo de cura. 

O medo de perdê-lo então começou a ser substituído por uma impotência crescente. O que eu faria? Pensa Eliza! Para quem eu ligaria? Da onde? Então me lembrei que Lucas sempre andava com um telefone e a única pessoa naquele momento que eu tinha certeza que viria era sua irmã. Maggie. 

***

Depois do incêndio tudo em Ilheias se tornou um caos, os guardiões reforçaram as barreiras, estipularam um toque de recolher e todos estavam em constate vigilância. O problema parecia apenas crescer cada dia mais, alguns ataques aleatórios aconteciam por volta da madrugada, mas ninguém era responsabilizado. Por mais que eu tentasse saber de algo, sempre dava com a cara na porta.

— Oi. - falou Helen. Desde o dia fatídico em que Nick me ligou, ela estava morando conosco.

Se você não se lembra, a Helen é a amiga humana da Kate e eu agora sou baba dela enquanto a outra Yvana foi transformada em vampira e estava com Alex. Tive de ficar com a humana, pois com certeza os vampiros a caçariam.

Enfim. Meu pai quando soube teve uma crise existencial como eu nunca tinha visto. Nem mesmo quando Lucas se transformou. Mamãe por outro lado tentava de toda forma acolher a garota como se ela fosse sua filha e não eu. 

No início eu quase me incomodei com toda aquela situação, enquanto Nick e Kate estavam em perigo lá fora, eu tinha que bancar a babá de uma garota de dezoito anos que passava a madrugada inteira chorando e o dia todo reclamando, às vezes minha única vontade era de enterrá-la viva. 

Mas com o passar das semanas eu percebi que tudo o que ela precisava era conversar. Com tantas coisas que estavam acontecendo, o conselho agitado, meu irmão sem notícias, Lucas desaparecido, meu pai cada vez mais arisco, eu nem me dei ao trabalho de entender o que estava acontecendo com Helen. 

Então, em uma noite em que voltei do treino a encontrei sentada no sofá encantando a lareira como sempre fazia, pensei em passar direto e só ir para o meu quarto como o costume, mas então eu simplesmente me sentei ao seu lado. 

— Eu nem lembrava que tinha essa blusa. - comentei aleatoriamente. Eu nunca tinha sido boa de puxar conversas, mas se eu não dissesse nada, ela também não diria. 

— Me desculpe por tudo Margareth...

— Maggie. - a corrigi.

— Sei que deve ser muito chato para você. - continuou. - Maggie.

— Imagina. - menti. 

Ela me encarou como se pudesse ler minha expressão e suspirou. 

— É só que eu não consigo absorver, eu sei que já tem uma semana que estou aqui, mas parece tão surreal. - gemeu. 

Então eu lembrei que ninguém ao menos tinha explicado a ela o que éramos todos nós. Ela deveria estar tão perdida que eu quase me senti culpada. 

— Alguém chegou a explicar o que somos? 

— Eu me lembro de algumas coisas que a Kate disse, meio por alto. 

— Hmmm e você quer saber? 

— Eu poderia? – perguntou.

Então depois daquele dia eu expliquei como funcionávamos, nossa origem e nossas funções. Helen parou de ficar tão alienada e passou até a se interessar pela nossa cultura, eu a autorizei a visitar a biblioteca pública. Quando nossa biblioteca não era mais o suficiente, ela estava cada dia mais curiosa e fazia perguntas muito interessantes, às vezes ficávamos madrugadas inteiras conversando sobre poderes, até que eu comecei a levá-la a treinos e sua fascinação só crescia.

Em um deles Daniel Mozart nos cercou me fuzilando como se eu fosse uma doente.

— É ela Margareth? – me perguntou encarando Helen.

— O que? – perguntei olhando-o irritada.

— A amiga da Kate. – respondeu. – Ouvi a conversa do seu pai com o meu.

Encarei seus olhos verdes. Esse garoto tinha a mania de ficar me olhando com esses olhos como se quisesse algo de mim, mas dessa vez ele apenas me olhava impaciente.

— Sim. – não tinha como mentir. – Helen este é o Daniel, irmão da Kate.

— Irmão? - ela me olhou curiosa.

— Daniel Mozart. – ele estendeu a mão e sorriu.

— Uau! – ela falou sorrindo de volta e eu revirei os olhos. - Helen ou Leninha.

— Talvez devesse ficar conosco, já que nós somos parentes da Kate. Minha família ficaria muito feliz. – ele falou olhando de relance para mim.

— Sem chance. – falei ríspida. – A baixinha ai é minha responsabilidade.

— Você é só amiga da minha irmã.

— Sem chance Daniel. – repeti encarando.

— Ok. – ele assentiu. – Se tiver noticias da Kate, por favor, me fale.

— Certo. - concordei.

— Foi um prazer Leninha. - ele disse se virando - Até mais Maggie.

Quando ele se afastou, Helen se virou para mim boquiaberta.

— Ele é um gato. – resmungou.

— Puf!

Os dias se seguiram e comecei a ficar irritada sem saber de noticias do Nicolas e quando finalmente ele atendeu ao telefone não senti nenhuma firmeza em sua voz e Helen que preferia ser chamada de Leninha ficava grudada em mim sempre atenta quando eu manipulava a terra.

Até que um dia ela me surpreendeu com uma pergunta inesperada. 

— Eu poderia me transformar em uma de vocês? 

Naquela hora estávamos no meu quarto dividindo o jantar. Meu pai tinha ficado mais uma noite no conselho em reunião enquanto minha mãe zanzava pela casa de curiosidade. Às vezes eu não entendia como o casamento dos meus pais funcionavam com tantas divergências, mas ignorava os fatos. 

— Por que você quer saber isso? - perguntei hesitante.

— Eu li umas coisas interessantes que há como replicar com o que aconteceu aos guardiões originais... E... - gaguejou - Depois de tanto tempo com vocês, queria saber se... 

— Ah. - respondi - É que... Eu não recomendaria a cerimônia. 

— Como assim? 

— Meu pai uma vez comentou sobre isso, ele disse que ninguém nunca sobreviveu e que então foram proibidas as transformações de mortais. - sussurrei.

Não era mentira, mas também não era verdade. Em tese a hipótese chegou a ser cogitada, transformar mortais em guardiões chegou a ter até uma pauta no conselho, mas depois de tantos protestos dos restante dos guardiões o conselho esqueceu-se da ideia. 

— Entendo. - respondeu voltando a comer. Eu tentei puxar conversa com outros assuntos, mas depois de um tempo entendi que ela não queria falar nada. 

Assim que me deitei meu telefone vibrou desesperadamente e eu olhei o visor e meu coração parou uma batida.

— Lucas? – atendi sentando na cama imediatamente.

— Maggie? – uma voz feminina respondeu.

— Quem é? – perguntei.

Ela ficou muda por um instante, mas sua respiração pesada a denunciava.

— Eliza. - respondeu por fim.

— Eliza? O que...

— O Lucas está com problemas. Eu não sei o que fazer... – ela suspirou como se estivesse chorando. – A matilha o considerou um traidor por... Por se envolver com a Katherine.

— Onde ele esta? – há essa hora Leninha já me olhava curiosa de sua cama.

— Ele está morrendo. – ela de fato estava chorando. – Você... Você precisa vir.

Fiquei sem reação e senti meus olhos pesados, me pus de pé num instante.

— Me manda as coordenadas Eliza. – falei com firmeza.

— Você vira?

— Estou indo. – suspirei. – Não deixe o meu irmão morrer.

***

 - Nick? Aí minha santa deusa! - murmurei entre lágrimas. Eu não consegui entender porque estava reagindo assim, eu simplesmente estava tão assustada que eu não parava de chorar desde que ele disse meu nome. Meu peito ardia de felicidade. 

Ele continuava a me encarar confuso enquanto eu secava as lágrimas freneticamente e tentava aquietar meu corpo que estava em total transtorno. Com tantas emoções na caverna com Faith e afins eu não tinha percebido o quanto estava esgotada física e psicologicamente. 

A dor se estendia muito mais do que mil treinos juntos, eu só queria poder dizer que agora eu teria paz para me recuperar, mas nem isso era uma certeza. A luta mau tinha começado e eu não conseguia lidar com nada. 

Quando finalmente parei de chorar Nicolas se aproximou me encarando. 

— Você não sabe a angústia que foi não ter você perto de mim. - falou tão tranquilamente que me derreteu completamente. 

Continuamos a encarar um ao outro como se uma barreira estivesse nos separando. Eu podia sentir a sua respiração em meu rosto, podia sentir o calor do seu corpo, mas para mim era muito esforço mexer se quer um músculo e pude ver que por mais que ele quisesse muito, também não estava em uma situação diferente. 

— Temos que ir embora daqui. 

— Sim. - respondi, mas não nos mexemos. 

— Você está tão diferente. - ele falou levantando primeiro. Ao se por de pé, notei que ele mancou além de fazer uma severa careta de dor. Por mais que a adaga o tenha trazido a vida, suas feridas ainda estavam graves. Ele estendeu a mão e com força me puxou fazendo com que eu ficasse em pé junto a ele. Depois de me encarar mais um segundo ele se abaixou delicadamente e pegou a caixa colocando a adaga que eu permanecia apertando muito mais forte que deveria. 

Foi quando eu pude absorver minha própria situação. Cada músculo do meu corpo doía como se estivessem se fundindo. Meus olhos ardiam e minha cabeça latejava como nunca na minha vida. Eu podia sentir minha coluna ardendo, minha pele estava coberta de hematomas, meu cabelo estava grudado em todas as partes, minha roupa permanecia poluída e pinicando. 

Eu precisava me recompor, mas nem estava conseguindo andar. Tentei respirar fundo e concentrar o pouco das forças que ainda me restavam e dei o primeiro passo me esforçando muito para não transparecer a dor que estava me causando. 

Não nos falamos o caminho inteiro. Quando saímos da montanha eu só queria desabar. O peso daquela missão parecia não ter fim e quando pegamos o táxi me deixei levar pelo cansaço. 

Acordei no quarto do hotel, por uma fracção de segundos imaginei que ainda estava na caverna e um tremor passou pelo meu corpo. Mas então eu olhei melhor e a sensação passou. Com muito cuidado me sentei e olhei em volta. O hotel era o mesmo. A cama estava quente e o chuveiro ligado. Nicolas deveria ter acordado não muito antes que eu. 

Durante uns minutos me senti culpada por ter dormido e tê-lo feito me carregar até a cama, mas então ele abriu a porta. Sua calça estava caída, o cabelo molhado cobria completamente o rosto, a cabeça estava abaixada e ele afivelava o cinto. 

Agarrei o lençol levemente incomodada. Meu coração estava disparando e eu quase me senti mal, estávamos no meio da missão, depois de tudo o que passei, todos os perigos, o simples fato de ver Nicolas causava aquela sensação de calor em mim. 

Como se estivesse sentindo que eu o encarava ele se virou repentinamente e me olhou. 

— Oi. - falou - Como está se sentindo? 

— Tonta. - respondi. Eu não gostava de me sentir fraca, depois de tantos meses ouvindo insultos dele, tantas reclamações de ser fraca e imatura, o medo de fracassar e decepcionar ainda me rodeava. 

— Você passou por muitas coisas, coisas que eu nem imagino. Acredito que mereça descansar. - respondeu. - Tome um banho, vou comprar comida enquanto isso. Não precisa se preocupar comigo - adiantou-se quando me viu abrindo a boca - Já me sinto melhor. 

Sorri meio torto e levantei. A dor que antes parecia grande triplicou. Tentei me manter equilibrada até chegar no banheiro. Assim que fechei a porta desabei no chão. Minhas pernas pareciam macarrão. Demorei mais de quinze minutos para levantar e me encarar no espelho. Eu estava com manchas por todo o rosto, pescoço, braços e pernas e quando tirei o restante da roupa achei ainda mais manchas. Meu ossos estavam quase transparentes sob a pele. 

Durante o banho lembrei de minha estadia no templo de Kira, o medo constante, a saudade de casa. Aquilo parecia um furacão na minha cabeça. 

Quando desliguei o chuveiro sentei na tampa da privada fechada e respirei fundo. Não percebi o quanto eu tinha me desligado até Nicolas bater na porta e falar. 

— Oi Kate, desculpa, mas eu trouxe a comida... - falou com a voz estranhamente baixa. 

— Hm, tudo bem. - respondi e me vesti apressadamente. 

Comemos em silêncio, Nicolas estava estranho, eu estava estranha, tudo estava com um clima pesado e por mais que eu me sentisse mal por não conversarmos, fiquei feliz por estarmos em silêncio. A comida não era nada demais, eram um conjunto de sanduíches, uma pizza, refrigerantes e pratinhos de salsa de frango. 

— Desculpa, sei que isso não é uma refeição, mas é o que achei. 

 - Sem problemas. - respondi sem tirar os olhos da comida. Eu estava com uma fome terrível, parecia que tudo o que eu tinha consumido no templo tinha virado ar no meu estômago.

— Quando partiremos? - me senti obrigada a perguntar 

— Amanhã a noite. - respondeu e então depois de um segundo mordendo o lábios ele falou pesadamente. - Kate eu não sei o que aconteceu no templo, eu sei que o que você passou deve ter sido pesado e que você quer um tempo para pensar, mas esse silêncio todo está me deixando maluco, eu fiquei preocupado e não consigo parar de pensar em mil e uma barbaridades que você passou e não está ajudando... 

— Nicolas. - interrompi.

— Sim?

— O que você quer saber? 

— Está tudo bem? - perguntou com os olhos tão sinceros que toda a dor, o cansaço, o estresse e mal humor que cresciam dentro de mim evaporou. 

— Não. - respondi. Ele aproximou-se e colocou os dedos delicadamente nas minhas bochechas. - Você quer falar sobre o que aconteceu lá? 

Neguei com a cabeça e levantei, ele se afastou com o rosto magoado e então o puxei para a cama onde sentamos juntos. 

— Você está com muitas olheiras. - comentei tentando sorrir - Faz mal para a pele não dormir direito, acho que nem todo o pepino do mundo pode acabar com essas olheiras, 

Ele sorriu e deu de ombros. 

— Então vamos treinar essa teoria de dormir querida, porque assim, você não está nem um pouquinho diferente de mim. - acusou e eu não duvidava nada. Seguindo seu conselho me acomodei na cama e dois segundos depois ele me abraçou enterrando o rosto em meu pescoço em silêncio. 

Não demorou para que eu caísse no sono. Em meus sonho eu estava presa em uma jaula gritando por socorro. Nicolas estava sendo espancado por homens de capas na minha frente, eu chorava por ajuda, mas tudo o que eu ouvia eram risadas. Por mais que eu tentasse acordar eu não conseguia, parecia uma daquelas situações em que eu não podia escapar, então o sonho mudou. 

Eu estava sozinha e Kira estava na minha frente com os olhos arregalados, a voz apreensiva. 

— Kate meu amor, temos pouco tempo! Você e Nicolas devem ir embora antes Kora saiba que você conseguiu a adaga e não medirá esforços para te impedir de derrotá-la. 

E dizendo isso ela simplesmente evaporou. 

Acordei expirando com o pulmão em chamas. Olhei para o relógio ao lado, ainda eram cinco da manhã, Nicolas permanecia dormindo, estávamos abraçados, mas dessa vez eu não estranhei. Pela primeira vez desde que havia voltado do templo eu me senti segura, queria permanecer assim pelo resto da minha vida e então eu virei para olhá-lo. Queria absorver aquela tranquilidade o máximo que pudesse. 

E novamente, como se pudesse me sentir olhá-lo, ele acordou. Seus olhos estavam tão escuros a pouca luz, tão diferente do azul cobalto brilhante de antes que ele quase parecia uma outra pessoa. 

— Porque você está acordada? - perguntou com a mão em meu rosto.  - O que houve?Está tudo bem?

Assenti, mas ele continuou me encarando preocupado. 

— É normal estar tão preocupada? - perguntei.

— Você seria louca se não estivesse. - falou e eu pude sentir um peso me esmagando. - Você quer me contar algo Kate? Já te disse que eu estou aqui para ouvir. 

Então eu contei detalhadamente cada minuto que estive no templo de Kira. Ele não me interrompeu, não mudou de expressão, não fez sequer um movimento, apenas me ouviu e quando eu terminei parecia que uma tonelada haviam sido tirada do meu peito. 

— Eu acho você incrível, sabia? - falou - Desde o primeiro dia que eu te vi na Kince joyce. 

Franzi as sobrancelhas e ele sorriu. 

— Você me detestava que eu sei. - falei tentando não sorrir.

— Você tem que entender que eu não sou o monstro que você criou. - respondeu revirando os olhos - Eu gostava de você, do seu jeito marrento, cheia de atitude e convicção. Eu respeitava você. Eu sempre respeitei você por isso. 

— Não parecia. 

Ele sorriu. 

— Só porque eu não podia confiar em você logo de cara e ainda tinha a história... - ele não continuou, mas eu sabia que ele ia falar Lucas. - Eu precisava ter certeza que você era o que eu precisava que você fosse. 

— E aí? Consegui supri as expectativas?

— Você ultrapassou. - respondeu. - Você sempre me surpreende Katherine. E é o que eu mais amo em você. 

Fiquei um segundo processando aquelas declarações sem entender como tinham começado. Não sabia o que dizer, apenas sentir.

Aproximei-me beijando seus lábios. O calor do seu beijo me deixou mais feliz e a sensação de proteção só aumentou. Ele me abraçou puxando-me para mais perto. Nosso beijo se tornou urgente, como se aquilo fosse umUP! para recomeçar. E quando precisamos de ar, ele me afastou delicadamente beijando minha testa.

Eu pensei em falar alguma coisa, mas vi que ele estava sonolento e eu também, então tudo que fiz foi deitar minha cabeça no seu peito e ali mesmo eu dormi. 


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Notas finais do capítulo

então gente? o que vocês acharam, deixem um comentário e façam duas leitoras felizes.
muito obrigada por ler até aqui.
amamos vocês :>



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