Eu não conseguia entender o motivo dele estar bem ali. Parecia que ele não era mais meu irmão, parecia outra pessoa. Seus olhos castanhos pareciam querer dizer-me que ele era um garoto-perdido, mas eu não acreditava. Rafael nunca faria isso, ele não seria tão burro a ponto de se tornar “servente de Pan”, aliais ele já pareceu burro o suficiente de ter vindo aqui. O que será que passou em sua mente ao vir para cá? Será que ele queria se tornar meu irmão herói?

– Rafael, o que faz aqui? – Perguntei quebrando o silêncio. Quis chegar perto dele, porém Gancho não deixou.

– Você deve vir conosco – Ele disse sem olhar nos meus olhos. Engoli seco, eu não podia acreditar nisso. Ele havia realmente mudado.

– Rafael! Pense no que está dizendo! Peter Pan não é uma boa pessoa! – Alertei querendo avançar mais.

– E por acaso Hook também é? – Ele retrucou e riu. Eu gostaria de chorar naquele momento, eu não conseguia acreditar que Rafael esteja fazendo isso.

– Rafael, você é meu irmão, tem que ficar comigo – Disse. Ele arqueou a sobrancelha e riu mais ainda.

– Não sou mais seu irmão – Meu coração pareceu se partir quando ele terminou aquela frase. As lágrimas começaram a querer descer, mas respirei fundo. Eu tinha que lutar por ele.

– É sim e sempre vai ser! Agora venha aqui agora! – Ordenei irritada e ele negou.

Que garoto teimoso, pensei.

– Queira fazer do modo fácil, ou seus amigos imundos vão sofrer – Ele ameaçou e os Piratas pigarrearam com raiva. Mas era a minha vez de negar com a cabeça.

– Proponho um duelo com o melhor de vocês, quem ganhar fica com meu irmão – Disse convicta. Todos os meninos que eram uns 4 no máximo sorriram.

– Está bem, hoje a noite teremos uma luta! – Rafael gritou entusiasmado. – Se perder, você vem conosco.

Assenti para ele. A pior parte foi quando ele saiu e entrou em um barquinho junto aos garotos e navegaram para a praia. Depois eu o vi acenar para mim e desaparecer na floresta. Ele havia amadurecido, com certeza.

Notei que os Piratas não sabiam o que dizer diante do que havia acontecido. Pareciam tão perdidos como eu. E então quando alguns minutos se passaram eles gritaram comemorando. Vieram me parabenizar por ter sido corajosa para uma menina e disseram que nunca viram alguém como eu desafiar Peter Pan – ao não ser Gancho.

Mas minha cabeça só conseguia pensar na luta e no que aconteceria depois… O que eu falaria para Mamãe e Papai se eu perdesse? Estava em jogo a vida de meu irmão, aliais e se eu não conseguisse voltar para casa? Eu estaria sendo fraca o bastante para deixar Peter Pan ganhar e assumir que tanto eu quanto meu irmão não voltaríamos para casa?!

Havia me sentado bem ali enquanto via os Piratas conversarem entre si sobre como era corajosa e outras coisas. Estava tão confusa sobre o que Rafael falou sobre os Piratas, ele acreditava que eles eram os vilões, mas Gancho/Hook parecia ser confiável. E eu acreditava nas palavras do Capitão.

– Você é mais durona do que eu pensava - Hook veio me falar se sentando ao meu lado.

– Não o bastante – Disse baixo pensando em Rafael e vendo os Piratas voltarem aos seus trabalhos. Já anoitecia, e eu só pensava em quem poderia lutar comigo.

– Vai ganhar, não precisa se preocupar – Hook tentou me confortar e então tirou uma garrafa do seu bolso. – Quer?

– Não, obrigada – Neguei com a cabeça e o vi tomar todo aquele líquido.

– Vai ser uma luta em tanto. – Comentou com o cheiro de álcool saindo de seus lábios.

– Como assim? – Perguntei curiosa. Ele sabia com quem iria lutar?

– Você ainda não sabe? – Ele quis saber e eu neguei. – Peter Pan é o melhor lutador dos meninos.

– Peter Pan?! – Gritei indignada. – Eu pedi que pegassem um Garoto-Perdido!

– E Peter Pan não é? – Lembrou. Bufei irritada e me levantei sendo acompanhada de Hook.

– Eu pretendia lutar com um Garoto-Perdido qualquer, não com o que ensinou a eles a se combater – Me defendi e Hook riu um pouco.

– Ele vai tentar intimida-la – O Pirata avisou. - Não recue muito, ele vai entender que é ele quem está ganhando mas funcionaria para engana-lo.

– Parece que lutou com ele bastante vezes – Comentei me lembrando da história do mocinho e do Capitão vingativo.

– É…Mas ele não me intimidava – Hook alertou e eu ri.

– Quer me contar algo com que eu possa me zangar dele? – Perguntei.

– Ele “roubou” seu irmão – Hook começou - Ele já trouxe uma garota para cá que leva o nome Thalia, ele não a tratou muito bem e acho que deve vinga-la.

– Ela morreu? – Perguntei arregalando os olhos. Como esse universo é quase diferente, não tenho o conhecimento exato para saber que Thalia pode ter morrido.

– Não, ela já deve estar adulta agora – Hook respondeu olhando para o céu como em quase dúvida.

Eu comecei a sentir esperança, se Thalia havia conseguido “escapar”, eu também iria conseguir, mas acho que ela não tinha tantos problemas como os meus. Entretanto, eu só começava a me sentir mais confusa, era tanta coisa nova para minha cabeça, era tantas histórias e tanta maldade que eu começara a sentir falta dos conselhos de minha mãe e meu pai. Eles devem estar tão preocupados, devem se sentir tão perdidos. Como sinto falta deles. Eu gostaria tanto de poder abraça-los, gostaria tanto de sair desse lugar, eu quero voltar para casa. Na verdade, vou voltar! Vou ganhar essa luta, trazer Rafael para mim e buscar um jeito de sair desse lugar.

– Eu vou ganhar – Sussurrei para mim mesma vendo a lua emergir e as estrelas aparecerem – Peter Pan mexeu com a garota errada.

– Não tenho dúvidas – A voz não foi de Gancho. Quando olhei para trás eu vi Peter Pan que estava diante de mim exibindo um sorriso de canto. – Então é você a garota com quem vou lutar?

– É sim – Hook respondeu por mim – Espero que esteja preparado para perder.

Peter arregalou os olhos como se estivesse preocupado. O garoto tinha olhos indecifráveis, como um misto de azul e verde, tinha lábios maliciosos, cabelo perfeitamente arrumado e roupas verdes. Ele parecia com o Peter dos contos só que muito mais realista e mais bonito.

– Então vamos logo com isso – Peter vociferou impaciente. – Tenho muita coisa para fazer.

Pode parecer como o Peter dos contos, mas sempre vai parecer egoísta e chato de se lidar. Disso eu havia percebido só com alguns segundos perto dele.

Caminhamos até o centro do barco onde todos nos aguardavam, inclusive Rafael. Fiz um olhar acolhedor para ele, mas o mesmo bufou e olhou para baixo. Eu não conseguia pensar em como ele começou a agir assim comigo, parecia que havia sido manipulado e se tornado alguém muito pior do que ele jamais seria. Eu sempre achei que ele seria forte o suficiente para aguentar tudo isso, ele é um garoto inteligente e muito determinado, admito que seja mais corajoso do que eu quando a Sombra apareceu em meu quarto. Eu gostaria de poder acordar nesse momento, meus sonhos haviam se tornado pesadelos quando eu o vi subir ao Navio Pirata. Mas de algo eu havia certeza: Eu iria conseguir recupera-lo, iria traze-lo de volta, e voltaríamos para casa como nos finais felizes de filmes ou contos.

Hook me deu sua espada e jogou no chão uma outra destinada a ser de Pan, que a pegou e exibiu um sorriso como se não importasse. Eu podia ver como era a rixa dos dois perfeitamente. Isso nunca iria mudar com certeza.

– Está preparada boneca? – Peter formou um sorriso malicioso. Ele não me intimidaria, tanto é que não o respondi. Podia ouvir a alegria de Rafael ao ver isso e o som dos meninos pedindo para começar.

Então, inesperadamente comecei a ataca-lo, sempre mirando em seu peito. Peter se defendia rapidamente como se pudesse ler minhas táticas de esgrima. Quando havia dado um passo para trás para me recuperar, ele começou a me atacar. Eu podia ver que ele não exercia força nenhuma, e se quisesse ganhar já o teria feito.

– Você é uma ótima competidora – Ele comentou sorrindo novamente. Aproveitei o momento para inserir um corte em seu braço. Ele recuou e olhou para o corte e depois para mim. Ele não pareceu irritado como eu queria que estivesse.

E então mãos frias me pegam inesperadamente fazendo com que meu coração acelerasse mais do que o normal. Era a sombra novamente! Ela me puxou para cima e me prendeu ali mesmo naquela altura. Era uma armadilha?! Eu podia ver os Piratas combaterem com os garotos. Peter Pan havia conseguido nos manipulado. E pensar que tudo ia muito bem, que até Gancho havia deixado fazermos a luta em seu Navio, tudo isso havia sido em vão?

– Ainda não acabou boneca – Eu vejo Peter subir as cordas que ligam as velas (As “Cortinas” que são usadas para o barco andar). A sombra me levou até em cima onde tinha a espécie de corrimão e me deixou em pé, tentei golpeá-la mas meu punho passou por ela.

Eu já deveria ter imaginado, pensei irritada.

Avistei Peter Pan ainda subindo agilmente as cordas. Por que será que ele não voava?

Aproveitei enquanto ele parecia longe o bastante e comecei a cortar as cordas. Porém a Sombra interferiu novamente e fez com que minha espada caísse.

Se eu deixasse que Pan me atingisse e ganhasse eu perderia Rafael. Coloquei meu cabelo atrás da orelha e quando ele chegou até onde estava eu o empurrei sem mais delongas. Porém ele havia me puxado contra ele e nós dois caímos contra a água do mar.

Eu senti a água gelada e alguma coisa me tocar, quando pensei que fosse Peter eu abri os olhos em meio a escuridão do mar e vi algo estranho se mover ao meu lado.

Meu corpo se arrepiou e voltei para cima inalando o ar. Deixei que meus olhos varressem o local em busca de Peter ou aquela coisa misteriosa. Foi fácil encontra-lo, ele estava nadando a caminho dá praia sendo perseguido por algo com uma imensa cauda. Arregalei os olhos ao ver a criatura emergir e pular em cima dele, os dois haviam sumido de vista.

Comecei a nadar até o barco em busca de alguma corda para poder escalar e sair da água. Quando não achei mais nada, meu corpo pareceu pesar e então me escorei e segurei em uma alça do Navio. Estava perdida e indefesa. Ouvia o som das espadas se baterem contra si. Só espero que Rafael esteja bem. Rafael!

– Rafael! Socorro! Por favor! Me ajuda! – Tentei chama-lo. Ele deveria ser o único que não lutava, os Piratas não bateriam em meu irmão. Ele havia aparecido.

– Curtindo a vista? – Ele perguntou.

– Rafael! Por favor, eu sou sua irmã! – Lhe disse com as lágrimas nos olhos. – Eu te Amo!

Ele piscou repetidas vezes e engoliu seco.

– Helena?! O que faz aí? – Ele perguntou e olhou ao redor. – Onde estamos?!

– Jogue a corda para mim – Disse com alegria. Eu consegui traze-lo de volta. Não têm nada que possa me deixar mais feliz do que isso.

– Ok! – Ele jogou uma escada feita de cordas. Comecei a subir e parei ao ouvir um grito. Olhei para trás e não era nada, e então quando dei um passo determinada a subir novamente algo agarra meu pé direito com força e me puxa para a água.

– Helena! – Rafael gritou. Agarrei a corda e tentei chutar aquela coisa. Quando consegui inserir um chute sem ter que olhar para baixo, comecei a subir rapidamente a corda.

Quando cheguei a parte de cima, eles ainda lutavam bravamente. Sendo que alguns Piratas já pareciam ter a situação em controle, alguns garotos perdidos ainda lutavam tentando soltar os que Smih amarrava.

Senti o abraço de Rafael contra meu corpo e eu revidei amassando e beijando suas grandes bochechas!

Hook veio me parabenizar pelo meu feito em ter ganhado de Pan. Alguns Garotos-Perdidos haviam conseguido fugir enquanto o resto estava sendo amarrado por Smih e eu me peguei pensando se Pan havia conseguido se salvar, mas isso não importa nesse momento. Eu havia conseguido trazer meu irmão de volta.