No dia seguinte acordo mais cedo do que o necessário para evitar encontros desnecessários, coloco uma blusa branca com o desenho de uma guitarra preta com caveira, minha jaqueta de couro favorita que esquenta até em dia de neve, calça jeans preta de aparência surrada e all star preto de cano longo, não me preocupo com meu cabelo e muito menos passo maquiagem, simplesmente saio de meu quarto esperando que os pais de Matt tenham se afogado em sua própria saliva enquanto dormiam ou que tenham tropeçado em algo indo ao banheiro, batido a cabeça no espelho e um pedaço especialmente grande e afiado se finque em seus crânios e vá até o cérebro, sei que é esperar de mais, mas a esperança é a última que morre, certamente os pais de Matt irão morrer antes da minha esperança...
Objetivo alcançado, não a morte do casal, isso ainda não confirmei, mas consegui tomar café da manhã em paz, sem ninguém por perto, depois de pegar algum dinheiro e tesouras, saio para a escola a pé. O tempo frio e com neblina deixava tudo muito interessante, vultos de árvores secas davam a impressão de lugar mal assombrado ou de cena de crime, sorri imaginando possíveis crimes nesse local.
Não percebo quando chego à escola, percebo apenas quando esbarro em alguém, olho para cima, é a tal garota do escravo, ela me lança um olhar irritado que logo se ilumina com familiaridade:
–-Ora, ora, você teve a ousadia de esbarrar em mim, se ajoelhe e peça desculpas! diz ela com voz arrogante.
Ignoro-a e passo reto até ser barrada por seu escravo:
–-A Senhorita Hannah pediu que você se ajoelhasse e pedisse desculpas. diz ele com seu tom de voz automático impedindo minha passagem.
Suspiro, por que pessoas desse tipo sempre se acham no topo de tudo?
–-Tenho cara de quem irá fazer o que a senhorita Hannah diz? digo em deboche.
–-Ajoelhe-se e peça desculpas.
–-Preciso me desinfetar, toquei em algo extremamente nojento! digo espanando o local em que toquei na garota, vejo um brilho vermelho de raiva passar por seus olhos.
–-Algo nojento é? Essa é segunda vezem que me desafia, teremos contas a acertar no almoço! diz ela num tom de voz que suponho que deveria ser sombrio, é impressão minha ou ela está me ameaçando? Suspiro novamente, pelo menos hoje irei ter alguém para brincar um pouco...
Dou de ombros e o escravo dela me dá passagem após um aceno de cabeça vinda de sua mestra, me dirijo para minha sala de aula e na porta já encontro um certo ruivo com orelhas de cachorro, uma coleira com Ted escrito e um osso falso em sua boca:
–-Au au! me recepciona ele.
Faço careta, me enganei, eu já passei por um sanatório sim, aliás, estou nele...
–-O que pensa que está fazendo? digo me referindo ao fato de ele estar tentando me abraçar, teria conseguido se eu não estivesse com minha perna estendida em seu estômago.
Logo ele desiste de me abraçar e me olha sorrindo:
–--Falei com minha mãe! Agora teremos todas as aulas juntos e como você espera que eu seja um cachorro, serei um cachorro!
Ele podia não ter rabo, mas conseguia imaginá-lo abanando um, faço careta de desgosto:
–-Já disse, prefiro gatos!
–-Mas eu serei o cão perfeito, não comerei suas lições, não sujarei os lugares e ainda consigo falar, não é demais?!
–-Não, você estragou o único fato sobre cães que eu gosto: eles não falam!
Ele novamente faz a cara de cão que caiu da mudança:
–-Por favor, me deixe ficar com você?!
–-Por que eu faria isso, Nerd?
–-Bom, vejo muitas vantagens de se ter um amigo Nerd! Primeiro: posso lhe ajudar com os conteúdos, segundo: posso lhe dar dinheiro pra o lanche todos os dias, terceiro: em trabalhos em dupla ou grupo suas notas aumentarão, quarto: estará investindo no futuro quando os Nerds dominarão o mundo dos negócios, quinto: Acho que isso só vale pra mim mesmo, sou rico e estou disposto a ser um cão!
–-Dinheiro nunca foi problema pra mim, não me preocupo com a escola e do jeito que levo minha vida duvido que esteja viva quando os Nerds dominarem o mundo dos negócios e repetindo: não gosto de cães, prefiro gatos, sério garoto, comprarei um gravador para que se lembre disso, está chato repetir toda hora!
Ele dá um risadinha, mas me encara com olhos de cachorro pidão, dou de ombros e sento nos fundos, cansei da frente, pego uma das tesouras e começo minha marca novamente, percebi que esqueci ela em algumas aulas, logo as faço, sem problemas...
O cãozinho senta na minha frente dessa vez e volta e meia me lança um olhar meio triste, quem ele acha que vai convencer? Pouco antes de o professor entrar e começar a aula chega a garota e seu escravo, ela me lança um olhar cruel e senta-se ao meu lado indicando ao seu escravo para sentar do meu outro lado, todos lançam olhares assustados em nossa direção, principalmente meu novo cachorro, consigo imaginar suas orelhas se encolhendo de medo:
–-Kayla... Sobreviva por favor! murmura ele e afasta mais um pouco a classe da minha.
Reviro os olhos, ao que parece esses dois intimidam os demais, dou um meio sorriso, será interessante desafiá-los!
–-Não se esqueça, hoje, no almoço, encontre-nos atrás da escola, pode levar seu mascote se quiser... Kayla Kiewn, hoje você morre, um pouco mais tarde do que planejava, mas morrerá! diz Hannah numa voz ameaçadora.
Por algum motivo lembro-me do sonho que tive, mas logo deixo pra lá e respondo:
–-Não está nos meus planos morrer hoje e muito menos por suas mãos nojentas!
Ela sorri maldosamente:
–-Ah não queridinha! Não sujarei minhas mãos com você, tenho alguém que pode fazer o serviço sujo por mim! ela indica seu escravo que está olhando fixo para frente sem ver nada.