Haviam se passado cerca de dois meses desde a experiência de natal no hospital estadual de Nova York – uma noite única para Reyna que via Leo como um ombro amigo, e, também para Leo que passara a madrugada admirando os olhos escuros e misteriosos de Reyna.

Piper acordara naquela manhã extremamente ansiosa, como se o jantar vegetariano do dia anterior pudesse sair de sua boca a qualquer momento, ela sentia algo pressionando sua barriga e pesando em suas costas de modo insuportável. No entanto, ela sabia que não estava doente e que ela não podia estar doente justamente naquele dia. O número 1 em vermelho permanecia de forma grandiosa embaixo do mês de fevereiro e um post-it laranja ressaltava infinitas vezes: “DIA DA INSCRIÇÃO/TESTE DO CONCURSO”. Ela respirou fundo e mesmo com os olhos inchados de sono conseguiu abrir seu sorriso nervoso ao levantar da cama. Precisava estar em Broadway em 2 horas.

Do mesmo modo que Piper acordava ansiosa, Reyna tentava lembrar dos passos da coreografia enquanto assoprava o café com gosto de sabão que serviam no hospital. Embora aquela não fosse sua vez de passara a noite com a mãe, Reyna implorou a Hylla com mil e uma promessas de que dormir ali não lhe atrapalharia para o teste, - sim, Hylla já sabia do concurso e apoiava a ideia – pois Reyna sentia que olhar a mãe dormindo iria lhe confirmar se aquela não seria a ideia mais louca de sua vida.

Voltando a realidade em um flash, a garota se xingou mentalmente por tão lenta pela manhã e em pouco tempo era possível ver sua silhueta revezando entre corridinhas e grandes goladas de café quente até o metrô mais próximo.

Foram necessários três metrôs do Brooklyn até a Broadway Avenue e mais um pedacinho a pé que Reyna teve que fazer até chegar à uma sala no terceiro andar em um prédio luxuoso e com o elevador em manutenção. Ela se perguntava como Piper estaria se saindo, provavelmente melhor e com um nível de dificuldade extrema por ter que despistar a mãe, a governanta fofoqueira, a secretária recalcada do pai o dito cujo.

Não ficou surpresa quando encontrou a melhor amiga lá dentro se alongando, - provavelmente saíra mais cedo dizendo que iria sair para um passeio com os amigos ou algo assim – porém sua testa se enrugou ao notar Jason, Leo e uma menina emo gótico roqueira cercando Piper com sorrisos de apoio.

– ...Então não ache que seremos seus escravos. – ela ouviu Leo completar sua fala.

– Mas, por que iríamos querer um escravo preguiçoso como você, Valdez? – ela se meteu na conversa enquanto jogava a mochila no chão.

– Diós mio! Mal se apresenta e já age como se fosse a Shakira. Saudades de mim, dulzura?

– Não creio que isso seja possível. – o olhar de Reyna ficou firme enquanto encarava Leo e depois de o garoto engolir em seco, a risada da garota punk ecoou ao seu lado.

– Gostei de você, com certeza deve ser a Reyna. – a garota era morena com cabelos repicados e muita maquiagem preta – Sou a Thalia.

– Ela é irmã de Jason. – Piper explicou para a amiga.

– Aham, vim dar apoio a minha futura cunhadinha junto com meu irmão porque não tenho nada pra fazer. – Thalia concordou limpando farelos de comida da sua blusa de Muse.

– Ela não é minha namorada, Thalia, que droga! Você está deixando Piper com vergonha. – Jason replicou.

– Olhem, ele se importa com ela! – ela fingiu um tom romântico – Calma aí, Don Juan!

Apesar da pequena briga ali amenizar a tensão do local, isso não diminuía o ritmo da cabeça de Reyna que repassava toda a ordem que deveriam seguir naquele dia. Primeiro, elas teriam que fazer a audição, e, caso estivessem ao nível do programa, pegar a autorização dada pelos 3 jurados, e em seguida, fazer a inscrição que custava 15 dólares. Depois disso apenas o talento e o destino saberiam dizer quanto tempo elas permaneceriam na competição.

Piper se encolhera num canto onde supostamente deveria estar procurando um copo de água, ela havia avisado, porém não sabia se fora ouvida, já que Jason e Thalia ainda discutiam enquanto Leo acompanhava atentamente a briga dando alfinetadas em ambos os lados com os típicos “uh!”, “Vai deixar essa?” e outros que eram com certeza a cara dele.

Ela se sentia encurralada ali, observada na verdade, e ela sabia que sua dedução estava certa. Tinham câmeras espalhadas por todo o salão e uma hora ou outra ela com toda certeza seria filmada. O que aconteceria quando seu pai a assistisse dançando em rede nacional?

Ao redor delas, diversos adolescentes, jovens e adultos se candidatavam para o concurso, e, o que Reyna não deixara de notar foi o fato de todos ali estarem a caráter enquanto ela e a amiga optaram pela combinação de legging preta, sapatilhas de jazz e uma blusa que não marcasse a silhueta. Por um instante, ela pensou na possibilidade de a roupa influenciar na decisão porque se isso fosse verdade, então elas precisariam de ajuda e uma ajuda BEM rápida.

A preocupação de Reyna aumentou ainda mais ao notar a amiga segurando um copo de água cheio enquanto encarava a parede do lado oposto. O que era aquilo? Exercícios de concentração ou algo do tipo? Bem, se fosse, Reyna precisava urgente de um exercício de relaxamento.

– OK, o que está acontecendo por aqui, Pipes? – Reyna perguntou tirando o copo da mão da amiga e dando um grande gole.

– Rey, você já percebeu onde estamos? Que esse é um concurso de cadeia nacional que será transmitido para o país todo? Se meu pai ocasionalmente ligar a TV no canal 7 e me assistir dançando com você, ele nem sequer vai ligar se é uma causa nobre ou não, e, ainda é capaz de mandar meus laços de amizade com você.

O tamanho do risco que corriam ali pareceu ficar diversas vezes maior e mais pesado sob suas costas, deixando-o impossível de ser ignorado antes de um breve aquecimento para o teste.

– Talvez agora não seja a melhor hora pra avisar que estamos fora do padrão dos candidatos daqui. – Reyna murmurou.

– Do que exatamente você está falando?

– Olhe ao redor, Piper, todas essas pessoas estão vestidos a caráter e nós estamos parecendo aquelas mães gordas que ficam correndo em volta do Central Park.

– Mas por que isso agora? Nós nem ligamos para roupas. – Piper replicou sem acreditar que a melhor amiga estava mais preocupada com o figurino do que com o fato de que o segredo dela estava prestes a ser vazado para o país inteiro.

– Porque e se o figurino fazer parte da apresentação? Vamos dançar a droga da música perfeitamente bem e, no final, perder porque parecemos mendigas.

O suspiro pesad escapou dos lábios das duas. A situação era arriscada, complicada e desafiadora, sem contar que precisavam imediatamente de um milagre. Estavam tão nervosas e agitadas que supersticiosamente se recusavam a falar qualquer frase negativa com medo de que mais alguma coisa desse errado. Infelizmente, coisas ruins atraem coisas ruins.

– COMO ASSIM VOCÊS NÃO COLOCARAM NOS ANÚNCIOS ESSA INFORMAÇÃO? VAMOS TER QUE ELIMINAR VÁRIOS TALENTOS APENAS PORQUE VOCÊ NÃO GOSTOU DA COR DA LETRA ESCOLHIDA? – a sala toda se virou para uma mulher de cabeleira ruiva que gritava com um homem que usava a blusa preta do staff do programa.

– Quer colocar a culpa é mim de novo, não é? Pois bem, eu assumo, Martha! – o homem ajeitou o crachá com o nome George e era visível que ele nem ao menos ligava para a situação que ocorria enquanto abria um sorriso convincente.

– Então avise a eles, querido. – a gota de sarcasmo escorreu metaforicamente de sua boca e ela encarou o rapaz moreno desafiadoramente. O rapaz se virou com um sorriso grande e persuasivo a grande plateia que o assistia há pouco.

– Olá, senhoras, senhores e jovens candidatos de todo o país, meu nome é George Snake e essa é minha esposa, Martha Snake. Temos um aviso de última hora para vocês. – ele começou. Nem na maior cara de pau do mundo, ele conseguiu esconder o constrangimento – Lamento informar que, todos os participantes que possuírem um grupo menor que três não poderá se apresentar. Ocorreram alguns erros técnicos e essa informação não pôde ser repassada a vocês. Daremos a todos um prazo de 10 minutos para que façam sua escolha e caso seja negativa... Desculpem o transtorno.

O caos se instaurou no salão, e, muito embora, Martha quisesse impedi-lo e controla-lo, ela puxou o marido para o acesso restrito e continuou seus xingamentos direcionados exclusivamente a ele.

Enquanto isso, Reyna parecia prestes a desabar a qualquer instante e Piper tentava pensar logicamente mesmo sabendo que sua mente estava num extremo estado de confusão. Haviam lutado tão duro pra tudo acabar sem nem mesmo começar?

– Droga, droga, droga e droga de novo! – Reyna dizia andando em círculos e chutando o ar. Raiva, ódio, azar... Tudo isso parecia cercar ela, mas acima de tudo, o fim da esperança dilacerava seu coração.

– Vamos dar um jeito, dulzura. Você vai ver. – Leo prometia a ela.

– Espero que esse “jeito” aconteça em cinco minutos porque essa é a merda de tempo que nos resta!

Thalia também estava apreensiva mesmo não tendo tanta ligação com as garotas ou familiaridade com toda aquela confusão. Ela daria o “jeito” antes que o tempo acabasse porque sabia que se deixasse esse dever para as “abençoadas” mentes masculinas de Leo e seu irmão, então provavelmente haveria hambúrguer de consolação para o almoço.

– Jason, você já ganhou aquele campeonato de Just Dance uma vez então vá no cantinho com a Piper e peça que ela lhe explique os passos. Entendeu? – era desesperador decidir tudo em cima da hora, mas deveria funcionar – Valdez, eu sei que você também é aceitável...

– Yo soy el rey de la baila, dulzura! – defendeu-se.

– ... Portanto, já está dentro da equipe. Viram um quarteto formado em dois minutos. Me agradeçam depois, mas agora vão lá repassar a coreografia de vocês.

Mesmo com apenas 3 minutos restantes, os quatro conseguiram dar pequenos ajustes e encaixes de última hora adaptando a dança um pouco antes de Martha e George começarem a pedir desculpas para todos os candidatos que não poderiam se apresentar. Olhando a fila naquele momento era óbvio que muitos deles teriam cachorro quente consolador para o almoço, lanche e jantar.

A tensão não aliviara com isso e para completar, eles eram os terceiros a se apresentar, só não sabiam se isso era bom ou ruim.

– Próximos! – a assistente gritou e eles se levantaram.

No backstage, foram cercados de maquiadores e um cara de lápis de olho que depois de os encarar longamente proibiu que entrassem no palco sem vestir mascaras pretas antes. Segundo ele, deveria haver um elemento em comum entre os cinco jovens para que no futuro seus fãs os pudessem identificar. De certa forma, isso alegrou Piper que ficaria parcialmente incógnita caso seu pai estivesse assistindo ao show.

Pisando pela primeira vez no palco do local, um frio percorreu a barriga deles e a situação pareceu piorar para Piper quando sua mão começo a suar ao ver as 5 câmeras de filmagem instaladas ali com refletores de luz entre seus intervalos. Os 3 jurados estavam sentados em poltronas atrás de um batente segurando canetas ou bebendo algo de sua caneca, prontos para os avaliarem. Certo, era real.

(N/Autora: Para entrar no clima, sugiro que aperte o PLAY Sem recalque pq vai abrir em outra aba)

Posicionando-se em suas marcas ouviram Neon Lights iniciar. Ambos começaram contando até três, Piper e Leo ficaram posicionados atrás, um do lado do outro, e, na frente, ficavam Reyna e Jason. Ao mesmo tempo, Piper e Leo estenderam o pé e a mão esquerda enquanto Jason e Reyna entendiam a mão e o pé direito. Juntos, os quatro começaram a empurrar e chutar o ar, elevando suas presenças. Seus passos começaram a ficar cada vez mais próximos até Piper e Reyna ficarem coladas, e, Jason e Leo, próximos. No último empurrão de ar, as meninas rolaram pelo chão trocando de posições enquanto Jason e Leo fizeram a passada de flexiona para esquerda, pra direita, pisa e gira para as alcançarem e puxarem-nas para uma dança de salão.

Leo e Reyna dançavam uma valsa com o ritmo dois compassos acelerados, e, Jason e Piper seguiam o mesmo compasso em ritmo de tango. Os dois casais em lados opostos da pista, improvisando um pouco no estilo, tiveram que esperar até o refrão para que, finalmente, as garotas fossem giradas e continuassem girando até o outro lado da pista onde se cruzavam no meio do caminho.

O giro se desfez deixando as garotas em posição de corrida enquanto os garotos possuíam um pequeno número que incluía pisar para trás, para frente e dar um mortal pra trás – algo que realmente preocupou Leo, já que ele já tivera outros problemas com mortais. Submetidas a correr uma contra a outra, elas seguiam na mesma direção girando em tempos alternados até que faltasse tão pouco espaço que, talvez, a coreografia se acabasse bem aí.

Surpreendendo a pequena plateia e os 3 jurados, Piper iniciou uma estrelinha por trás de Reyna, ao mesmo tempo que, esta executava a sua própria. Jason pegou Piper pela cintura e a empurrou contra si fazendo com que dessem uma inclinada em giro para baixo, fazendo o papel de plano de fundo da dança, Reyna e Leo começaram a bater em sincronia contra os próprios corpos, como se fossem um espelho dividido entre o casal.

Com Reyna e Piper na frente, e os garotos em suas laterais, o refrão final chegou. Deveriam se movimentar ao mesmo tempo como um máquina. Era a parte mais difícil da dança, em parte por não terem tido um verdadeiro ensaio entre os quatro.

A batida rápida e eletrônica comandava os passos. Pisada com o pé esquerdo, pisada com o pé direito, curvada no ombro esquerdo, curvada no ombro direito e jogar a cabeça do oeste para o leste, com pequenos pulos rápidos para o sentido anti-horário, eles trocavam de posição. Quando acabaram o ciclo, ainda sobre efeito da adrenalina, a dança foi finalizada com as morenas prestes a socarem uma a outra enquanto os meninos as impediam segurando suas cinturas finas.

E a pergunta era: eles haviam passado no teste?