Entre sem bater - Para Shana Black Rx escrita por Amigo Secreto


Capítulo 3
Capítulo 03 – Mesmo que a porta volte e bata na sua cara?




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Foi chegar ao tal “Copo Sujo” que percebi que o nome do lugar tinha haver literalmente com ele. Era um barzinho bem fuleiro, simples, sujo, com uma varanda e tocos de madeira que serviam de mesas e cadeiras ao ar livre. Mas o engraçado era existir um lugar como aquele ali, praticamente no centro de Campo Grande, no cruzamento de grandes avenidas. Apesar de o barzinho estar localizado em uma rua não tão movimentada.

Mesmo assim, aquele tipo de bar parecia mais o tipo que se encontraria nas vilas. Aliás, tinha muita vila pela cidade que tinham bares com padrão até bem elevados.

O mais engraçado não era o bar em si, mas foi perceber que havia ali, centenas de carros de luxo estacionados. Senhores — que pareciam bem de vida — se encontravam sentados na mesa e bastante à vontade. Curtindo o som de MPB, enquanto conversavam, bebiam caipirinha e beliscavam porções de peixe.

Conforme fomos entrando, fomos sendo cumprimentados pelos presentes. O Thiago parecia conhecer muitos deles, ele até parou pra pegar na mão de alguns.

Antes de entrarmos no bar, um senhor mestiço de japonês veio nos recepcionar, o Thiago o reverenciou — curvando o corpo pra frente — e ele fez o mesmo, falando em uma língua estranha.

Irasshai, Thiago-kun![1] Seus amigos estar lá no fundo. Entrar. Entrar. — ele disse, animado, fazendo gesto para que nos apressássemos.

Eu fiz uma reverência só com a cabeça para o homem e segui o Thiago que parecia saber muito bem aonde ia. Passamos pela área de entrada, pelo bar e fomos para os fundos, onde tinha outra área com grupos, dessa vez, só de jovens. Todos em mesas no mesmo estilo da frente e do interior do bar. Havia gente de todo os tipos e percebi algo que me fez sorrir, que eu pude contar somente com uma olhada rápida, havia vários casais gays ali, entre garotas e entre garotos. Nenhum deles pareciam constrangidos em estar de mãos dadas, ou abraçados. Eu de repente respirei. Pela primeira vez na vida eu me senti normal.

— Aqui, Thiago! — um cara acenou, estava bem ao fundo, embaixo de uma árvore frondosa, acompanhado de outros, um deles dedilhava um violão acústico enquanto o grupo cantarolava uma música da Legião Urbana. Não era uma das canções mais conhecidas, porque eu não reconheci a letra, mas pelo ritmo eu pelo menos sabia que era do Legião.

O cara que havia acenado saiu do lado da namorada e se levantou para recepcionar o Thiago com um abraço, depois ele também me abraçou, se apresentando.

— Olá, eu sou o Claudio.

— Oi, Claudio. Sou Caio.

O Claudio analisou meu rosto e depois de alguns segundos constatou.

— Opa! Você é bem bonito, hein, Caio — disse, dando tapinhas no ombro do Thiago.

— Cala a boca — o Thiago respondeu, dando um safanão na cabeça do tal Claudio.

Fui apresentado a todos na mesa, eram sete ao todo. O Claudio e a namorada Amanda. A Luciana e o Vinícius. A Francisca estava sozinha naquela noite, mas fiquei sabendo que ela namorava a Jéssica. Por último o Ronaldo e o seu namorado Heitor. Todos me abraçaram e cumprimentaram com beijos no rosto, menos a Luciana, que ficou agarrada no braço do Vinícius o tempo todo, enquanto me olhava de esguelha.

Havia algo na minha presença que a estava incomodando, eu tentei não ficar preocupado, porque, diferente dela, a Amanda e a Francisca eram uns amores. A conversa se focou praticamente na revolução que estava acontecendo no Brasil e pelo que entendi aquele grupo ali estava envolvido na organização da passeata que iria acontecer na nossa cidade.

— Vamos nos concentrar na Praça do Rádio por volta das quatro da tarde.

— Mas e aquele caminhão de som que tão falando que vai estar lá, cara? Tô falando, tem dedo de gente interesseira aí.

— Já demos o nosso “te-mato”. Se o carro de som aparecer, a gente vai tombá-lo. É sem partido, essa porra! — Thiago bateu com o punho fechado sobre a mesa. — É sem bandeira! — bateu de novo. — Ter apoio dos próprios partidos é ridículo.

— E você soube que até o prefeito disse que iria participar? — O Vinícius comentou, rindo e entornando outro gole da caipirinha.

— Mas é isso que dá, Thiago. “Causa sem bandeira” permite que gente interesseira assuma a causa. — O que estava com o violão comentou.

— Ah, não vem com essa não, Heitor. Eu já discuti com meu professor por causa dessa merda aí. Se a gente não permitir, ninguém vai levantar bandeira e querer dar as caras para assumir nossas ações não.

O Heitor balançou a cabeça, ainda discordando.

— Só sei que tem grupos e tem gente financiada no meio dessa passeata que vai acontecer aqui. Escreve.

— Então vai ter pau — garantiu, Thiago. — Por que eu vou ser o primeiro a quebrar e queimar as bandeiras que não sejam do Brasil.

Houve palmas, assovios e batidas na mesa para comemorarem a fala do Thiago.

— É isso aí, Thi! Vamos brindar! — propôs Francisca e todos ergueram suas taças, brindaram e beberam.

Era incrível. Eu não conseguia abrir minha boca e nem opinar. Afinal, eu era o novo no grupo, me resignei a assistir o debate. Mas não consegui não admirá-los. Eles estavam realmente envolvidos naquela situação dos protestos e pelo que tinha entendido, estavam se preparando para a passeata que haveria na nossa cidade. Além disso, pelo que tinha percebido, o Thiago era um tipo de líder, um revolucionário.

A conversa estava boa, a bebida também e o clima gostoso. Tudo indo maravilhosamente bem até que o Vinícius, namorado da tal Luciana, que não parava de olhar feio para mim, me perguntou:

— E você... é....?

— Caio.

— Isso, Caio! É sempre tão quietinho assim? Você vai participar das passeatas?

Vi a Luciana beliscar o braço do namorado por estar puxando assunto comigo e, antes que eu o respondesse, ela o fez na minha frente.

— Pelo menos o Gui estará lá com certeza. Aliás, ele perguntou onde a gente estava reunido e eu falei pra ele. Acho que ele está vindo pra cá nesse exato momento. Deve estar chegando.

— Ótimo! — o Thiago terminou de entornar o outro gole de tequila, bateu o copo na mesa, estalou os lábios e se levantou. — Então é hora de ir. Bora, Caio.

— Larga de ser naja, Luciana! — reclamou a Francisca com ela.

— Eu, naja, Fran?

— Lu, melhor parar — o namorado dela pediu.

— Isso, Vinny. Faz ela calar a boca ou ela vai ouvir o que não quer.

O Thiago fez um gesto pedindo para eu levantar e eu levantei rapidamente, já com o capacete em mãos.

— É muito bonito pra sua cara, né, Thiago? Chegar aqui esfregando na nossa cara seu novo namoradinho e quer que fiquemos quietos? Eu não sou sangue frio para aguentar esse tipo de coisa. Beleza, o garoto não tem nada a ver com a história e não merece ouvir, mas...

— Cala a boca, Lu — mais de um deles pediram, interrompendo-a ao mesmo tempo.

Thiago só se despediu com breves acenos e avisou.

— Tchau, pessoal. A gente se fala pelo Face. Pessoalmente tá foda. A coisa já tá resolvida faz tempo e tem gente que insiste em ficar remoendo o passado. Fui.

O Thiago passou pelo Caixa, deixou uma parte da conta paga, comprou mais bebidas para viagem e quando estávamos saindo vimos aquele rapaz entrando.

Ok. Juro. Eu quis morrer em seguida.

Ele parecia um artista de televisão, esportista, modelo, sei lá. Só sei que era lindo. Ele tinha os traços marcantes da Luciana. Era como se fosse a própria Luciana na versão masculina. Loiro, cabelos curtos, espetados para cima, olhos azuis, a pele do rosto parecia bunda de bebê e o corpo era bem malhado. Bermuda creme, sapatênis bege, camisa branca com o símbolo do “Hollywood Café” no centro, relógio no pulso, gargantilha de prata, carteira na mão, celular e chaves de um carro que certamente era grande.

Houve uma troca discreta de olhares entre o Thiago e ele, mas eles não se cumprimentaram. O loiro voltou seu olhar pra frente, empinou mais o nariz ao passar pelo Thiago e, mesmo com um som das conversas, da música ambiente, foi audível o sussurro: “perdedor” dito por ele.

O mestiço japonês, dono do lugar, passou pela gente nos cumprimentando, mas somente eu o reverenciei, o Thiago já estava na rua, chutando o pneu de uma caminhonete Dodge Ram vermelha e gigantesca que estava estacionada ali na frente. Depois ele subiu a rua e eu o segui. Chegamos à moto.

— Você tá legal? — Eu quis saber, já que estava apertando o estômago, como se estivesse sentindo cólicas.

— Será que podemos não falar agora? — ele me pediu, sentando na moto e colocando o capacete.

Dei de ombros.

— Você é quem sabe — respondi, mas antes de colocar o capacete eu disse o que de certa forma estava entalado na garganta. — Se o problema for me levar para casa, você pode voltar. Eu pego um moto-táxi. Eu sei me virar, cara. Só acho que se você tem algo ainda para resolver, ou se gosta do Gui e ele gosta de você, então deveriam...

A minha fala se interrompeu quando o vi levantar, erguer o capacete para o meio da cabeça, apanhar minha camisa pela gola e me puxar em direção a ele até fazer com que nossas bocas se encontrassem. Então ele inclinou a cabeça levemente e me beijou.

Não deu tempo de se tornar um beijo de verdade, com troca de saliva e línguas entrelaçadas, foi algo seco. Ele só prensou os lábios dele contra o meu de forma abrupta, então se afastou da minha boca e voltou a sentar na moto.

Mesmo não sendo um beijo de verdade, eu senti minhas pernas tremendo e meu estômago revirando.

— Será que agora entende que eu só faço o que eu quero? Eu vou te levar em casa — reafirmou o que já havia me prometido. — Só quero saber se tem algum problema se eu dormir lá hoje? Você mora com alguém?

— Não — eu respondi rapidamente.

Ele sorriu.

— ‘Não’ para qual resposta, neném? Eu fiz duas perguntas.

— Ah? Bem... Eu não moro com ninguém e não tem problema se quiser dormir lá.

— Ótimo, então monte — ele pediu, recolocando o capacete.

Eu fiz o mesmo e montei no banco do carona. Assim que sentei tomei aquela atitude, sem me preocupar se ouviria uma nova advertência sobre o cheiro de suor. Simplesmente me abracei ao corpo dele e esperei que Thiago seguisse. Aquele meu gesto simples pareceu revigorá-lo, pois ao sair dali o Thiago acelerou a moto e passou em frente do Copo Sujo feito uma bala.

Já era mais de uma da manhã e as movimentadas avenidas da cidade começavam a dormir, senti o vento gélido do início da madrugada cortando minha pele. O Thiago só reduzia a velocidade nos cruzamentos, fora isso, ele andou em velocidade máxima o tempo todo.

Quando vi o “Gui” entrando no Copo Sujo eu cheguei a pensar que estava ferrado. Nunca eu chegaria aos pés de alguém com todo aquele brilho. Também não consegui entender como um cara boa pinta e com panca de ter status como o Gui havia se apaixonado por um cara que parecia de origem humilde como o Thiago. Ao mesmo tempo em que sentia vontade de saber mais sobre aquela história, eu não queria. Eu sentia medo. Porque eu pressentia que iria doer. As palavras da Luciana haviam doído demais. Doeu ter cruzado com o Gui e ver o quão deslumbrante meu antecessor era. Não queria mais sentir aquele tipo de dor.

Estavam acontecendo muitas coisas naquela noite e rápido demais. Desde a hora que saímos da faculdade, as vinte e duas e vinte, até aquele momento, que era em torno de uma da manhã, eu já havia passado por mais estados emocionais que nos meus vinte e um anos de vida. E pelo jeito estava prestes acontecer muito mais, afinal eu nunca havia dormido com alguém antes. “Dormir” de passar uma noite inteira com alguém e não de fazer sexo. Eu tive um único relacionamento na minha vida. Com uma pessoa que não quero me recordar no momento, mas foi com ele minha primeira vez e as transas seguintes, que sempre ocorreram a luz do dia.

Depois dele, tive somente tentativas frustradas.

Não queria, de verdade, que o Thiago se tornasse mais uma.

...

Eu moro em uma vila de casas de aluguel, o lugar é bem pequeno, mas é bem organizado e limpo. Apesar de ser várias casas em um único terreno, cada casa é separada por muros e portão. Para mim, que vivo sozinho, as três peças eram mais que suficientes. Na verdade, a cozinha nem dava para ser considerada uma peça separada, era do tamanho de um corredor e fazia divisa com o meu quarto-sala. Tinha também o banheiro, uma área de serviço nos fundos com tanque e espaço para pendurar as roupas lavadas e a varanda da frente que chega até o portão. Claro que se eu tivesse carro teria que ficar na rua, não tinha espaço para garagem ali, mas a moto do Thiago coube direitinho na varanda.

Demorei a encontrar a chave da porta, eu sempre a guardava no estojo, mas estava tão nervoso que me atrapalhei. Procurei nos bolsos da calça também e nada. Tudo que eu menos queria era ter que chamar um chaveiro àquela hora da madrugada, mas voltei a averiguar o estojo e acabei encontrado a bendita dentro de um buraco que abriu entre os forros.

— Tá aqui. Achei — eu disse, destrancando a porta rapidamente, entrando e ascendendo a lâmpada do quarto-sala no interruptor ao lado da porta. — Tá meio bagunçado. Eu normalmente limpo no fim de semana.

— Eu nem perguntei se você vai trabalhar amanhã — Ele falou de repente, ignorando minha observação e largando a mochila no chão, perto da porta.

— Não trabalho aos sábados. Pode ficar tranquilo.

— Tá. Posso usar seu banheiro pra tomar um banho?

— Sim. Deixa eu pegar uma toalha para você.

Fui até a cômoda que ficava ao lado da cama e abri a última gaveta, tirei a tolha e joguei para ele.

— Fica a vontade, pode usar meus xampus se quiser lavar o cabelo.

— Valeu.

Achei que ele havia ficado estranhamente sério, mas a verdade era que o Thiago era sério. Então sacudi a cabeça e dei um giro dentro do quarto, constatando após uma breve análise: “Quanto tempo ele levaria no banho? Se for no mínimo dez minutos eu consigo dar um jeito nessa zona”.

Então, pensando positivo, arregacei as mangas e comecei a arrumação de emergência. Primeiro recolhi minhas roupas e os calçados sujos do chão, levei tudo para área de serviço; juntei os livros e os cadernos que estavam espalhados no carpete, de frente da televisão, em uma única pilha ao lado do aparelho. Troquei o lençol, as fronhas dos travesseiros, das almofadas e ainda forrei na cama uma colcha nova, que eu ainda não havia usado.

Depois disso, recolhi todas as vasilhas sujas, pratos, copos, embalagens vazias, que estavam espalhadas pelo chão e em cima da cômoda. O que era lixo foi para o lixo e o restante guardei tudo debaixo da pia da cozinha. Por último passei um pano úmido com desinfetante no chão e fui para cozinha. Olhei no display do celular e fiquei orgulhoso, só tinha se passado cinco minutos. Como eu não iria lavar aquela pilha de louças sujas que estava dentro da pia, só juntei tudo e guardei com as outras no compartimento embaixo dela. Passei um pano úmido no fogão e sobre a pia, então guardei as nossas bebidas no frigobar e aproveitei para retirar duas vasilhas de plásticos onde guardava carne fatiada e calabresa. Liguei o fogo, botei a frigideira sobre ele, forrei de azeite e coloquei todo o conteúdo das vasilhas dentro da frigideira. Ah! Essas também foram para debaixo da pia em seguida. Despejei Sazon de carne em cima da carne, um pouco de pimenta do reino, sal, orégano e então larguei tudo fritando.

Recolhi o lixo da cozinha, coloquei para fora, passei o pano úmido na cozinha também, larguei o rodo e o pano na área de serviço e fechei a porta. Lavei as mãos, olhei o relógio e constatei eufórico: onze minutos! Dei um sorriso que não cabia no rosto. Virei a carne na frigideira, depois de algumas viradas fui pra sala, liguei a TV na Globo, estava passando o Jô. Ajeitei as almofadas sobre o carpete na frente da televisão de tela plana de 32 polegadas, aliás, era o único aparelho eletrônico decente que eu tinha conseguido comprar para minha casa, e depois disso fui para o gaveteiro, procurar algo que pudesse caber no Thiago.

O Thiago era alto e magro, mais de 1,80, e eu não sou tanto, devo estar com 1,70, no máximo, mas eu tenho mais corpo que ele (pra não dizer que sou mais cheinho!) então meus shorts poderiam ficar largos, dançando na cintura dele talvez. Recordei de um short preto com cós de elástico que estava apertado em mim, procurei por ele, dei uma analisada e assenti; com certeza iria servir. Escolhi esse e uma regata branca. Foi fechar a gaveta e me levantar, e o Thiago saiu do banheiro.

— Seu chuveiro é uma merda, a água é muito rala — ele reclamou, batendo as mãos no cabelo para tirar o excesso da água.

— Isso é verdade. Vou formalizar uma reclamação para dona.

Aquele bendito gelo no estômago que havia ido embora há algumas horas voltou com força, o Thiago de cabelo solto e molhado não era aquele mesmo cara esquisito da faculdade, talvez fosse a ausência das roupas bregas e dos óculos, que ele segurava junto com a roupa suja, não sei, no entanto, ali, só com a toalha em volta da cintura, sem os óculos, ele pareceu o ser mais lindo do mundo. Notei que ele tinha bastante pelos pelo corpo, nos braços, no tórax, que, aliás, tinha uma pequena elevação de músculos, assim como os braços também exibiam músculos definidos. Ele não era tão magricela como eu pensava. A roupa larga deveria dar aquela falsa impressão.

— Isso aí é pra mim? — ele perguntou, me despertando do transe. E jogando as roupas dele sobre a mochila que eu havia movido pra perto da cama.

— Sim. Vê se serve — eu entreguei para ele o par de roupas.

O Thiago segurou e não se preocupou em puxar a toalha da cintura e ficar completamente nu. Nesse instante eu prendi a respiração e ele só se sentou na beira da minha cama, colocou os óculos do seu lado e jogou a toalha sobre os cabelos que ainda estavam pingando, passando a secá-los.

— O cheiro está bom, o que ta fritando?

— Eu tinha umas coisas cortadas, carne, calabresa. Não comemos nada lá no Copo Sujo, não sei você, mas estou faminto. V- vou tomar banho, você dá uma olhada na frigideira?

— Vai nessa.

A curiosidade era grande, mas tentei passar desviando o olhar da parte entre as pernas dele. Só que foi mais forte do que eu e na hora que passei por ele para ir para o banheiro, não resisti e olhei.

“Puta merda!”. Ele era grande. Já tinha ouvido falar que caras magros e alto tinham pênis grande, mas aquilo era até um exagero. Entrei no banheiro com outra toalha e um par de roupas. Larguei tudo em cima da tampa do vaso e me olhei no espelho em cima da pia, bati as mãos no rosto levemente e suspirei.

— Mantenha a postura. Mantenha a calma. Não dê nenhum fora, não faça nada que possa afugentá-lo, Caio. É sua chance.

Então era hora de uma faxina em mim mesmo!

Mas realmente o chuveiro não colaborava, principalmente quando se quer lavar até o mínimo pedaço do seu corpo. Lavei os cabelos, limpei os ouvidos, me barbeei e até debaixo das unhas eu limpei. Mas eu achei que estava demorando demais e fiquei com medo de que o sono vencesse o Thiago e acabei apertando o passo. Quando estava me enxugando notei a bendita da minha barriga saliente, peguei naquele pedaço de banha e apertei, estava começando a fazer uma dobra! Cheguei a conclusão que somente a academia nos fins de semana não estava sendo suficiente. Ou eu começava a malhar sério durante a semana, ou teria que começar uma dieta. Mas felicidade de pobre é comer, — pelo menos era o que minha mãe dizia — como vou parar de comer? Vou entrar em depressão!

Mas aquela camisa rosa, que estava tão velhinha que o rosa já estava desbotado, escondia bem a bendita daquela saliência. O short branco também, que era bem curto e o tecido lembra uma samba-canção, era meio ousado, mas era roupa de dormir! — Essa seria a minha desculpa.

Passei creme pós-barba no rosto e hidratante nas pernas e nos braços, não achando suficiente, ainda dei umas esborrifadas do Malbec no pescoço. Era exagero passar colônia se eu não iria sair, mas...

Fechei a porta do armarinho, tentei ajeitar o cabelo passando os dedos e, enfim, estava pronto. Suspirei fundo e saí.

As luzes estavam todas apagadas, a única claridade provinha da tela da televisão. Mas apesar de ter demorado 22 minutos no banheiro, (constatei após olhar o relógio digital que tinha sobre a cômoda), o Thiago não havia pegado no sono a minha espera. Ele estava de costas, sentado no carpete de frente para televisão, encostado na cama. Estava vestido, os cabelos ainda soltos. Ele parecia concentrado no celular, mas por algum motivo ele disfarçou e colocou o aparelho no chão ao perceber minha presença e apanhou a lata de cerveja.

Não consegui evitar sentir aquela estranha sensação de ciúmes ao imaginar que ele estava respondendo alguma mensagem enviada pelo “Gui”.

Mas eu precisava ser mais eu, ter mais confiança. Podia não ser lindo de morrer como o Gui, mas com certeza não sou do tipo que se joga fora. Apaguei a luz do banheiro, fechei a porta e fui me sentar ao lado dele, de frente para televisão.

— Uau. Você fez isso? — eu perguntei ao olhar os petiscos que eu havia colocado para fritar.

O Thiago havia dado uma cara decente ao prato. Organizando tudo no prato refratário do Microondas, de certo, por não ter encontrado uma bandeja. A calabresa havia sido disposta seguindo o contorno do prato, depois, seguindo a mesma forma, havia fatias de tomates, outro contorno de calabresa, outro de azeitona e no meio estava todo o contra-filé cortado em tiras e alguns palitos de dentes espetando a carne. Parecia um prato servido nos barzinhos.

— Só não coloquei cebolas porque não sou muito fã.

— Tudo bem, também não sou muito fã de cebola. Só uso para tempero.

— Também usei os tomates e a azeitona que tinha no frigobar — ele falou em tom de justificativa, como se não tivesse certeza se poderia ter usado.

— Não tem problema. Tá com uma cara ótima.

— Eu já trabalhei de garçom lá no Copo Sujo. Eu trabalho na entrega no Super-Frutas durante o dia, aquele mercado lá do lado. Na época eu trabalhava no Caixa e ainda não fazia faculdade, então comecei a fazer um bico lá a noite pra levantar uma grana extra. Depois que comecei a faculdade precisei sair.

Talvez tenha sido dessa forma que ele tinha conhecido o Gui. Apesar de estranho, era perceptível que o lugar era frequentado por gente grã-fina.

— Tá explicado o prato caprichado — dei um sorrisinho. Ao mesmo tempo em que eu queria saber mais sobre a história deles, me batia uma tremenda incerteza e eu já não tinha mais tanta certeza se queria saber sobre a história dele com o Gui. Então, mudei de assunto. — Mas por que não ta comendo?

— Eu já belisquei um pouco quando estava arrumando, resolvi esperar você. ­— Ele estendeu a outra lata de cerveja para mim. — Deve ta meio quente, você demorou pra caramba.

— Desculpa. O chuveiro realmente não ajuda.

— Nada. Afinal, valeu a pena. Você sempre se perfuma assim quando vai dormir? — ele disse, aproximando o nariz perto do meu pescoço e espirando meu perfume, fazendo com que eu apertasse a lata de cerveja nas mãos, enquanto um arrepio percorria minha nuca.

Fiquei envergonhado.

— Bem... Não, né. Mas não é sempre que durmo acompanhado.

— Isso tudo é pra mim?

Cara, como ele conseguia me constranger com perguntas tão cretinas e ditas de uma maneira tão simples?

— É... — respondi meio vacilante. — Se tiver a fim, claro.

Ele riu e bateu a mão na minha perna, e ficou com a mão ali, em cima da minha coxa por um tempo, fazendo com que o gelo no meu estômago aumentasse.

— Come aí. Tá esfriando.

Depois eu iria pensar nos meus pecados alimentícios, mas eu estava mesmo precisando comer. O cheiro e a cara dos petiscos estavam bons e não resisti, comecei a comer um atrás do outro. A princípio o Thiago só ficou olhando, revezando sua atenção entre eu e a TV enquanto bebia.

— Não vai comer? — Insisti.

— Já vou — ele respondeu, bebericando a cerveja, meio pensativo. —Sabe que eu estava pensando?

— Não.

— Esquecemos de passar em uma farmácia e comprar camisinha. Você tem alguma aí?

Eu estava curvado para frente para pegar mais petiscos no prato quando ouvi aquela pergunta e quase entalei com a carne que mastigava, forcei a engolir e voltei a me encostar à cama. Eu disse, ele tinha o dom de fazer perguntas indiscretas com naturalidade, sem cerimônias. Eu não conseguia evitar o sobressalto. Mas tentei disfarçar.

— Tenho. Duas na carteira. E uma cartela na última gaveta da cômoda.

— Garoto prevenido — ele observou sorrindo e bebericando a cerveja novamente. — Estava quase saindo pra comprar já que estava demorando no banho.

Aquela era a constatação de que iríamos transar aquela noite? Ou ele só estava querendo uma desculpa para sair e terminar de responder a mensagem para o Gui?

— Apesar de que ainda estou pensando em sair para comprar cigarros, tem algum lugar aqui perto?

— Você fuma?

Ele coçou a nuca.

— É... Na verdade, estou tentando parar faz um tempo. Por isso estou reduzindo aos poucos e usando aqueles adesivos. Mas quando eu fico ansioso ou nervoso, não consigo evitar. A vontade fala mais alto. Eu fumei o último que eu tinha no intervalo de hoje da faculdade.

— Ah... — eu voltei para minha cerveja.

De repente, estava ficando difícil de engolir. Ele precisava fumar porque havia ficado nervoso por causa das palavras ferinas da Luciana e por ter visto o Gui?

Agora ele queria sair para comprar cigarros e algo me dizia que não era só para isso. Certamente ele iria falar com o Gui e dependendo dessa conversa, ele nem voltaria.

Mas meu momento de angústia foi quebrado por um gesto do Thiago, ele segurou meu queixo e virou meu rosto na direção dele.

— Você viaja demais sabia? O que ta se passando aí dentro? Do nada você fica quieto e dá pra notar que sua cabeça ta longe.

Eu desviei meus olhos do dele, mesmo assim ele continuou segurando meu rosto.

— Só estava pensando que você está querendo falar com o Gui.

— Olha pra mim — ele pediu, apertando meu queixo.

Eu ergui os olhos e encarei os verdes atrás das lentes que agora refletiam a televisão.

— O que eu faço pra enfiar na sua cabeça de uma vez por todas que eu só faço o que eu quero? Se eu quisesse mesmo falar com ele, eu já tinha feito.

— Mas você estava respondendo uma mensagem no celular quando saí do banho, se não era para ele, porque largou o celular então?

— Isso aqui— ele pegou o celular, tocou na tela então o virou na minha direção. — Só estava no Facebook, na página de Eventos da Anônimus MS. Queria saber quantas pessoas haviam aceitado o convite para nossa primeira passeata que será no domingo que vem.

— Você é o dono dessa página?

— Um dos — ele respondeu secamente, devolvendo o celular no chão.

Eu fiquei levemente constrangido, como eu era patético. O Thiago era tão seguro de si, tão idealista, inteligente, e eu bancando o babaca, infantil, patético e pior de tudo: ciumento possessivo se nem ter certeza do que estava rolando entre a gente.

— Você já ta viajando de novo?

— Desculpe.

— Não precisa se desculpar tanto, eu não tô chamando sua atenção — ele voltou a ficar sério. —Você quer saber mais alguma coisa?

Eu pensei por um instante. Então me enchi de coragem pra fazer a pergunta daquilo que realmente estava me perturbando.

— É cedo pra querer saber o que rolou entre você e o Gui?

— Não é que é cedo — ele rebateu, deixando a cerveja de lado. — Só acho que não é relevante. O que rolou entre o Guilherme e eu é passado, é só o que tem pra saber — ele deitou a cabeça no meu colo e concluiu meio sonolento. — Esquece meu passado, faça perguntas do meu presente, vamos falar do futuro...

Continua...


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Notas finais do capítulo

Irasshai (japonês) – Bem vindo;

“Kun” sufixo usado nulamente em nome de rapazes. 



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