Velhos Instrumentos escrita por KariAnn
Notas iniciais do capítulo
Último instrumento.
Espero que apreciem.
Voz
Ela caminhava solene em meio às flores cujas pétalas murchas caiam ao chão. O ambiente era fúnebre e o céu nublado convertia felicidades em tristezas.
Os galhos balançavam um pouco com o vento frio que trazia consigo um som. E a mulher conhecia aquele som.
Você compartilhou carne comigo
Dançou comigo no círculo antigo
De vida, de nascimento e morte
Mas Você vive novamente
Era só uma voz... Uma voz ao longe... Uma voz que o vento carregava. Uma voz masculina, melodiosa, grave, suave como pétalas de uma rosa branca.
A mulher seguiu aquela voz, cada vez mais atenta ao que cantava.
Enquanto as folhas do outono caem
No verão de minha vida
É a pedra de moinho
Ao redor do pescoço de todos nós
Em meio às árvores era quase impossível ver qualquer coisa ou pessoa. Mas a voz continuava a cantar, sem intervenção, sem nenhum instrumento a mais, apenas aquele, apenas a voz e as palavras.
Mas Você usou isto como uma coroa
Tecendo ao estridente
Que faz de todos nós covardes
Mas para Você isto era harmonia
A mulher sentia estar cada vez mais perto. E olhava, calma, a procura do dono daquele belo instrumento que não precisava de mais nenhum exceto dele mesmo.
Você conheceu a vergonha como nenhum outro
Você provou a morte como nenhum outro
Você derramou lágrimas como nenhum outro homem
Você compartilhou carne comigo
Dançou comigo
Olhou ao redor. Não havia nada além de árvores, porém ela podia ouvir a canção. Sentia estar perto, ao mesmo tempo em que parecia estar ainda muito distante. Sua calma aos poucos se esvaía e ela já não simplesmente queria, ela precisava encontrá-lo, ouvi-lo de perto.
Esta encarnação me repeliu
Mas me lançou de joelhos
Posso eu ser algo
Exceto uma traça para a chama?
Era uma canção perfeita para o tempo e para o lugar. Fúnebre. Lutuosa. Para uma voz que parecia se derramar como uma cachoeira.
Você é a respiração que me dá vida
Você é mistério
Você é beleza
Você é o Cristo que ascendeu
Então a voz se calou. E a mulher ficou lá, parada, com apenas aquele último verso ecoando em sua mente, aquelas palavras preenchendo seus pensamentos. Uma pequenina lágrima escorreu por seu rosto. Ela não sabia o porquê, mas sentiu vontade de chorar e deixou que as lágrimas quentes escorressem singelas.
Aquela voz logo seria uma lembrança de um rosto nunca visto, de um sentimento desconhecido. Um instrumento autônomo, velho e eterno.
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Música: tradução de Anthem - Virgin Black
Espero que tenham gostado.