–Eu já ouvi! – eu sei que o despertador não me ouvia, mas sabe quando faz sem nem perceber? Parecia que eu tava era brigando com alguém de verdade.

É, sou estranho.

Me arrastei até o banheiro, tranquei as portas e deixei a água quente cair na minha nuca até começar a arder. Isso por alguma razão desconhecida, me despertava na hora. Devia ser umas 8:30 da manha, íamos sair as 9:00.

Bati na porta do quarto da Manu pelo banheiro mesmo. Nada. Bati de novo.

–Hum?

–Acorda e se arruma, avisa pra sua amiga que pegamos ela em meia hora.

–Por que tão cedo?

–Deixa de preguiça e levanta.

Me enrolei na toalha e voltei para o quarto. Vesti uma bermuda preta e uma camiseta amarela lisa que achei perdida pela gaveta, calcei o primeiro chinelo que vi e peguei uma mochila, colocando uma roupa extra caso eu entrasse na piscina, protetor solar e algumas folhas e lápis de desenho.

–Manu? – gritei do meu quarto mesmo.

–Não enche!

É, o humor dela não estava bom.

Larguei a mochila no sofá e fui para cozinha. Enchi um copo com leite e bebi.

Olhei no relógio. Faltava quinze minutos pras nove.

–Manu...

–Quase.

Ouvi o barulho da torneira, portas do armário abrindo e fechando, algumas coisas caindo no chão. Ela veio prendendo o cabelo – muito mal preso por sinal. Aquela garota realmente não sabia prender aquilo direito?

Estava de chinela também – só que obviamente a dela era muito mais bonita e elaborada do que a minha – um short de cós alto e uma blusa fina de mangas. Não tinha muitos botões porque certamente era pra ser usada com uma blusa por baixo, o que a Manu não fez, deixando a mostra o biquíni estampado.

–Cadê o resto da roupa?

–Ta de sacanagem né? É um clube...

–Eu disse que meus amigos são legais, e não que não são homens! Vai botar uma blusa se não quiser ser atacada!

Ela bufou e voltou para o quarto pisando forte. Não demorou e veio vestindo uma regata fininha, jogando o mesmo casaquinho por cima.

–Melhorou?

–Muito.

Ela continuou de cara fechada o caminho todo até a casa da Laura. Pela primeira vez, eu a via totalmente sóbria.

Ela estava bonita. O cabelo era ondulado, cortado no fim do pescoço, de um castanho claro, quase loiro.

–Isso é roupa de sair de casa Manu – disse apontando para o macacão colorido da Laura, que ia até o pé.

–Vai se fuder Eduardo – doce que nem limão, essa é a Manu.

Sim, doce que nem um limão comigo, mas extremamente simpática e sorridente para todos os meus amigos. Não, eu não gostei disso. Os risinhos que soltava com o Caio, a cara fechada que fazia pra mim... O que ta rolando aqui?

–Eduardo?

Era a Laura.

–Oi, ta se divertindo?

–Sim, seus amigos são muito legais. Na verdade... Eu só queria agradecer por ter me levado em casa aquele dia...

–Não, relaxa – ela estava vermelha que nem um pimentão.

Continuei observando os risinhos bobos e as expressões que o Caio fazia. Respira Eduardo. Ela cruzava as pernas. Batia de leve em seu ombro enquanto ria.

Calma Eduardo.

Então ela jogou o cabelo para o lado. Sorrindo de ponta a ponta da orelha.

Caio, eu juro que te mato! O problema nem era ela estar toda toda pra cima dele, e sim que o Caio tinha a pior fama entre todos nós! Prefiro não comentar o que ele já fez...

–Fala cara, só deu pra chegar agora.

Gus.

O Gus era menor que eu, mas gordinho que eu e muito mais idiota. Mas era gente boa.

–Ta atrasado... Mas, tenho alguém para te apresentar.

A Laura já estava de costas para mim, balançando o corpo com a musica que tocava. Peguei seu braço, virando seu corpo de frente pra mim de novo.

–Gus, essa é a Laura. Laura, esse é o Augus...

–Só Gus!

Ela me olhou tipo “você ta doido?” e o Gus me olhou “ela é linda mas eu te mato se falar meu nome!”.

Me afastei, deixando só os dois. O Gus nunca gostou do nome de verdade: Augusto Henrique. Dizia que era nome de mauricinho... Vai entender né?

Fazia muito tempo que eu não ia no clube... Ela ta chegando perto demais... Esquece Edu, esquece.

Argh, e esse calor? Pera, ela ta tirando a regata? Chega.

–Manu! – ignorado, cheguei mais perto – Manu! – mais perto – MANUELA!

Ela fez careta e me olhou tipo “o que pensa que ta fazendo?”.

–Podemos conversar?

Ela levantou. Não parecia realmente brava, só irritada. Nos afastamos do pessoal, ninguém pareceu realmente notar. O clube ficava na beira do lago, sentamos em alguns bancos perto da margem na sombra.

–Péssima ideia.

–Ta falando do que?

–To falando do Caio, ele não é pra você.

–Eu só to conversando com ele, não precisa se preocupar!

–Desde quando – imitei tudo que ela tinha feito, rindo, mexendo os cabelos e cruzando as pernas – isso é conversar? E por que tirou a blusa?

–Ta um calor do caralho aqui! E eu não mexo no cabelo desse jeito!

–Só to falando...

–Ta com ciúmes Edu?

Opa!

–Claro que não.

–Então qual o problema?

–Problema nenhum...

Levantei nervoso e já estava saindo quando ela segurou minha mão. Sua pele era quente...

–Espera – respirou fundo – sei que to sendo chata e grossa desde que acordei... Desculpa ta? Não faço de propósito.

–Relaxa.

–Podemos conversar um pouco?

Fez uma carinha de “por favoooooor”. Eduardo seu fraco!

Sentei e ela começou a me contar sobre como tinha sido bom dançar e de um tal Ben. Foi até... Agradável. Mas eu não consegui prestar muita atenção no que dizia, o fato de estar sem blusa me afetava demais.

–To com calor. Piscina?

Ela travou na hora.

–Não, não... Serio, eu to bem aqui.

–Qual é Manu...

–Serio Edu, não!

Revirei os olhos sem paciência pra aguentar ela de doce.

Levantei e fui para a água.