Despertar escrita por Seto Scorpyos


Capítulo 2
Capítulo 2




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Uruha acendeu um cigarro e tragou lentamente, sem desviar os olhos do outro loiro à sua frente. Assoprou a fumaça para cima, inclinando a cabeça no processo.

- E então Reita, o que queria tanto falar comigo?

O baixista estava indeciso sobre como abordar o tema. Uruha não era a pessoa mais fácil do mundo para se lidar.

- Como você está? – perguntou, sabendo claramente que o outro percebeu que estava enrolando.

Uruha deu um sorriso cansado.

- Reita, me poupe, ok? Eu pego no próximo trabalho daqui a uma hora!

- É complicado...

- Não tanto quanto me dizer que eu estava atrapalhando a banda e que vocês não me queriam mais.

O tom seco fez o baixista se encolher, atingido.

- Também não foi assim...

- Em qual parte eu menti?

Reita ficou em silêncio. O amigo estava com todas as defesas em alerta e não podia realmente culpa-lo. Seria melhor ir logo direto ao assunto, assim teria tempo para argumentar.

- Uruha, tem um empresário que acha que nos consegue um contrato com a PSC.

- Que bom para vocês. – respondeu com um meio sorriso claramente forçado – Pelo jeito o trabalho duro valeu a pena.

- Tem uma coisa... – o baixista respirou fundo – O empresário prefere a formação com você.

O loiro ergueu uma sobrancelha. Tragou o cigarro novamente, num silêncio quase enlouquecedor para o amigo.

– Disse a ele que eu não toco mais com vocês?

Reita se mexeu, desviando os olhos e respirando fundo.

- Eu mencionei por alto, mas ele prefere nosso som com você. Na verdade, não temos tido muita sorte. –  o baixista respondeu, hesitante.

- O que eu tenho a ver com isso? – Uruha perguntou, sério.

- Nadao-san, o empresário, quer que você esteja na banda. Ele nos viu antes e acha que com você temos mais chance de conseguir o contrato. Nosso visual e o som que temos... – parou, sem sustentar o olhar pesado de Uruha – que tínhamos parece que é o que eles procuram.

O silêncio que se seguiu incomodou o baixista novamente, o deixando inseguro. Depois de longos minutos, Uruha respirou fundo e sacudiu a cabeça.

- Agradeço a lembrança, mas não quero tocar com vocês de novo.

- É nossa grande chance, Uruha! Não pode ignorar isso!

- Engraçado... há alguns meses, eu tive que sair da banda para justamente não atrapalhar...

- As coisas estão diferentes, agora. Você está melhor. – Reita argumentou – Podemos tentar.

- As coisas não estão diferentes, Reita. Não pode dizer isso sem saber, só olhando pelo lado de vocês. Eu não quero e não vou me aproximar de novo.

- Uruha... – Reita até tentou encontrar algum argumento, mas calou-se. Não conseguiu pensar em nada.

- Se era só isso...

- Sem você não vamos conseguir... – o baixista disse, desanimado – Será que não pode nem tentar?

- Não.

Reita desviou os olhos, tentando reprimir a vontade de gritar. Uruha pegou a carteira e tirou algumas notas, disposto a dividir a conta e o baixista viu a última chance de se fazer ouvir.

- Antes de eu vir aqui, conversamos e todo mundo concordou em te procurar. – explicou, segurando a mão do guitarrista loiro - Akaya tem noção de que não é uma guitarrista à sua altura e perdermos muito com sua saída. Estávamos esperando que se recuperasse – encarou o outro – Só queremos que volte e nos ajude. Sei que pode ser estranho e difícil no início, mas pelo menos... por favor... Será que pode tentar?

Uruha devolveu o olhar, em silêncio.

- Não.

Reita soltou a mão do guitarrista, passando a sua pelo cabelo, consternado. Não esperava por tanta decisão do outro e suspirou, derrotado. Uruha deixou as notas sobre a mesa e levantou-se. Deu um leve sorriso e tirou a franja do rosto.

- Reita – o baixista olhou para ele, ansioso – Se não fosse por essa exigência, vocês teriam me chamado para voltar? - o rapaz arregalou levemente os olhos e mordeu o lábio, empalidecendo. Uruha ajeitou a jaqueta e sacudiu a cabeça – Então não aja como se não soubesse que eu iria recusar. Tenho certeza de que vocês vão conseguir sem mim.

Com um cumprimento, o loiro mais alto deixou a lanchonete sem olhar para trás. Reita acompanhou o amigo até que ele entrou no carro e deu partida, saindo do lugar.

Tinha que admitir, mesmo com tudo o que estavam passando, a volta de Uruha sequer foi mencionada.

 

****

 

- Então é isso... – Ruki desabou no sofá, desanimado.

Aoi acendeu um cigarro, sentando-se nos degraus. Akaya e Kai estavam de pé, encarando o baixista sentado.

- Eu achei... – Kai estava perplexo – Quer dizer... eu realmente achei que ele ia concordar.

- Mas ele está certo, Kai. Se não fosse essa exigência, acho que não iríamos procurar por ele. – Reita disse, suspirando – Apesar de termos falado, nunca dissemos a ele que podia voltar ou perguntamos sobre isso.

- Ele está se vingando? – Akaya perguntou, um pouco irritada com a atitude do guitarrista.

- Ele não pode fazer isso. – Ruki se levantou – Eu vou falar com ele!

- Não. Eu vou. – Aoi disse, mordendo o lábio. – O problema começou conosco, então... sei lá... eu posso conversar e...

- Eu vou com você! – a moça se aproximou, resoluta – Vamos resolver isso de uma vez por todas!

- Não. Vou sozinho. – o guitarrista moreno ignorou a expressão carregada da namorada – Eu posso tentar convence-lo.

- A única coisa de que vai convence-lo é de que usamos você para faze-lo voltar. – Reita comentou, recostando-se e encarando o moreno – É isso o que quer?

Aoi rolou os olhos, perdido.

- Eu vou... – Ruki disse – Melhor, eu e Kai. Podemos conversar com ele, a chance é boa demais para a gente perder. Eu não quero voltar para a roda de festivais...

Reita olhou o namorado longamente. Não tinha muito boas lembranças da última conversa entre ele e Uruha.

- Não. Eu resolvo isso. – ergueu uma mão para cortar o protesto do vocalista – Amanhã eu ligo para ele, ok? Eu vou tentar mais uma vez.

Os músicos concordaram, a contra gosto, mas não tinham muitas opções. Reita conhecia o loiro melhor que ninguém e sabia lidar com ele.

 

***

 

Uruha desligou o telefone, incrédulo. Pelo jeito suas irmãs resolveram pegar pesado para que voltasse para casa. Como elas descobriram que não estava tocando, era um mistério. Agora teria que arrumar um jeito para não ser arrastado de volta. Se acontecesse, seu pai nunca mais o deixaria sair de Kanagawa.

Olhou em volta, desconsolado. A verdade é que não tinha procurado nenhuma banda. Até foi sondado por alguns amigos, mas não teve vontade de se juntar a nenhuma.

Apesar de toda a segurança com que respondera a Reita, estava louco para voltar. Sentiu uma falta imensa de tocar e de ficar com eles, mas a idéia de passar por tudo de novo o deixou com medo. Não conseguiu se desligar nem um segundo de Aoi e de tudo o que sentia pelo guitarrista.

Estava quase enlouquecendo de saudade. Passou pela situação constrangedora de ir a alguns festivais, vê-los tocar escondido e aquele sentimento de solidão apenas aumentou. Notou que Aoi não conseguiu encaixar sua música na de Akaya, mas achou que fosse seu ciúme falando mais alto que seu profissionalismo.

- E não era... – murmurou, baixinho.

Decididamente, não sabia o que fazer. Se voltasse, não sabia se conseguiria camuflar o que sentia e se não, tudo pelo qual lutou tanto com os amigos não ia acontecer.

Caminhou lentamente até o pequeno apartamento, subindo as escadas sem nem mesmo perceber que o fez. Parou e respirou fundo, sacudindo a cabeça. Calmamente andou até seu apartamento e entrou, jogando-se na cama e acendendo um cigarro. Encarou o teto, exausto de pensar. Não podia mais continuar daquele jeito ou seria levado de volta para casa, e se aceitasse voltar para a banda, não sabia o quanto seu coração era capaz de agüentar.

E o pior de tudo é que não tinha ninguém com quem desabafar. Seus melhores amigos eram os músicos da banda e os outros, só companheiros. Desde a reação irada de Ruki, guardou tudo para si mesmo. Aprendeu, à custa de muitas lágrimas silenciosas, a trancar seus sentimentos e fingir que tudo estava bem.

Não havia o que fazer se não era correspondido e muito menos, se não conseguiu se controlar. Essa era a parte complicada da coisa, se controlar.

Ver, ouvir e sentir Aoi do lado e não poder reagir de forma nenhuma. Nenhum olhar mais demorado, nenhum sorriso sem motivo... nada.

Não sabia se seria capaz. Longe dele até conseguiu, mas sinceramente? Não sentiu a menor confiança de que poderia fazer.

 

O toque do celular o fez lançar um olhar angustiado para o aparelho. Deixou tocar, tragando o cigarro lentamente e acompanhando os desenhos abstratos da fumaça. Depois de três toques, a pessoa desistiu.

A pessoa não, Reita.

Levantou-se e apagou o cigarro. Tirou a roupa e resolveu que um banho e um sono eram as melhores opções para conseguir descansar e pensar melhor. Não podia errar, não a essa altura da situação. Se tinham uma chance com uma gravadora como a PSC, não tentar era loucura. Deu um meio sorriso satisfeito ao se lembrar de que o empresário notou que o som da banda mudou sem ele, e que agora não estava bom o suficiente. Queria ter visto a cara de Ruki quando o homem disse aquilo. Não por vingança pessoal ou algo do tipo, mas a satisfação pessoal que sentiria... ou melhor, que estava sentindo... uma coisa boa, afinal. Mesquinha, mas ótima.

Deixou a água quente relaxar os músculos tensos e se esforçou para não pensar em nada, brincando com a espuma do sabonete. Depois de terminar, colocou uma roupa confortável e voltou para a cama. Estava sem fome então, concentrou-se em notas e músicas até pegar no sono.

 

****

 

 Reunidos na garagem, os quatro músicos estavam tentando decidir o que fazer. Nadao-san já tinha ligado, perguntando quando estariam prontos. Kai quase teve um surto nervoso, angustiado com a possibilidade de perder aquela chance.

- Você não disse que se Uruha não quisesse, íamos do mesmo jeito? – Akaya perguntou, olhando de um para outro – Vamos assim mesmo, eu ensaiei mais e... não sei... posso tentar tocar melhor.

Aoi ergueu os olhos para a namorada, fumando em silêncio. Kai olhou para ela, desesperançado. A moça simplesmente não encaixava com eles.

- Eu lembro que disse, Akaya. Só não quero ter que fazer isso. Vamos tocar um pouco e avaliar, ok?

Sem esperar, os músicos se ergueram e ajeitaram os instrumentos. O baterista começou a contagem e iniciaram Wakaremichi. Na segunda parte da música, Akaya errou a seqüência de notas e deixou Aoi perdido. Ruki olhou incrédulo para ela.

- Mas o que...

- Essa música é difícil! – ela exclamou, constrangida pelo erro primário.

Reita e Kai se entreolharam, sombrios.

- Vamos tentar Red Motel, ok? – Kai ofereceu, iniciando a contagem antes que Ruki explodisse.

Infelizmente não adiantou. A moça estava claramente nervosa e adiantou dois compassos na música, saindo completamente do tom. Aoi parou de tocar e Ruki sentou-se, ainda segurando o microfone.

- Kaya... – o guitarrista moreno suspirou, passando a mão pelo pescoço – Não precisa ficar tão nervosa.

- Eu quero tanto continuar a tocar e não achei justo o que esse empresário quer! – ela rebateu, apertando o braço da guitarra – Eu sei que posso...

Ela encarou o namorado, desconsolada. Aoi a olhou de volta, sério.

- Não, Kaya. Você não consegue. – o moreno respondeu, depois de alguns minutos – Infelizmente, você não consegue e não dá para fingir. Essa chance é única demais para tentar fazer de qualquer jeito.

A expressão chocada da moça fez o moreno quase se arrepender de simplesmente dizer a verdade, sem rodeios. Ela fez cara de choro, mas Aoi simplesmente se encostou à parede, aliviado pelo toque do celular de Reita.

O baixista atendeu e fez um sinal, sem esconder a expressão aliviada.

- Uruha! Oi!... É, eu te liguei... – parou, ouvindo atentamente o loiro – Tudo bem, estamos na casa do Kai... Você pode vir agora? – Ruki saltou do sofá, abrindo um sorriso. O baixista elevou uma sobrancelha – Ok, eu entendi.

Depois de se despedir, Reita olhou em volta.

- Ele vai vir para cá.

Akaya rolou os olhos, tirando a guitarra do ombro. Aoi quase sorriu de alívio, mas não o fez. Não queria que as coisas se tornassem ruins como antes.

- Sinto muito, Akaya. – o baterista disse, sem esconder o alívio, também.

- Se quiser, pode ir para casa. Eu passo lá depois de terminarmos aqui. – o moreno se aproximou e fez um carinho no cabelo da moça.

Ela se virou, contrariada.

- Porque não posso ficar?

O tom dela fez Aoi erguer uma sobrancelha.

- Eu não disse que não podia. Eu disse por que vamos ensaiar e você pode ficar entediada ou mais irritada do que já está e temos que concordar que não vai ser muito legal, não é?

A reprimenda na voz do guitarrista a fez respirar fundo. Não queria brigar, mas estava frustrada demais para perceber o incômodo dos músicos com sua atitude.

- Eu vou ficar calma. Não há o que fazer, não é?

Ela deu um sorriso e o puxou para um beijo. Aoi correspondeu, desejando internamente que ela resolvesse não ficar. Não queria aquele clima pesado de novo.

 

Depois de algum tempo, Ruki já estava à beira de um ataque de nervos e Kai, batendo nervosamente as baquetas na perna.

- Uruha está demorando. – o baterista comentou – Não é melhor ligar para ele?

A mãe de Kai colocou a cabeça para dentro da garagem, chamando a atenção dos rapazes.

- Filho, Uruha chegou!

O vocalista e o baterista poderiam soltar fogos, mas se contentaram em esperar. O loiro entrou na garagem ainda com o sorriso que dera a senhora que o recebera. As mesmas roupas casuais e o já surrado estojo da guitarra no ombro.

- Graças a Kami! – Ruki comemorou, se aproximando – Achei que a gente ia ter que te seqüestrar!

Uruha olhou para ele, deixando o sorriso morrer um pouco. Reita notou o desconforto do amigo e se aproximou, puxando-o pelo braço.

- Agora que o GazettE está completo, vamos ensaiar o que apresentar ao homem.

Kai evitou maiores comentários e Ruki deixou para lá. Aoi e Akaya, juntos no canto, tiveram reações opostas. O moreno deu um sorriso aliviado ao ver o loiro e Akaya ficou apreensiva. A morena notou que Uruha os cumprimentou com um breve aceno da cabeça, recebendo o sorriso de Aoi e nada mais. Ela não devolveu o cumprimento e o loiro não se aproximou.

Quando se posicionaram, ela notou com tristeza que o namorado estava mais relaxado e muito mais confiante. As músicas fluíram com facilidade e não adiantava fingir. Havia um oceano de diferença entre ela e o guitarrista loiro. Ele conseguia complementar a guitarra de Aoi de uma maneira que ela nunca seria capaz. Quando, sem se darem conta, trocaram um sorriso, aquela sensação incômoda de não fazer parte daquilo tomou conta dela novamente. Apesar de estar ali, ela sentia como se não fosse onde deveria estar.

 

****

 

A voz potente de Ruki, o som apaixonado do baixo, as batidas fortes da bateria e as guitarras em perfeita sincronia fizeram o homem sorrir, atrás da divisão de vidro do estúdio. As músicas tinham letras fortes e às vezes, incompreensíveis. Só Matsumoto sabia o que realmente queria dizer com aquelas palavras aleatórias que na voz grave adquiriam forma, mas podiam significar qualquer coisa.

O contraste do visual ainda podia ser melhorado e a postura da banda também, mas uma coisa não podia se negar. Eles tinham talento.

Os cinco ainda não podiam crer que haviam conseguido. Nadao-san havia saído com Kai para resolver alguns detalhes do contrato, mas tinham conseguido. Os quatro músicos e Akaya estavam esperando numa sala contínua, tentando conter a animação. Aoi se aproximou e abraçou Uruha afetuosamente. O guitarrista loiro ficou completamente paralisado, mas não houve tempo para reação. Akaya puxou o moreno pelo braço, com uma expressão furiosa na face.

Uruha arregalou os olhos, subitamente tenso. Reita imediatamente se aproximou e o puxou para perto de si e Aoi a encarou, abismado.

- Kaya! O que está fazendo?

O moreno olhou dela para Uruha, consternado. Reita estreitou os olhos e o loiro corou, completamente envergonhado. O baixista respirou fundo e puxou o guitarrista pelo braço, levando-o para o outro lado da sala. Ruki o fez se sentar, estendendo a garrafa de água com um sorriso um pouco forçado.

Ela ainda estava parada no meio da sala, vermelha e envergonhada.

- Eu... desculpem... eu não queria... – balbuciou, completamente sem jeito.

Assim que olhou em volta, deu com os olhos negros de Aoi sobre si. O guitarrista moreno não disse nada, apenas sentou-se, afastando-se dela. Ela entrelaçou os dedos, sem saber o que fazer e sentou-se ao lado do namorado, olhando-o hesitante.

- Eu me aproximei e o abracei, Akaya – a voz dele saiu baixa e seca – Ele não tem nenhum tipo de doença ou nada que me faça temer toca-lo. – o olhar duro dele a deixou desconcertada – Uruha nunca se comportou de maneira errada comigo e nunca o faria, confio nele e acho que você passou de todos os limites do bom senso e da educação.

O moreno se levantou e ela o acompanhou com os olhos, incapaz de segui-lo. Aoi simplesmente sentou-se ao lado de Uruha, notando claramente que o guitarrista se encolheu. Reita lhe lançou um olhar duro.

- Desculpe, Uru... – o moreno pediu, inclinando a cabeça para olhar o jovem.

O guitarrista loiro não respondeu e nem devolveu o olhar.

- Isso não está certo – Reita disse, fazendo o moreno olha-lo – Se ela reagir assim a cada vez que vocês se tocarem, não vai funcionar. Ele não fez nada, Aoi.

Akaya se contraiu. Preferia qualquer coisa e ter que se afastar de Aoi. Ela se levantou e se aproximou dos músicos, sentindo claramente a ameaça no olhar do baixista.

- Desculpe, Uruha. – ela colocou uma mecha do cabelo atrás da orelha, sem olhar especificamente para ninguém – Eu não queria ofender...

- Mas ofendeu, e não só a ele. – Reita rebateu, sério – Agiu como se ele fosse tirar um pedaço do seu homem ou tivesse uma doença contagiosa. E não vamos esquecer que foi seu namorado que o abraçou, e não o contrário.

Uruha não sabia onde esconder o rosto. Ainda estava meio atordoado com o abraço quente de Aoi e depois a reação de Akaya. Consciente da proximidade do moreno, ele se aproximou de Ruki. O vocalista percebeu o movimento e entrelaçou os dedos nos dele, compreensivo. Apesar de ter reagido com impaciência antes, agora não tinha como não se penalizar com a situação do loiro. Ele tinha ignorado aquilo tudo para estar ali e não era justo, principalmente quando não tinha culpa nenhuma.

A porta se abriu e Kai entrou, com um sorriso enorme no rosto, que lentamente foi morrendo, ao notar o clima estranho.

- O que aconteceu?

- Akaya não gostou do abraço que Aoi deu em Uruha para comemorar o contrato. – Ruki explicou.

A moça se abraçou, à beira das lágrimas.

- Eu... desculpem... Não sei o que me deu.... – ela tentou explicar, completamente vermelha.

- Vamos embora. Aqui não é lugar para isso. – Kai disse, sério.

Sem olhar para ela, ele atravessou a sala e literalmente puxou Uruha para perto dele. Ajudou o loiro com a guitarra, enquanto os outros músicos recolhiam as coisas.

- Mas que merda, devíamos estar comemorando. – Ruki resmungou, estressado.

Ninguém disse nada e Uruha ficou imensamente agradecido por Kai ter ficado ao lado dele o tempo todo. Deixaram o prédio da PSC. O loiro não conseguiu olhar para ninguém, desesperado para sair dali o mais rápido que pudesse, a alegria do contrato já completamente esquecida. Se encaminhou rápido para o carro, guardando o instrumento no porta malas. Reita se aproximou e deixou o baixo também.

- Uru, não fica assim... – o amigo estava inconformado.

- Tudo bem.

O baixista não rebateu, mas estava óbvio que as coisas estavam longe de estarem bem. Kai e Ruki se aproximaram.

- Vamos beber um pouco? – Ruki convidou, olhando de um para outro – Qual é gente... vamos comemorar!

- Não estou com vontade, mas deixo vocês onde quiserem. – Uruha respondeu, sem olhar para ninguém.

Ruki suspirou. O loiro deu carona para ele e Reita, além de Kai. Akaya e Aoi vieram de moto. O moreno deixou a moça perto do moto e se aproximou.

- Ainda vamos sair? – ele perguntou, tentando desfazer o clima ruim.

- Uruha não quer ir. – Ruki respondeu, contrafeito – Além do mais, acho que sua namorada não ia querer ficar no mesmo lugar que a gente.

- Eu vou deixa-la em casa. Podemos nos encontrar naquele bar perto dos armazéns. – o moreno respondeu, sem parecer ter ouvido o vocalista.

- Lá é um bar gay, Aoi. – Kai respondeu, erguendo uma sobrancelha.

- É um ótimo lugar para comemorar. – o moreno rebateu, virando-se – E eu gosto de lá.

Kai e Reita acompanharam o moreno voltar para perto da namorada e então, ambos saíram. Akaya ainda lançou um olhar um pouco arrependido, seguido de um sorriso sem graça. Uruha estava mais atrás no grupo e não ergueu o olhar. Só queria ir para casa.

- E aí, a gente vai? – Ruki perguntou, olhando o namorado.

- Se ele deixar a namorada, não vejo porque não. – Reita respondeu, dando a volta para entrar no carro.

Ruki e Reita sentaram-se atrás e Kai se acomodou no banco da frente, ao lado de Uruha.

- Onde eu deixo vocês? – ele perguntou, dando a partida.

- Vamos comemorar, Uru. Aoi vai deixar Akaya em casa e então, vamos nos encontrar naquele bar gay dos armazéns. – o baterista respondeu, dando um leve sorriso.

Uruha negou com a cabeça.

- Péssima idéia.

- Merecemos isso. – Kai sorriu – E eu sinceramente quero que ela se exploda se não aceita os amigos do namorado.

- Isso não vai dar certo, Kai – Uruha comentou, baixinho.

- É problema do Aoi, agora.

Uruha podia discordar e dizer que o problema era com todos, se ela continuasse agindo daquela maneira, mas se calou. O guitarrista realmente não queria pensar onde tudo aquilo ia parar e já estava intimamente arrependido de ter cedido.

 

****

 

Aoi estacionou em frente à casa da namorada, esperando que ela descesse. A morena o fez, claramente envergonhada.

- Desculpe, acho que perdi o controle de novo. – ela pediu, com a cabeça baixa.

Aoi deu uma olhada longa na moça e depois suspirou, contrafeito.

- Eu ligo mais tarde.

Ela ergueu a cabeça e o encarou, com os olhos arregalados.

- Você não vai entrar? Ficar comigo?

- Vou para o bar com eles. – o moreno explicou, olhando nos olhos dela.

- Eu vou com você.

- Para quê? 

- Eu não... – ela avermelhou o rosto de vergonha – Aoi... eu não sei o que pensei, só reagi. Fiquei com ciúme e não queria que ele te tocasse... não pode me culpar! - o silêncio do moreno a fez morder o lábio, nervosa - Você está bravo por causa de Uruha, não é?

- Estou bravo porque você vive pedindo desculpas, mas nunca para de ter esses ataques de ciúme completamente estranhos. Uruha e Ruki nunca fizeram nada comigo.

- Uruha se declarou... – ela se interrompeu ao ver os olhos dele se estreitarem.

- E daí? O que ele fez de errado?

- Ele não podia...

- Não podia por que? Você não se declarou para mim?

- Mas eu sou uma mulher...

O moreno a olhou com uma expressão indecifrável no olhar.

- É exatamente por isso que você não vai comigo. Lá é um bar gay e provavelmente vão me passar um monte de cantadas. – deu um sorriso sem humor – É engraçado que eu sempre disse que estava com Uruha para me livrar do assédio, sem o menor problema.

Ela o olhou, tentando entender e não se irritar.

- Eu pedi desculpas para o Uruha, mas Reita não o deixou responder. – ela passou a mão pelo cabelo, tentando explicar – É difícil para mim, Aoi.

- Você mesma está tornando tudo pior, Akaya. – o moreno respondeu, sério – É melhor parar e pensar em como vai ser de hoje em diante. Com esse contrato, nós vamos ficar muito tempo juntos, viajarmos e tudo o mais. E provavelmente você não vai poder ir sempre comigo, como é agora. Se você não puder lidar com isso, vai ser um problema.

Ele simplesmente recolocou o capacete e ligou a moto, deixando-a sem se despedir. Ela mordeu o lábio e se recriminou por não conseguir controlar o próprio ciúme. Suspirou, tentando pensar no que fazer. Estava se descontrolando fácil demais e isso era ruim.

Subiu até seu apartamento, tentando controlar as lágrimas de frustração. Assim que entrou no quarto, ignorando os chamados das irmãs, sentou-se na cama e encarou os pés.

Amava Aoi e não estava entendendo o por que de se sentir tão ameaçada pelo guitarrista loiro. Nunca tinha sido assim, mas desde a declaração... Ainda se lembrava da perplexidade do namorado quando contou a ela, depois de muita insistência sua. Foi como se ele não conseguisse acreditar, mas o que realmente a incomodou (e ainda incomodava), é que ele não ficou com raiva ou se sentiu ofendido.

Aoi não se sentiu tão indignado quanto ela pensou que aconteceria, por ser alvo dos sentimentos de um homem.

Talvez por que fosse Uruha, talvez não. O moreno era até muito tolerante quanto a esse tipo de coisa, bastava ver como apoiava o relacionamento de Reita e Ruki. Ela não conseguia deixar de achar estranho, mas acabou se acostumando. O que fez com reagisse com tanta hostilidade foi a declaração descabida do loiro. Ele não tinha o direito.

Ele simplesmente não podia chegar tão perto a ponto de fazer Aoi notar sua presença e se preocupar com ele como estava fazendo. Isso era...

Ela apertou os lábios, limpando o rosto. Talvez apenas estivesse se comportando da maneira errada, se deixando levar por uma ameaça que não existia. Uruha não tinha se aproximado nenhuma vez de Aoi, depois que voltou. O guitarrista loiro evitou qualquer tipo de situação e ela tinha que admitir, não tinha realmente motivo para se preocupar.

 

****

 

Aoi jogou-se sobre o sofá no canto, realmente tão frustrado como parecia.

- Eu devia ter feito alguma coisa...

Reita encarou o copo, contrafeito.

- Concordo, Aoi. Uruha não fez nada, foi você.

O moreno olhou em volta, incomodado. Uruha realmente não tinha vindo, apesar de toda a pressão do vocalista. Fechou-se no silêncio e não cedeu. Simplesmente deixou-os ali e foi para casa, comprometendo-se a chegar mais cedo e levar os instrumentos que ficaram no carro.

- Eu o considero meu amigo. – o moreno respondeu – Não tenho nenhum tipo de reserva com ele... – parou, tirando a franja da frente dos olhos – Por mim, está tudo bem.

- Mas para ela, não. Devia ter visto o jeito que ela olhou para Uruha... – o baixista rebateu, virando o copo na boca.

- Acho que você tem que resolver isso com ela, Aoi. Uruha não se aproximou de você desde que voltou e não fez nada. – a voz de Kai soou, séria – Agora o problema não é ele, é ela.

O guitarrista moreno olhou o baterista de volta e não respondeu. A noite demorou menos do que previam e logo, estavam de saída. A falta de Uruha e o clima estranho estragaram a comemoração. Reita e Ruki foram embora de táxi e Aoi levou Kai.

 

Mais tarde naquela noite, o guitarrista moreno estava fumando, sentado próximo à janela. Seus pais estavam um pouco decepcionados com o filho, seguindo a carreira de músico. Achavam que ele talvez se saísse melhor num emprego mais convencional, mas não interferiram. Aoi tinha muita coisa para pensar. Desde que se juntou a eles novamente, Uruha o tinha mantido à distância.

Ele conversava normalmente, mas apenas sobre música e assuntos aleatórios. Não tinham mais as brincadeiras e toques, como antes. Foi um pouco complicado, mas até Aoi concordou que era melhor assim. A amizade deles estava mais fria e não dava para ser diferente. Pelo menos, ainda conseguiam se relacionar bem o suficiente para a banda. Nenhum dos músicos sabia dizer como ele ainda se sentia em relação ao guitarrista moreno e também não perguntaram nada. Uruha estava se saindo bem.

Agora, era resolver o assunto com Akaya.

O moreno suspirou. Gostava da namorada e não queria terminar. Ela era divertida e bonita, além de inteligente. Ela o apoiava e foi o incentivo dela que o fez investir tanto na banda, mas agora... lamentava profundamente ter contado sobre Uruha. A namorada não estava lidando bem com a situação.

Era verdade que, no começo, o guitarrista loiro os estava deixando loucos com todo aquele sofrimento claro e angustiante, mas agora as coisas estavam melhores. O Uruha discreto e um pouco confuso de antes estava de volta e isso era mais que perfeito.

Aoi deu um sorriso ao lembrar do amigo. Uruha estava realmente dando o melhor dele pelo bem da banda. Graças a Kami, ele voltou atrás e decidiu tentar e por causa disso, agora tinham um contrato com uma gravadora que podia realizar o sonho deles.

O moreno apagou o cigarro e se preparou para dormir. Seu último pensamento foi para o loiro, uma pergunta quase sussurrada para ele mesmo que nunca repetiria em voz alta.


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