Facção. Dos. Perdedores escrita por jonny gat


Capítulo 62
Quebrou.




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Era um tipo de organização não-governamental criada por um magnata qualquer pra proteger o mundo e todo o seu conglomerado industrial de ameaças vermelhas. Geralmente eles não precisavam se esforçar muito para descobrir as ameaças, sempre havia algum proletariado delator que acabava com as revoluções. Assim o trabalho dos Salvadores era muito mais simples. Não eram possuidores de grandes poderes, mas tomavam doses de drogas pangaláticas que os davam habilidades um pouco sobre-humanas. Nada de absurdo para vocês, leitores, mas com essas habilidades conseguiam acabar com as revoluções, ou melhor, com a cabeça de cada revolução antes que ela desse o ar da graça e começasse a mudar a hierarquia das classes sociais. Os trabalhadores queriam isso, mas os Salvadores da Galáxia não. Ué, se os Salvadores da Galáxia não querem, só pode ser algo ruim, né? Afinal, eles querem salvar a Galáxia. E assim foi espalhado pela mídia o movimento antitrabalhismo. Os operários aspirantes à revolucionários nunca foram tanto oprimidos.

Teve aquela vez que os Salvadores do Universo, três adultos e dois adolescentes, foram invocados por um magnata industrial qualquer para dar a limpa nos marxianos em Nova-Londres, numa fábrica que ficava mais ou menos no hemisfério Norte do planeta entre os estreitos de Kant e de Mendeleev. Era um lugar bastante incomum, não havia fauna nem flora e o clima era completamente frio. Ainda assim, existiam minerais de alta qualidade para serem explorados por ali. Manganês, Irídium, Cobre, apenas maravilhas para as mãos dos magnatas que venderiam para a indústria de construção aerogalática. Os adultos são indiferentes para a história, porque entre os jovens nós temos Cracker, ou Richard se você for um dos Salvadores, e a menina, a mulher mais importante desse capítulo, Sabaneta.

Convenhamos que Sabaneta e Cracker não são nomes muito comuns e talvez isso já seja um bom início de conversa, como por exemplo:

– Ei, eu sou Cracker, me falaram que você se chama Sabaneta, é verdade?

– É sim, por quê?

– É porque Sabaneta e Cracker não são nomes muito comuns. Talvez combinem, quer sair comigo qualquer dia desses?

– Mas eu pensei que seu nome fosse Richard.

– É Cracker, me chamam de Richard porque são drogados. Então, quer sair?

Sabaneta, como estava alta e desesperada para conseguir alguém que pudesse pagar as dividas que ela tinha com a indústria de metanfetamina, decidiu aceitar sim sair com Cracker. E a janta foi uma maravilha. Ela pensou que ele fosse só um cara qualquer, pobre, sem uma espaçonave e sem bom gosto musical. Mas isso tudo estava errado – o gosto musical estava certo, ele tinha um péssimo mesmo, e ainda por cima muito limitado, mas ela era uma mulher interesseira demais que podia muito bem ignorar tudo isso.

– Nossa Cracker, você é um fofo.

ESSAS PALAVRAS FIZERAM CRACKER FICAR MALUCO porque Cracker odiava essa palavra.

– Fofo? Eu não sou fofo. – Porque para Cracker fofo significava a mesma coisa de que estar sendo rejeitado. Odiava essa palavra, todas as meninas – e meninos – que os rejeitaram e que o viam apenas como um amigo, chamava-lhe de fofo. Não queria mais ser chamado assim, não por Sabaneta.

Cracker achava Sabaneta uma menina fantástica demais para que perdesse. Talvez fosse a maior paixão de sua vida. Mentira, não fora, até porque uma vez houve a Tayssa, mas vamos deixar isso de lado? Talvez Cracker até tenha esquecido Tayssa porque ela com certeza esqueceu Cracker. Foi uma dessas por aí que esqueceram Cracker porque ele nunca foi especial pra vida nela e nem sequer tiveram um resquício de um relacionamento amoroso, nem bobo e nem sério. Ele não amava mais essa, amava agora Sabaneta e era tudo que importava no momento. Ele adorava os lábios secos e os olhos arregalados dela, adorava o jeito que ela tinha de parecer sempre... estranha, e de seus vestidos sempre serem roxos com flores amarelas ou vermelhas. Apreciava cada segundo quando ela pegava a xícara para beber o chá de pêssego que havia pedido, e a cada garfada que cada naquele pedaço pequeno de Irídio Orgânico.

– Mas você é muito fofo, Cracker.

– E o que isso significa?

– Que você é uma pessoa simpática e gentil.

– Eu não acho que significa isso, Saba.

Ela gostou do apelido e sorriu, era algo bem simples, mas ninguém nunca havia dito isso.

– Não importa o que é, mas você é.

– Mas se alguém me chama de alguma coisa, eu quero saber do que é.

– Então, tudo bem. Vou te dar a definição de fofo... Fofo é você, Cracker.

Cracker ficou sem graça, e assim o amor por ela aflorou. Estava mais do que no topo de seu limite de amor, estava quase explodindo disso e os sentimentos estavam cada vez mais emergindo, não notou mas suas pernas estavam bambas e estava ereto, sim, ereto por causa de palavras, estranho, né? Talvez não, mas Cracker era um cara bem sensível. Como um homem tão sensível assim, cheio de sentimentos e vermelho de vergonha o jantar todo, se tornou aquela aberração que no capítulo anterior fora derrotada por Molly? O que era aquilo?

O leitor não sabe, mas ele já estava prestes a levantar. É, o homem sobrevivera aos ataques de Molly e levantou, mesmo com seu corpo em farrapos e com a testa sangrando. Sangrava litros de sangue, e sua expressão não tinha mudado ainda. Como dizer o que se passava na mente daquele homem se ele parecia que nem olhos ele tinha?

Como Ramon suspeitava, o homem não foi derrotado. Ainda sentia a presença de Vril naquele homem, a aura maligna que estava perfurando o seu corpo psicologicamente, e não estava vendo esse poder ser liberado. O poder Vril está... Guardado? Não pode ser.

Molly também pensava e sentia o mesmo, e já sentira essa situação anteriormente, numa batalha, há alguns anos atrás, enquanto lutava ao lado de Frota... Mas isso não merece ser citado por completo, é bom deixar algumas coisas por incompletas na história e essa é uma dessas coisas. Molly reagiu mantendo-se como antes, Molly estava sentindo uma coisa estranha naquilo tudo, estavam faltando explicações demais, tudo parecia estar acontecendo aleatoriamente desde que Wilson sumiu do templo. Parecia que as coisas estavam perdendo o sentido lentamente, e que a cada segundo isso aconteceria mais e mais. Já imaginava que não seria apenas aquilo a luta, imaginou que o inimigo estivesse com uma carta na manga até porque a luta estava fácil demais. Aquilo não era uma luta, era algo estranho demais em que o inimigo utilizava técnicas de combate completamente estranhas que havia custado à Molly o braço esquerdo. Não queria perder seu corpo novamente, isso era como um trauma para Molly.

Molly estava pensando em alguma coisa maneira. Não tinha uma luta séria desde a última vez que morreu. Queria algo muito legal. Pensava em alguma coisa legal, como a explosão de seu braço que gerou um clarão. Molly fez algo bem sutil então. Quando Molly uma vez foi uma partícula, e apenas uma partícula, ele achou interessante e ao mesmo tempo melancólico que ele podia, mesmo não tendo um corpo, observar o mundo. Talvez se ele desfizesse de algumas pequenas partes de seu corpo e deixasse suas partículas em locares diferentes, conseguiria ângulos distintos da posição do inimigo caso atacasse. Fez isso, lentamente pequenas dobras desnecessárias de seu corpo foram embora para se tornarem os olhos de Molly. Não tinha só um olho. Agora tinha alguns, alguns 200 olhos espalhados por aí. Era uma técnica interessante que podia ser aprimorada, mas para aprimorar, primeiramente deveria sobreviver ao combate.

– Eu estive pensando, qual o seu nome mesmo?

– É Cracker. – Diferentemente da voz grossa e bruta que Molly ouviu pouco antes do homem dar cerca de setecentos ataques agressivos, dessa vez essa era uma voz muito mas sutil. Uma voz feliz, uma voz que tinha sentimentos.

– Você não perguntou, mas o meu é Molly.

– Que engraçado, nós dois temos nomes estranhos. – Cracker teve uma espécie de dejavu e por um segundo a sua expressão séria e inexpressiva se tornou a expressão de um homem ao lembrar que tinha que chegar às onze da noite e já eram duas da manhã porque estava traindo a sua mulher. – Onde eu já disse isso mesmo?

Molly se assustou com o movimento brusco que os músculos faciais do rapaz e percebeu que alguma coisa estranha estava acontecendo dentro dele. Não pensou duas vezes antes de perguntar.

– Está tudo bem, meu jovem?

– Está. – Cracker agora mostrava expressões em seu rosto. – Ué, por que o seu braço está sangrando?

Molly se surpreendeu porque o rapaz não lembrava e apontou para a espada arranhada e quase quebrada em certas regiões, localizada ao lado de Cracker.

– Fui eu que fiz isso? Não é possível, mas eu nem estava aqui agora há pouco. Eu simplesmente acordei e estava aqui.

– Não, você estava aqui e nós estávamos lutando.

– Isso não faz sentido, Marry.

– Não é Marry, é Molly.

O nariz de Molly começou a sangrar.

– Também sou eu que estou te fazendo sangrar? – O jovem estava confuso demais.

– Creio que não, meu jovem.

– Eu... Estou em péssimas condições. Realmente estávamos lutando? – disse, após reparar que estava em farrapos.

– Estávamos, né, eu disse. Ainda quer lutar?

– Eu não tenho nem pelo que lutar... Sabaneta se foi...

Agora que o homem mostrava pelo menos alguma feição, alguma expressão facial, Molly percebeu que ele era claramente aquilo que acabara de dizer: Um homem sem um objetivo para viver. Seja lá quem fosse Sabaneta, foi uma vez o motivo de lutar desse homem, e a ida de Sabaneta sabe-se lá para onde acabou transformando o jovem num monstro. Num monstro? É, o caolho não descartava a possibilidade de que o homem estava com alguma espécie de trauma que deixou Cracker naquela situação de antes, um assassino que não se move, um assassino que não olha, um assassino que não reage. Claro que poderia ter ficado assim por causa de ameaças externas, mas Molly já havia presenciado a Guerra, já havia presenciado perdas em sua vida e sabia exatamente como as pessoas podem ficar depois que não há mais razão de se viver.

Ele só precisou de uma batida na cabeça para recordar à consciência..., pensava Molly.

Molly pensava que o encontro com Cracker, claramente um Vril, não foi algo que o destino simplesmente traçou sem querer. Algo estava naquilo ali. Ramon, que observava tudo à distância, também pensou que não foi por isso, não acreditava que os passos de Shan Grila pelo universo tivessem feito com que Molly encontrasse aquele homem ali. Aquele assassino, mesmo que com um corpo e mente travado, estava claramente ali para matar Molly. Mas agora que já havia retornado à consciência, já estava melhor.

– O que é você, Cracker? – perguntou Molly.

– Por que você não olha pra baixo? Molly, não é? Talvez a resposta esteja bem debaixo desse seu nariz.

– O que você está insinuando?

– Que eu, assim como você, sou simplesmente poeira cósmica da maior explosão de todos os tempos. A explosão que gerou esse universo.

– O universo não surgiu, ele sempre existiu, foi isso o que aconteceu.

– Como pode afirmar isso com tanta certeza?

– Porque eu vi.

– Como?

– Foi quando eu morri.

– Você conseguiu as respostas das perguntas que você sempre teve quando você morreu, velhote?

– Consegui.

– Mostre-as para mim.

– Eu não vou te matar, se é isso que você quer.

– Você me deixou nesse estado, é claro que você quer me matar. Termine o trabalho.

– Você não é o meu inimigo. Meu inimigo, aquele que eu realmente feri e quis ferir, está agora vagando dentro da sua mente.

– Se você me matar, ele vai junto.

– Eu não levo isso como uma certeza. E, bem, enquanto ele não estiver causando problemas, eu não preciso acabar com ele. Você tem que lidar com as suas perdas, garoto, foi assim que eu vivi até hoje, e eu não vivi poucas épocas.

– Você diz como se tivesse vivido milênios.

– Isso é porque eu aprendi tudo que eu sei com meu mestre. E ele sim viveu milênios. Não sei quanto tempo esse velho viveu, mas deve estar aí desde que o universo existe.

– Será que esse velho sabe as respostas para as minhas perguntas?

– Eu não sei. Para as minhas também não sei se ele sabia, mas ele nunca quis me contar. Você quer ir perguntar a ele? Isso ajudará o seu estado emocional?

– Eu preciso saber onde está Sabaneta, porque...

– Você quer falar disso comigo, garoto?

– Não precisa, velhote, eu já sei muito bem do que eu preciso e conversar com você não vai ajudar muito. Mas eu preciso encontrar Sabaneta e isso vai além do meu dever como namorado dela ou algo assim. Isso é pra salvar o mundo.

– Que coincidência, acho que todos nós estamos tentando salvar o mundo.

– Eu não acho que vocês vão conseguir fazer isso comigo.

– Por quê?

– Porque eu vou salvar um mundo que vocês não conhecem. Um outro mundo, uma outra dimensão, não essa pra qual eu fui enviado. Derrotar o homem que me trouxe para cá é o primeiro passo pra salvá-la. Sabaneta é o mundo, entende?

– Não entendo. Mesmo.

– Vocês podem salvar esse mundo, não vou mais atrapalhá-los. Desculpo-me por ter retirado o seu braço e o seu olho.

– Não... O olho é de épocas bem passadas, sério, e não tem problema, eu arrumo um outro braço, mas mesmo assim é muita gentileza você se desculpar.

– Deixe-me falar com o velho. Qual é o nome dele?

– Don Ramon.

– Don... Ramon?

Não foi preciso que Molly levasse Cracker até Ramon. O próprio sábio aproximou-se deles numa velocidade implacável. Um simples toque em qualquer corpo o faria entrar em órbita. Ramon não deu um simples toque em Cracker. Ramon simplesmente deu o seu soco mais poderoso para que nunca mais tivesse que sentir a aura estupidamente grotesca de um Vril.

Molly se assustou, por que Ramon faria isso com um garoto inocente? O velho não se confundiria achando que o assassino do capítulo anterior e esse garoto eram a mesma pessoa, é claro que o garoto estava transtornado. Mas Molly estava completamente perplexo. Por que isso? O rapaz parecia tão... Comum? Parecia um rapaz que Molly poderia calmamente conversar em um bar enquanto bebiam alguma cerveja bem barata, parecia ser um garoto com problemas de depressão, mas que isso poderia ser cuidado com o tempo. Mas... Mas... Ramon simplesmente... Por quê?

– Por que você fez isso, velho? – Molly não costumava contestar as decisões de Ramon.


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