Harry estava possesso, boquiaberto e possesso novamente pela cena a qual acabara de presenciar. Gina saíra do carro, um Audi estupendo, e pelo lado do motorista. E aquilo era só a ponta do iceberg, porque quando ele jogou propositalmente o farol alto sobre o veículo suspeito em frente a casa dos Weasley, esquadrinhou a silhueta de um homem no banco do passageiro.

O que está acontecendo?

A irmãzinha de seu amigo correu do carro até a porta de casa, como se ela estivesse assustada. Harry viu-se no dever de sair rapidamente do seu próprio automóvel (que custava quatro vezes menos do que aquela máquina) e dar uma boa encarada em quem estivesse lá dentro. Por fim, o inoportuno desconhecido ligou o motor.

Ele correu para a ruiva.

— O que houve? — perguntou esbaforido.

— O que houve o que? — ela berrou impaciente abrindo a porta de casa.

— Quem era aquele?

— Não enche!

Harry viu o quanto a ruivinha estava transtornada, certamente traumatizada. Olhou novamente para a rua, mas a placa do automóvel já estava muito longe para ser identificada.

— Diga quem é que vou chamar seus irmãos e vamos caçar esse desgraçado e dar uma sova nele. — prontificou-se agitado.

— Harry, seu idiota, ele é só meu professor de dança.

— Professor?

Ela levou uma mão à cintura, abandonando a maçaneta.

— É, professor.

— Desde quando isso? — a pergunta escapuliu.

— Isso o que? — Gina estufou o peito. Ainda intratável com ele.

— Seu professor, Gina! Por que esse cara te trouxe aqui? Não! Por que saiu do lado do motorista?

— Porque ele me deixou dirigir.

— Dirigir? Você tirou a carta outro dia!

Novamente um fitar furioso, e desta vez a Weasley entrou pisando duro. Harry fez menção de segui-la, entretanto lembrou-se que ali o território era dos pais e dos irmãos dela também. E ele era apenas o amigo de Rony para ficar seguindo-a pelos cômodos pedindo explicação.

Entrou na residência só escutando os passos da garota se chocando contra o assoalho. Ela começou a subir as escadas.

O rapaz olhou na sala e não encontrou nenhum ruivo à vista. Seguiu direto para o quarto de Rony. Entrou sem bater.

O garoto estava espaçosamente jogado na cama lendo seus mangás.

— Chegou cedo. E sem bater. — comentou ao ver Harry entrar como um furacão.

— Queria conversar comigo? — o questionou com agressividade. O outro não deixou passar. Abaixou sua revista e analisou-o.

— O que houve?

— Tá sabendo que a Gina tava no carro de um marmanjo lá fora?

— Como assim? — pareceu preocupado, deixando a leitura definitivamente de lado.

— Enfiada dentro de um Audi preto. Saiu correndo quando cheguei e tinha um cara lá dentro. Quando a questionei disse que era o professor de dança.

— Eles estavam, tipo, conversando ou fazendo algo mais?

— CONVERSANDO! O QUE MAIS FARIAM?

Rony entortou a cabeça olhando para o vazio. Aquilo irritou Harry.

— Você é bunda mole mesmo, Rony.

— Ei... eu ia te dizer que beijei a Hermione no sábado. Isso é atitude de um “bunda mole”?

— Quer saber? Não tô nem aí pra essa sua vida maluca. Quer se meter com a mulher dos outros, se mete. Cadê seus pais? — perguntou decidido.

— Fazendo compras. — o amigo levantou — Harry, o que há com você? De verdade?

Nem ele sabia. Só queria sair socando alguma coisa ou ir dar uma boa reprimenda na pirralha por ficar entrando na conversa de professores de dança.

— Eu vou chamar a atenção da sua irmã, porque tô vendo que se depender de você, ela se perde nos braços de algum aproveitador.

E saiu correndo para o andar de cima, querendo dizer a ela como funcionava a vida e a cabeça dos homens. A porta do quarto estava escancarada, e o barulho vinha do banheiro no final do corredor. Encontrou-a escovando os dentes, parcialmente vestida para dormir já. A parte de cima do pijama de alcinha e calça jeans azul claro.

Ele entrou sem ser convidado e ainda por cima fechou a porta atrás de si.

— Harry! Saí daqui! — ouviu-a exigir depois de enxaguar a boca.

Tentou abrir a porta obrigando-o a bloquear a mesma com seu corpo.

— Gina, quem é esse professor? Quantos anos ele tem?

— Virou meu pai agora? — disse desafiante.

— Se preciso for. Olha, te vi crescendo, sou mais velho e conheço o mundo. Conheço os homens. Esse é o típico caso de um aproveitador de ninfetinhas. Eles viram professores de dança só pra sair fazendo a limpa nas alunas. Pergunte pra suas amigas, ele já deve ter fisgado metade delas.

— Acho que você foi para a América para fazer um estágio de como se tornar mais idiota e, de quebra, ainda levou um mestrado de retardado, só pode! Estou praticamente convencida disso agora.

— Me escuta... — ele desencostou da porta e aproximou-se da ruiva, tentando tocar no rosto dela.

Gina deu-lhe um tapão na mão.

— Depois não quer que te chame de criança! — exclamou irritado pelo tapa.

— Só tem uma pessoa que realmente me inferioriza a todo instante pela minha idade, Potter. Se eu sou uma criança, desculpe decepcioná-lo, mas é só aos seus olhos que isso acontece. Para qualquer homem lá fora, eu já sou uma mulher.

Harry crispou os lábios no auge do seu descontrole, pegando o rosto dela com as duas mãos. Seus olhares se emparelharam fulminantemente, ele via-se perturbado na presença dela. Não conseguia mais idealizá-la como a pirralha bobinha e esse sentimento o frustrava a cada reencontro.

Lágrimas vieram aos olhos de Gina.

— Eu estou abrindo mão definitivamente das minhas intenções por você, Harry. Não quero mais isso pra mim.

Ele a soltou... e saiu de seu caminho. Ela abriu a porta e passou sem esbarrar em seu corpo.

Sozinho no banheiro, inebriado pelo cheirinho de pasta de hortelã no ar, sentiu-se absurdamente vazio.