Todos aqueles sentimentos não podiam ser absorvidos, enjaulados queimando a carne na região de seu peito, uma dor constante que ele não podia, não queria esquecer.

Ele tocou o vidro da cela, os dedos traçando o reflexo de seu rosto no vidro.

Quem era ele? O deus da mentira, o grande mentiroso, e o mais enganado.

Fechou seus dedos em punho, socou o vidro com força o impacto só causou dor em seu pulso, o vidro permaneceu intacto.

“Eu sou o monstro que os pais contam para os filhos não saírem da cama à noite.”.

Sua voz saiu lentamente, já tinha falado aquilo, algum tempo atrás, não tanto tempo assim, mas tempo suficiente para parecer uma década.

Ele queria fugir, mas para onde? Onde ele poderia ir? Onde ele poderia descansar? Ele poderia ser esquecido, poderia esquecer-se de si?

Não havia um lugar assim em todos os noves reinos.

Um príncipe sem reino, um homem sem destino, uma criança sem família, uma sombra de qualquer coisa que ele já sonhou em ser.

O pensamento não incitou fúria, não casou rebeldia, nem ódio, a certo tempo todos esses sentimentos inconformados tinham morrido lentamente, deixando a vala aberta para outros semearem e crescerem: Rancor. Melancolia. Depressão. Culpa. Apatia.

Ele poderia deitar e dormir, um sono sem sonhos, um sono completo, isso se ele tivesse a chance, mas ele não conseguia nem mesmo dormir.

Seus cabelos estavam grandes, seus olhos vermelhos doloridos pela falta de sono, olheiras negras, o corpo naturalmente magro estupidamente fraco, ele não comia também, mas um deus não morre de inanição por mais que ele se esforce para isso, seu corpo é teimoso demais para sucumbir.

- Loki. – A voz o tirou de sua pequena letargia sua atenção sendo levada a figura alta, brilhante, estonteante de seu belo não- irmão.

- Bem vindo. – Sua voz saiu mais rouca do que o necessário. Ajeitou as costas, estava levemente curvado, como se realmente saudasse a presença do loiro.

- O que estava fazendo?

- Agindo como uma besta cativa, andando de um lado para outro, imaginando coisas malvadas, sorrindo para mim mesmo por debaixo da minha miséria. Enlouquecendo lentamente. Sabe. Todas essas coisas que um bom animal cativo desenvolve para sua própria distração.

A face do loiro se contorceu em desgosto, se aproximando mais do vidro pousando a mão aberta contra a superfície, repetindo o mesmo gesto do mais novo a poucos segundos atrás.

-Loki. – Thor chamou novamente, mais baixo, tão baixo um sussurro, um clamor. Thor estava pedindo para ele voltar a ser o que era, voltar a ser o irmãozinho dele. Loki conhecia o olhar daquele gigante idiota, uma raiva se incitou na superfície de seu ser.

- Deveria vir me ver amanhã, estou planejando arrancar os cabelos da cabeça, e a morder as mãos até arrancar meus dedos. O que acha?

- Chega disso, LOKI! – Ele socou o vidro, que tremeu diante a força estupida do deus do trovão. Loki sorriu levemente, se apoiando contra a parede de frente para Thor.

- O que? Você prefere fazer isso por si mesmo? – Ele sorriu maldoso. – Aposto que você gostaria de arrancar...- Não conseguiu terminar de falar, no segundo seguinte Thor estava na sua frente, a mão do loiro no seu pescoço o apertando, o impedindo de falar, sua cabeça latejou quando o irmão o atirou no chão.

- PARE COM ISSO! – Thor o segurou no lugar novamente, estava ofegante. Loki percebeu como sentia falta do cheiro dele, mas afastou o pensamento novamente, realmente surpreso com o fato de Thor estar ali dentro com ele. Afastou os olhos levemente, do homem furioso acima de si, e encarou o vidro perplexo, ele estava completamente despedaçado, então ouviu o canto de Mjolrn o martelo gritava firme na mão de seu irmão.

- Entendo. – Voltou à atenção a Thor que encarava realmente possesso. – Prefere fazer essas coisas por si mesmo.

Thor rosnou e olhou para o irmão quase perplexo. –Não tenho intenção de te ferir! Loki! EU nunca tive a intenção de te ferir de nenhuma forma!!! – Ele gritou nervoso ainda prendendo Loki contra o piso.

Loki realizou que aquilo não era mentira, não era e ele sabia disso, Thor tinha a capacidade intelectual de uma ameba, sendo gentil, e um controle emocional pior do que de uma dama em TPM.

Sempre rápido para raiva, e tendencioso a esquece-la mais rápido ainda. Esse é Thor, guerreiro dourado, príncipe de Asgard, herdeiro do Trono de Asgard, Deus do trovão, matador de Jötun.

- Quando você me olha assim, eu tenho vontade de fugir. – Thor quebrou o silêncio tenso entre os dois, se afastando de Loki se sentando pesadamente ao lado do moreno que permaneceu deitado contra o chão gelado.

- Perfeito. Pelo menos temos isso em comum. - Sua voz saiu dolorida, e ele fechou os olhos tentando restaurar o mínimo de vontade para continuar a importunar Thor. Sentiu os dedos do irmão traçando o maxilar de seu rosto, escorregando o dedo até o queixo de Loki, descendo para seu pescoço. O mentiroso deixou um leve suspirou escapar de seus lábios.

- Você parece tão quebrado...- Thor murmurou afagando a pele com cuidado, seus dedos ásperos traçando linhas no pescoço marcado no irmão. Que ironia. Loki lambeu os lábios levemente. “A mão que afaga é a mesma que apedreja.”. Tinha lido isso em um poema Midgardian, outrora as palavras pareciam apenas capricho de um poeta amargurado, agora ele vivia poesia. Acabou rindo de leve.

- Eu não sei o que fazer para te concertar. – Thor gemeu alto e o puxou para seu colo, as mãos brutas em sua cintura o puxaram como uma boneca para o colo do loiro, sua mão afagava agora a parte baixa de suas costas.

- Algumas coisas são irreparáveis. – Não sabia se estava falando consigo mesmo, ou com Thor, o cheiro do irmão o atingiu de uma vez, ele tremia levemente, de repente se sentindo cansado demais para resistir, gritar, esbravejar, pensar ou ser desagradável.

- Não você! Não! – Thor falou segurando seu rosto, o forçando a encarar aqueles lacrimosos olhos azuis. – Eu não quero perder você para sempre.

Loki sentiu um aperto no coração, uma dor que causou um pequeno gemido de choque, as lágrimas amargas principiando por trás de suas pálpebras.

- Não quero perder você, para toda essa raiva doentia de si mesmo. – Thor afagou suas bochechas, encostou sua testa na dele. O cheiro dele mais forte. Loki fechou os olhos, aproveitando o calor que o outro emanava.

- Quando eu cai. – Sua voz saiu tremula. – Eu esperava que você tenta-se me segurar. No fundo do meu coração, eu queria. – Ser sincero fez sua garganta se aperta-se. Thor estava prestando profunda atenção nele. – Mas ao mesmo tempo queria que você esquecesse-se de mim, porque eu não suportei aquelas mentiras, não suportei pensar que tinha perdido você, e fiquei com ódio de você, porque eu amava você demais para aguentar saber que você me repudiaria. – Sentiu que estava chorando quando a lágrima salgada tocou seus lábios.

Thor não estava em um estado diferente do moreno. O loiro então o trouxe para mais perto se possível, e seus lábios se encontraram em um afago salgado, e pesado, quase bruto.

Loki sentiu seu corpo se arrepiar e abriu os lábios levemente, permitindo a passagem da língua do loiro, que envolvia seu rosto com sua mão quente afastando as lágrimas teimosas, enquanto a língua quente duelava com a sua, uma luta lenta e sensual que causava arrepios nas suas costas.

- É hora de perdoar Loki. – Thor falou o queixo apoiado na sua cabeça, suas costas repousadas contra o peitoral firme do loiro.

- Não Thor. – Loki falou encarando a mão do loiro, os dedos dele entrelaçados nos seus.

- É hora de redenção.