A Feiticeira escrita por rkaoril


Capítulo 10
Papo-Cabeça




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X

SABRINA

COMO HAVIA PREVISTO, Sabrina não dormiu naquela noite. Ela ficou se revirando na cama por longas horas, pensando no que estava acontecendo com aquele lugar. Quando havia levado ela e suas amigas para o acampamento, Professor Sheep havia dito que o Acampamento Meio-Sangue era um lugar seguro para crianças como elas. Até agora, elas só haviam estado seguras até o pôr-do-sol, até onde se lembrava.

Sabrina se levantou de sua cama. O chalé 6 era um lugar espetacular – ou pelo menos em seu ponto de vista. Por dentro, ele era quase que uma biblioteca em miniatura – haviam livros por todo o lugar, seguidos de mapas táticos das mais remotas épocas e pergaminhos, canetas, cadernos e computadores em todos os campos. Durante o dia, ela tinha visto os livros em cima das camas para limpar o caminho e facilitar o transito dentro do lugar, mas de noite todas aquelas bugigangas estavam no chão.

Sabrina conseguiu encontrar seus óculos e passar pelo labirinto de livros até a porta da cabine, deixando o lugar silenciosamente. Ela precisava caminhar, precisava de ar fresco e precisava decidir o que fazer.

Havia sido de mais para um dia só – primeiro o cavalo em chamas, então uma queda do céu até um lago congelado, seguido de um passeio em um acampamento cheio de coisas da mitologia grega, o reconhecimento de maternidade após 15 anos (antes tarde do que nunca) e então, uma guerra com monstros na qual uma de suas melhores amigas salvou o dia só para desmaiar de exaustão.

Ela caminhou pelo campo completamente silencioso, ouvido as corujas na floresta piarem e às vezes, ninfas dormindo pelo chão e até alguns sátiros. Ela pensou ter visto uma mulher com penas em atrás de si mesma uma vez ou outra, mas foi apenas um vislumbre. Ela caminhou pelo acampamento até chegar ao lago, o lugar no qual tinha despencado do céu. Ela se sentou na ponte que havia nas margens, e ficou ali por alguns minutos encarando a vegetação e com a cabeça vazia.

Uma pessoa se sentou ao seu lado.
– Olá. – disse a mulher. Quando a viu, Sabrina quase teve outro ataque do coração.

A mulher era muito bela, embora não como uma atriz ou modelo. Ela tinha longos cabelos negros atados em uma trança longa nas costas, grandes olhos cinzentos e usava uma roupa parecida com a de uma advogada – camisa social e saia longa – assim como sapatos de saltos baixos. Ela apoiou as pernas na superfície sólida do lago, e olhou para o céu.
– Da última vez que eu te vi, pessoalmente – disse a mulher – você tinha 3,650 kg e 20 centímetros. – ela sorriu para Sabrina – E não usava óculos.
– M...mãe? – disse Sabrina, um pouco assustada. O sorriso da mulher se alargou.
– Fico feliz que você me reconheceu, Sabrina – disse Atena – é muito bom finalmente poder falar com você, mas eu sinto ter que dizer que não será uma conversa agradável de mãe e filha. – Sabrina engoliu em seco.
– Certo. O que você tem para me dizer? – Atena suspirou.
– Estamos atravessando tempos difíceis, aqui e no Olimpo. Zeus está sendo tolo e os outros – a maioria pelo menos – estão assustados. Um grande desafio se aproxima de vocês, e não é algo que será tão fácil quanto escapar daquele autômato.
– O que nos espera? – disse Sabrina mais calma.
– Faz algum tempo – disse Atena – que uma ameaça similar abalou nosso planeta. Algum tempo antes do que você conhece como a Guerra de Tróia, uma semideusa muito poderosa nasceu. Ela foi a primeira meio-sangue nascida de sua mãe, uma deusa muito poderosa que até meu pai teme.
– Zeus temia essa deusa? – perguntou Sabrina, muito alto. Atena levantou as sobrancelhas e a acalmou com os olhos, como se dissesse em sua mente algo como mais baixo querida. Eles não precisam nos ouvir no Olimpo.
– Lamentavelmente, sim. Ela era tão poderosa que sua participação em guerras divinas e humanas decidia o lado vencedor. Percebendo isso, ela se afastou da humanidade por um tempo, não se envolvendo em questões oficiais ou vindo ao mundo dos mortais por cerca de cinco mil anos. Durante esse tempo, ocorreram guerras importantes nas quais ela não teve qualquer participação. Mas não é exatamente isso que eu quero te falar.

Atena descalçou seus sapatos e os colocou ao seu lado, ajeitando sua postura e puxando um palmtop do nada. Ela escreveu alguma coisa com a caneta especial rapidamente, apenas para depois guarda-lo em um bolço.
– Me desculpe, um universitário em prova estava fazendo uma prece. Onde estávamos?
– Você ia me falar sobre a semideusa poderosa. – disse Sabrina delicadamente, dessa vez no mesmo tom que Atena.
– Ah, sim. A Feiticeira. É assim que nós a chamamos. Havia um livro que usava um método similar, Harry Potter? Sim, em Harry Potter eles chamavam Voldemort de Você-Sabe-Quem. Nós a chamamos de Feiticeira.
– Você leu Harry Potter? – Sabrina perguntou com os olhos estreitados, era seu livro favorito. Atena sorriu e colocou a mão no peito orgulhosa.
– Quem você acha que é a mãe de Joanne Rowling?
Isso explicava muita coisa para Sabrina.
– De qualquer forma, a Feiticeira se mostrou muito boa na arte da Magia. Eles devem ter explicado à você no chalé a respeito da Névoa, não é? – Sabrina assentiu – Existem aqueles que conseguem manipulá-la. A Feiticeira é a mortal que melhor dominou essa arte, tendo conquistado muitas riquezas e outras recompensas com isso. Por um tempo, ela havia sido apenas uma forte semideusa na qual meu pai tinha uma pulga atrás da orelha. Sendo filha de quem era, ele sempre fazia o possível para dificultar sua vida. Nós, os outros deuses, pensávamos que ele estava fazendo muito caso de uma menininha. Eu mesma estava admirada com sua força e astúcia, mas nunca pensei que ela ira modificar tanto seus princípios para atingir seus objetivos.
– “Após ter boa parte de sua e companheiros destruída por meu pai, que sempre fazia de seu destino pior do que as próprias Parcas, ela se virou contra o Olimpo. Usando seus poderes mágicos, ela entrou no Jardim das Hesperídes e roubou uma maçã de ouro, tornando-se imortal. Após isso, ela usou seus poderes de semideusa – aqueles que não eram relacionados a névoa – para construir um exército de monstros. Convenceu vários deuses menores e um primordial, fazendo deles suas peças em um tabuleiro para usurpar o Olimpo. Por pouco ela não atingiu seus objetivos, ela só tinha sido detida por sua própria mãe, que após muitas mortes decidiu que era hora de intervir.
– “Ela foi selada quase que completamente no Mundo Inferior, só não foi morta por causa da maçã que comeu. Acho que isso era seu plano b, no caso da usurpação não dar certo. Após milênios de seu selamento, um de seus mais fiéis seguidores finalmente se recompôs no Tártaro, dando início ao ritual necessário para acordá-la, que devia ser no dia mais sombrio.
–“Felizmente, a deusa poderosa que era sua mãe havia estado a par de todas as profecias do Oráculo, tal como mantendo-se por perto do próprio Apollo. Ela conseguiu decifrar as profecias e previu uma batalha final que finalmente colocaria um fim na Feiticeira, mas também soube de coisas negras no futuro: a Feiticeira despertaria antes do nascimento dos heróis que estavam destinados a vencê-la. Coincidentemente, estando tanto tempo a par do mundo mortal por perseguir constantemente o Oráculo, ela se apaixonou por um mortal.
–“Quando seu filho nasceu, ela pensou que ele poderia se tornar tão forte quanto a Feiticeira, podendo por um fim nela e iniciando a cadeia de acontecimentos que levaria a Feiticeira à ruina. De certa forma, ela estava certa, mas não precisamente. Acabou revelando-se que seu filho não estava destinado a vencer a Feiticeira, mas sim dar início a profecia com outro papel. Ele se sacrificou para manter a Feiticeira dormindo por mais tempo, para dar tempo aos heróis da profecia para se prepararem.
–“Trinta anos se passaram, e o selo do último herói está se quebrando. É por isso que o acampamento está sendo atacado, Sabrina, e é por isso que eles estão trazendo todos os semideuses o mais rápido possível para o acampamento. Em parte por que ela está planejando uma matança para eliminar os supostos heróis da profecia, e em parte por que dentro do acampamento, eles tem mais chances de se prepararem para a luta final.”

Após essa longa explicação, houve um momento de silêncio. Sabrina tinha sua cabeça trabalhando a 200km/h, tentando processar e guardar tanta informação quanto possível. Após algum tempo refletindo, ela olhou para os olhos tempestuosos de sua mãe.
– Você acredita que eu e minhas amigas somos os heróis da profecia? – Atena ficou ainda mais séria.
– Sim. – ela disse – Mas vocês não são as únicas. Amanhã de manhã haverá um conselho de guerra. Você deve pedir à sua irmã, Verônica, para que ela solicite uma profecia do oráculo. O oráculo irá dar a profecia que irá revelar os passos que vocês e suas amigas devem seguir para encontrar os outros heróis. Longe do acampamento Meio-Sangue, vocês irão firmar laços mais fortes com os Romanos e encontrarão os outros heróis lá. – Atena então fez uma coisa que Sabrina não esperava: ela levantou sua mão e tocou de leve sua bochecha – Eu acredito em você. Faz cinquenta anos que eu não via uma filha minha tão dotada de inteligência quanto você. Não se aflija quando as batalhas chegarem: os heróis que tem inteligência o bastante para resolver seus problemas são muito melhores do que aqueles que usam os punhos. Além disso, eu tenho um presente pra você – ela sorriu. Do mesmo modo que tirou o palmtop de lugar nenhum, algo parecido com uma luva feita de fio de ouro apareceu em sua mão do nada. Ela colocou o objeto nas mãos de Sabrina.

A luva tinha um corte cigano: ela não cobria nenhum dedo, mas tinha um círculo para encaixar o dedo médio. Era feita de fios de ouro com uma pedra cinza em formato de retângulo no centro e ia até o pulso de Sabrina. Ela a vestiu e esperou ansiosa para que algo acontecesse, mas nada ocorreu.
– Aperte a pedra. – sugeriu Atena.

Sabrina fez o que ela disse, e se arrependeu quase que instantaneamente. No momento que fez isso, a luva ganhou vida. Ela então se desdobrou em bronze, criando um círculo ao redor de seu braço e formando um lindo escudo brilhante.
– Isso... é lindo mãe. – ela conseguiu dizer. Atena sorriu.
– Eu achei que você fosse gostar. Mas não se esqueça, isso tem mais de mil utilidades.

Atena então se levantou, vestiu os sapatos e estendeu a mão para Sabrina se levantar.
– Eu devo ir agora. – ela disse – Apenas se lembre do que eu disse, certo?
– Certo. – disse Sabrina. Ela já ia indo quando de repente parou como se tivesse tido uma revelação.
– Eu quase me esqueci! –disse ela, sorrindo para Sabrina – Mande um recado para suas amigas, certo? Diga a Suzana que ela não deve tentar interpretar as profecias por si só e a Elizabeth que ela não está ficando louca. – Sabrina achou estranho o que Atena disse, mas concordou – Adeus filha. Espero te ver em breve.

E então Atena sumiu.


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