As consequências de nossos atos são sempre tão complexas, tão diversas, que predizer o futuro é uma tarefa realmente difícil. – Alvo Dumbledore

—Eu não aceito, ela só pode estar brincando e é uma brincadeira de muito mau gosto! - Isabele caminhava por entre as macieiras das terras de Cair Paravel, não pregara os olhos a noite inteira, a revelação feita pela melhor amiga ainda assombrava sua mente e seu coração. Como poderia Mariana deixá-las ali? Depois de tudo o que passaram?

—Falar sozinha, mesmo em Nárnia, não costuma ser um bom sinal. - a voz de Edmundo a surpreendeu, mesmo em meio ao caos de seus sentimentos, sentiu o coração acelerar e as mãos suarem, não disse nada. Ao se aproximar, o rei notou que a garota sustentava uma expressão severa, magoada, e sentiu-se mal ao vê-la assim. - Não fique assim, Isabele, a Mary só está tentando fazer o que é melhor...

—Melhor pra quem? Para ela mesma? - respondeu a garota, insistindo em sua teimosia. Ele sorriu, balançando a cabeça em descrença da irritação da moça.

—Não, ela só está magoada e não quer atrapalhar ninguém. - ela o olhou pela primeira vez desde que o mesmo se aproximara, encontrou-se com um sorriso calmo e acolhedor, desejou que ele a abraçasse e dissesse que tudo passaria. Não fez nada, permaneceu quieta, fitando-o a espera da continuação. - Você ouviu o que disse ontem no jantar, todas vocês acharam algum... Motivo para lutar... - ele não conseguiu prosseguir por que a verdade acabara de lhe acertar como um golpe de espada, com os olhos arregalados ele compreendeu o que Mariana queria dizer na noite passada ao sugerir que Isabele o tinha como motivo para lutar.

Por Aslam, como pode ser tão tolo de não perceber isso antes?

Sem precisar dizer nada, ela já entendera a qual conclusão ele havia chegado, por que em seu íntimo, já sabia disso há muito tempo, apenas não aceitava e não queria admitir, afinal, diferente de Allessandra que parecia aceitar tudo muito bem entre ela e Pedro, Isabele não pensava assim. Ela era uma plebeia, uma pessoa órfã criada num lugar sem estruturas de lhe proporcionar o que mais precisara, ele era um rei, crescera no mundo dela, mas ainda assim tinha um padrão de vida muito melhor, e ali, em Nárnia, ele era um soberano, mesmo que Caspian seja o legítimo herdeiro do trono, Edmundo é o antigo rei e jamais deixará de ser.

—Isabele... Você tem algo para me dizer? - a pergunta soara suave, quase sem intenções propriamente ditas, mas era óbvio que elas estavam ali, impregnadas no contexto da situação.

—Acho que não, majes... - ela não pudera terminar, seu corpo havia sido puxando de encontro ao dele, seus olhos estavam tão fixos que ela poderia se perder na imensidão escura de suas íris, sentindo seu corpo formigar com a proximidade, deixou-se levar e encostou seus lábios aos do rei, aconchegando-se em seus braços e o enlaçando pela nuca.

Enquanto os dois se perdiam em sentimentos, Júlia caminhava ao lado de Benson pelo pasto, ajudando-o com o cavalo que ela havia escolhido no primeiro dia em que cavalgara.

—Será que a Mary vai embora mesmo? - Jubs sentia-se triste pela possibilidade de deixar a amiga, havia crescido com ela, era sua família, e assim como Alle e Izzy, tudo o que tinha.

—Não sei, mas espero que mude de ideia. - Benson comentou, fitando-a de soslaio. - Mesmo que ela vá apenas para Myriades, sei que ninguém ficará feliz em deixá-la ir. - Júlia sorriu triste, sabia que ele a compreendia, havia se tornado um bom amigo para Mary, assim como os demais.

—Eu só espero que alguém consiga convencê-la rápido, por que pelo que o mensageiro disse hoje pela manhã, Kyron foi visto e não demorará a ser capturado, e quando isso acontecer, ela vai partir com Jordana para ilha. - suspirou pesadamente, parando ao lado da cerca que separava o pasto do restante do terreno, Benson deixou o animal ali e se juntou a ela, pegando-a pela mão, guiou a jovem pelo terreno até pararem em frente ao penhasco, de onde a vista era magnífica.

—Não se preocupe, nós daremos um jeito, sim? - ele a olhou apaixonado, como sempre fazia quando tinha oportunidade de fitá-la tao de perto, sorrindo docemente aproximou-se da garota, que já esperava por isso e a abraçou; repousando sua cabeça contra o peito do guerreiro Júlia sentiu-se segura de que tudo se ajeitaria de uma forma ou de outra, eles dariam um jeito na situação.

Lá embaixo, sem saber que os amigos poderiam vê-la, Mariana caminhava com a mãe pela praia de Cair Paravel, as duas já haviam conversado sobre tudo, e agora estavam em silêncio, observando a imensidão azul estendida pelo horizonte, RipChip caminhava com elas, apesar de não admitir, gostava da moça e da rainha.

—Tem certeza da decisão que tomou querida? - Jordana perguntou quando ambos pararam próximos a uma pedra, sentaram-se ali e deixaram que o calor do Sol aquecesse seus corpos.

—Para falar a verdade não, mas sinto que é o melhor a fazer. - após uma pausa para olhar ao redor, notou que o pequeno rato parecia entretido com algo que achara na areia, um pouco mais a frente de onde as duas se encontravam. - A senhora viu o que aconteceu ontem. A rainha Susana me odeia, e não quero atrapalhá-la em seus planos.

—Por que diz isso, Mary? - a rainha tomou a mão da filha entre as suas, confortando-a antes mesmo de ouvir o que a moça tinha a falar.

—Ela acredita que eu estou envolvida de alguma forma com Caspian, digo, com o rei décimo. - ela suspirou antes de continuar. - Vi os dois juntos outra noite, antes de irmos até Myriades, ela praticamente o pediu em casamento, mas não fiquei para ouvir a resposta, desde então sinto que ela me persegue com a intenção de me afastar.

—Mariana, por que ela faria isso? Não há motivos para tentar afetá-la, ou há? - Jordana não era boba, notara que havia algo a mais naquela conversa que não estava sendo contada, viu a filha engolir em seco e a resposta já fora obtida antes de ser proferida.

—Não, eu creio que não. - negou veemente, tentando convencer a si mesmo. - O rei e eu somos bons amigos, ele me ajudou muito quando cheguei, assim como fez com as demais, nós costumávamos cavalgar pelo reino, ou conversar no fim da tarde quando ele acabava seus afazeres, por fim, quando todos chegaram isso não tornou a se repetir, mas creio que a rainha ainda tema a minha presença aqui por conta de algo do tipo. - explicou rapidamente, sentindo as bochechas corarem ao se lembrar dos momentos em que passara na companhia de Caspian.

Jordana não disse nada, mas também não precisava, já tinha certeza do que se passava ali e desejou que Kyron fosse capturado o quanto antes, precisava ajudar a filha.

Escondido em meio aos coqueiros que cercavam a praia, ele ouvira tudo e não dissera nada. O pânico que se apossara de seu peito desde a noite passada, impossibilitando-o de dormir, começava a se dissipar com as revelações da garota, mesmo as não ditas, foram o suficiente para levar um singelo sorriso ao rosto do homem que agora retornava para o castelo com muitas dúvidas e algumas certezas.

—Susana, acho que você me deve uma explicação. - Lucy disse ao adentrar o quarto da irmã, a mesma encontrava-se em frente ao espelho, penteando os cabelos e sem se importar com a invasão da irmã, a rainha Gentil passou o batom que tanto lhe agradava e virou-se para fitar a visitante.

—Não lhe devo nada, Lucy. - respondeu rapidamente, pondo-se de pé e caminhando até a cama, onde se sentou.

—Oh não? E o que foi tudo aquilo ontem a noite? Por que foi tão rude com Mariana, daquela forma? - a mais nova quis saber, pondo a mão na cintura e fitando a irmã a espera da resposta. Susana bufou, abismada com a intromissão de Lucy em seus assuntos.

—Não é algo que lhe diga respeito, Lucy. - disse prontamente, fitando-a com o cenho franzido, a mais nova não se abalou. - Você deveria estar passeando com os demais e não aqui me perguntando coisas inúteis. O que eu disse para aquela... Plebeia não diz respeito a você ou a ninguém. - e após deixar a garota boquiaberta, a rainha Gentil deixou o quarto, rumando para o andar inferior onde esperava encontrar Caspian.

Lucy olhava estarrecida para porta pode onde a irmã passa a pouco, o choque das palavras que a morena usou a deixou completamente sem chão. Sabia que Susana havia mudado após a saída de Nárnia, só não imaginou que fosse tanto. Doía-lhe muito admitir, mas já não sabia quem era sua irmã no atual momento.

Na biblioteca do castelo, Pedro e Allessandra encontravam-se entretidos em uma conversa animada, o rei fizera de tudo para distrair a moça, que sustentara um olhar triste durante toda a manhã.

—Então, acho que podemos dar um jeito. - Alle disse animada com a possibilidade de manter a amiga ali, após a ideia que tivera, e com a ajuda de Pedro e dos demais, talvez seu plano desse certo.

—Com o seu plano, não sei se fico feliz ou triste. - confessou ele.

—Ué, e por quê? - curiosa, questionou ao rei, que sorriu com a expressão em seu rosto.

—Já que alguém que amo sairá perdendo. - respondeu simplesmente. - Por outro lado, não acredito que haja um sentimento sincero por parte dela. - deu de ombros.

—E da sua parte? - a pergunta surpreendeu o loiro, que a fitou desconcertado, ela também não tinha pretensão de constranger ninguém, mas a dúvida fora mais rápida.

—Ainda restam dúvidas depois de ontem? - ele lhe respondeu com outra pergunta, fazendo-a sorrir.

—Gente, temos novidades! - Júlia invadiu a biblioteca ao lado de Benson, os dois estavam vermelhos pela corrida, e pouco se importaram em terem atrapalhado o momento entre o rei e Allessandra. - Vamos nos reunir no salão informal. - e então correram porta afora, depois de trocarem um rápido olhar, Allessandra e Pedro fizeram o mesmo, parando apenas ao chegaram no salão e encontrarem os demais.

—Para que nos chamaram aqui? - Caspian perguntou, fitando diretamente ao responsável pela guarda do castelo.

—Temos novidades sobre Kyron.