Do Lado De Dentro escrita por Mi Freire


Capítulo 43
Primavera




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"É que, às vezes, o coração acelera em câmera lenta."

O baile da primavera esse ano seria diferente. Aconteceria na tarde daquele domingo e pouco a pouco os convidados iam chegando e sendo acomodados no grande espaço preparado no salão de festas.

Os alunos não só fariam parte do baile, como também, muitos de nós, ajudaria na organização e todos os preparativos ao lado da professora Eliza que estava divinamente linda em um vestido azul celeste.

— Será que seus pais vem? – Amy estava muito nervosa pensando nessa possibilidade desde que acordou aquela manhã.

Nós duas estamos na cozinha. Hoje seremos uma espécie de garçonete e servirem com elegância e sutileza a todos os convidados que nos esperavam no grande salão. Entre eles os pais, funcionários do colégios, responsáveis e amigos dos alunos e professores.

— Eu espero muito que eles venha, Amy. Será ótimo! – dou um beijinho no rosto dela. — Agora venha, me ajude com essa outra bandeja.

Estava na hora de servimos as bebidas.

— Hayley, você está linda! – cruzamos com Nath e Eric ao seu lado pelo caminho até os convidados. Eles, ao contrário de nós, tem a função de ver se as coisas estão em ordem e se não estiverem têm que ter uma solução. — Amy você também, amiga.

No começo me senti ridícula sendo praticamente obrigada a usar aquele vestido floral em comemoração à primavera e um avental branco amarado a cintura e sapatilhas claras. Estamos definitivamente parecendo uma dona de casa se essa era a intensão. Meus cabelos foram amarrados em um alto coque, diferente da Amy, já que os delas são muito curtos.

A decoração do salão é simples, como estivéssemos apenas em um chá da tarde de um domingo qualquer. Flores como enfeites, toalhas brancas para as mesas, xicaras de porcelana, arranjo de flores, cortinas floreias, carpetes e perfume de flores por todo o ambiente.

A banda do Jesse está no palco já tocando. Mas nada de um show de rock pesado onde a galera pula e grita no meio do salão. Estão todos sentados, nada de grandes aglomerações. Os garotos tiveram que trabalhar duro para fazer uma pequena seleção de músicas mais calmas e clássicas de décadas passadas.

— Você não é a mãe do Jonathan? – um dos garotos da banda. Estou ao lado da mesa de uma senhora elegante, porém simples com cabelos pretos que insistem em ganhar alguns fios grisalhos. — Prefere limonada, suco de maça ou chá de erva-doce?

— Oi. E você é a Hayley? – assinto, sempre com um sorriso impecável. Exatamente como a professora Eliza pediu. Pelo canto do olho vejo a Amy servindo biscoitinhos na mesa mais próxima. — Eu aceito um copo fresco de suco de maça. – sirvo-a. — Obrigada querida.

Afasto-me. Antes de partir pra próxima mesa e depois pra outra e pra outra até ter que reabastecer minha bandeja, volto-me para o palco, e aceno mesmo de longe para o Jesse. Ele retribui sorridente, muito elegante com uma roupa mais social atrás do piano.

Não vejo Tyler por nenhum lugar. Sei exatamente que ele não queria está ali aquela tarde forçando sutilezas para esses desconhecidos. Eu bem que tentei insistir, mas nesse momento ele deve estar escondido em algum lugar com seus amigos. Oliver, está em uma das portas do salão, vestindo em um blazer preto e uma camisa branca com botões. Ele está recepcionando os convidados que chegam. Estou orgulhosa dele.

Alexa, que hoje parece muito normal, ao contrário de dias atrás em que na maior parte do tempo eu a encontrei sozinha vagando pelo colégio com um ar de esquisita e uma aparência de cansada, está conduzindo os convidados até as mesas que lhe são destinadas.

— Hayley, aqueles não são seus pais? – Amy cochicha ao meu lado minutos depois que nossas bandejas já estão vazias e precisamos retornar a cozinha e pegar mais.

Meus pés são estão doloridos e o baile mal começou.

Mamãe e papai entram de braços dados sendo conduzidos por Alexa que está sempre bonita. Parece que toda roupa fica boa nela. Amy vem atrás de mim em direção aos meus pais, de longe vejo que Oliver também está indo até eles.

Todos nós nos cumprimentamos assim que eles sentam a uma mesa no canto.

— Mãe, você está linda! – Oliver dá um abraço apertado em mamãe. Mesmo mais afastada, é quase como se eu pudesse enxergar lágrimas em seus olhos que brilham a luz do sol que adentra as janelas.

Não há tempo para conversas, precisamos voltar aos nossos postos, retornar ao trabalho que nos espera.

Penso no Jesse. Talvez ele seja um dos poucos alunos em que os pais não foram convidados porque estão mortos. Tento pensar em como ele está se sentindo nesse momento. Se está tranquilo ou decepcionada por ver todos os pais dos amigos menos os dele. Também não sei dizer se Alexander, ou algum outro parente dele, vem para o baile.

— Hayley, por favor, me ajuda. – Tyler toca meu ombro. Quase deixo a bandeja cair conforme vai sendo preenchida por Lucinda, outra aluna voluntaria. — Meus pais estão aqui.

— Tyler, por favor. – o repreendo, levando-o até um canto mais reservado enquanto ainda tenho tempo. — Não seja impiedoso. Vai lá e fale com os seus pais. Eles estão aqui por vocês essa tarde!

— Não, eu não vou. – ele faz careta. — Hayley, você sabe que detesto essa situação. Não quero vê-los. Não agora.

E ele sai, cuspindo fogo pela boca.

— Oi bonitinha – uma morena alta, magra e bem vestida me para no meio do caminho até a próxima mesa na qual eu iria servir com refresco. Ela parece bem mais nova do que realmente deve ser. Recoberta por joias. — o Tyler me falou muito de você. “A garota do cabelo azul.” – ela jogou a cabeça para trás, para dar uma gargalhada. — Eu sou Bonnie. A mãe do Tyler – ela virou-se para um homem mais velho, porém muito atraente. — E esse é o Henry, o pai do Tyler. Meu marido.

Cumprimento-os mesmo me sentindo completamente envergonhada. Não imaginava, que mesmo o pouco tempo que Tyler passa com os pais, ele ainda fala de mim.

— Você sabe me dizer onde ele se meteu?

— Oh, não. Desculpem. Eu não sei. – forço um sorriso amigável. — Porque não se sentam aqui? - apontei para uma mesa vazia. — Eu vou atrás dele pra vocês. Só esperem um instante.

Apresso-me, perguntando para todos que passam por mim do Tyler, mas ninguém sabe me responder exatamente onde o viu pela ultima vez.

— Jake, por favor, me diga. Onde está o Tyler? – Jake faz parte da limpeza. — Os pais dele querem vê-lo nesse momento.

Ele riu, mas não soube dizer ou não quis me contar a verdade.

Estou furiosa com o Tyler. Até algum tempo atrás eu poderia entende-lo, afinal, eu detestava os meus pais. Detestava tê-los por perto e ter que atura-los. Mas agora, não vejo razões para isso, mesmo certa de que eles não são os melhores pais do mundo e eu não sou a melhor filha que eles poderiam ter. Mas ainda assim são a minha única família. E enquanto uns tem tudo, outros como o Jesse e Amy, não tem nada.

— Sejam todos bem-vindos ao baile da primavera. – Eliza pediu para que os meninos parassem com a música e ela pegou o microfone. — Espero que estejam todos gostando. – ela era toda sorrisos. — Nesse momento vamos iniciar o baile. Quero que todos vocês, senhoras e senhores, fiquem a vontade para irem até o centro do salão e dançaram. A festa vai começar! – todos aplaudiram.

Pessoas mais ousadas foram os primeiros a pegarem seus parem e irem até o meio do salão para iniciar a dança. De repente me senti dentro de uma valsa. Outros mais recadas preferiram observar, por enquanto, de longe, ainda sentados em suas mesas.

Eu ainda procurava o Tyler atentamente com os olhos por todos os lados quando fui pega pela cintura e arrastada até a dança.

— Oliver! Não podemos está aqui. – fiz uma careta. Oliver pegou minha mão e colocou em seu ombro e a dele ele colocou na minha cintura. — Temos muito trabalho!

— Não por enquanto. – disse ele sorridente, movimenta-nos de um lado para o outro suavemente. Eu nem sabia que meu irmão sabia dançar! — A professora Eliza deu um tempo livre para descansarmos. É pouco tempo! Mas é o suficiente.

Vejo não muito longe de nós Amy e Jesse. Eles estão dançando assim como eu e meu irmão. Os dois sorriem um para o outro. Mas o mais surpreendente, é que não estou com ciúmes ou incomodada, apenas contente, Amy realmente superou aquela velha história. Os dois agem como dois velhos amigos.

— Olha só para o papai e para a mamãe – Oliver chama a minha atenção com a voz bem próxima do meu ouvido. — eu nunca os vi tão próximos apesar de serem casados há tanto tempo!

Os olhos da minha mãe ainda brilhavam. Papai e ela estavam dançando também. Mais tímidos, mas não demoraria muito para que eles se soltassem pouco a pouco. Papai nunca pareceu tão educado e cavalheiro. Os dois pareciam dois jovens apaixonados sussurrando um no ouvido do outro enquanto soltam risinhos animados.

Oliver me surpreende me rodopiando fazendo com que a saia do meu vestido de voltas no ar. Ele se solta de mim. Quando dou por mim estou segura nos braços de Jesse. Ele e Oliver são como dois cumplices. Os dois trocaram de parceiras de dança. Agora eu com o Jesse e Oliver com a Amy.

— Você está bem? – pergunto olhando diretamente pra ele. — Em relação a hoje, ao seus pais, por eles não estarem aqui...

— Estou bem. Estou ótimo! – ele sorri bonitinho, apertando um pouco mais os dedos em minha cintura. — Ainda melhor agora.

Tento controlar a minha vontade de deitar minha cabeça em seu peito enquanto balançamos de um lado para o outro e esquecer do resto do mundo. Mas não posso esquecer que estamos rodeados de pessoas. Como ele mesmo disse não podemos simplesmente fugir para viver nossa história de amor quando se tem tanta gente envolvida nessa história.

— Será que algum dia teremos um amor pra toda a vida? – Jesse quebra o silencio, fazendo-me voltar a olhar pra ele. — Olha só para os seus pais. Eles estão juntos a muito tempo! Eles brigam, discutem, se desentendem como qualquer outro casal. Mas ainda estão juntos. E isso é lindo! E eu fico imaginando se algum dia eu chegarei a esse ponto. Se eu estarei com a mulher amada mesmo depois de muito tempo juntos. Como se a cada dia fosse um novo começo para ama-la cada vez mais. – seus olhos de alguma forma parecem translúcidos. — Você acha que isso é possível?

— Eu não sei. – digo francamente com um meio sorriso. — Mas se eu fosse essa mulher sortuda que passaria o resto da vida ao seu lado, eu faria com que a cada minutos ao seu lado fosse eternizado. Uma vida é muito pouca para o tamanho do que eu sinto por você.

Por um momento pensei que iriamos nos beijar. Mas não aconteceu, por muito pouco. Fechei os olhos rapidamente, senti os lábios dele apertando minha bochecha, voltei a abrir os olhos quando ele se afastou.

— Ei, você é o Jesse? – nossos precioso momento foi rompido por uma garota ruiva, baixinha com sardas.

— Sim, sou eu. – Jesse se afastou, surpreso. — Porque?

— Aconteceu uma coisa. – a garota parecia agitada, acelerada de alguma forma. — A Alexa está desmaiada dentro do banheiro feminino. Acho que ela precisa de você nesse momento...

Jesse saiu em disparada. Só consegui pensar em um coisa além de imaginar o que teria acontecido com a maluca da Alexa: saí correndo atrás dele também. Precisava estar ao lado dele. E ajudar no que fosse preciso.

A cena no banheiro parecia uma cena de crime. Alexa estava deitada no chão toda desconjuntada e desacordada. Uma torneira estava aberta e havia água para todo o lado misturando-se ao sangue que escorriam de um grande ferida em um de seus joelhos. Não consegui imaginar o que exatamente tinha acontecido ali. Mas parecia muito sério.

— Por favor, se afastem! – eu pedi aos curiosos de plantão que faziam tumulto na porta do banheiro. — Ela precisa de espaço.

Jesse pegou Alexa no colo com todo cuidado do mundo e saiu com ela em seus braços em direção a enfermaria. Estavam todos querendo saber o que tinha de fato acontecido, os alunos cochichavam entre si criando hipóteses entre eles. Mas não haviam respostas para tantas perguntas. Eu temi que a notícia do incidente acabasse se espalhando pelo colégio e atrapalhasse de alguma forma o baile que ainda acontecia no salão de festa.

Eu não conseguia pensar em mais nada. Sabia que tinha que voltar ao trabalho e servir os convidados, ou que papai e mamãe ainda estavam no baile talvez procurando por mim. Mas estava muito preocupada com o Jesse e no que se passava na cabeça dele nesse momento trancafiado com a Alexa na enfermaria somente eles e as enfermeiras de plantão. Eu sei que deveria está preocupada com ela, mas nada me tirava da cabeça que fora ela mesma que criara aquela situação para chamar a atenção.

Alexa estava agindo de uma maneira muito estranha ultimamente.

— Hayley, te encontrei. – Amy sentou ao meu lado em um dos bancos espalhados pelos corredores vazios próximo a enfermaria. — Eliza está uma fera atrás de você. Vamos voltar para o baile? Seus pais...

— Não Amy, você não entende. Aconteceu uma coisa. – eu olhei bem para os olhos dela. — O Jesse precisa de mim agora. Entende?

— Entendo. – ela sorriu docemente pousando sua mão sobre a minha. — Tudo bem. Eu vou segurar as pontas pra você. Fique aqui ao lado dele o tempo que for preciso. – antes de partir, ela beijou o alto da minha cabeça. — Depois, me dê notícias.

Como eu poderia agradecer?

Jesse saiu de dentro da enfermaria vinte minutos depois e parecia esgotado demais. Como se houvesse passado a noite em claro afogando as magoas. Mas eu sabia que era bem pior que isso. Ele realmente gosta da Alexa, se importa e está preocupado com ela nesse momento. É natural, afinal, eles ainda são namorados.

Levanto-me e o abraço.

— Como ela está? – pergunto ao me afastar, segurando suas duas mãos com as minhas. — O que aconteceu?

— Não sabem dizer. As enfermeiras vão esperar o momento certo, após o baile, para falar com a direção. – ele mal me olhava. — Mas ela está bem agora. Ela caiu, bateu com a cabeça e desmaiou. Agora é só esperar.

Volto a abraço-lo, e fico feliz que ele tenha forças para corresponder.

— Hayley, filha? – afasto-me de Jesse quando ouço a voz da minha mãe vindo de trás. Nós dois viramo-nos para olhar pra ela, que se aproxima pouco a pouco, com papai mais atrás. — Aqui está você.

— O que foi mãe? – olho bem para ela, e depois para o meu pai. Mas tudo parece perfeitamente bem. Não tenho com o que me preocupar.

— Estávamos te procurando... Estamos indo embora. Viemos nos despedir. – ela me puxa para um abraço de urso daqueles bem apertados e reconfortantes. — Ah, oi Jesse querido. Como você está?

— Oi Margaret. Olá Sr. Collins. – Jesse força um sorriso que para os meus pais podem até parecer verdadeiro, mas pra mim não passa de um farsa para esconder que ele está um caco. — Eu estou bem. E vocês?

— Estamos ótimos! É bom te ver. – ela dá um último sorriso para Jesse antes de voltar-se para mim com as mãos em meus dois ombros. — Obrigada filha. A festa foi ótima! Você foi maravilhosa. Nunca estive tão feliz por poder participar de perto da sua vida.

— Eu te amo, mãe. – eu nunca disse isso a ela antes. Não foi difícil. Mamãe parece surpresa, mas logo sua expressão some e torna-se em algo iluminado, quase que um raro contentamento. Ela abre um sorriso antes de me puxar para outro abraço.

— Também te amo, Hayley.

Me despeço do meu pai com apenas um aceno. E os dois se vão, de mãos dadas, o que ainda me faz sorrir ao lembrar de um jovem casal de namorados que se amam intensamente como se não houvesse o amanhã.

— Em meio a essa loucura – sinto Jesse se aproximar, sua voz vem de trás. Sua boca bem próxima a lateral do meu rosto. — posso dizer que estou feliz por você está finalmente se dando bem com seus pais.

Viro-me de frente para ele, mas dessa vez não estou hipnotizada por seus olhos e sim por sua boca pequena e bem delineada. Sinto falta de quando seus lábios colavam nos meus e me faziam sentir algo diferente se remexer dentro de mim.

— Tem algo em você que me faz querer ser diferente.


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Notas finais do capítulo

Acho que com esse capítulo já dá pra imaginar que vem muitas surpresas por aí. Alguns mistérios pouco a pouco serão desvendados. Comentem! Não me deixem sozinha nessa.



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