Do Lado De Dentro escrita por Mi Freire


Capítulo 41
Campeonato




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"De novo esse quase, esse sempre, esse nada.”

Digamos que eu esteja um pouco chateada com o Tyler. Ou até mesmo exagerando. Mas é que eu detesto ciúmes, me sinto sufocada, presa. O nível de ciúmes sempre tem uma tolerância. Detesto também ironia em tom de brincadeira em momentos inapropriados. Estou esperando pelo momento em que ele vem se desculpar comigo. Enquanto isso sigo minha rotina normalmente.

Após passar um bom tempo conversando com o Jesse no jardim, deixo-o livre, porque sei que a qualquer momento a Alexa poderia aparecer e causar problemas. Não quero ter que ter ainda mais problemas. Me junto a Natalie e o Eric para o jantar. Alguns minutos depois a Amy aparece, com o ar de cansada, mais ainda assim com um sorriso impecável.

— Podemos conversar agora ou você ainda vai ficar fazendo ceninha? – isso não pode está acontecendo. Respiro fundo.

— Quando você aprender a ser menos infantil, me procura, e só então podemos conversar como dois adultos.

Bato a porta do quarto. Tyler não insiste.

De todos os garotos que fiquei na vida, sem duvidas, o Brandon foi o melhor deles. Não tem nada a ver com o beijo, os amassos, ou o que sentíamos um pelo o outro. Brandon era diferente. Ele era maduro, compreensível, respeitador, amigo para todas as horas. Nós pouco brigávamos por coisas tão insignificantes. E sempre que isso acontecia, não demorava nem meia hora para que nos rendêssemos ao orgulho e voltássemos correndo para os braços um do outro. Porque de todas as coisas no mundo só queria ficar juntos e superar qualquer coisa.

— E agora podemos conversar ou você acha que não sou maduro suficiente para reconhecer meus erros? – Tyler me encontrou na saída da aula de matemática na manhã seguinte.

— Aprenda Tyler: se você quer mesmo conversar sério comigo, primeiro você tem que deixar suas brincadeirinhas, sua babaquice, sua ironia, suas perguntas sem noção e seu sarcasmo para trás.

Dou as costas e prossigo para a próxima aula. Estou me divertindo com tudo aquilo. Admito. É claro que eu não iria deixar qualquer coisa me afetar e acabar com a minha alegria.

— Ficou sabendo que o time de basquete do internato foi escolhido para participar do campeonato intercolegial? – Amy comentou comigo durante a aula infinita de química. Detesto ter que aprender quantas camadas de valência tem em um átomo.

— Então é isso. – me sobressalto. — Professora, posso ir ao banheiro? Agora. – ela pausa sua explicação e me olha com aquela cara de debochada como quem não acredita em uma só quer palavra minha. Mas não deveria mesmo acreditar. — Obrigada.

Saio correndo em direção ao terceiro andar. Nesse momento, imagino que Tyler esteja tendo aula de História. Bato na porta sem pensar duas vezes. Alguns segundos depois, o professor em sala, que eu desconheço, olha pra mim esperando que eu diga o que de fato eu vim fazer ali além de atrapalhar a sua preciosa aula.

— Posso, por favor, falar um minutinho com o aluno Tyler Willis? – sobre o ombro do professor baixo e magricelo, vejo os olhinhos dos alunos entediados atentamente voltados para mim.

— Graças a Deus você me salvou! – por um momento Tyler esquece que estamos “brigados” e me abraça. Ele se afasta, me olhando muito curioso, acho que ele lembra que estamos mesmo “brigados”. — O que você veio fazer aqui Hayley?

— Me desculpe, Tyler. – fico na ponta dos pés para poder abraçá-lo outra vez. Pra minha sorte sou correspondida. — Acabei de saber sobre o campeonato. E me desculpe por ter sido grosseira com você. Você deve está muito tenso. Afinal, não é todo dia que o time da escola é convocado para jogar fora. – solto um riso. Ele retribui parecendo bem melhor.

— Eu ia te contar tudo. Mas eu fui um idiota. Fiquei com ciúmes de você e do Jesse. Mas vocês só estavam ajudando a professora de artes com a decoração para a primavera. Mas é que as pessoas falam cada coisa! – opa, dessa parte eu não sabia.

— As pessoas? Que pessoas Tyler? O que elas disseram?

— Bobagens Hayley. Tudo para nos separar! – ela abaixa a cabeça frustrado. Parece até que vai... Chorar. Sim, ele vai chorar. Não resisto ao impulso de abraço forte novamente.

— Ei, tá tudo bem. – passo a mão por seus cabelos curtos de um castanho quase escuro. — Não dê ouvidos ao que eles dizem. – seguro seu rosto fazendo com que ele olhe diretamente para mim. — Agora você tem que focar no time meu amor!

Eu não sei nada sobre esportes. Mas acabo passando o resto da tarde com o Tyler, ouvindo-o falar sem parar sobre todos os preparativos para a grande estreia do campeonato intercolegial. A primeira fase acontecerá na sexta-feira. E a escola inteira já está se preparando.

Foram alugados muitos ônibus, não só para o time, mas também para aqueles que estavam dispostos a ir irem assistir os jogos e vibrar com o time representando do nosso colégio.

A senhora diretora, que é assim que a chamo, pois sempre esqueço seu nome de bruxa malvada, nunca esteve tão orgulhosa.

É quinta-feira e o Tyler não pensa, não respira, não fala em outra coisa além do time. Afinal, ele é o capitão. Deixo-o a vontade para treinar pela ultima vez aquela tarde ensolarada. Estão todos passando o tempo livre na piscina.

Fico paralisada quando por acaso meus olhos focam no Jesse do outro lado da piscina. Detalhe: sem a Alexa. Eu nunca o vi tão bonito, parece um deus grego. Com uma camiseta fina branca de mangas longas – sempre mangas longas por causa das cicatrizes no braço – bermuda jeans, chinelos, boné azul e um Ray-Ban preto.

E ele está vindo em minha direção.

Ai. Meu. Deus.

— O que foi? Porque está me olhando desse jeito? Viu um fantasma?

— Não. – solto um riso. Encabulada. — É você. Você está bonito!

— Obrigado. – ele sorri sem jeito, as bochechas muito rosadas por causa do sol ou talvez porque eu acabo de elogiá-lo descaradamente. Jesse pega a minha mão. — Vem, vamos sentar em algum lugar.

O lugar escolhido foi na sombra para o meu total alivio.

— Cadê sua namorada? – é só uma pergunta. — Não estou vendo ela por aqui. Vocês ainda estão em “crise”?

— A Alexa teve autorização para sair após receber mais uma ligação misteriosa dos pais. Ela não quis conversar sobre isso. Ela se foi sem nem se despedir. Não sei o que está acontecendo. Mas, e você e o Tyler?

— Entre nós está tudo bem. – próximo a nós um grupo de garotas estão de mãos dadas, ligadas uma na outra, e dão uma rápida corridinha até a piscina e pulam juntas. Pingos de água respigam em nós. — Tyler está muito agitado com o campeonato de amanhã. Você vai?

— Vou claro. Não perderia isso por nada. – trocamos um sorrimos amigável. De repente Jesse desvia os olhos - ele está sem óculos agora - do meu rosto e vão descendo por cada tatuagem minha que está visível. Estou usando um short jeans rasgados, a parte de cima do biquíni e chinelos. — Eu já te disse o quanto eu gosto das suas tatuagens? Elas combinam perfeitamente com você.

Estou completamente sem jeito. Só falta encontrar um buraco para enterrar minha cabeça.

— Você tem quantas tatuagens?

— Sete. Depois eu falo melhor sobre elas.

Do outro lado da piscina vejo que Oliver e Amy estão nos olhando com sorrisinhos sínicos enquanto cochicham um para os outros. Devem está falando de mim e do Jesse. E isso é uma ideia perturbadora. Deixa-me ainda mais sem graça do que já estou. Parece que é a primeira vez que eu e o Jesse estamos nos conhecendo.

— Porque você não vai dar um mergulho? – sugiro.

— Não posso, lembra? Seria muito estranho pular na piscina com blusa de mangas longas. Eu disse que esse seria uma consequência que eu teria que levar pelo resto da vida pelas minhas atitudes mal pensadas. – ele sorriu torto. — E você, porque não vai?

— Bom, eu poderia fazer com que a sua queda na piscina fosse acidental. Assim ninguém se importância. – abro um sorriso. — Eu não vou... Lembra? Eu não sei nadar.

— Ah é, eu quase me esqueci de que você quase morreu afogada. – Jesse solta um riso engraçado. O retardado achou tanta graça na sua própria piadinha que acaba se debruçando para rir da minha cara. Não fico mal por isso. É realmente muito vergonhoso pra eu não saber nadar com quase dezoito anos. — Desculpe por isso.

— Não, tudo bem. – consigo sorrir, mesmo ainda muito constrangida. Sinto-me uma tola. Para o meu espanto, Jesse se levanta. É o momento perfeito para me vingar. Não que essa seja a intensão. A ideia passa por minha mente tão rápido quanto um relâmpago.

Com apenas um empurrão Jesse cai na água de roupa e tudo. Fico arrependida instantes depois. E se junto com ele foi todos seus objetos pessoais? Eu não pensei nisso. Jesse pode ter perdido o celular.

Estou na beira da piscina com o coração na mão. Jesse sumiu desde que eu empurrei. E a cada segundo que passa fico mais aflita por ele ainda não ter voltado a superfície para buscar ar. As pessoas que viram aquela cena estão rindo, provavelmente de mim. O que me irrita muito. Porque não fazem nada? O garoto pode está morrendo lá embaixo...

Alguém me puxa pela perna e voo para dentro da água. É tudo muito rápido. Não tenho tempo para me afogar e já estou sendo puxada de volta a superfície. Sinto que posso encostar os pés no chão. Estamos na parte rasa. Jesse segurando o meu corpo entre risos pelo susto que me deu.

— Acha mesmo que eu te deixaria impune? – ele brinca comigo. Jesse não para de olhar pra mim. Imagino a minha situação agora, complemente molhada. O cabelo azul desajeitado por causa do cloro da água. — Não se preocupe – acho que ele pode ler meus pensamentos. Jesse toca meu rosto, afastando uma mecha do meu cabelo do olho. — Você sempre estará linda em qualquer situação.

— Seu babaca! – grito sorrindo. Batendo a mão na água que voa em direção ao rosto dele. Já estou recuperada do susto tanto quanto da sensação que me todas as vezes que ele me toca. — Sabe que poderia ter me matada afogada não sabe?

— Sabe que eu jamais faria mal a você não sabe? Eu não deixaria nunca que isso acontecesse. Não se eu puder evitar. – a expressão em seu rosto volta à serenidade. — Você é preciosa demais pra mim, Hayley.

Desvio o olhar, mordendo o lábio inferior.

— Não diga essas coisas. Eu fico sem chão. – para diminuir a tensão, tento dar-lhe o meu melhor sorriso. — Agora vamos sair daqui. Antes que as pessoas comecem a achar isso muito estranho. Digo, o fato de você está de blusa nesse calor!

Tento secar meu cabelo com o secador da Nath o máximo que posso após tomar um banho quente.

— Achei tão fofa – viro-me para ver Amy entrando no quarto no final daquela tarde. Enrolada em uma tolha de banho. — a cena que presenciei lá em baixo. Você e o Jesse na piscina.

Pelo visto, Amy está mesmo totalmente recuperada. Até piadinha com o “ex paixonite” ela é capaz de fazer agora.

— Não brinca, Amy.

Desligo a droga daquele secador que faz um barulho alto e irritante, mal posso ouvir a voz da minha própria amiga.

— Hayley? Tem alguém na porta. Quer falar com você.

Na minha cabeça só passa uma pessoa: o Tyler. Acho que finalmente acabou o treino e ele quer me ver para conversar sobre amanhã.

— Jesse?

— Oi. – seu sorriso é lindo. — Quer dar uma volta comigo? – ouvimos quando Amy limpa a garganta. Jesse mesmo constrangido tanto quanto eu parece notar a ironia. — Uma volta normal entre dois amigos.

O sol já está se pondo atrás das colinas que envolvem o internato no meio do nada cercado por arvores e uma densa vegetação sombria. O dia passou tão rápido quanto uma garoa boa no verão.

— Queria te mostrar uma coisa.

Estamos no jardim e nos afastamos cada vez mais do prédio do internato. Não sei exatamente onde o Jesse quer me levar, mas confio nele e o deixo me guiar para onde quer que seja.

— Um girassol? – O único entre todo aquele mar verde. É como o sol, destaca-se e parece brilhar como se tivesse luz própria. Aproximo-me e sinto o cheirinho da planta. O girassol é mais ou menos do meu tamanho ainda. Pode crescer muito mais. E está voltando para o sol que está desaparecendo cada vez mais. — É lindo!

— Eu sabia que você ia gostar. – Jesse se aproxima, virando a cabeça para poder me olhar. A brisa noturna balança nossos cabelos. É uma sensação prazerosa. — Quando eu o encontrei só conseguir pensar em uma pessoa – ele fez uma pausa dramática. — você.

Pego sua mão para segura-la.

— Como você está? – pergunto preocupada. Como qualquer outra amiga faria com um amigo.

— Eu estou bem. – ele volta os olhinhos claros para o céu que pouco a pouco vai escurecendo. — Um pouco preocupado com a Alexa, ansioso pelo time amanhã e com saudades dos meus pais.

O que eu poderia dizer que pudesse conforta-lo?

— Você ainda sente muita falta do Brandon? – ele olha pra mim só por um momento apertando firme minha mão. Só para ter certeza de que eu ainda estou ali. Depois se volta para o céu outra vez. — Eu não consigo imaginar o dia em que deixarei de sentir menos falta dos meus pais.

— Eu também. Sinto muita falta dele ainda. Mas quando estou com você – passo a olhar para o céu também. Eis que surge a primeira estrela no meio do nada. — tudo ao meu redor parece melhor.

— Engraçado – nós trocamos sorrisos e olhares. — eu sinto a mesma coisa. A saudade parece diminuir, assim como as preocupações, as dores, toda a minha fragilidade, os meus medos, insegurança... Veja – ele aponta para a única estrela. — É a nossa chance de fazer um pedido.

— Que tal fazermos isso junto em voz alta?

Jesse soltou um risinho que fez algo dentro de eu estremecer. Uma onda de alivio por um momento eu ter acreditado ter sugerido uma bobagem.

— Podemos pedir tantas coisas! Podemos pedir a vitória do time amanhã, podemos pedir rever quem perdemos, podemos pedir que as preocupações diminuíam ou que as coisas sejam mais fáceis. Mas não há nada que eu queira mais do que estar com você. Isso basta.

Jesse é o mais perto que já estive da perfeição.

Você. É tudo que eu peço. – digo em voz alta sorrindo para ele mesmo me sentindo muito tola por isso.

Jesse está me tirando o sono. Antes de uma forma, agora de outra. Não consigo pensar em mais nada mesmo sabendo que tenho que dormir para amanhã acordar cedo. Mesmo que não tenha aula amanhã por causa do campeonato.

Amy vai sentar-se com Oliver no fundão do ônibus. À frente Natalie com Eric. Tyler poderia está aqui comigo, mas foi alugado um ônibus exclusivamente para o time. Quase todos os lugares no ônibus já estão completos. Mas ainda estou sozinha. E isso não me importa muito desde que eu esteja com meus fones de ouvido.

— Posso me sentar aqui com você? – posso ouvi-lo mesmo com a música em meus ouvidos. Diminuiu o volume quando o sinto sentando ao meu lado. — Pelo visto somos os únicos que sobraram.

Vamos conversando durante todo o caminho. Esqueço a musica, esqueço o barulho que vem do fundão, esqueço até mesmo para onde estamos indo. Nada disso importa. Os minutos parecem passar devagar ao seu lado. Por um momento, nem ouço mais o som da sua voz. Só consigo olhar para ele. Os primeiros raios solares refletindo em seu rosto e deixando-o iluminado.

Tentamos sentar o mais perto possível dos nossos conhecidos. Está uma confusão dentro do ginásio que parece pequeno para aquela grande multidão. As lideres de torcida temta animar os mais interessados no canto da quadra. Não vejo Tyler desde que acordei aquela manhã. Mas estou torcendo muito por ele, pois sei o quanto isso é importante para ele, assim como para todo o colégio.

O jogo foi apertado em todos os sentidos. Tyler, como capitão do time, teve uma das melhores desenvolturas. Jake, seu parceiro e amigo, também jogou muito bem. Os dois fizeram passes que deixaram todos boquiabertos, até mesmo a torcida do time adversário. A cada cesta nós vibramos juntos em um só coro. Éramos um corpo só torcendo, gritando, pulando, animados pelo time. O resultado foi satisfatório. Acabamos sendo classificados para a próxima etapa.

Ao final do jogo, desci correndo passando pelas pessoas aglomeradas na arquibancada, Tyler já estava me esperando no meio do ginásio com os braços abertos. Ele nunca esteve tão feliz. Saltei em seus braços e ele me girou no ar.

— Eu estou muito feliz por você! Parabéns, Tyler. – eu sorria, olhando nos olhos dele. — Estou orgulhosa.

— Eu devo muito a você, Hayley. – ele sorria como aqueles galãs de cinema. — Eu só pensava em você em cada arremesso.


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