Um Anjo (quase) Caído escrita por Gaby Molina


Capítulo 14
Capítulo 14 - Um belo dia para baixar a guarda


Notas iniciais do capítulo

O tÍtulo já diz muita coisa...



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Serena

— Tudo bem aí? — Audrey ergueu uma sobrancelha para mim quando voltei ao campo. — Parece que você viu um fantasma.

— Heath me ouviu tocando e cantando — falei, desviando o olhar. — Ele brotou lá no final da música e disse que tinha escutado tudo. Acho que eu preferiria ver um fantasma.

— Sério?! E e o que ele achou?

— Ele... adorou.

— Eu te digo que você é ótima!

— Tá, tá. Você deveria voltar para o treino.

Audrey fez biquinho.

— Certo, chata.

Enquanto estávamos no carro depois do treino, foi blá blá blá treino, blá blá blá pirâmide, blá blá blá Leslie, blá blá blá as outras líderes de torcida...

— Tipo, a Leslie acha que ela tem que ficar no topo da pirâmide porque é a capitã, só que ela tem 1,72m de altura! As meninas foram reclamar com a treinadora, o que eu acho muito certo.

— Uhum — concordei, mas não estava prestando lá muita atenção.

— Sonhando acordada com o cavaleiro das trevas? — Audrey abriu um sorriso malicioso.

— Dirige aí — retruquei. — Eu não estava pensando no Seeler.

— E eu não citei nenhum nome. Eu me referia ao Batman.

— Sei! — eu ri.

* * *

— Eu deveria ter escolhido Natação como terceiro período de quarta-feira — Audrey lamuriou-se no dia seguinte, antes de ir para a aula de Culinária (ela era uma excelente confeiteira).

— Cansou de cozinhar?

— Nunca! Mas... Sabe... Heath Seeler só de bermuda... — ela soltou um suspiro sonhador. — Sortuda.

A ideia de Heath Seeler só de bermuda vinha junto com a ideia de Heath Seeler só de bermuda na chuva gritando comigo.

Então não era lá muito legal.

— Se você diz — fechei meu armário, pegando a bolsa com o meu maiô. — Vejo você depois.

— Tuuudo bem...

Coloquei o maiô no vestiário e fui para a piscina. Encontrei Heath — de fato — só de bermuda. Ele parecia ignorar totalmente a regra que o obrigava a usar uma touca no cabelo. Adicione essa a todas as outras regras cuja existência ele ignorava.

Eu jamais admitiria em voz alta, mas a visão de Heath sem camisa não era nem um pouco ruim. Ele me pegou admirando seu tanquinho, e eu enrubesci quando me lembrei da conversa do dia anterior.

Como se você não ficasse olhando quando eu tiro a camisa!

Ao invés de dizer alguma coisa, ele simplesmente deu uma boa olhada em minhas pernas nuas.

Cretino.

— Seeler, raia um. Costas, ida e volta — disse a treinadora Foster para Heath, que piscou para mim e pulou na piscina.

Cretino!

— Argent, aquecimento.

Quando o sr. Cretino saiu da piscina, veio direto até mim e disse:

— Bati o recorde.

— E eu com isso?

Heath abriu um sorriso presunçoso.

— Invejinha?

— De você? Sonhe! Acabo com você no borboleta.

— Minha especialidade!

Encarei-o, levemente entretida.

— Está a fim de ser derrotado, Seeler?

— Nem um pouco. E você, Argent?

É, acabamos apostando uma corrida de nado borboleta. Eu tinha certeza de que estava perdendo, mas subitamente... ganhei.

Ganhei!

— Na sua cara, Seeler!

Ele abriu um leve sorriso e deu de ombros.

— Você não parece tão decepcionado — notei. — Seeler, você...

Heath

— Você... me deixou ganhar?

— Claro que não.

Serena me encarou por um longo momento com aqueles olhos azuis inquisitores.

— Admita!

— Argent, largue de ser paranoica.

— Seeler!

— Certo, eu posso ter d...

— SEU MANÉ! — ela berrou, e por um instante achei que fosse me jogar na parede, ou na piscina, ou sei lá, mas apenas começou a reclamar e me lançar um olhar assustador.

Nada diferente do normal.

— Argent. Seeler. Talvez queiram continuar essa discussão lá fora? — a treinadora Foster nos censurou.

— Não é neces... — comecei.

— É, sim, seu mala — Serena me puxou pelo pulso até o vestiário. — E então?

— Eu não queria. Mas é que... Sangue angélico é mais poderoso do que sangue mortal. Ele aguça os sentidos e as habilidades. Não seria justo.

— E desde quando o senhor se importa com justiça?

— Você apenas... pareceu querer muito ganhar — dei de ombros, mas não olhei nos olhos dela.

E então o discurso feminista começou.

— Eu sou uma mulher forte e independente, não preciso que nenhum babaca fique com pena de mim, até porque mulheres podem fazer tudo o que os homens fazem em cima de um salto quinze!

— Argent, eu estou falando sobre o fato de eu ser meio anjo, e não de ter um órgão genital diferente do seu. Quer saber?! — encarei-a. — Acho que você apenas não sabe perder.

— Eu sei perder! Eu sei perder muito bem!

— Eu discordo.

— Como é que é?

Abri um leve sorriso, ciente do perigo da colocação seguinte.

— Eu acho que você apenas não admite que não soube perder quando viu que eu estava dançando com a Jill e não com você.

Achei que ela fosse me xingar, mas ao invés disso apenas me fitou e, com um sorriso presunçoso nos lábios, disse:

— E eu acho que você apenas não admite que se arrepende de ter dançado com ela, e não comigo.

— Vou ter outras chances de dançar com você, Serena Argent.

— Eu não contaria com isso.

— Então vou fazê-la mudar de ideia.

Ela soltou um pequeno riso.

— Boa sorte — e então recomeçou o discurso feminista.

A partir dali não ouvi mais nada da palestra nada a ver. Ela ouvira alguma coisa do que eu dissera? Provavelmente não.

Então apenas fiquei observando o rosto dela, que estava em mais destaque por causa da touca de natação. A pele era clara e basicamente perfeita, exceto por uma pintinha charmosa acima dos lábios.

Lábios carnudos e naturalmente avermelhados, que contrastavam com o quanto a pele era alva.

— Eu não sou uma florzinha indefesa, está bem?! Você não precisa ficar protegendo meu pequeno coração de cada pequena decepção! — ela me fitou, séria.

— É, assim como não preciso proteger você de ser atropelada?

— Pare de fazer soar como se eu fosse uma incompetente!

— Incompetente é a última coisa que você é — prometi. — Mas que é uma desastrada...!

— E você é um babaca arrogante!

Meus olhos continuavam fixos nos lábios dela.

— Estou com muita vontade de te beijar — confessei, sem mudar o tom de voz.

Ela semicerrou os olhos.

— Então por que ainda não beijou?

O fato de ela ter feito soar como uma censura irritada me lembrou de por que eu a considerava fascinante. Abri um sorriso provocador.

— Passei algum tempo imaginando se seria contra todo o seu movimento feminista, ou...

— Eu odeio você — ela resmungou e me beijou nos lábios.

Eu não fazia muita ideia de o que estava fazendo, mas devia estar fazendo alguma coisa certa, porque ela não me afastou.

Empurrei-a na fileira de armários, grudando nossos corpos molhados. De olhos fechados, procurei a touca de cabelo dela e a puxei. As longas ondas louras que eu gostava um pouco demais caíram pelos ombros. Acariciei o cabelo dela, que era tão macio quando eu sempre imaginara que fosse. Ela sorria entre os beijos, às vezes hesitando, mas então apenas me beijava com mais vontade.

A ideia de que eu provocava aquele bug no cérebro dela me fez sorrir também.

Quando finalmente nos afastamos, depois de... Quinze minutos? Sei lá. Serena me fitou por um longo minuto com aqueles orbes azuis, e aquela foi a primeira vez em que eu presenciava a cena de Serena Argent sem palavras. Ou fôlego.

Percebi os pequenos pingos d'água no cabelo dela e comecei a relacioná-los com Drops Of Jupiter, e então percebi que estava ouvindo muito Train.

— Isso foi... — ela desviou o olhar. — Eu nem sei o que isso foi. Deveríamos voltar antes que alguém venha nos procurar.

— Espere um minuto — fiquei olhando para cima, ainda envolvendo-a pela cintura.

— O que você está fazendo? — ela sussurrou, erguendo uma sobrancelha.

— Estou esperando ser acertado por um raio de... cem milhões de volts, ou algo assim — dei de ombros, ainda olhando para cima. — Não? Nada? Tudo bem, então. Vamos.

Serena parecia querer muito dizer alguma coisa, mas não o fez.

— Se você calar a boca assim toda vez que nos beijarmos, vou fazer isso mais vezes — provoquei.

Ela me empurrou.

— Babaca.

A treinadora Foster nos encarou por um longo minuto, provavelmente percebendo que parecíamos ter acabado de voltar da guerra ou algo assim.

Bem, se tratando de mim e Serena, era quase isso.

Serena pareceu perceber, porque começou a pentear seu cabelo bagunçado e meio molhado com os dedos. Como se ajudasse em alguma coisa. Sorri ao imaginar a expressão dela quando visse o estado dele no espelho.

— Se resolveram? — a treinadora franziu o cenho. Assentimos lentamente. — Não vou nem perguntar. Turma, estão dispensados!

* * *

— Que merda aconteceu com o meu cabelo?! — Serena correu até mim antes do quinto período.

Dito e feito.

— Olha, você não deixou o meu nem um pouco melhor — abri um meio sorriso, apontando para o ninho de rato em que ela havia transformado meu cabelo. Mas, ao contrário da srta. Serena Perfeita Argent, eu nem havia me dado ao trabalho de arrumar. Depois resolvia. — Vai voltar para casa comigo e com o Damien hoje?

— Não sei. É que eu meio que... — ela desviou o olhar.

— Meio que o quê?

— Meio que tenho que ficar na detenção hoje.

— O que você fez dessa vez?!

— Eu... Hm... Cheguei na metade da aula no quarto período porque fiquei lavando o cabelo e secando.

Revirei os olhos, mas não consegui conter um sorriso. Ela estava impecável de novo, apesar de que eu não estaria reclamando se ela passasse o dia de maiô.

A verdade é que ela era o tipo de garota que não conseguia não ficar impecável, mesmo quando ia ao shopping com um moletom velho ou depois de me agarrar no vestiário.

— Tá, vou ficar vendo o ensaio da bandinha da escola — falei. — Boa sorte na detenção, Loira.

— Não tem garotas com roupas curtas na banda da escola — ela me lembrou.

Sorri.

— Sempre esperando o pior de mim, Argent.

Serena

Depois da detenção, eu estava voltando com Heath e Damien de carro. Meu celular começou a tocar Lost Cause, do Imagine Dragons.

— Não faça perguntas, não sei se vou conseguir mentir hoje — foi a primeira coisa que disse ao atender.

Tudo bem aí, mulher? — Audrey riu. — Certo, não responda. Estou na Dillard's, o que você acha de jaquetas de couro?

— Eu amo jaquetas de couro, sabe disso.

E como estava o Heath só de bermuda?

Heath se inclinou para trás.

— Eu posso te ouvir, Audrey.

E daí? Afinal, por que você está aí, Seeler?

— Carona para casa, lembra? — falei.

Uhum, sei. Ei, fiz uma torta hoje na aula de Culinária, você quer?

— Quer que eu engasgue? — provoquei.

O que não te mata te transforma no Homem-aranha, meu bem!

— Eu quero torta! — berrou Heath.

— Seeler, cai fora — empurrei-o de volta para o banco da frente.

— Ei, estou tentando dirigir aqui! — Damien reclamou.

Heath

Eu ainda estava esperando ser acertado por alguma coisa. Mas o dia continuou normalmente. Depois que fiquei parado no quintal por duas horas, fui falar com Damien.

— Ei, pergunta hipotética e aleatória: Caius está me observando?

— Não, ele estava cuidando de algum outro caso. Por isso estou aqui.

— Então... Tudo o que eles sabem sobre o que fazemos aqui embaixo é o que você relata?

— Sim — Damien me encarou por um momento. Ele me conhecia bem demais. — Seeler, o que você fez?

— Eu não fiz nada — sorri, o que era quase verdade. Eu não tinha começado nada. Mas propora a ideia.

Deitei no quintal, com o sol na cara mesmo. Eu esqueceria Serena no dia seguinte, prometi a mim mesmo.

E eu podia até esquecê-la no dia seguinte, mas naquele momento... Puta merda.


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