SALLY’S POV

Eu mexia compulsivamente nos objetos que enfeitavam a estante que ficava próxima à porta de entrada do meu aconchegante apartamento no Upper East Side. Um desses objetos era um porta-retratos com uma foto minha com o meu filho, em Montauk. Esta foto tinha sido tirada no final do Verão do ano anterior, logo após a vitória sobre o titã Cronos. Eu e Percy tínhamos passado a semana na pequena cabana que eu costumava alugar. No dia desta foto eu havia acabado de contar a ele que eu tinha comprado a cabana. Senti meus olhos arderem, mas fiz força para não chorar.

Percebi uma agitação no corredor, as portas do elevador se abriram e passos ecoaram. Meu coração começou a bater mais forte, fui em direção à porta, quase tropeçando no meu desespero de ver novamente meu filho. Girei a tranca com rapidez e abri a porta com um enorme sorriso estampado no rosto, somente para me decepcionar. Era apenas Rick, o vizinho, chegando com o seu marido e as compras do mercado.

–Oi, Sally! Tudo bem? – perguntou o simpático vizinho. Acenei positivamente antes de fechar a porta, desanimada.

Eu não via Percy desde Dezembro do ano passado, quando ele foi para a sessão de inverno do Acampamento. Ainda me lembrava da M.I. que Annabeth me mandou, avisando do desaparecimento dele. Durante todo ano eu sofri, chorava quase todos os dias. Em Junho recebi a mensagem de voz do Percy, avisando que ele estava bem, o que me acalmou um pouco e logo depois uma mensagem de Íris de Annabeth e Percy avisando que eles já estavam juntos, mas que não poderiam voltar para Manhattan ainda.

Annabeth... A namorada que toda a mãe pede para o seu filho. Ela se dava o trabalho de vir toda a semana me visitar, para me informar de como estavam as buscas pelo tal Acampamento Romano. Chorávamos juntas, nos consolávamos. Neste período eu vi que o amor entre os dois era mais do que verdadeiro, Annabeth estava completamente destruída por dentro. Dava para ver através do olhar dela, o olhar cinzento que parecia sempre estar planejando algo se encontrava morto, sem brilho nenhum, somente uma dor imensa. Eu não teria aguentado, eu teria sucumbido à depressão se Annabeth não tivesse vindo semanalmente, para nós fortalecermos juntas e para não perdermos a esperança.

A preocupação só aumentou depois que soube que eles estavam indo para a Europa, as Terras Antigas, sob a sombra da Profecia dos Sete. Foi quando eu amaldiçoei todos os deuses do panteão grego por terem colocado pela segunda vez, em menos de um ano, o destino do mundo nas mãos do Percy e de Annabeth. Os dois mereciam ter uma vida calma depois disso. Eu sei que isso não é possível para um semideus, principalmente um que é filho de um dos Três Grandes. Mas eu vou lutar ao lado dele e de Annabeth para eles terem uma vida mais normal possível.

Quando recebi uma M.I. de Rachel avisando que Annabeth e Percy estavam presos no Tártaro, esperei pelo pior. Foi a pior semana da minha vida, minhas esperanças de rever meu filho caíram para quase zero e desta vez não tinha Annabeth para me levantar. Telefonei para o pai dela, para dar as notícias. Foi a conversa mais triste que já tive com alguém. Eu ficava sentada no sofá o dia inteiro, não conseguia escrever o meu livro e nem Paul conseguia me animar. Eu ficava inerte, sem ação, me culpando por ser mortal e não poder fazer nada para salvar meu filho. A pior sensação que uma mãe pode sentir é essa, não poder fazer nada para ajudar o seu filhote.

Meu alívio veio em forma de anjo, ou melhor, Di Angelo. Em uma tarde Nico apareceu no meio da minha sala, completamente esgotado, e avisou que Percy e Annabeth haviam conseguido sair do Tártaro e fechar as Portas da Morte. Eu o abracei e logo depois ele desmaiou.

Esses oito longos meses angustiantes estavam chegando ao fim, dentro de minutos Percy iria chegar ao apartamento e eu vou abraçá-lo novamente e empanturrá-lo de cupcakes de chocolate com cobertura azul que estavam esfriando na janela da cozinha aonde o Enlace Lunar, que Percy tinha trazido de Ogígia ainda resplandecia, completamente florida.

Ouvi novamente o som do elevador, um pling estridente, as portas abriram. Ouvi passos pelo corredor. Agora só podia ser o meu filho. Corri para a porta e a abri já não conseguindo controlar as lágrimas, que já escorriam pelas bochechas.

Saindo do elevador, lá estava ele. Meu filhinho (se é que posso chamar ele assim ainda, já que ele está mais alto do que eu e até mesmo de Paul), lá estava ele saindo do elevador, com a camiseta laranja do Acampamento e uma calça jeans. De mãos dadas com ele estava Annabeth. Uma sensação maravilhosa percorreu meu corpo, ele estava ali, meu filho estava novamente perto de mim.

Quando chegaram no hall eu pulei em cima de Percy. O abracei tão forte que acho que o deixei com falta de ar, beijei todo o seu rosto, ele também estava chorando. Annabeth ainda estava na batente da porta, visivelmente emocionada. Eu devo tanto a ela. Annabeth foi a melhor coisa que já tinha acontecido na vida do Percy.

–Venha para cá também, Annabeth. – falei. E abracei a filha de Athena como se fosse a minha filha. Depois abracei os dois ao mesmo tempo.

Larguei os dois e os observei. Estavam magros, muito magros e com olheiras profundas, como se não dormissem há semanas. Não conseguia imaginar o que os dois tinham passado, devem ter lembranças terríveis dos momentos que passaram no Tártaro.

Beijei os dois na testa e falei:

–Vocês querem cupcakes azuis? Acabei de tirar uma fornada.

Percy sorriu e este foi o momento mais feliz dos meus últimos oito meses.