Coração Gelado escrita por Jane Viesseli


Capítulo 37
Addio, Volterra! – Parte I




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Jane entra na recepção do castelo sozinha depois de um longo período de viagem, em que tivera de usar lentes tão ridículas quanto as de Heidi para passar pelo aeroporto e conseguir um voo particular. Ela podia sentir o aperto na boca de seu estômago novamente, tão forte quanto no dia em que precisou enganar o seu mestre depois dos eventos da Notte Rossa.

Maximilian tinha virado o seu mundo de ponta cabeça, definitivamente a arrancando de sua rotina controlada e posto superior, e lançando-a num outro tipo de realidade, mas ela não sentia-se zangada por isso. Não havia raiva ou arrependimento em seu interior, apenas a ansiedade por estar fazendo o que muitos vampiros já tentaram inutilmente realizar: rebelar-se contra os Volturis.

Os mestres eram muito bons para farejar levantes e ainda melhores para apagá-los, será que desconfiariam dela quando cruzasse a porta do grande salão? A vampira respira profundamente enquanto avançava pelo corredor, colocando ordem em seu interior e vestindo sua melhor máscara de frieza para que se parecesse com a mesma Jane que deixara o castelo há quase um mês, torcendo para que seus olhos não estivessem expressivos demais.

O camaleão era tão fácil de se ler que ela temia ter ficado igual.

Aquilo seria difícil, muito difícil.

As portas do grande salão estavam abertas quando ela se aproximou, entrando com passos firmes e se colocando no centro dele, bem à frente dos três tronos, mas, ao mesmo tempo, o mais longe que conseguiu ficar sem levantar suspeitas. Heidi e Demetri estavam lá, conversando com os mestres sobre a organização do próximo banquete, e calaram-se ao vê-la, não demonstrando surpresa alguma com a ausência de Maximilian.

Aro sorri diante de sua chegada solitária, imaginando que não somente Andrômeda como também o camaleão estavam devidamente mortos. A caçada havia demorado e os mestres acreditaram, a princípio, que a tarefa deveria ser árdua para uma única pessoa fazer. Contudo, ali estava ela, Jane Volturi, com o brasão cintilando em seu peito e sendo a única a retornar. O sabor da vitória era tão doce quanto o sangue e Aro ansiou por tocar as mãos de sua leal serva, a fim de conhecer todos os detalhes de sua missão individual.

Ele queria saber como foi a caçada, qual a estratégia usada por sua pupila para atrair e matar Andrômeda, e queria ver o sofrimento no rosto de Maximilian por encontrar a morte final através das mãos de sua amada, que nunca se lembrara dele ou de sua promessa de ficarem juntos. Aro sorria de satisfação, tanto por dentro quanto por fora, e aguardava a aproximação de Jane, uma aproximação que não veio…

Jane sempre se aproximava dos mestres quando era a líder de uma missão, sempre oferecia sua mão voluntariamente porque nunca tinha nada a esconder, sendo sempre o cãozinho obediente que se postava ao lado de seu dono quando retornava. Contudo, ela não foi assim dessa vez. A vampira não avançou um passo, não estendeu suas mãos ao líder do clã Volturi e não se colocou ao seu lado.

— Onde está Alec? – pergunta seriamente, mantendo a postura bem ereta e se concentrando para que suas sobrancelhas não arqueassem em expectativa. Ela sentia saudade de seu gêmeo, desejava abraçá-lo e retirá-lo dali o mais rápido possível, pois já podia sentir a atmosfera mudando e se tornando perigosa.

Será que os outros percebiam o mesmo que ela? Ou a atmosfera daquele castelo sempre fora hostil e somente agora ela se dava conta daquilo? Será que todos os vampiros que entravam ali sentiam aquela opressão de morte sobre os ombros? Como se eles não fossem mais sair vivos daquele salão?

— Certamente em seus aposentos… – comenta Aro, estranhando imensamente o comportamento da vampira, mas ainda esperando que ela se aproximasse como sempre fazia.

Jane acena positivamente com a cabeça e caminha em direção ao corredor ao lado dos três tronos, saindo da vista dos mestres e deixando a todos embasbacados. E como poderia ser diferente? Ela não podia simplesmente lhe conceder sua mão e deixá-lo saber de tudo, das lembranças, do amor, de seus pensamentos mais secretos, da localização da residência e do paradeiro de Maximilian.

A vampira sabia que tudo aquilo levantaria suspeitas e que não demoraria muito para que Aro constatasse que havia algo errado com ela. Era impossível não notar. Por isso ela precisava ser rápida e encontrar Alec em primeiro lugar.

Coincidentemente, enquanto caminhava pelos corredores em direção a ala dos quartos, o seu gêmeo surge em seu caminho mostrando-se tão ansioso para revê-la quanto ela a ele. Alec já sabia que ela estava retornando, havia sentido isso através de sua bússola interna e aguardou alegremente que pudesse sentir a presença dela ali, em Volterra e dentro do castelo.

— Jane! – sussurra ele ao abraçá-la, retirando-a momentaneamente do chão e a apertando contra o seu corpo, fazendo-a fechar os olhos instantaneamente com o carinho que eles pouco estavam acostumados a trocar. No conforto dos braços de seu gêmeo, a vampira constatou o quanto aquilo era bom, o quanto amá-lo e tê-lo como família era uma coisa boa e reconfortante.

Jane sentiu a saudade ser aplacada rapidamente através daquele gesto, mas não o aperto em seu estômago, e foi essa sensação que a obrigou a afastar o irmão e olhar ao redor a procura de possíveis bisbilhoteiros.

— Para o seu quarto agora mesmo! – sussurra ela, deixando a ansiedade transparecer levemente em seu rosto.

— O que deu errado?— questiona Alec, já constatando o pior diante de seu semblante.

— Agora, Alec! – insiste, mais mandando do que pedindo, enquanto agarrava o pulso de seu gêmeo e o guiava apressadamente para o aposento dele.

A vampira o empurra para dentro do cômodo rapidamente, entrando logo em seguida e fechando a porta atrás de si. Ela tinha muito o que contar, porém, não sabia se teria tempo para dizer tudo ou qual seria a reação dele ao lhe revelar todas as coisas que vinham lhe acontecendo. Tal conflito interior a impedia de perceber que Alec também tinha algo importante a lhe pedir…

— O que aconteceu? Onde está Maximilian? – começa ele.

— Está bem! Eu cuidei de tudo como disse que faria… No entanto, para isso, fiz outra coisa que não deveria... – explica ela pausadamente, querendo mostrar que a situação estava tão ruim como quando deixou o castelo, que nada havia realmente melhorado e que eles precisavam pensar em tudo aquilo com cautela. – Acho melhor se sentar, Alec, porque você certamente vai ter dificuldade em acreditar no que vou lhe dizer...

Ele obedece, e, quando estava devidamente sentado na cadeira de sua escrivaninha, Jane despejou sobre ele toda a verdade, contando-lhe sobre os flashs que tivera de seu passado, o reconhecimento que fizera de Maximilian, a lembrança de sua promessa e o que isso a levou a fazer com Andrômeda e com o clã, somente para que pudesse salvá-lo. Um relato longo e extremamente necessário, que não deu a Alec nenhuma chance de resposta, tamanha era a sua perplexidade.

Jane não queria entrar em detalhes sobre sentimentos ou sobre o amor, não considerando-se pronta para falar com ele sobre o assunto ou sobre o que sentia, depois de tanto tempo mandando-o reprimir todas as suas emoções humanas. Como ela poderia dizer ao gêmeo que simplesmente havia encontrado o amor? Que Maximilian batera na porta de seu coração depois de um longe tempo, e que o seu passado resolveu abrir a porta e deixá-lo entrar? Que o seu coração gelado agora parecia tão quente quanto a pele de um ser humano?

A vampira não tinha tempo o bastante para filosofar sobre o amor e para convencê-lo de que estivera errada, preferindo deixar aquilo para outro momento. E, como se corroborasse com sua decisão, Alec mostrou-se tão perplexo com a enxurrada de informações que sua irmã lhe dava que mal percebeu o quanto ela estava mudada.

O gêmeo não se deu conta de todo o sentimento que estava implícito nas atitudes de Jane com relação a Maximilian. Tudo o que ele conseguiu processar, diante de todas aquelas novidades e revelações, foi que Jane desobedeceu a ordem de Aro e que estava protegendo o seu amigo do clã a quem jurou lealdade, uma traição em altíssimo grau que poderia custar a sua própria existência.

— Precisamos deixar o castelo agora mesmo! – conclui ela, querendo que ele soubesse de que tudo o que estava fazendo tinha um custo extremamente alto.

— Que droga! – resfolega ele, parecendo ainda mais chocado, colocando-se de pé novamente e se aproximando da irmã para sussurrar o que o estava entalado em sua garganta há muito tempo: – Pensei que você iria me achar um louco por sugerir tal coisa. Eu não quero mais ficar aqui, Jane, tenho pensado em fugir há semanas, mas tive medo que você não quisesse vir comigo e que me considerasse um traidor!

Alec tinha tanto a dizer a ela, tanto a esclarecer sobre sua curiosidade quanto ao amor e sua vontade de vivenciar o sentimento… Entretanto, aquele não era o momento, eles estavam encrencados e por isso o vampiro também guardou a verdade sobre tudo o que vinha lhe acontecendo no fundo de sua mente, concentrando-se somente naquele instante e naquela situação.

— Nós somos traidores, Alec, nós dois, por nossos pensamentos, escolhas e feitos! Porém, mesmo que apenas um de nós o fosse, eu jamais permitiria que alguém o ferisse – confessa ela, aproximando-se de Alec e segurando o seu rosto com ambas as mãos. – Também tive medo que você não concordasse comigo, que se voltasse contra mim depois de tudo…

— Nunca faria isso! Eu sou leal a você, sempre!

— Seremos Alec e Jane para sempre?

— Seremos Alec e Jane para sempre! – afirma ele.

— Ainda bem… Porque você iria comigo de um jeito ou de outro, mesmo que amordaçado e arrastado. – Dá de ombros, fazendo o gêmeo reprimir um sorriso ao imaginar a cena, contente por saber que ela jamais o deixaria para trás.

— O que faremos agora?

— Pegue somente o que for importante e prepare-se para partir.

— Eu já tenho tudo o que preciso bem aqui, a minha frente – diz Alec rapidamente, fazendo Jane sorrir de canto e segurar em sua mão esquerda. Nenhum deles se apegava a coisas ou depositava lembranças em objetos, e por isso nada possuam para levar além de sua irmandade.

— Então estamos prontos para partir! – conclui Jane, pouco antes de Renata invadir o quarto abruptamente, com o rosto alarmado de quem trazia péssimas notícias.

— Maximilian está aqui. Mestre Aro quer toda a Guarda no salão agora mesmo! – anuncia rapidamente, quase se perdendo nas próprias palavras por saber que o camaleão e Alec eram amigos de verdade, e que tal notícia deveria ser tão horrível para ele quanto era chocante para ela. Contudo, ao contrário do que a escudeira esperava, foi Jane a esboçar um semblante de pavor.

A vampira corre porta afora no mesmo segundo, arrastando o gêmeo pela mão e literalmente correndo pelos corredores até a sala dos três tronos, sentindo o aperto aumentar em seu estômago. Se fosse humana, Jane tinha certeza que vomitaria àquela altura. Ela para de súbito, pouco antes de entrar no salão, virando-se para o irmão e ignorando completamente a presença de Renata, que ainda os seguia.

Seu rosto estava tomado por uma mistura de raiva e preocupação, e Renata não soube dizer o que aquilo significava. Porém, através de um aperto em sua mão, Alec captou a clara mensagem que ela lhe enviava: “não era para ele estar aqui!”, mesclada com alguma outra coisa que o vampiro não soube definir de imediato.

Jane havia prometido dar um jeito na situação e realmente o fizera, poupando a vida de Maximilian e o deixando longe de Volterra. Sua parte no acordo já estava feita e ela nada tinha a ver com o fato do camaleão bancar o suicida e voltar. Então por que ela parecia preocupada por tê-lo ali? Por que seu lindo rosto foi tomado de um completo pavor por saber de sua presença no castelo?

E como se Alec tivesse acabado de levar um soco, ele percebeu o óbvio: que Jane não tinha apenas se lembrado de Maximilian e de sua promessa, mas que também estava sentindo coisas e possivelmente o amando de volta. Sua irmã havia encontrado o amor e agora possuía uma necessidade muito maior de querer o camaleão vivo, maior do que as regras, maior do que Aro e maior do que o clã.

A história de Marcus surge em sua mente de repente, fazendo o vampiro estremecer diante do que Aro era capaz de fazer para impedir o amor. Se ele matasse Maximilian agora, Jane ficaria tão apática quanto o seu mestre, porque aquele castelo era amaldiçoado e nada de bom florescia dentro dele, como Renata havia o alertado. Diante de tal fato, Alec sentiu a ondulação de seu dom mover-se para os seus braços, acumulando-se ali como se tivesse vida própria e fizesse questão de ser usado.

— Eu sou leal a você, Jane! – lembra ele com um sussurro, tornando-se sério de repente. – Uma única ordem e eu neutralizo todos eles. Podemos matar a todos também, é só me dar o comando!

Renata ofega com o comentário, lembrando-os de que ainda estava ali e impedindo Jane de responder ao irmão em voz alta. A vampira limitou-se a acenar positivamente com a cabeça, fechando os olhos momentaneamente e respirando fundo para controlar o próprio semblante. E quando ela voltou a abri-los, todo e qualquer resquício de preocupação desapareceu, como se outra pessoa tivesse assumido o seu lugar.

Jane sabia o que deveria fazer e sentia-se ainda mais confiante de seu sucesso com Alec ao seu lado. Ela se concentra por mais um minuto inteiro, redobrando o seu autocontrole para voltar a ser a vampira que todos conheciam: fria, calculista e cruel, pois das duas opções, uma certamente aconteceria: ou eles deixariam aquele castelo tranquilamente, ou as paredes de Volterra agonizariam diante do seu poder.


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