Essência escrita por AnaMM


Capítulo 12
Medo


Notas iniciais do capítulo

Trilha indicada:
http://www.youtube.com/watch?v=2rbsPQfOmU0 - 9 crimes
http://www.youtube.com/watch?v=1EtbA9BtFYA - half a heart



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– Você é louco... – Orelha comentou na sala de espera. – Só você, mesmo, pra beijar a Lia daquele jeito. – Álvaro riu.

– A Lia nega tanto, que se eu fosse esperar pelo aval dela, esperaria por três reencarnações. – Dinho zombou em resposta.

Adriano estava aéreo. Sabia que a roqueira ainda o desejava, que ainda sentia algo pelo ex, mas também a conhecia o suficiente para saber que beijos roubados seriam a única coisa que conseguiria de Lia Martins. Não se entregaria em voz alta, contudo beijara a namorada quase à força por saber que seria sua única chance de beijá-la, não de tê-la de volta. Não a teria de volta. Agarrá-la de surpresa era apenas uma brincadeira tragicômica que lhe confirmava os sentimentos que Lia jamais admitiria. Era saber que há água depois de quilômetros de deserto, mas que jamais conseguiria atravessá-lo. Era saber exatamente o que falar e não ter voz. Era angustiante, principalmente estando sóbrio. Olhou à volta, nenhuma garrafa.

– Tudo certo, foi só uma batida com a cabeça, mesmo. – Dinho anunciou ao ler o resultado dos exames. – O que você acha de comer alguma coisa no bar aqui do lado?

Era um truque fácil, clássico. Orelha não percebeu. Em alguns segundos, Adriano matava sua sede novamente, para desconforto do melhor amigo enganado.

–x-

– O que aconteceu com você? Amiga, você tá encharcada! – Ju perguntou ao abrir a porta.

– Nem queira saber. Que ódio que eu tenho dele, que ódio!

– Dinho. - Juliana riu. – O que ele fez dessa vez? Pra quem odeia ele, vocês se encontram bastante.

– Não foi nada demais, ok? Não precisa nem começar a pensar besteira! Eu fui ver se ele tava bem, só isso.

– Aham, certo. Você foi aleatoriamente ver se o seu ex-namorado que você supostamente odeia estava bem? Que preocupação é essa agora? Desde ontem você tá estranha.

Lia suspirou alto. Havia esquecido estrategicamente de comentar os últimos acontecimentos. Exausta, narrou o que havia acontecido desde sua volta com Vitor, cortando as partes que a comprometessem. Até onde Juliana saberia, Lia não tinha se deixado levar por Dinho em nenhum momento desde o casamento.

– Você vai contar pro Vitor? O seu relacionamento com o Dinho acabou porque ele não contou, né?

– Ah, Ju, foi diferente. O Dinho me beijou a força, eu não tive parte nisso. Já ele me traiu, ficou a viagem toda com aquela gringa paraguaia.

– É, mas na época da gringa vocês tavam dando um tempo. Você e o Vitor estão supostamente bem.

– Mas eu não beijei o Dinho, ele me beijou a força!

– Será mesmo? Acho que essa história tá mal contada, hein. – Juliana riu.

– Sem essa, Ju. Eu não tenho, nem vou ter nada com aquele idiota.

– O que significa “voltarei com ele daqui a uma semana” no seu dicionário. – Ju falou baixo para que a amiga não escutasse.

– Eu preciso encontrar com o Vitor daqui a pouco. Valeu, Ju. – Lia se retirou.

Havia corrido para a casa da melhor amiga em busca de conselho, precisava saber o quão grave havia sido o beijo. Claro, ocultara o que realmente definiria a gravidade da questão, mas não tinha a intenção de ouvir o discurso eterno de Juliana sobre como ela não resistia ao ex porque ainda o amava. Sabia que ainda o amava. Já bastante se incomodava por conta própria enfrentando sua consciência, não precisava de sermão da melhor amiga. Odiava Dinho cada vez mais. Odiava-o pela traição, pelo retorno quando sua vida parecia retomar seu rumo, pelo beijo em frente a todos, pelo beijo escondido, odiava-o mais ainda por sentir o mesmo, por amá-lo apesar de tudo. Odiava-se por estar tão mexida pelo beijo, por estar traindo Vitor como Dinho fizera no passado, e como ela mesma fizera com Ju. Odiava-o por fazê-la se odiar. Odiava-o por estar se tornando um alcoólatra, pela audácia de beijá-la sem se importar com o mundo à sua volta, por poder se declarar sem amarras. Odiava-o por lembrá-la do quão mais vivos eram seus beijos, seus sentimentos, seu relacionamento. Odiava-o por lembrá-la de quem era a verdadeira Lia, de um tempo em que era plenamente feliz, de um tempo em que vivia, em que sentia, em que seu namoro era mais que uma fachada, em que Lia Martins era mais que um vulto, que uma cover de si mesma.

Queria distância de Adriano, ao mesmo tempo em que contava as horas para vê-lo bater à sua porta implorando novamente por perdão. Sentia sua falta a cada segundo que passava longe do ex, e queria fugir de qualquer coisa que lhe lembrasse de Adriano. Era metade sem ele, uma metade anestesiada, porém incompleta. Desejara que o tempo parasse, que o momento com Dinho no quarto de Orelha durasse para sempre, e fugira tão logo lhe deram espaço. Não entendia a si mesma com Adriano por perto. Flagrava-se levando a mão à boca e olhando distraída em direção ao sofá do Misturama onde o deixara na outra noite. Esperava o namorado, mas não conseguia focar um pensamento sequer em Vitor. Dinho a consumia.

– Lia? Tá tudo bem? – Nando perguntou.

– Ah, sim, Nando, tudo certo. – Lia respondeu atrapalhada.

– Você falou com o Dinho? Como ele está?

– Que? Como você sabe que ele-?

– Devo confessar que eu e os meninos tentamos dar um trato nele pra que não fizesse feio pra você. Deu certo? – Nando falou sem jeito.

– Então quer dizer que existe um complô masculino pra que a gente volte? – Lia questionou abismada. – Pode desistir, Nando, eu não vou voltar com ele.

– Então não era nele que você tava pensando há pouco?

– Claro que não! Você lê os meus pensamentos agora? Se lesse, saberia que eu odeio o Dinho, e mais nada.

– Não, não leio, não, é que você tava olhando pro sofá onde a gente deixou ele aquela madrugada e suspirando o nome dele. Esse seu jeito de odiá-lo é engraçado. Quer saber o que eu acho?

– Eu tenho escolha?

– Você tem medo. E não é medo de voltar a sofrer, não, porque você adora sofrer. Às vezes, parece que você prefere sofrer, que cultiva a dor que sente como se fosse uma desculpa pra se esconder do mundo. Você, Lia Martins, tem medo de ser feliz.

– Isso é um absurdo, Nando! – Lia protestou. – Essa bateria tá te deixando gagá! Você tá bebendo, que nem o Dinho?

– Não, eu não bebo mais e você sabe disso. Tá vendo? Você já citou o Dinho de novo. Ele não sai da sua cabeça, mas você não admite, mesmo ele tendo atravessado um oceano pra te ter de volta, que ele a ame, que não voltará a te fazer sofrer. Você só pensa nele, sofre mais com isso do que poderia sofrer estando com ele, e, ainda assim, não se reconciliam. Alguns acham que é por orgulho, mas orgulhosa você já é há anos. Eu acho que você finalmente encontrou a felicidade e tem medo de encará-la de novo. A felicidade está longe da sua zona de conforto, você não sabe abraçá-la. Eu vou te dar uma dica: esse menino precisa de você. Ele está entrando em um caminho sem volta, e precisa reencontrar essa mesma felicidade da qual você está fugindo. Ele está sendo consumido pela culpa e você teme em não perdoá-lo. Você quer que ele sofra o que você sofreu, e eu entendo, mas o quanto disso é também querer arrastá-lo no seu próprio medo? Você teme ser feliz e quer fazê-lo sofrer junto.

– Então o Dinho é um santo e eu sou egoísta agora? – Lia questionou ofendida. – Chega, Nando, você enlouqueceu. Eu vou esperar o meu namorado na praça.

– Como quiser, só não esqueça o que eu falei. Eu só quero ver vocês felizes. – Nando respondeu derrotado.


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Notas finais do capítulo

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