Essência escrita por AnaMM


Capítulo 10
Semi-Vida


Notas iniciais do capítulo

Se eu quase chorei escrevendo? Sim. Se tem lidinho? De todas as formas. Se tem choro e gritos? Aos montes. Dinho bêbado? Sempre. Lia à beira de um ataque? Também.

http://www.youtube.com/watch?v=X8D3IzzpQHg música tema do capítulo e de suas cenas, mas, principalmente, inspirou a cena em que caem os dois ao chão e a divagação da Lia. A partir daí, tudo imaginei ao som da música até a parte em que a Lia se levanta bruscamente.
http://www.vagalume.com.br/duncan-sheik/half-life-traducao.html



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– Dinho? – Lia se surpreendeu ao atender a campainha.

– E-eu vim porque... – Adriano gaguejou com a voz grave gaguejando. Procurava as palavras para que a roqueira não fugisse, nem fechasse a porta. – Eu queria agradecer pelo que você fez ontem à noite.

– Eu teria feito por qualquer um.

– Eu sei.

Lia fechava a porta, mas o aventureiro não poderia perder a oportunidade. Não sabendo o quão difícil seria fazê-la escutar de novo.

– Ainda assim, obrigado. – Repetiu com seriedade.

– Era só isso? – Lia perguntou impaciente.

– Quase. A gente pode conversar?

– O seu tempo se esgotou. – A roqueira respondeu rispidamente.

Como resposta, Adriano empurrou a porta de leve, o suficiente para entrar na casa e impedir Lia de expulsá-lo. Apertou-a contra a parede.

– Você pode me ouvir? Eu não mordo.

Seus rostos estavam desconfortavelmente próximos. O suficiente para a roqueira sentir o odor de álcool. Dinho a segurava firmemente.

– Você tá bêbado de novo.

– Eu bebi, não tô bêbado.

– Você precisa se tratar. – Lia tentou se desvencilhar, sendo impedida rapidamente por Adriano.

– Você sabe muito bem do que eu preciso. – O aventureiro acusou com o rosto praticamente colado no da ex.

– De vergonha na cara. – Lia zombou afastando o rosto.

Adriano enfim se afastou, levando as mãos à cabeça e andando em círculos pela sala. Parou repentinamente, percebendo o que havia feito.

– Foi mal, Lia. Eu não ando pensando ultimamente.

– Só ultimamente? – A roqueira riu.

– O seu senso de humor continua o mesmo. – Adriano ironizou, apoiando-se no sofá.

– E a sua falta de noção tampouco mudou. – Apontou a loira.

– É que... Sei lá, nada faz sentido sem você.

– Devia ter pensado nisso antes.

– E o beijo?

– Esquece o beijo, eu não quero nada com você. Eu tô com o Vitor agora, e eu tô feliz. Você também devia seguir em frente. – Lia sugeriu com um nó na garganta.

– É isso mesmo que você quer?

– Sim.

Dinho pegou a garrafa que escondera em sua bolsa. Alguns goles para decidir seu futuro. Estava sóbrio demais para ir embora e sóbrio demais para ficar.

– Você quer parar com isso?! – Lia exclamou, roubando a garrafa das mãos do ex.

– Eu pensei que você não se importasse. – Adriano comentou.

– Eu não me importo! – Lia gritou, exasperada.

– Então me deixa em paz!

– É o que eu mais quero! Pode sair! Sai agora! Volta pra sua gringa paraguaia de merda!

Adriano voltou a pressionar a ex contra a parede, com seus joelhos a imobilizando.

– Eu estava falando dessa vozinha irritante que não me deixa em paz desde a minha viagem. – Dinho praticamente rosnou. – Eu estou falando da sua imagem me assombrando todas as noites só pra me lembrar do quanto eu preciso de você. Tudo que eu mais queria era poder te esquecer e sair por aí pegando as gringas das mais diferentes nacionalidades, mas eu não consigo! Eu tentei seguir em frente, eu tentei parar, e eu não aguento mais essa semi-vida! – Lágrimas encharcaram o rosto de Dinho, desfigurado pelos gritos. – Eu não aguento mais ter que beber para acordar e beber para conseguir dormir! Eu não aguento mais sonhar com você e acordar sozinho, e, principalmente, eu não aguento mais esse vazio sufocante que eu sinto desde que eu percebi que te perderia! Eu não aguento mais! – Dinho se ajoelhou, desesperado.

Gritou, chorou, sentiu-se sufocar novamente. Precisava agir, precisava... De um pulo, tentou roubar a garrafa de Lia. Estava seco, seco na garganta, seco por dentro. Precisava se sentir vivo e sentir menos. Menos dor, menos desespero, menos solidão.

– Me solta, Dinho, me larga! – Lia gritou em vão, tentando se desvencilhar dos braços famintos de Adriano.

– Eu preciso da garrafa, por favor! – Implorou Adriano, cada vez pior.

A roqueira estava desesperada, não sabia como agir. Sabia que devia mantê-lo longe do líquido, ainda que não aguentasse a visão de seu ex desfigurado se arrastando pelo chão tentando arrancar-lhe a garrafa das mãos. Estava doente, havia o deixado doente.

– Dinho, por favor, para! – Lia implorou chorando.

Não conseguia vê-lo naquele estado. Estava pior do que pensara. Sem pensar duas vezes, caiu em frente ao garoto e o abraçou. Talvez assim o tranquilizasse.

– Por favor, para. – Sussurrou em seu ouvido, acariciando seus cachos.

Adriano chorou em seu ombro, desolado, enfim desistindo do líquido. Abaixou os braços, derrotado. Deixou-os caídos ao seu lado por um tempo, até conduzi-los ao corpo de Lia. Já não chorava. Enterrou o rosto úmido no ombro de Lia, cuja mão explorava lentamente os cachos do ex. Era melhor que álcool, muito melhor que álcool. Um sonho, talvez. Seu maior desejo era que o momento não terminasse. Ficaria nos braços de Lia, ajoelhados no meio da sala, pelo resto da eternidade. Seria tão mais fácil... Ali estava completo.

Lia respirou fundo. Era tudo tão simples nos braços de Dinho... Mal se lembrava de como era não fingir ser outra pessoa, de como era estar verdadeiramente tranquila, sem barreiras para erguer, sem defesas para trabalhar. Ainda teria que arranjar forças para dispensá-lo, mas podia demorar. Demoraria o quanto pudesse para não enfrentar a realidade. Apenas ali, indefesa, ajoelhada aos pés de Dinho, abraçando-o como se não houvesse tempo e espaço, percebeu o quanto detestava ser a nova Lia. Era inútil esconder-se em roupas coloridas e mechas rosas. Era apenas uma semi-vida. Uma vida de fachada, de sentimentos pela metade. Seria mesmo tão difícil encarar o medo de sofrer novamente e realmente viver, apesar dos perigos? Valeria a pena não sentir para não sofrer? Nos braços de Dinho, sabia preferir sofrer mais mil vezes por um amor que terminou mal, mas que fora vivido a pleno, do que viver um semi-amor, uma relação praticamente de mentira. Viver pela metade compensaria a perda de momentos como aquele em que estava? Sentia-se completa, feliz, tranquila. Não se sentia assim há praticamente um ano. Ou melhor, há praticamente um ano, desde que camuflara sua dor, simplesmente não sentia.

As lágrimas teimaram em cair sobre o rosto da roqueira, resultantes do vazio preenchido, da dor de estar nos braços que desejara por um longo ano de espera. Não sabia se poderia voltar ao vazio. Desde o beijo, a ideia de que estava bem e melhor se desmoronara. Suas feridas estavam vencendo a maquiagem, abrindo, e não sabia como remendá-las. Queria beijá-lo, arrastá-lo até o quarto, amá-lo como se nada devesse a ninguém; queria confessar o que sentia, implorar que não lhe deixasse novamente; pedi-lo em casamento e fugir para a Nova Zelândia como tanto sonharam. Queria viver tudo novamente, os bons e maus momentos, desde que pudesse estar com Dinho, porém não podia. Simplesmente não podia. Seus lábios estavam a centímetros da boca do ex. Não podia. Adriano estava prestes a quebrar a distância e beijá-la. Seus lábios roçavam.

– Não. – Lia se afastou bruscamente.

– Se é isso que você quer. – Dinho respondeu de coração partido.

O garoto se levantou de onde estava, voltando à porta. Sentia seu corpo acelerar pelo que havia passado com Lia, e a sala a sua volta girar por efeito do álcool. Atordoado, tropeçou no sofá, caindo. Gritou de dor. Gritou pela dor de haver batido sua perna contra o móvel e pela dor da distância. De tê-la tão perto até alguns segundos antes e bruscamente perdê-la outra vez. Ficou onde estava por um momento. Precisava de forças para levantar, para se reerguer e seguir em frente, literalmente e metaforicamente.

– Eu não consigo! – Exclamou exausto. – Você pode me pedir o que quiser, menos isso. Eu vou recuperar a sua confiança, você vai ver. Eu vou mudar, eu juro que mudo! Eu fico sóbrio por você, só não me faça sentir esse vazio de novo. – Implorou.

– Eu não posso. Me perdoa, Dinho, mas eu não consigo. Você acabou comigo, me destruiu. Você não tem o direito de querer voltar pra minha vida como se não tivesse feito nada, só pra bagunçar tudo que eu já fiz pra superar o que aconteceu. O Vitor é o cara certo pra mim, e você vai ter que lidar com isso se quiser continuar no Brasil. – Lia disse friamente do meio da sala, enquanto via o garoto se apoiando no sofá para se levantar.

– E o que você sente por mim? Eu sei que você ainda me ama!

– Que se danem os meus sentimentos por você, eu quero que eles se explodam! Eu já os escondi no passado mais de uma vez e agora, mais do que nunca, eu sei o quanto eu estava certa em lutar contra isso!

– Você viveria uma mentira? – Dinho questionou.

– Viver uma mentira seria acreditar que poderia ser feliz com você de novo sem ser traída.


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Notas finais do capítulo

Comentários são sempre bem-vindos e necessários e recomendo com força que ouçam a música depois ou antes de ler e imaginem a cena ao som da música, fica bem mais forte e bonita ^^ Bjos e até a próxima atualização!