[ Era o meu próprio grito. Porque quando olhei para o chão, Maat, o garoto dono do sorriso mais bonito do mundo, estava caído e inerte aos meus pés.]

O calor foi se espalhando pela ponta dos meus dedos e depois de alguns instantes de certo desconforto com a quentura excessiva eu me permito segurar a garrafa térmica com aspecto de papel laminado prateado com as duas mãos. Ainda tremia e tentava controlar a respiração, falhando miseravelmente , como sempre. Certamente, sou a criatura mais horrível e desprezivel do mundo chorando.

Me encolhi por dentro do cobertor, mas mesmo assim, parecia que aquele lugar era frio demais. Senti o meu estômago se apertar e contorcer, como sempre acontecia nessas situações. Tudo ao meu redor estava tão distante, que eu tive medo de ter outra crise. O que tornava toda a situação ainda mais rídicula. Maat precisava de mim e eu mal conseguia respirar.

" Ahh Isabelle, como você é idiota. Obviamente não parece que é uma filha de Atena" eu penso comigo mesma. " Nem merece o sobrenome Chase" outro soluço horroroso me escapa, mas eu seguro a respiração mais uma vez. "Muito menos ser irmã de Annabeth". Aquilo, por hora, é o suficiente para que eu saia daquele estado de transe.

Meus olhos analisam Nico, alguns metros a minha frente ajeitando a pequena fogueira improvisada. Sua expressão era cansada e não era para menos. Vi Maat, agora dormindo, depois de ingerir uma quantidade assustadoramente alta de néctar e ambrósia. Sua pele, antes alva e corada levemente com o sol de outono da Califórnia, agora estava ressecada e escura em vários pontos. Relembrei alguns momento que se passaram há algumas horas. Eu assisti completamente incapaz de me mover, Nico chegar a conclusão de que ele havia sido eletrocultado. Nico o reanimar. Nico lhe dar Ambrósia e Néctar. Nico sem saber direito o que fazer e achando pomadas para queimadura no nosso quite de primeiros socorros. Nico fazer o curativo. Nico me sentar em um canto e me enrolar em um cobertor. Nico limpando as feridas de Maat. Nico acendendo uma fogueira. Nico me fazer chocolate quente. E eu ali, estática, sendo devastadoramente inútil mais uma vez.

Se passa um instante até que eu beberique um gole do meu chocolate, agora não mais tão quente e sinta Nico se sentar, enrolado em um cobertor semelhante ao meu, do meu lado. Um silêncio estranhamente aconchegante e familiar se instala entre nós.

– Me desculpe - digo sussurando depois de um tempo, tomando mais um gole do líquido frio.

Mais uma pausa acontece.

– Exatamente pelo que você está se desculpando ? - ele pergunta, também sussurrando.

– Por ter sido completamente inútil. Por ter surtado completamente.

Ele parece pensar na situação por um minuto.

– Não posso aceitar suas desculpas, porque não tem pelo que você se desculpar. Eu sei como é perder alguém que é tudo pra você, e acredite, é exatamente do jeito que você estava se sentindo.

– Mas por eu não ter feito nada, ele poderia ter morri...

–Você tem razão, ele estava bem perto disso. Mas não pode se culpar, as parcas que decidem a hora para essas coisas acontecerem. Considere, que vocês dois tiveram sorte por eu ter vindo - ele fala esboçando um sorriso triste.

– Eu nunca duvidei que tivessemos - eu adimito, verdadeiramente grata.

Ficamos em silêncio por mais um bom tempo.

– Sabe, - ele começa.- Você não deveria ter sido tão grossa com Annabeth.

– Você só diz isso porque tem uma queda por ela - eu solto essa, sem nem mesmo pesar o efeito que isso pode causar.

Mas para minha surpresa, Nico só balança a cabeça negativamente com um sorriso idiota na cara. Não como se negasse as minhas palavras, mas como se o fato delas serem verdadeira só dessem ainda mais razão para o que ele havia dito, como se ele esperasse que eu fosse dizer algo desse tipo.

– Isso não muda o fato de que ela é sua irmã

– Eu sei disso.

– E de que você tem sorte por ainda ter uma irmã.

– Eu sei disso.

– E de que querendo ou não, nenhuma outra garota do chalé 6 pode substituir o que
você e Annabeth tem uma com a outra.

– Eu também sei disso - digo com a voz voltando a ficar embargada. - não estou mais com raiva de Annabeth. Fui tola por ficar irritada com isso. Era extremamente egoísta da minha parte querer que ela viesse em uma missão salvar o meu namorado quando o dela e o mundo estavam esperando.

Nico assentiu tristemente, como se aquele fosse um ponto importante.

– Eu falo sério Isabelle, quando digo que você tem que entender o que ela escolheu por mais egoísta que possa ter parecido. Eu confesso que até eu achei meio errado o fato dela não ter vindo com você - ele continua .- , mas as vezes, até mesmo Annabeth Chase, ou Bianca Di Angelo, tomam decisões pensando nelas mesmas. Ninguém é perfeito o tempo todo Bel's. Mas amar alguém é exatamente isso, é conhecer os defeitos e aprender a ama-los também. Eu aprendi isso da maneira mais dura possível.

– É que ás vezes não é muito fácil conviver com a grande Annabeth Chase , a heroína do século e tudo mais - eu adimito corando, envergonhada.

–Eu imagino que não seja - ele diz, compreensivo. - Mas olhe Maat, por exemplo. Ele tem, todo esse jeito ciumento e possessivo, mesmo que talvez , você que devesse ter ciúmes dele, sempre bancando o garanhão pra todo mundo.

Eu solto um risinho com o comentário, porque era realmente verdade. Maat era muito bonito e tirava proveito disso na cara dura. Era um hábito que me irritava muito, e sinceramente, agora que Nico comentou, lembrei que ainda teriamos uma conversinha sobre toda aquela "atenção especial" que ele costumava receber.

E lá estava o problema novamente. Aquele era o jeito de Maat. Eu me apaixonara por ele daquele jeito, eu fui sua melhor amiga a vida toda e ele sempre foi assim. Eu não tinha o direito de querer mudar isso nele, do mesmo modo que não podia exigir que Annabeth fosse menos orgulhosa, que ela fosse menos inteligente e genial. E principalmente, não podia cobrar que ela deixasse de ser Annabeth por conta de um problema com minha auto-estima.

– Você tem toda razão Nico - eu digo. - eu estava sendo sincera, não estou mais brava. Na verdade, a única coisa que eu espero com todas as minhas forças é poder voltar viva para dizer isso a ela.

Ele concordou com a cabeça e ficamos em silêncio novamente. Eu me levantei e apliquei as pomadas novamente em Maat, refazendo os curativos e tentando da melhor maneira possivel ignorar o fato dele estar quase pelado. Decidi usar as ataduras e não pude evitar o sorriso que se formou em meus lábio com a visão dele todo embalado, parecendo uma múmia. Quando terminei, o enrolei em um cobertor e dei para ele apenas mais um pouco de néctar. O vento estava forte, então o arrastei para mais perto da lareira e o envolvi em um cobertor.

Me sentei novamente ao lado de Nico, que eu sabia que havia ficado me observando. Nós dois sabíamos que os curativos ainda estavam praticamente limpos e não precisavam ser trocados e que provavelmente, eu só tenha piorado tudo, usando grande parte do nosso estoque. Mas também sabíamos que eu precisava fazer algo por Maat ou enlouqueceria.

Estava tão frio, que abandonei as cerimônias e me aconcheguei perto de Nico, o que eu sabia que o assustaria, mas não liguei. Ele era meu amigo agora, não era ?

– Bel's?

– Hum...

– Como sabe sobre ...

– Annabeth ? - perguntei de uma vez.

– Bem... é - ele respondeu embaraçado.

– Você não parece se esforçar muito para esconder isso, senhor Di Angelo - eu respondo meio rindo. - e para mim, tudo fico claro, quando você e Annabeth tiveram sonhos sobre a missão e eu não. Eu não estava falando com ela e Maat mal a conhecia. Tanto eu quanto Maat não estavamos exatamente dispostos a te aceitar na missão. Mas você acreditaria nela, e faria o que ela pedisse, a ponto de confiar em um sonho e atravessar o país para salvar uma garota que havia acabado de conhecer apenas para realisar um favor para ela.

Ele parou por um tempo, analisando o que eu disee.

– Parece que as parcas se engarregam mesmo de tudo - eu concluo.
ele sorriu amarelo e se aconchegou mais perto de mim. Definitivamente eramos amigos agora. Abriu a boca uma vez, mas eu enterrompi

– Não se preocupe, não vou falar para ninguém. - garanti. - E também, quem não se apaixonaria por Annabeth, certo?- comentei com mais amargura.

Ele soltou um risinho e se aproximou do meu ouvido para dizer algo.

– Tenho uma queda por filhas de Atena. - escutei ele sussurrar.

– Nhãaaah - fiz um som estranho, rindo e o empurrando pra longe, o que fez com que ele risse também.

– Você quase conseguiu ser agradavel por um dia inteiro - reclamei.

– Relaxe, ainda passaremos um bom tempo na companhia um do outro, até o senhor olhos azuis acordar e darmos um jeito de sair daqui - ele ironizou.

O ar entre nós era amigavel,por isso, não tive receio em voltar para perto dele.

– Mas sabe, isso sobre Annabeth é algo mais sobre minha infância - ele acabou o assunto e eu acreditei, Nico era muito diferente do menininho assutado que ela me descrevera.

– Além do mais, encontrei uma garota muito mais divertida. - ele "sensualizou" piscando pra mim.

– Mernie? - respondi rapido.

– Poxa Bel's, você tem um manual para "Nico", hein? - ele pergunta corando. - Como
que eu vou irritar Maat agora?

– Me poupe Nico, sei que vai continuar no meu pé. E sobre minha amiga, pode ir tirando o cavalinho da chuva - ele corou ainda mais. - quer saber, vou pensar no seu caso.

– Bel's

– O que foi agora ? - finjo irritação

– Não se acostume com isso. Não falo sobre sentimentos nem faço chocolate quente, se é que me entende.

– Entendo perfeitamente. Somo iguais nisso também.

E nós dois acabamos sorrindo. A verdade, é que aquele momento foi mais do que
Mernie, Maat, Annabeth, Percy e Gaia. Aquele momento foi meu e de Nico. Ele era um menino solitário, que perdeu a irmã e a mãe e não é filho do "pai do ano" e que tudo o que teve foi Percy e Annabeth. Mas ainda assim, era meigo e atencioso quando queria. Certamente irritante, mas eu parecia me dar bem com meninos assim.

E pela primeira vez, desde que conheci o Di Angelo, entendi porque Maat o tratava como um concorrente.