Meu Anjo escrita por Mari May


Capítulo 10
Interrogatório




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         Era a aula de Geografia do professor Ebisu. De repente, ele anunciou que faríamos um teste-surpresa em dupla, e que era pra juntarmos com o colega do lado pra fazer.

         Ao meu lado, estava Sakura. Ela sorriu, juntando sua carteira com a minha.

- É boa em Geografia?

- Mais ou menos... Humanas não é bem minha área... – ela fez uma pausa, e depois continuou – Ei, nada de piadinhas infames sobre isso, hein!

- Hahahaha, eu nem tinha pensado nisso... – tive que rir, era mesmo irônico – Mas... Qual é a sua área então?

- É...!

         O professor pôs o teste na nossa mesa, interrompendo-a.

- Depois do teste eu falo. – prometeu.

 

        

         Mesmo dizendo que não era tão boa com a matéria, Sakura tinha uma ótima base para as respostas. Eu apenas confirmava, complementando uma coisa ou outra.

         Humanas era minha área.

         Sendo assim, logo já tínhamos feito tudo e o professor nos liberou. No pátio, sentamos num banco qualquer.

- Nem acredito que fomos os primeiros a acabar! – exclamou, animada.

- Pois é... Mas acabamos. – dei um meio sorriso frente à alegria contagiante que a menina emanava - E pra quem disse que não era tão boa em Geografia, até que se saiu bem, hein?

- V-você acha?

- Tenho certeza. Sem dúvida, você é uma das melhores alunas da classe, senão “A” melhor.

         Desde quando fico elogiando os outros assim de graça?!

- O-obrigada... – respondeu, encabulada – Eu... Quero fazer mais trabalhos em dupla com você, Sasuke-kun...

         Aquele meigo sorriso me deixava sem jeito. Então, antes que meu rosto queimasse ainda mais, tratei logo de lembrá-la sobre um assunto pendente.

- Você ficou de me contar uma coisa...

- Uh? Ah, é! Minha área é Exatas! Quero ser engenheira química!

- Hum... Interessante...

- E você?

- Ah... Eu... Bom, não sei...

- Nem faz idéia?

- Fazer, faço... Mas...

- Mas...?

- O problema é o meu pai. Ele obrigou meu irmão a fazer Medicina, sendo que o maior sonho dele era ser músico, e ensinar as pessoas a tocarem violão, piano, e outros instrumentos que sempre foram o hobby dele. Minha mãe tentou conversar, mas meu pai não voltou atrás. E Itachi preferiu fazer o que o papai queria mesmo, tinha medo de brigar a ponto de ficarem anos sem se falar...

- Poxa... Que pena, Sasuke-kun... É uma situação bem complicada mesmo...

- É...

- E... O que ele quer que você faça?

- Ele não disse nada específico, mas com certeza vai ser algo de Exatas. E essa, definitivamente, não é minha área...

- Nem do seu irmão?

- He... Meu irmão é um gênio... Pode fazer qualquer faculdade que passa...

         Por que estou abrindo meu coração com ela?!

         Sakura me deixa tão... À vontade... Não sei por quê...

- Hum... Mas o que VOCÊ quer, Sasuke-kun?

- Ah... Eu queria ser sociólogo.

- Hahahahaha!

- Qual é a graça?

- É que isso é a sua cara, Sasuke-kun! Sempre tão observador, querendo entender o que se passa na mente das pessoas e por que elas se comportam de certas maneiras... Nossa primeira conversa começou por causa da sua mania de observação, hehe...

- Hunf! – corei de leve.

         Ela riu de novo e disse, ficando séria de repente:

- Sasuke-kun, sei que é difícil, mas você não pode deixar acontecer com você o que aconteceu com seu irmão. Ele sempre será um músico reprimido. Você não quer ser um sociólogo reprimido, né?

- Não, mas o que posso fazer? Fugir de casa e correr atrás disso?

- Se for preciso, sim.

         Eu a fitei, incrédulo.

- Tá falando sério?

- Bastante sério.

- Mas...!

- Seu pai é assim, mas ele te ama, certo? Pode ser que ele demore um dia ou uma década pra aceitar, mas ele vai te entender e te apoiar. Afinal, os pais querem nos ver felizes em todos os sentidos. E o profissional é um deles. Então, depois disso, seu irmão vai se sentir livre pra largar a medicina e enfim se dedicar à carreira musical.

- Você fala como se fosse simples...

- Mas NÃO é simples, e nunca será. Pense bem, Sasuke-kun: é o seu futuro. Deixe claro pro seu pai que o ama, e que não vai fazer nada por rebeldia, e sim porque quer que ele o entenda.

         Fitei-a por longos segundos.

- Você é bem idealista, hein?

- Só tento ser o mais otimista possível.

- Hunf... – acabei deixando escapar um sorriso.

- Vai seguir meu conselho??? – perguntou, empolgada.

- Não sigo conselhos de gente irritante.

- Como é que é??? – ela me fuzilou com os olhos, e dei uma risada.

         Ela sorriu, entendendo que aquela era minha maneira de dizer “sim”.

         Será que um dia vou poder fazer meu pai me entender tão fácil assim?

- Sasuke-kun...? – chamou ela, fazendo-me sair dos devaneios idealistas.

- O quê?

- Meus pais querem falar com você.

- Hã?! Como assim?!

- Eles estudam sobre aquela raridade da qual você faz parte, mas só quando têm tempo. Afinal, ser pais, trabalhadores e Anjos da Guarda ao mesmo tempo já é cansativo. Mas é um cansaço gratificante.

- E não existem anjos com a função de estudar especificamente isso?

- Não, pois é melhor estudar quem tem mais afinidade com o assunto, e quem melhor do que os Anjos da Guarda, que podem ver de perto essa raridade, hum?

- É, faz sentido... Mas por que vocês pesquisam em vez de perguntar diretamente a Deus, que sabe todas as coisas?

- O ser humano já descobriu a cura pra todas as doenças do mundo?

- Quê? Não, mas o que isso tem a ver?

- Deus é onisciente, mas Ele gosta de ver a gente desvendando esses mistérios, e fica feliz quando ficamos felizes ao chegar a uma resposta. Assim como os cientistas, também queremos fazer descobertas por nós mesmos.

- Entendi...

- Hoje, meus pais pediram licença no trabalho só pra falar com você. E aí, você vai?

- Na sua casa?

- Aham.

- Tudo bem. Também quero saber o que há de errado comigo.

         Depois disso, as outras duplas começaram a descer: Naruto e Lee, Ino e Shikamaru, Hinata e Tenten, Chouji e Gaara, e formamos a rodinha de conversa (sim, Gaara agora é o mais novo integrante da trupe).

 

 

         Quando cheguei à casa de Sakura, fui recebido por seus pais.

         Eu ainda não os conhecia, pois nas vezes que eu e o pessoal viemos ensaiar aqui eles estavam trabalhando.

- Prazer! Sou Iruka Haruno!

- E eu sou Anko Haruno! Como vai, rapaz?

- Bem. Obrigado.

- Por favor, sente-se! – disse a mulher de cabelo roxo (as mulheres dessa família têm fetiche por pintar o cabelo de cores tão, er, singulares?)

- Aqui, Sasuke-kun! – disse Sakura, apontando um lugar vago ao lado dela no sofá em que estava.

- Obrigado.

         Confesso que esperava ser guiado até um quarto escuro, com uma tenebrosa música de suspense ao fundo, me amarrariam numa cadeira e, de repente, a luz cegante de uma lanterna iria surgir no meu rosto. Então, eu seria torturado psicologicamente até arrancarem minhas confissões (?) – é, eu sei que é muita viagem, mas depois de tanta coisa surreal e sobrenatural acontecendo bem na minha frente, não duvido de mais nada.

         No outro sofá, os pais de Sakura. Iruka com um laptop em mãos, certamente para as anotações (cara, tô começando a passar do estágio de “assustado” para “apavorado”... que tipo de pergunta será que vão fazer???)

- Pode começar, amor. – disse ele.

- Beleza! Vamos lá: primeiramente, qual o seu nome completo?

- Sasuke Uchiha.

- Tem alguma ligação com Madara Uchiha?

- Ele é meu tio por parte de pai. Por quê?

- Curiosidade. Afinal, o caso dele foi até manchete dos jornais, revistas, etc... Queríamos saber melhor sobre sua ligação com ele, se não se importar em contar.

- Ah, ele era um tio que eu gostava muito, eu era meio apegado a ele... Até que... Bem, vocês sabem...

- Eu não sei a história dele. – comentou Sakura.

- O caso foi abafado. – explicou Iruka.

- É. Os Uchiha não queriam o nome manchado por causa dele. – continuei – E... Pagaram certas quantias pra não tocarem mais no assunto...

- Mas... O que ele fez, Sasuke-kun?

- Sakura, respeite, ele não quer mais falar disso! – repreendeu a mãe – Depois eu te conto.

- Não. – falei – Tudo bem, deixa que eu conto.

- Ah... Então, tá.

         Respirei fundo antes de começar:

- Meu tio era um médico de renome. Os Uchihas devem ser renomados em qualquer profissão, aliás... – comentei com desgosto, e voltei ao assunto – Ele era bem-sucedido. Bem-sucedido até demais pro pouco tempo de carreira que tinha. Meu pai, que é policial, já tinha começado a desconfiar, mas não queria acreditar. Então, pra se certificar, aproveitou quando foi visitar o irmão pra pegar a chave da casa dele, tirar o molde e mandar fazer uma cópia depois. Assim, no fim-de-semana que meu tio precisou viajar pra um congresso, ele foi até a casa dele e, com a ajuda de outros peritos, grampeou o telefone. E foi através disso que descobriram que ele chefiava um dos grupos de traficantes de drogas que a polícia vinha tentando deter há tempos, a Akatsuki, e descobrir a identidade da pessoa que ficava no comando, apelidada de Tobi. O chefe era tão cruel que, se algum cliente demorasse pra pagar, passando do prazo estipulado, ele ordenava a execução do mesmo. E com a exigência de que tudo parecesse ser apenas um acidente, quando na verdade era um homicídio friamente calculado. – fiz uma pausa, encontrando o olhar arregalado de Sakura, e prossegui – Meu pai ficou chocado e angustiado quando descobriu. Estava caçando seu próprio irmão. E, às vezes, lhe confidenciava qual seria a próxima emboscada que a polícia armaria pra pegar o Tobi, afinal, confiava plenamente nele. Então, meu pai escolheu ficar do lado da justiça e participou da operação que o prendeu. Meu tio o ameaçou de morte, jurou vingança, dez anos se passaram e nada. Ele continua preso.

- Detendo o líder, rapidamente deteram os outros integrantes da Akatsuki... – Anko comentou.

- Sim. Uns foram presos, uns foram mortos em combate com a polícia, e alguns ainda estão soltos por aí porque estão desaparecidos. A polícia vem trabalhando pra encontrá-los, mas já faz dez anos... Alguns até já desistiram da busca... – suspirei – É isso.

- Você tinha quantos anos quando ele foi preso? – indagou Iruka.

- Seis anos. Claro que, na época, eu não entendia direito porque o tio que eu tanto gostava estava atrás das grades, nem por que os colegas de classe se afastaram de mim, dizendo que os pais mandaram eles fazerem isso. O único que não se afastou de mim foi... – acabei sorrindo de leve – O Naruto. Graças a ele, todos entenderam que não era porque o meu tio era um “cara mau” que eu também seria e, aos poucos, voltaram a falar comigo. Mas o mais próximo sempre foi o Naruto. Na 5ª série veio a Hinata, mas não é a mesma coisa... Meu laço com o Naruto...! – parei quando vi os largos sorrisos que faiscavam “que gracinha de amizade!” – Me perdoem... Acabei fugindo do assunto...

- Sem problemas. – garantiu Anko – Precisamos saber o máximo sobre você pra seguirmos com nossos estudos.

         Engoli em seco, atordoado por lembrar repentinamente que estava sendo objeto de estudo.

- Seu depoimento está sendo gravado no meu laptop. – disse Iruka – Desculpa por não avisar antes, esqueci. Vamos continuar?

- Er... Tá, mas... Antes posso pedir um favor?

- Claro.

- Poderia cortar o que eu falei sobre o Naruto? É algo que, definitivamente, não precisa ficar registrado... Vos imploro!

         Meu tom dramático fez todos caírem na gargalhada.

- Que orgulho é esse, moleque?! – dizia Anko, aos risos – Não se preocupe, guardaremos sigilo absoluto! Ninguém além de mim e do meu marido vai ouvir sua declaração de amizade eterna, tá bem?

- Mãe!!!

- Hahahaha, não resisti!

- Agradeço. – falei, esboçando um sorriso constrangido.

- Mas é sério, Sasuke-kun, só eles vão ouvir. Meus pais estudam os humanos raros voluntariamente e, por isso, não precisam contar exatamente tudo que descobrem quando algum curioso pergunta.

- Ufa... Menos mal... – dramatizei de novo, fazendo-os rir outra vez.

         E até eu acabei rindo agora. Mas só porque fiquei aliviado com a certeza de que ninguém mais – principalmente o Naruto – ouviria aquela coisa melosa que falei! Sou orgulhoso demais pra isso. Fora que é divertido deixá-lo em dúvida quanto à reciprocidade do sentimento fraternal dele por mim.

         As perguntas que se seguiram foram sobre as profissões dos meus pais, meus hobbys, enfim, assuntos mais leves.

         Após a sessão de perguntas, Anko me ofereceu bolo, biscoitos e suco, e fiquei ali com a família Haruno falando de banalidades.

         Quando vimos, já tinha se passado quase duas horas desde que cheguei. Eu tinha ido em casa almoçar, tomar banho e vim pra cá.

- Foi bom te conhecer, Sasuke. – Iruka falou, já na porta comigo.

- Digo o mesmo.

- Volte sempre! – convidou Anko.

- Menos, mãe, ou vai assustá-lo...

- Menos nada! – ela sorriu, marota – Ou vai dizer que não gostou da idéia?

- M-mãe!!! – a face dela ganhou um tom escarlate.

- Hehehe, brincadeira... Obrigada pela gentileza em vir, Sasuke.

- Não há de quê.

- Sakura, acompanhe ele até o ponto.

- Q-quê?!

- Anda, menina! Obedeça a sua mãe!

- Mas que coisa é essa pra eu obed...?

- Apenas vá! – a mulher disse, empurrando a filha praticamente em cima de mim.

- Tá, tá! Eu, hein...

         Então, nós caminhamos até meu ponto de ônibus.

         Lá, ela disse:

- Não liga pra minha mãe não, tá? Ela é meio doida assim mesmo... Hehe... Muito contraste com o meu pai, que é tão sereno...

- Tudo bem. Convivo com um boçal de nascença há anos. Sou expert em lidar com doidos, não se preocupe. Sua mãe é pouco perto “daquele ser”.

- Hehe... O Naruto, né?

- ...hunf.

- Mudando de assunto, Sasuke-kun... Er... Eu... Queria perguntar algo, mas não sei se devo...

- Fale logo antes que meu ônibus chegue.

- Bem... É que... Seu pai... Ele... Ele quer que Itachi seja o que seu tio Madara não foi, né? Insistindo pra ele fazer medicina e tal... – disse, fitando o chão.

- Isso mesmo. – levantei seu queixo devagar – Você é mais esperta do que eu imaginava, Sakura. – ela fitava meu rosto, surpreendida, e eu sorri, soltando-a.

- Então... Isso é mais um motivo pra você seguir meu conselho, Sasuke-kun. Claro, se quiser.

- Shhh... Fica na sua. Faço o que quiser da minha vida.

- Eu sei. Mas pense com carinho.

- Já não falei pra ficar quieta?

- Olha a grosseria, garoto!

- Hunf... Irritante!

- Ora, seu...!!!

- Opa, meu ônibus! – falei, fazendo o sinal pra ele parar.

- Ninguém te merece, Sasuke Uchiha!

- Idem, Sakura Haruno!

         Enquanto eu subia...

- Hehe... Até amanhã!

         Virei-me para ela, sorrindo de canto enquanto assentia.

         Foi tudo mais calmo do que eu esperava, e os pais da Sakura são legais. Será que vão descobrir logo por que sou um humano raro?

         Ao mesmo tempo que anseio pela resposta, tenho medo de sabê-la.


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