School Of Rock III escrita por Snapelicious


Capítulo 21
All That We Are


Notas iniciais do capítulo

Entããããão ~Snapelicious surge do nada, com um pacote de balas e um sorriso culpado~ Será que ainda há alguém aqui?
Antes de mais nada, quero que saibam que sim, eu odeio a mim mesma por ter demorado tanto. Tenho estado tão ocupada, que nos únicos momentos de tempo livre que eu tenho, ou estou dormindo ou vegetando (quem estuda em Institutos Federais sabe do que eu estou falando). Nessas últimas semanas dei tudo de mim para completar esse capítulo, e isso inclui ficar até as três da manhã de uma segunda-feira escrevendo. Espero que me perdoem.
5000 palavras. Bom o suficiente? 13 páginas no Word de um único capítulo. Daqui a pouco meus dedos sangram de tanto digitar (nah, Giordana, menos).
E o capítulo seguinte já está em andamento ~atira bala e confetti pro alto~
Enjoy!



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Ginny Weasley

Eu cantarolava uma música baixinho quando ouvi a porta bater.

–Nossa - falei, me erguendo nos cotovelos, deitada no sofá - Não precisa destruir a casa.

Rony não respondeu. Ele estava mais vermelho do que o normal.

–Que foi, perdeu no Uno de novo? - provoquei, rindo - Sabe, não é o fim do mundo.

Ele revirou os olhos, atirando a mochila em um canto e desabando em uma poltrona.

–O que aconteceu? - perguntei, mas ele não se prestou a responder. Coloquei os fones de volta no ouvido. Batuquei os dedos sobre minha própria barriga, tentando acompanhar o ritmo da bateria na música, enquanto cantava baixinho. Depois de alguns segundos, Rony deu com uma almofada na minha cara.

–Ei! - exclamei, me encolhendo e olhando pra ele com raiva - Pra quê isso?

–Eu estou te chamando há séculos - disse ele.

–Eu estava ouvindo música, como espera que eu escute? - resmunguei, e ele não pareceu se importar.

–O que você estava ouvindo? - perguntou. Peguei o iPod para conferir.

–Alguma coisa do Fall Out Boy - respondi, emburrada, passando a mão no meu cabelo bagunçado.

–Desde quando você escuta isso? - perguntou ele, erguendo as sobrancelhas.

–Sei lá - dei de ombros, voltando a deitar - É legal.

–Não é não.

Olhei pra ele, como se não pudesse acreditar.

–Vem cá, você vai ficar emburrado assim a noite toda? Porque se for, eu vou sair antes que sua idiotice me infecte.

–E vai pra onde?

–Pro telhado. Vou chamar o Harry. Vamos nos transformar em anarquistas. Grudar espinhos nas nossas roupas. Desafiar o sistema. - falei, séria. Rony me encarou por alguns segundos, tentando descobrir se eu estava brincando ou não. Depois de um tempo, ele suspirou.

–Desculpe - falou, com os ombros caídos - Hoje eu não tô legal.

–Você parecia bem antes de ir pro Harry mais cedo - comentei - O que aconteceu?

Por um segundo, eu achei que ele fosse responder. Mas Rony apenas fez que não com a cabeça, resmungou alguma coisa parecida com "banho" e subiu as escadas antes que eu pudesse fazer alguma coisa. Pisquei, confusa, e peguei o celular.

Depois de duas tentativas, Harry atendeu.

"Hallum" disse ele, e depois riu de si mesmo "É tão engraçado falar isso."

–Por que demorou tanto pra atender? - perguntei, com um sorrisinho.

"Desculpa, não sabia onde estava o celular."

–Por que você tem celular, se nunca usa?

"Tem uns joguinhos bem legais."

–Oh. Isso faz sentido - falei, com uma risadinha - Rony acabou de chegar extremamente emburrado. O que aconteceu?

"Oh... Hãã, Tia Lene, não lembro onde coloquei. Vou procurar, um segundo" disse ele, parecendo afobado. Franzi o cenho, tentando entender com quem Harry estava falando. Logo depois ouvi passos apressados, e uma porta bater "Desculpe, Ginny, Hermione estava do meu lado."

–Hã?

"Não tenho certeza; do nada ele ficou de mau humor." continuou ele, sem parecer se importar com minha confusão. "Eu estava estudando com Mione, e ele ficou emburrado. Talvez... Oh."

–O quê? Oh o quê? - perguntei, me aprumando no sofá, ansiosamente.

"Isso faz muito sentido." disse Harry para si mesmo, dando uma risadinha.

–O que faz sentido? Me conta! Harriiiiiêêê! - implorei.

"Pensa comigo. Rony ficou emburrado do nada, dois segundos depois de Hermione me ensinar uma matéria difícil e eu agradecer, dizendo que a amava. Ele..." disse Harry.

Oh. - fiz, sacando imediatamente. - Oh! Não pode ser. Sério?!

"É o que parece" riu ele "Mas não podemos tirar conclusões precipitadas."

–Tarde demais.

"Não temos o que fazer em relação a isso, na verdade" suspirou o garoto "Eles que tem que se resolver."

–Mas eles são idiotas! - resmunguei - Nunca vão se resolver.

"Desde que eles não matem alguém..."

Fiquei alguns segundos em silêncio.

–A menos que a gente juntasse eles - comentei.

"Haha, boa, Ginny" Harry ironizou "Isso aqui não é filme, não. Não podemos juntar duas pessoas assim, do nada."

–Podíamos tentar - insisti, fazendo manha.

"Você poderia tentar. Sinto muito, mas não consigo fazer isso. Já tenho problemas demais."

–Problemas? - ri - Harry, você fica relutante até de sair de casa, como vai ter problemas? Não é como se você se metesse em confusão, ou algo assim.

"Eu invadi a rádio da escola, não?"

Abri a boca para responder, mas o que ele disse me atingiu com a força de uma porrada no meio da cara. Soltei um som estrangulado, mas não consegui falar nada. Foi como se meu cérebro tivesse deletado todos seus arquivos, inclusive o passo-a-passo de como reagir a comentários constrangedores.

"Ginny?" chamou Harry, hesitante "Tenho que desligar. A gente se fala amanhã, ok?"

Antes de desligar, tive a impressão de murmurar um "tchau" fraquinho. Coloquei o celular no sofá, e o fiquei encarando por um bom tempo.

Ted Lupin

Coloquei as partituras em minha frente. As observei por alguns segundos, tentando decidir se faria ou não. Lentamente minhas mãos se aproximaram das teclas, mas não saiu nenhum som. Não conseguia me mover.

Passei a mão pelos cabelos, frustrado. Voltei a olhar para o piano, e uma fração de segundo depois, apertava as teclas com força, as notas agressivas. Erradas.

Voltei a analisar a partitura, tentando entender o que havia feito de errado. Já fazia tanto tempo que meu cérebro não lia as informações com a mesma rapidez de antes. Coloquei lentamente cada dedo sobre cada tecla. Comecei a marcar o tempo batendo os dentes no ritmo. Pressionei as teclas, formando as primeiras e hesitantes notas da melodia. E fui interrompido.

–Achei que você não tocasse mais.

Me virei rapidamente, só pra ver Remus parado na porta da sala de jantar. Suas mãos estavam nos bolsos da calça, e ele parecia tentado a se aproximar. Não pela primeira vez, observei como éramos parecidos. Não idênticos. Mas o suficiente para me manter desconfortável o tempo todo.

–Achei que vocês tinham saído – comentei, sem olhar nos olhos dele.

–É quase meia-noite – disse Remus – Tínhamos que voltar alguma hora, não?

Intimamente, queria que não.

–Dorcas já subiu – continuou. Sua cabeça se inclinou para o lado, pensativo – Ouvi a música. Fazia tempo que ninguém usava esse piano. Achei que você não tocasse mais – repetiu.

Há momentos em que eu queria desaparecer só para não ter que conversar com alguém. Não estava com saco para responder a provocações, ou para tentar parecer indiferente em relação a elas. Só estava cansado. Exausto.

–Eu também – ouvi minha voz responder.

–É algo relacionado à banda? – perguntou Remus. Ergui os olhos. Ele sabia. É claro que ele sabia. E de qualquer forma, fiquei feliz por ele não ter questionado minha decisão de não ter contado a ele. Na verdade, não queria contar.

–Não – respondi, depois de pensar sobre alguns instantes. – Não tem nada a ver com a banda.

Ele ficou em silêncio. E eu senti o impulso de continuar.

–Na banda eu só toco guitarra. Eles queriam que eu cantasse, mas eu não acho minha voz legal. Eu gosto da guitarra. Mas sentia falta disso. Do piano. – falei, acariciando as teclas com a ponta dos dedos. – Mamãe não deixa eu tocar.

O silêncio caiu pesadamente sobre a sala de jantar. Pelo canto dos olhos, vi Remus ficar subitamente tenso. Ele endireitou a postura, tirou a mão dos bolsos e me encarou fixamente. Sua boca se abriu para falar alguma coisa, mas mudou de ideia no último segundo.

–Porque isso faz ela lembrar de você.

Foi baixinho. Mas ele ouviu. É claro que ouviu.

Fechei a tampa do piano, tentando não fazer barulho. Me ergui da banqueta o mais silenciosamente possível, como se tentasse parecer despercebido. O que era meio difícil, já que meu pai analisava minunciosamente todos os meus movimentos. Atravessei a sala de jantar com passos largos, e não hesitei quando passei por Remus na porta. Seu olhar me seguiu, mas apenas quando eu estava com o pé no primeiro degrau das escadas, pude ouvir sua voz cansada.

–Me desculpe.

E só.

Senti vontade de gritar.

Harry Potter

Aumentei o volume da música e segui em frente. Por mais que adorasse ouvir música, não me sentia bem fazendo isso com outras pessoas ao redor. Tinha medo do volume estar alto demais, ou não ouvir alguém me chamando e fazer papel de ignorante. Mas pelo menos dessa vez, era necessário.

Logo que atravessei as portas de entrada da escola, senti os olhares sobre mim. Já esperava por isso. Claro, agora eu era o “tal do Potter”. Aquele garoto que de uma hora para a outra todo mundo notou a existência. O retardado que colocou uma música para tocar na hora do almoço, enchendo o saco de todo mundo.

Quando começou a tocar uma música do Jimmy Eat World, tive a impressão que alguém me chamava. Diminuí o passo, mas não olhei ao redor. Alguns segundos depois Hermione estava ao meu lado. Com uma expressão nada boa.

–O que aconteceu? – perguntei, mas logo percebi que não tinha conseguido escutar ela. Tirei os fones. – O quê?

Ela revirou os olhos.

–Viu Rony por aí? – perguntou.

–Não, acabei de chegar. Por quê? – imediatamente lembrei da conversa que tinha tido com Ginny na noite anterior.

–Tá todo mundo falando sobre isso. Já vieram me perguntar o que eu sabia umas cinco vezes só hoje, quero saber se Rony também está sendo assediado. – Hermione suspirou – Por mais que eu ache errado faltar aula, acho que não foi uma boa escolha vir pra escola hoje.

–Tá brincando? Fiquei dois dias em casa. Já estava com saudades do cheiro de podridão e das pessoas ignorantes que têm aqui – falei, respirando fundo, com um falso sorriso de contentamento.

–É uma surpresa que você não esteja apavorado – comentou ela, ajeitando a mochila no ombro, enquanto seguíamos em direção à aula de Geometria. Eu odeio Geometria.

–Espera, do que você está falando? – perguntei, mas antes que a garota pudesse responder, alguém veio correndo por trás de mim, e me deu tapinhas nas costas.

–Grande Potter! – exclamou o garoto, sorrindo para mim e se afastando com os amigos.

Parei no corredor, com os olhos arregalados, tentando alcançar o local que ele tinha tocado. Mal cheguei e já recebi ameaças de morte.

–Deixa de ser bobo, ele não colou nada aí – disse Hermione, após conferir. Abaixei o braço e a encarei, fazendo a minha melhor expressão de o-quê-diabos-está-acontecendo-aqui?

–O que diabos está acontecendo aqui? – perguntei, levemente esganiçado – Quem era aquele garoto? E por que ele me cumprimentou? Ninguém nunca me cumprimenta. Eu sou um idiota, esqueceu?

Hermione me olhou como se sentisse pena de mim. O que com certeza não fez eu me sentir melhor.

–Desde sexta-feira o pessoal só está falando de você – respondeu ela, parecendo cansada – A notícia de que foi você quem colocou a música se espalhou rápido demais. E alguém ainda espalhou por aí que você tem uma banda. Nos últimos dias todo mundo tem me perguntado sobre essa banda, mas eu respondia que não sabia de nada e caía fora.

–O q-? – gaguejei, boquiaberto.

–Eu não te contei porque esperava que todo mundo tivesse esquecido quando você estivesse de volta. Aparentemente, estava errada. Eu sinto muito, Harry!

Não respondi de imediato. Enquanto tentava absorver o que Mione tinha dito, olhei ao redor. Pelo menos quatro alunos me observavam, enquanto conversavam em seus grupos de amigos, sem ao menos tentar disfarçar que o assunto era eu. Senti uma tontura repentina, e meu estômago embrulhou.

–Tudo bem – falei, com a voz fraca, sem saber exatamente pra quê eu falava isso. – Eu estou bem.

Na verdade, não estava.

–Harry? – chamou uma garota que eu nunca tinha falado na vida, se aproximando sorridente – É verdade que você tem uma banda?

Pisquei, confuso.

–Hãã... – olhei para Hermione, pedindo silenciosamente por ajuda, mas ela apenas ergueu as sobrancelhas. Me voltei para a garota. – É sim.

–Maneiro! – exclamou ela, se aprumando. Tive a impressão que seus peitos podiam a qualquer momento explodir para fora da blusa justa demais. – Qual o nome? Quem mais tá nela?

–Hm... Ted Lupin, do sétimo ano – respondi, ignorando propositalmente a primeira pergunta. Os olhos da garota se arregalaram.

–Aquele loiro gostoso? – perguntou ela, afobada. Franzi o cenho, tentando descobrir como eu reagia àquilo, mas ela apenas soltou um gritinho esganiçado e voltou saltitando para as garotas que esperavam ela mais adiante.

Ficamos em silêncio por alguns instantes.

–O que diabos foi isso. – não era uma pergunta.

–Harry! – comecei a sentir um calafrio, quando percebi que era Rony quem se aproximava. – Já sabe? Você é famoso!

Soltei um som estrangulado.

–Você está bem? – perguntou ele – Tá pálido. Hey Mione. As pessoas te atacaram também? Todo mundo quer saber do tal do Potter, o garoto que faz música. Acho que até pararam de te chamar de Potter Pateta. Já é um começo, não? Vamos para a sala, se não vamos chegar atrasados. Acho que a gente devia escolher um nome de uma vez. Enquanto ainda estão falando da gente. Quero dizer, só mostramos uma música, mas já somos a banda mais famosa da escola. Pera, somos a única banda da escola, não? Acho que tem alguém que tem uma banda de rock também. Um tal de Derek. Não gosto daquele cara. Mas isso é muito maneiro!

Enquanto era arrastado por um Rony tagarela para uma sala de aula infernal, não pude deixar de ter o sentimento que algo ao meu redor tinha mudado dramaticamente.

Maggie Black

–Saaaaaam – choraminguei – O quê cê tá ouvindo?

Ele me olhou com uma careta. Inclinei a cabeça para o lado e pisquei os olhos rapidamente, de um jeito que imaginava ser fofinho.

–Maggie, você parece uma débil mental – disse ele, sem se afetar. Ouvimos uma risadinha mais atrás.

–Parece? – riu Joan baixinho, sem levantar os olhos do próprio caderno.

–Nossa. Deu de brincar com meus sentimentos, não? – falei, levemente ofendida. Sam deu um sorrisinho adorável e apertou minhas bochechas. O que fez ele parecer menos adorável e mais socável.

–Own, Maggie – disse ele, com voz de bebê – Tá carente?

–Tô.

–Vem cá.

Sam me puxou para um meio abraço, passando o braço pelo meu ombro e fazendo eu me encostar nele. Suspirei. Sam era fofinho. E abraçável. Aproveitei para pegar um de seus fones de ouvido e colocar. Por um segundo pensei que fosse macumba.

–Que é isso? – perguntei, devidamente assustada.

–Música japonesa – respondeu ele rapidamente, como se para dar um impacto menor nas reações.

–Uh – falei, continuando a ouvir – Não tô entendendo nada, mas parece inspirador.

–Música japonesa? – riu Joan, agora nos encarando com uma careta, da classe de trás. – Por que você escuta essa droga?

Antes que Sam pudesse pensar em algo idiota para dizer, eu respondi:

–Na verdade, Joan, as pessoas escutam o tipo de música que elas quiserem. Não precisa ser tão preconceituosa. Não estamos obrigando você a gostar também.

Ela ficou em silêncio. Quase pude sentir a temperatura da sala baixar, mas tentei não pensar nisso, e nem no fato de eu provavelmente ter sido rude demais com minha melhor amiga. Mas bah, é verdade. Falar mal da nossa música não vai tornar a dela melhor. Vou tentar fazer ela entender. E depois comprar uma Tortuguita para ela. Tortuguitas fazem tudo ficar melhor.

Quando ouvimos Joan voltar a trabalhar nos exercícios de Física, eu e Sam, que já tínhamos terminado a tarefa, ficamos escutando música, eu ainda com a cabeça em seu ombro. Tive a impressão de ouvir alguns cochichos maldosos vindo do fundo da sala, bem como olhares estranhos em direção a nós dois, mas tentei não dar bola.

–Sammy – sussurrei para ele. Achei que ele fosse me ignorar por eu ter usado um apelido idiota, mas ele soltou um “hm” desinteressado – Casa comigo?

O garoto abriu os olhos e me encarou com uma sobrancelha erguida.

–Como?

–Vamos casar – repeti – Você é o amor da minha vida. Vamos casar, ter filhos e morar na Alemanha.

–O que vamos fazer na Alemanha?

–Comer batata.

–Desculpe, Maggie – disse ele – Mas você não faz meu tipo.

–Mas eu sou sua melhor amiga! – exclamei tentando parecer ofendida, ainda controlando o tom de voz.

–Desculpe – pediu ele de novo, agora com um sorrisinho – Mas não acho que você não poderia satisfazer minhas necessidades.

Demorei alguns segundos para entender do que ele estava falando, e quando entendi, meu queixo caiu.

–Nossa! Você... Eh... Argh. Isso foi rude.

Ele estava rindo. Logo estava rindo junto. Só paramos quando ouvimos alguns alunos nos mandando calar a boca educadamente.

–Sam, Sam... – suspirei, voltando a me encostar nele – Eu vou achar um bofe pra você.

Ele não respondeu. Mas se eu conhecia bem mesmo meu melhor amigo, ele provavelmente estava pensando que aquela era uma péssima ideia.

Ted Lupin

–Como se fala “macacos me mordam” em francês? – perguntei.

Victoire olhou para mim e franziu o cenho.

–Sério – falei. Ela piscou, confusa.

–Não existe essa expressão na França – respondeu.

–O quê? – me endireitei na cadeira, virando completamente para ela. – Então o que os franceses falam quando estão bolados?

Alguns segundos depois, ela ria.

–Achei que fosse algo como “macacons mí mordón” – continuei. Victoire chegou a apertar a barriga de tanto rir, tentando abafar com a manga do casaco. Fiz uma careta pra ela – Você tá rindo de mim?

–Não – mentiu ela, tentando controlar a respiração.

–Bom mesmo – falei, me fingindo de emburrado. – Porque senão eu ficaria realmente bolado e teria que usar uma expressão não-francesa para expressar isso, o que sinceramente seria muito constrangedor.

Victoire olhou para mim de um jeito estranho, ainda tentando controlar as risadas. Sorri para ela, sem saber o motivo.

Dessa vez, não tínhamos matado aula. Até porque a garota era aparentemente um exemplo de boa aluna, e não seria eu quem a levaria para o mau caminho.

Desde que ela tinha entrado na escola, alguns meses atrás, Victoire se tornou meu par para toda e qualquer matéria. Fazíamos par no laboratório, na classe, nos projetos de turma. Só nos separávamos na Educação Física, mas eu não compareceria de qualquer jeito. Victoire se tornara uma constante em minha vida; para onde eu olhava, lá estava ela. Foi de repente. Mas parecia tão certo.

–A próxima é tua, gênio – disse ela, empurrando o livro de Espanhol em minha direção.

–Mas eu traduzi a última – respondi, tentando parecer inocente.

–Nope, eu traduzi a última – a garota revirou os olhos, sorrindo – Vai logo.

Peguei o lápis e encarei as frases bobas do livro didático. Três segundos depois, me virava para ela.

–O que vai fazer hoje á noite?

–Faça as atividades, Teddy – insistiu ela.

–Tem algum compromisso? – perguntei – Sabe, eu estava pensando, a gente podia fazer algo.

–Eu vou ter que fazer tudo sozinha? – perguntou Victoire, sorrindo como se tivesse que lidar com uma criança de sete anos levemente lenta – Você é uma tragédia em Espanhol. Não sei como você ao menos consegue falar inglês.

–Podíamos alugar um filme – sugeri, pensativo.

Victoire olhou para o livro, estática. Alguns segundos depois, ela levantou a cabeça e me olhou, sem expressão nenhuma.

–Teddy? – chamou – Você está me chamando pra sair?

–Depende – respondi, dando de ombros e desviando os olhos por alguns instantes, tentando não ficar vermelho – Está funcionando?

Quando voltei a olhar para a garota em minha frente, senti um incomum frio na barriga, e percebi que não iria aguentar esse tipo de rejeição. Porém, antes que eu pudesse dar com a minha cara na mesa, vi o pequeno sorriso surgindo em seus lábios entreabertos, como se ela não pudesse acreditar.

–Yeah – respondeu Victoire baixinho, seu sorriso aumentando cada vez mais.

–Legal – falei no mesmo tom, sem conseguir conter meu próprio sorriso.

Não sei quantos segundos ficamos ali encarando um ao outro, sorrindo como idiotas. Foi Victoire quem quebrou o silêncio.

–Vamos, Teddy – disse ela – Ainda temos que fazer os exercícios.

Voltando os olhos para o livro, suspirei de contentamento. Ela era a única pessoa que me chamava de Teddy. E eu não via problema nisso.

Harry Potter

Pela primeira vez em quatro anos, eu fui convidado para fazer um projeto em grupo com meus colegas. Normalmente, era apenas eu, Hermione e Rony. Interagir com pessoas que não fossem eles era no mínimo assustador.

–Então – comecei, olhando para o livro, tentando não parecer muito nervoso – Vocês já tem alguma ideia do que querem fazer?

O resto do grupo me encarou, mas não falou nada.

–A gente só copia e cola da Wikipédia – disse um garoto, por fim. – Muda umas frases de lugar. Tira os hiperlink. O professor nem vai notar.

Tive dificuldades em segurar minha vontade de bater minha própria cabeça na parede. Mas tinha que ficar consciente até o final da aula. Pelo menos era o que o professor dizia.

–Eu posso dar conta da parte escrita – murmurei, me endireitando na cadeira, incomodado.

–Eu seguro o cartaz – disse Lilá Brown, levantando a mão, orgulhosa de si mesma. Enquanto os outros reclamavam e pediam para trocar de posição na apresentação, fiz força para não revirar os olhos. O que diabos eu estou fazendo aqui?

–Hey Harry – chamou Seamus Finnigan, o garoto do time de basquete que só pensa em garotas. Toda escola tem um desses. – Quando vai mostrar mais alguma música para nós?

–É, Harry – concordou Parvati Patil, com sua voz fina de patinho assustado.

–Estou trabalhando nisso – respondi, fazendo pouco caso.

–Vocês tem, tipo, um canal no YouTube, ou algo assim? – perguntou ela. – Eu realmente gostaria de ver vocês tocarem.

–Não... – tentei falar, mas me interromperam.

–Você e sua banda podiam tocar no Baile de Inverno! – continuou Seamus. O resto do pessoal soltou exclamações de surpresa e animação, e imediatamente começaram a tagarelar sobre o quão fantástico isso seria. – Fala com Dean, ele que está organizando. Dean! Vem aqui!

–Não vem aqui, não – sussurrei, apavorado, mas ninguém ouviu.

Me perguntei como as coisas tinham saído de controle daquele jeito.

Depois de me lançar um olhar mal-humorado, Dean separou-se de seu próprio grupo e veio em nossa direção. Tentando controlar meu desespero, lembrei a mim mesmo que eu era o principal responsável por a ex-namorada dele ter mudado tanto e dado um pé na bunda dele. As pessoas comentaram isso durante dias.

–O que foi? – perguntou ele a Seamus, que começou a tagarelar a ideia de colocar eu e minha banda para tocar no Baile de Inverno, daqui a alguns meses. Lembrei a mim mesmo que minha banda nem ao menos tinha um nome. Ou um baterista. Mas era tarde demais para mencionar isso. – É uma possibilidade.

Dean olhou para mim novamente, como se analisasse o fundo de minha alma em busca de informações que pudessem me destruir. Seus olhos caíram em minha camiseta do Green Day. Imediatamente percebi que era a mesma camiseta surrada que eu tinha emprestado a Ginny algumas semanas atrás.

–Mas não podemos colocar vocês na apresentação se não nos mostrarem mais músicas – disse ele, friamente. – Tem um pessoal na outra turma interessado em tocar também.

–O quê? Quem? – perguntou Seamus, exaltado – Não pode ser aquele bosta do Malfoy, pode?

Dean deu de ombros.

–Temos que admitir que os caras tocam bem – disse ele.

–Mas tocam coisas velhas – resmungou Lilá. – Queria escutar algo novo.

Enquanto eles discutiam para saber qual banda era melhor e qual guitarrista era mais bonito, suspirei e olhei para o livro em minha frente, sentindo uma pontada de pena deles. Será que é tão difícil fazer um simples projeto de Sociologia?

Mentalmente exausto, abaixei a cabeça e comecei a fazer o trabalho. Sozinho.

Maggie Black

This ain’t a song for the broken-hearted – cantava Harry, tocando violão e fazendo cara de mau – Nor a silent prayer for faith-departed...

–Harry, você tá cantando errado! – gritou Ginny, rindo. Em resposta, ele voltou a cantar. Alto. Muito alto.

IT’S MY LIIIIFE IT’S NOW OR NEVEER! I AIN’T GONNA LIFE FOREVER!

–Ah, mas não vai mesmo – disse Ginny, se levantando e avançando ameaçadoramente para Harry.

I JUST WANNA LIVE WHILE I’M–EW! – soltou ele, segurando o violão com força e correndo pelo gramado, fugindo de uma ruiva invocada. – ALIVE! SOCORRO! MY HEART IS LIKE AN OPEN HIGHWAY...

–O que diabos eles estão fazendo? – perguntou Tio Remus, se aproximando da fogueira.

–Declarando seu amor um pelo outro – respondi, no instante que Ginny tropeçou e caiu de cara no chão. Harry começou a rir, e dois segundos depois se aproximava para ver se estava tudo bem.

Eu, Remus e Dorcas demos uma risadinha da situação. Rony estava ocupado demais se queimando com os marshmallows.

Eram umas sete da noite, e estávamos no quintal dos Potter, sentados ao redor de uma fogueira. Por mais que pareça uma situação incomum, estávamos acostumados. Esses eram os únicos momentos que conseguíamos reunir ao menos parte da família, mesmo que por algumas poucas horas. Sendo que todo mundo tinha que acordar cedo na manhã seguinte. Mas valia a pena.

James tinha organizado. De acordo com ele, fogueiras eram legais e ele também. Por isso devíamos fazer uma festinha no quintal da casa dele, com marshmallows, bolinhos e músicas no violão. Ele só mandou mensagens para todo mundo, e cinco minutos depois estávamos aqui.

Ouvimos um estrondo vindo da cozinha, som de algo de vidro se espatifando no chão, seguido de um grito agudo de mulher.

–Controle-se, Sirius! – exclamou Lily, em um tom irritadiço. Sirius resmungou algo impossível de identificar no lado de fora, e alguns segundos depois Lily sentava-se pesadamente na grama ao meu lado, parecendo furiosa.

–Que foi, Lilyzoca? – perguntou Dorcas sem ao menos olhar para a amiga, parecendo dez vezes mais interessada nos próprios marshmallows. Ao lado dela, Rony observava atentamente seus movimentos, como um pupilo tentando aprender como se fazia.

–De acordo com eles, hoje a cozinha é “dos machos” – resmungou a ruiva, cruzando os braços. – Se eles deixarem meus bolinhos queimarem, eu juro...

–Mas não foi Sirius quem gritou antes? – perguntei, dando uma risadinha.

–Sem dúvidas – respondeu Remus – De acordo com Sirius, as cordas vocais dele são sensíveis demais.

–É por isso que ele não gosta de cantar?

–Não. Ele não gosta de cantar porque ele canta mal pra caramba.

Ri da idiotice do meu próprio pai. Às vezes você tem que olhar pra própria família para sacar o quão besta ela é.

Harry e Ginny se aproximaram ofegantes e voltaram a sentar ao redor da fogueira com a gente. Ele segurava firmemente o violão, mas não dava indicações de que iria tocar algo, provavelmente traumatizado e com medo, agora que haviam duas ruivas furiosas com ele. Ginny tinha o cabelo amassado e cheio de grama, mas não parecia se importar.

–Mãe, cadê os bolinhos? – perguntou Harry, fazendo cara de cachorrinho perdido.

–Estão com seu pai – respondeu Lily, em um tom que deixava bem claro que os bolinhos ficariam bizarros, impossíveis de se comer e no mínimo tóxicos. – Passa esse violão pra cá – mandou ela, estendendo a mão.

–Lily, você não sabe tocar – lembrou Remus, quando a ruiva se posicionou com o instrumento. Ela ergueu os olhos para o amigo, parecendo perdida.

–Ah, é – disse Lily, estendendo o violão para ele, que o pegou prontamente. – Toca alguma coisa legal.

Depois de pensar por dois segundos, Remus começou a tocar. Sorrimos em conjunto, reconhecendo a música. Lily suspirou.

I’m not angry anymore, well, sometimes I am – começou a cantar – I don’t think badly of you, well, sometimes I do.

Olhei para Tia Lily, mal podendo acreditar. Fazia anos que não a ouvia cantar. Ouvir CDs não era a mesma coisa, ao vivo era muito melhor. Eu não tinha percebido o quanto sentia falta desses momentos.

It depends on the day, the extent of all my worthless rage – cantava ela, com o olhar desfocado em direção a fogueira – I’m not angry anymore.

O silêncio que se seguiu foi no mínimo deprimente. Pelo canto do olho, podia ver James nos observando da janela da cozinha. Cada um perdido em seus próprios pensamentos, em suas próprias lembranças. Lily parecia que ia chorar. Remus a observava, apertando o violão com força. Dorcas tinha os olhos baixos, mastigando lentamente um doce. Enquanto eu pensava em alguma piadinha para fazer, meu celular vibrou.

“Onde você tá?” era uma mensagem de Ted. Olhando ao redor, notei pela primeira vez que ele não estava, apesar da presença de seu pai e de sua madrasta. Revirando os olhos para a bestalexia de meu primo, respondi:

“No pátio da Tia Lily, ao redor de uma fogueira, comendo marshmallows e tentando entender o motivo de todos terem ficado nostálgicos de repente. Vem pra cá.”

“Não posso.” Veio a resposta, alguns segundos depois “Tenho um encontro.”

–O QUÊ? – gritei, encarando a tela do celular com surpresa. Todos ao meu redor pularam de susto ao serem arrancados abruptamente de seu transe, mas eu não me importei. Comecei a rir, sem saber o motivo.

“Impossível.” Mandei para ele, provocando.

“Tô terminando de me arrumar no meu quarto. Quer conferir?”

Pedi licença, levantei e saí correndo. Alguns segundos depois estava na casa de Remus, subindo as escadas rapidamente. Sem nem bater, abri abruptamente a porta do quarto de Ted.

–Não pode ser – murmurei para mim mesma, ao ver ele parado na frente do espelho, cutucando o próprio cabelo. Pelo reflexo, ele me direcionou um sorrisinho no mínimo irritante.

–Achou que eu fosse antissocial demais para isso, não? – perguntou ele, em um tom convencido.

–Eu não achei nada – respondi – Eu tinha certeza. Quem diabos gostaria de sair com você?

–Muita gente – ele revirou os olhos, parecendo não conseguir tirar o sorriso da cara – Eu sou irresistível.

–Mas quem... – comecei, mas antes de terminar a pergunta, a ficha caiu. – Não me diga... A vizinha loira!?

Ted virou para mim, e abriu os braços, mostrando a roupa.

–Maneiro o suficiente? – perguntou, ignorando totalmente minha cara de surpresa.

Ted estava, de fato, muito bonito. Tinha trocado as costumeiras camisetas de banda amassadas, por uma camiseta de banda não amassada (o que era uma baita de uma evolução, levando em consideração que falávamos de Ted Lupin). Uma calça jeans escura, com sua barra para dentro dos coturnos. E tinha algo de diferente em sua expressão. Abandonando a constante expressão de tédio, Ted sorria. E era o que fazia toda a diferença.

–Uau – suspirei, o analisando de cima a baixo – Dessa vez você caprichou. A garota deve ser especial, huh?

Novamente, ele ignorou minhas provocações, e saiu do quarto a passos largos. Por costume, o segui.

–Onde você vai levar ela? – perguntei, correndo atrás deles nas escadas.

–Vamos assistir a um filme aqui mesmo – respondeu ele, apontando para a sala de estar, tentando parecer desinteressado. Mas eu o conhecia melhor do que ele imaginava. Sabia que por dentro Ted estava saltitando como um filhotinho. – Depois talvez vamos dar uma volta. Ainda não sei.

–Nossa – comentei, sentando na bancada da cozinha, enquanto ele fuxicava nos armários de cima. – Que empolgante.

O garoto me lançou um olhar desconfiado.

–Aconteça o que acontecer, não conte para meu pai – pediu ele, sério.

–E como você espera esconder de Remus que você está com uma garota na sala de estar dele? – perguntei, zombando.

–Só segura ele lá na Tia Lily o máximo que você puder – continuou ele, subitamente demonstrando uma leve expressão de medo – Não quero ver eles comentando nada sobre mim. Dorcas ia fazer o maior fuzuê.

Mesmo sem entender porque diabos ele estava preocupado com isso, assenti. Alguns segundos depois ele me expulsou de casa, alegando que ia buscar Victoire, e me ameaçando de morte se eu contasse para alguém.

Enquanto atravessava novamente a rua, em direção a casa de Harry, observei a casa dos Weasleys, pensativa. Aconteça o que acontecer, pensei, nunca vou deixar Ted esquecer desse dia. Sorri, percebendo que finalmente o garoto estava crescendo.

Saí do meu estupor ao ouvir um barulho de vidro se quebrando na casa dos Potter, acompanhados dos gritos histéricos de Lily.


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