No Olimpo dois deuses andavam, sem parar, de um lado para o outro. Cada um isolado dos outros ao redor, perdidos em pensamentos. Cada deus com seus devaneios.

Hermes pensava em uma maneira de impedir que seu filho se perdesse. O deus buscava desesperadamente uma cura para o que viria em um futuro muito próximo... “Ela. É Ela. Algo relacionado à menina... Mas ela será a única escapatória dele”. Um suspiro lhe escapa e o deus volta aos seus afazeres.

Zeus tinha em mente, mandar um sátiro levar sua filha em segurança até o famoso acampamento. Sua consciência e seu peito pesavam por ter dado a sua única filha um destino terrível. A menina sofria as consequencias dos atos do pai. E esse, entre outros fatos, era errado e injusto... Mas como os meios-sangues tão bem sabiam, não tinham muitos direitos garantidos e sim muitos deveres.

O peso de ser um semideus é algo ao qual nenhum humano conseguiria medir em palavras. Crianças poderosas com raros talentos e mais responsabilidades do que seria o recomendado. Uma criança nascida de um dos Três Grandes tinha todos esses raros talentos dobrados... E o peso deles também.

“... Mas nenhuma dessas crianças tem um deus indignado seguindo-a, com um desejo insaciável de vingança e sangue.” Zeus pensava enquanto percorria extensos jardins, em áreas mais afastadas de todo o Olimpo. “E eu consegui complicar ainda mais a vida dela”

Um longo e pesado suspiro escapou do Senhor dos Céus.

“Ela só não sofre mais porque, por algum milagre, eu consegui controlar era e sua vontade de ver a menina e a mãe mortas” Zeus completou seus pensamentos com uma raiva imensa.

Hera tinha todo e completo direito de ter raiva e ódio... Mas de maneira alguma deveria descontar em mortal algo que ela devia descontar e cobrar dele próprio. Matar a criança e sua mãe só apagaria a prova da traição, mas não mudariam nada.

Com esses pensamentos tristes e realistas fizeram o deus decidir. Ele empinou o queixo e endireitou os ombros caídos. Com passos firmes ele se afastou ainda mais do Olimpo e de todos os que poderiam incomodá-lo.

 - Um sátiro ira levar Thalia em segurança até o Acampamento Meio-Sangue. – Zeus pronunciou essas palavras em alto e bom som como para ter a confirmação de que estava fazendo o certo.

E essa confirmação veio em forma de alivio e alegria... Em partes.

Sendo assim uma Mensagem de Iris surgiu no meio do acampamento visível para todos.

Os campistas estavam jantando, cada qual com seus irmãos enquanto na mesa principal os dois líderes e representantes do acampamento aparentavam indiferença e normalidade, escondiam de todos, as inseguranças e medos que vieram junto com as sombras. O deus sabia a causa de tamanha inquietação, mas não dividia a informação com Quíron.

Conversas e risadas ecoavam de forma animada e todos os campistas desfrutavam do que era, aparentemente, uma noite quente de primavera... Até a mensagem aparecer.

É verdade que há muito tempo Dioniso esperava por aquela mensagem; a ordem simples e clara de Zeus. Mas também é correto dizer que não esperava que ela surgisse tão publicamente.

-Mande um sátiro. Mande atrás dela. Traga-a para a segurança do Acampamento.

Zeus foi breve. Era visível para o deus do vinho, que ele andara preocupado e que esta decisão fora tomada sem a consciência precisa do Conselho Olimpiano. O timbre da voz do Senhor dos Céus era forte, decidido e inegavelmente autoritário; hoje esta demonstração de firmeza faliu, pelo menos para o Deus que o conhecia melhor que os outros.

Dioniso se limitou a assentir e a mensagem se dissipou no ar, levando consigo a imagem quase perfeita de Zeus. Todos estavam atônitos demais para sequer perguntar o que acontecia. O deus se levantou e com uma voz perigosamente calma chamou:

- Todos os sátiros para a clareira onde se realiza o Conselho de Casco Fendido.

Ele caminhou lentamente para a região em que falara enquanto deixava para trás campistas, sátiros e um centauro, muito confusos e preocupados. Embora confuso Quíron não hesitou em seguir o imortal até a beirada da floresta.

Vendo que nenhum sátiro se mexia, Dioniso gritou:

-AGORA!

Inevitável dizer que todos “despertaram” e correram na frente abrindo caminho e preparando a clareira para a inesperada reunião. Quíron se virou no ultimo segundo e comunicou os campistas.

-Assim que tudo estiver esclarecido, todos vocês serão devidamente informados. Até lá, voltem para os chalés e tenham uma boa noite.

Cada um seguiu para um lado; relutantes, mas seguiram. Assim que todos se mostraram presentes na clareira Dioniso falou. O deus contou tudo o que sabia sobre a quebra do juramento entre os Três Grandes. O choque que se espalhou não foi maior do que a revelação de que a criança era uma menina e que seus traços físicos eram todos herdados do Senhor Zeus.

- Hades deseja vingança. Ele clama por sangue e não estará saciado até ter a alma da menina em seus domínios. Todos os sátiros disponíveis sairão na busca pela menina Thalia. Fui claro? Alguma pergunta? – Dioniso concluiu e esperou alguém se manifestar.

Um sátiro jovem e que aparentava ser bastante atrapalhado perguntou uma duvida praticamente coletiva.

-Senhor, como saberemos que é ela?

- Grover, não? – o jovem assentiu um pouco constrangido – Dizem que ela apresenta uma beleza digna e, talvez, até superior a das filhas de Afrodite; uma beleza natural e perigosa como a de Ártemis – Dioniso fez uma pausa olhando para todos os sátiros ao seu redor, que por sua vez, suspiravam pensando nas deusas e na beleza singular da menina - Tem os olhos mais azuis possíveis. Se olhar bem fundo neles, conseguira ver a imensidão e todos os mistérios do céu. Cabelos longos e cacheados apenas nas pontas de um tom escuro de castanho. - mais passos e olhares penetrantes foram dirigidos aos sátiros – Se a virem lutando, a menina apresenta uma ferocidade digna de uma criança de Ares. É criativa como um bom filho de Atena.

O imortal deu uma pausa, como se pensando e escolhendo melhor as palavras.

- Se prestarem atenção, irão notar que ela tem uma mínima fração de características, tanto físicas quanto relacionadas à sua personalidade, de todos os filhos de Zeus. Isso tudo sem contar na áurea forte que todo filho dos Três Grandes possui.

Dioniso se calou e esperou até todos digerirem as muitas informações para uma noite só. Quíron continuou, como se finalmente saísse do estado de choque.

- A menina deve ser trazida em segurança até o Acampamento Meio-Sangue. Não façam nada que comprometam a missão. É crucial termos esta criança em segurança. Ela pode ser a criança da profecia e devemos protegê-la das ameaças de fora. O primeiro sátiro que encontrá-la mandará uma Mensagem de Iris para nós e avisará aos outros sátiros. Não façam nada, nada, que comprometa a missão.

Todos os sátiros assentiram e se dispersaram para partir, deixando na clareira o centauro e o deus.

-Que Hades não apegue! – Quíron murmurou baixinho esta prece de todo sincera e saiu da clareira.

Dioniso permaneceu no lugar; o deus não se sentia à-vontade com toda aquela agitação voltada para a menina de Zeus.

“Semideuses exibidos!” foi tudo o que pensou antes de seguir pelo caminho que tinha vindo.